sábado, dezembro 07, 2019

Espiritismo: a crença na reencarnação e na comunicação com os espíritos


     
   O Brasil, segundo o IBGE, tem 20 milhões de adeptos do espiritismo. Se forem contadas as pessoas que praticam outras religiões, mas simpatizam com a doutrina espírita, esse número pode ser muito maior, o que faz do Brasil a maior nação espírita do mundo. É também uma religião que cresce bastante, especialmente os segmentos com maior nível intelectual, já que o seu principal meio de divulgação são os livros. A maioria deles psicografados, alguns dos quais se tornaram best seller, como o juvenil Violetas na Janela.
            O espiritismo surge em meados do século 19, quando começam a se tornar famosos médiuns capazes de se comunicarem com os espíritos, mas só se estruturou de fato a partir da obra de Alan Kardec, pseudônimo de Hippolite Léon Denizard Rivail.
            Rivail era um famoso professor francês, discípulo de Pestalozzi. Aos 18 anos, ele já era professor de uma escola secundária e traduzia livros do inglês e do alemão para o francês. Escrevia livros no sentido de facilitar o entendimento de disciplinas como aritmética e sobre pedagogia.
            Era também um espírito racional e interessado pelas descobertas científicas de sua época, inclusive do ponto de vista da metodologia científica. Assim, ele não acreditou quando lhe falaram do fenômeno das mesas girantes, que, teoricamente, falava através de um código de batidas no solo. Na época, esse fenômeno era a diversão elegante das elites dos grandes centros urbanos europeus. Homens e mulheres davam-se as mãos em círculo ao redor de mesas redondas, que se erguiam sem serem tocadas. As perguntas, respondidas pelas mesas através de batidas no chão, geralmente se concentravam em futilidades.
            Rivail soube do fato e concluiu que se tratava de algum fenômeno magnético, mas, ao ser informado  que as mesas respondiam perguntas com inteligência e até compunham textos literários, ele achou se tratava de um conto de carochinha: “Só acreditarei quando o vir e quando me provarem que uma mesa tem cérebro para pensar, nervos para sentir e que possa tornar-se sonâmbula”.
            Ao participar das reuniões, na casa da senhora Planemaison, ele se espantou ao perceber que o fenômeno era autêntico.  Nesse período, já havia uma transição do uso das mesas para o uso de cestas com lápis, que eram seguradas por dois médiuns e escreviam diretamente sobre o papel.
            Rivail usou sua sólida formação filosófica e científica para estudar o fenômeno e começou a modificar o caráter das reuniões. Ele levava para as sessões uma série de perguntas metodicamente preparadas, que eram respondidas com precisão pelos espíritos. Chegou a um ponto em que, se ele faltava, os outros não sabiam o que perguntar.
            Usando um elemento importante da metodologia científica da época, a indução, ele evitava hipóteses, estudando caso a caso, comparando respostas e selecionando-as. “Cada espírito, em virtude de sua posição pessoal e seus conhecimentos me desvendava uma face daquele mundo”, escreveu ele, em O Livros dos Médiuns.

Alan Kardec

            Nessa época surgiu a ideia de reunir os resultados desses estudos na forma de um livro. Rivail foi incentivado por um grupo de estudiosos que incluía membros da Academia Francesa, livreiros e editores, muitos dos quais lhe entregavam material recolhido em reuniões mediúnicas. O codificador seguia o princípio “Observar, comparar e julgar” na seleção e organização do material. Ele contou também com uma revisão feita pelos espíritos através da médium Japhet em sessões na sua casa, com dia e horas marcadas.
            Na hora de publicar, Rivail resolveu não usar seu nome verdadeiro, já muito associado a livros didáticos. Ele acabaria assinando O Livro dos Espíritos como Alan Kardec. O nome surgira de uma comunicação de seu espírito protetor Z, que lhe revelara que ele fora um sacerdote druida em outra encarnação, nos tempos de Júlio César.  Alan Kardec, seu nome druida, foi o nome como Rivail passou a ser conhecido a partir dali.
            O Livro dos Espíritos, lançado em 18 de abril de 1857, em Paris, foi um sucesso estrondoso. Logo a publicação se espalharia por todos os países da Europa e da América. Kardec recebeu inúmeros elogios e cartas pessoas famosas e anônimas.
            A publicação era dividida em 501 perguntas e respostas, que depois seriam ampliadas para 1019 e trazia os princípios básicos da filosofia espírita, incluindo a crença na reencarnação e na comunicação com os espíritos.
            Apesar do sucesso, O Livro dos espíritos despertou reações contrárias. Um padre de Lyon chegou a acusar Kardec de estar ficando rico com o espiritismo. Na Espanha, o bispo de Barcelona mandou queimar 300 exemplares da obra em praça pública no episódio que ficou conhecido como auto-de-fé de Barcelona. O resultado foi o oposto do esperado: os populares disputavam os poucos livros não queimados e a cidade viveu um grande interesse pelo espiritismo. “Podem queimar livros, mas não se queimam ideias”, escreveu Kardec.

Doutrina
            A doutrina espírita parte de alguns princípios: a existência de Deus, a imortalidade da alma, a reencarnação, o esquecimento do passado, a comunicação com os espíritos, a existência de vida em outros mundo, a lei da ação e reação, a fé raciocinada, a lei da evolução e a lei moral.
            O espiritismo kardecista acredita que Deus existe e é a causa primeira de todas as coisas, mas é impossível ao ser humano conhecê-lo totalmente, pois somos imperfeitos.
            O homem é criado simples e ignorante e evolui através das diversas encarnações. Assim, embora o corpo seja mortal, a alma é imortal. Quando está no corpo, diz-se que o espírito está encarnado. Quando morre, desencarna e volta para o plano espiritual, mas continuam com muitas das características que tinham durante a vida: preguiçosos ou trabalhadores, cultos ou medíocres, verdadeiros ou mentirosos.
            Segundo o espiritismo, os espíritos estão em toda parte, inclusive entre nós. Os menos evoluídos são os que mais se agarram ao plano material, ficando junto das pessoas. Outros vão para o umbral. Os menos apegados às paixões e ao mundo espiritual seguem para colônias espirituais. O espiritismo não acredita no inferno. 
            Os espíritos evoluídos voltam à terra em missões espirituais de consolo e ajuda a pessoas necessitadas. Tanto esses quanto os menos evoluídos influenciam em nosso pensamento, mas não podem agir sobre a matéria. Para fazer isso, eles necessitam de médiuns.
            Sãos os médiuns que permitem uma comunicação mais efetiva entre os espíritos desencarnados conosco. Segundo o kardecismo, nem todo espírito que se comunica conosco é digno de crédito, já que há muitos enganadores.
            A função das reencarnações é a evolução espiritual. O ser-humano, segundo a doutrina espírita, tem o livre-arbítrio e pode escolher entre o bem e o mal. Quando escolhe o bem evolui de encarnação em encarnação, como um aluno na escola, passando de uma série a outra. Normalmente, um espírito precisa reencarnar várias vezes antes de conseguir passar para um estado mais evoluído, adquirindo conhecimento intelectual e principalmente espiritual através das várias vivências.
            Muitas das reencarnações ocorrem para resolver problemas do passado. Assim, é possível que inimigos reencarnem na mesma família, como forma de resolverem suas diferenças através do amor.  Essa é a razão pela qual o ser humano esquece as encarnações passadas. Se lembrássemos do passado, teríamos dificuldade para nos reconciliar com inimigos que hoje convivem conosco como filhos, irmãos, mães ou pais.
            Para o espiritismo, quando reencarnamos, traçamos um "plano de vida", com compromissos assumidos com a Espiritualidade e conosco, e que dizem respeito à reparação do mal e à prática de todo o bem possível. Muitos escolhem sofrimentos que ajudarão a reparar erros de outras vidas. Outros dedicam sua vida a ajudar os outros, reparando-se através do amor. Assim, os sofrimentos não são uma punição de Deus, mas uma escolha do espírito para espiar erros do passado.
            A partir de um determinado nível de evolução, o espírito passa para outro planeta, de categoria mais elevada. A Terra é vista como um mundo de provas e expiações, acima apenas dos planetas primitivos onde encarnam as almas mais jovens e menos sábias. Num nível mais elevado, há os mundos de regeneração, que servem de transição para o nível mais elevado dos mundos felizes. Nos mundos de regeneração, a alma encontra a paz, o descanso e evolui. Mas ainda é um mundo físico em que se experimenta o desejo, mas sem as paixões desordenadas. 
            Nos mundos felizes, o bem supera totalmente o mal. A matéria é menos densa e os espíritos são mais livres das garras da matéria. A autoridade é sempre respeitada, pois decorre unicamente do mérito. Também a reencarnação acontece mais rápido justamente pela proximidade entre corpo físico e espiritual.
            Finalmente, no patamar mais elevado, existem os mundos celestes ou divinos, em que só reina o bem.


Chico Xavier 

            Chico Xavier é o mais famoso médium brasileiro e grande responsável pela popularização do espiritismo no país. Sua importância é tão grande que ele era respeitado até mesmo por pessoas de outras religiões. Quando morreu, aos 92 anos, em junho de 2002, deixou 412 livros psicografados, a maioria de autoria de seu parceiro espiritual, Emmanuel, reencarnação do padre Manoel da Nóbrega. Por seu pacifismo e luta em prol dos necessitados, é comparado a Gandhi, Madre Tereza de Calcutá e São Francisco de Assis.
            Chico Xavier nasceu em Pedro Leopoldo, Minas Gerais, em 2 de abril de 1910. Desde pequeno revelou sinais de mediunidade. Aos quatro anos, um espírito lhe disse que o aborto da vizinha havia sido espontâneo, e não provocado. Os pais não lhe deram atenção.
            Em 1915, a mãe morreu e Chico passou a ser criado pela madrinha, que o maltratava continuamente. Nessa época a mediunidade aflorou e ele, sempre que era castigado, corria para o quintal, para se consolar com o espírito da mãe.
            Apesar da mediunidade, ele continuava freqüentando a igreja católica. Mas em 1927 resolveu aderir definitivamente ao espiritismo. Foi nessa época que lhe apareceu o espírito Emmanuel, que o acompanharia pelo resto da vida.
            A fama veio na década de 1970, quando Chico participou do programa Pinga Fogo, da TV Tupi. O sucesso foi imediato e houve um grande interesse pelo kardecismo a partir de então.
            Filas de pessoas se formavam na frente do Centro Espírita onde ele atendia, em Uberaba (MG), procurando notícias de pessoas desencarnadas. Nem sempre se conseguia contato com o espírito, mas quando esse contato acontecia, até as gírias e assinaturas eram iguais.
            Apesar do sucesso, Chico continuava uma pessoa humilde e vivia com simplicidade. Sua única fonte de renda era a aposentadoria de funcionário público do Ministério da Agricultura. O dinheiro dos 30 milhões de livros vendidos ia todo para instituições de caridade.
            Chico nunca se casou, mas adotou um filho, o dentista Eurípedes Higino dos Reis, hoje diretor do Grupo Espírita da Prece e do Museu Chico Xavier.
            Pouco antes da sua morte, uma câmera de TV captou duas luzes que caíram do céu e entraram pela janela onde Chico estava. A fita foi mandada para perícia, que revelou que as imagens não haviam passado por nenhum tipo de manipulação. Ele revelou que as luzes eram o espírito de Emmanuel e de sua mãe.
            Chico morreu em casa, no dia em que o Brasil conquistou o pentacampeonato de futebol, no Japão. Seu corpo foi enterrado no cemitério São João Batista, em Uberaba.

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