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sábado, agosto 02, 2025

Capitão América – Se houver amanhã

 


Na trama criada por JM DeMatteis e Mike Zeck para o encontro do Capitão América com Deathlok, no ano de 1986, uma organização criminosa lançara um plano de extermínio de super-heróis. Esses foram enviados para dimensões separadas, onde acabaram sendo mortos. Como resultado, a Terra se tornou uma distopia.

No número 289 da revista Capitain America, o sentinela da liberdade volta para 1986 para tentar impedir que isso aconteça.

O Capitão precisa impedir um plano para matar todos os super-heróis. 


O plano já está em execução, então ele não pode pedir ou contar com o auxílio de nenhum grupo de heróis. Nessa época, o Capitão era um herói fodão, que sozinho conseguia salvar o mundo.

A sequência mais interessante é quando entra na sede da organização e precisa destruir gerador que transportará todos os heróis para as dimensões paralelas. O meio de defesa são raios psíquicos, que cavam as profundezas do inconsciente e projetam horrores aos quais nenhuma mente resiste.

Mike Zeck faz toda uma sequência em um único quadro. 


A sequência era JM DeMatteis exercitando a profundidade psicológica que o tornaria célebre anos depois com Mooshadow e A útlima caçada de Kraven.

Por outro, lado, Zeck se mostra extremamente competente e criativo nos desenhos. Ele, por exemplo, usa um quadro só para mostrar todo uma sequencia de ação impressionante, com o Capitão se movimentando ao redor de um robô.

A edição trazia uma história imaginária. 


Uma curiosidade é que a edição americana trazia uma história, curta, imaginária, na qual Bernie torna-se uma super-heroina, Bernie America.

A capa de Watson. 


 A Abril cortou essa HQ e, como a capa fazia referência a ela, a solução foi encomendarem uma capa original para o artista brasileiro Watson, que fez um belo trabalho.

Raul Seixas - Eu sou

 


Se estivesse vivo, Raul Seixas estaria fazendo 80 anos. Para marcar a data, a Globo produziu a minissérie Raul Seixas – Eu sou. Dirigida por Paulo Morelli, ela conta a história do pai do rock nacional, desde a infância até a sua morte em 1989.

O seriado começa errático. O primeiro capítulo foca em um show de Raul na cidade de Caieiras, no ano de 1982, no qual Raul foi confundido com um farsante, atacado pela multidão e preso por policiais. Raul pergunta: se eu não sou eu, quem eu sou? E esse é gancho para contar sua história. É uma ideia interessante, que atrai o expectador desde o início. Mas o roteiro acrescenta tantas linha narrativas, com tantos saltos temporais, que a história se torna confusa.

Esse problema vai sendo resolvido nos capítulos seguintes, com uma narrativa mais clara ao mesmo tempo em que o espectador vai se fascinando com a história do cantor.

Seria impossível fazer um seriado ruim sobre Raul pela simples razão de que só suas músicas já salvariam a atração. Mas Paulo Morelli maneja bem a trilha, usando-a para pontuar os mais diversos momentos, dos mais tristes aos mais empolgantes, passando por momentos verdadeiramente hilários, como quando Raul foi fazer um show em um garimpo no Pará e quase morre quando começa um tiroteio. Isso é facilitado pelo fato de Raul ter mais de 200 músicas, o que torna muito simples encontrar pelo menos uma adequada para cada momento.

Outro destaque é mostrar, ainda que de forma ficcional, como Raul revolucionou o rock ao misturá-lo a ritmos nacionais, como o baião.

Além disso, há algumas boas metáforas, como a do elevador em que cada andar representa um ano, antecipando a morte do cantor, aos 44 anos.

No elenco se destaca Ravel Andrade, que faz o protagonista e imita com perfeição até mesmo a maneira de andar do cantor. Já João Pedro Zappa, que faz Paulo Coelho, parece e caricato em alguns momentos, mas nada que comprometa a série.

No últimos episódios, já estamos tão envolvidos na história do pai do rock que a tendência é maratonar.

X-men – Wolverine à solta

 


Quando tornou-se co-roteirista dos X-men, John  Byrne começou a dar protagonismo ao Wolverine. A razão é que o desenhista queria chamar atenção para um herói canadense como ele. Mas esse processo logo transformaria o baixinho em um dos personagens mais populares da Marvel.

Em nenhum outro momento o protagonismo do herói foi tão relevante quanto em The Uncanny X-men 133. Na história anterior, todos os X-men tinha sido facilmente derrotados e aprisionados pelo círculo interno do Clube do Inferno, com excessão de Wolverine, que foi jogado no esgoto.



A revista começa exatamente com os capangas do Clube no subsolo do local, procurando pelo Carcaju enquanto ele se equilibra acima deles, no teto. Sem dúvida, uma das cenas mais célebres dos X-men de todos os tempos, assim como toda a sequência seguinte.

Wolverine salta do teto e enfrenta os capangas. No final sobra apenas um. Wolverine se mostra em toda a sua essência, numa perfeita demonstração de como o texto de Claremont encaixava perfeitamente nas imagens criadas por Byrne: “Sei o que está pensando, xará. Ele tá ferido, a cinco metros de distância e meu fuzil está carregado. A pergunta é: eu consigo matar o Wolverine antes que dele me alcançar e me fatiar como um sushi com aquelas garras?”. No final, o homem, apavorado, joga sua arma no chão e se entrega.



Só essa sequencia já valeria a história, mas há duas outras, igualmente antológicas.

Na primeira, a Rainha Negra trata Ororo como escrava, revelando como o lado sombrio se apossara dela.



Na segunda, Ciclope tenta entrar em contato com Jean usando o elo mental que existia entre eles. Byrne desenha a sequência sem cenários, com um fundo branco. Em contraste com as outras cenas, repletas de cenários, fica claro que aquela sequência se desenrola num espaço mental. E é nesse ambiente que Cíclope é derrotado e morto pelo Mestre Mental em um duelo de espadas.

sexta-feira, agosto 01, 2025

Livro A árvore das ideias marca 35 anos de carreira de Gian Danton

 

 

Em 2024 o roteirista de quadrinhos Gian Danton completa 35 anos na área de quadrinhos. Para marcar a data, a editora Marca de Fantasia lança o livro e-book A árvore das ideais – memórias de um roteirista de quadrinhos.

O livro é uma junção de textos e quadrinhos autobiográficos e narra a trajetória do roteirista desde a infância até o momento atual, passando por sua parceria com Bené Nascimento, a criação do grupo Ponto de Fuga e até mesmo a produção literária. Também a atuação na área acadêmica é focada na obra, assim como a descoberta do diagnóstico de autismo.  

A obra traz, na parte visual, a colaboração de três dos principais parceiros de Gian Danton: Bené Nascimento (Joe Bennett) fez a ilustração da capa; Antonio Eder desenhou duas HQs e JJ Marreiro desenhou uma HQ e fez o design da capa. Edgar Franco, orientador de doutorado de Gian, assina o prefácio.

Entre as várias histórias contadas no livro estão os bastidores cômicos da criação da revista Manticore, o falso Gian Danton e o psicopata que fez com que o roteirista começasse a pesquisar sobre serial killers.

O livro tem 184 páginas e pode ser baixado gratuitamente no link https://www.marcadefantasia.com/livros/quiosque/a_arvore_das_ideias/a_arvore_das_ideias.htm.

Sandman – A série televisiva

 


Durante anos os fãs de Sandman esperaram uma série ou um filme do Mestre dos Sonhos. Mas, enquanto personagens secundários da série, como Lúcifer, ganhavam sua versão áudio-visual, Morpheus parecia nunca ter sua chance na tela, seja pequena ou grande.

Agora descobrimos porque isso aconteceu. Neil Gaiman esperava a possibilidade de ter controle sobre sua criação, o que finalmente aconteceu com a série recentemente lançada pela Netflix , na qual Gaiman atuou como produtor executivo, roteirista e consultor. Há relatos de que ele interferia até mesmo na direção de atores, repreendendo constantemente o ator: Tom Sturridge: “Você não é o Batman!”.

O resultado é uma extremamente fiel aos quadrinhos a ponto de muitas vezes parecer que estamos vendo uma versão animada dos quadros.

Em alguns casos, a versão do seriado é melhor que a dos quadrinhos, pois o tempo da série, sendo maior que a de uma revista de 24 páginas, permite que os roteiristas consigam explorar melhor os personagens e situações.

Exemplo disso é o capítulo cinco, que adapta a história 24 horas. Até então o seriado vinha trabalhando com várias narrativas paralelas. Nesse episódio, a ação foca apenas na lanchonete na qual está o Doutor Dee com o rubi dos sonhos, criando uma uma utopia às avessas em que todas as regras de civilidade são dispensadas. A estratégia, inteligente, cria uma sensação de claustrofobia, como se o expectador estivesse ali, preso junto com os clientes da lanchonete. Detalhe: a atuação de David Thewlis é fenomenal como Doutor Dee.  

Outro episódio memorável – e que também acaba sendo melhor que a HQ, é O som das asas dela, que mostra o encontro de Sonho com sua irmã, a Morte. A atuação de Kirby Howell-Baptiste é marcante e dá o tom de alegria e acolhimento que a personagem exige. Além disso, sequências como a do violinista ganham muito quando o receptor consegue ouvir o som. De forma inteligente, os roteiristas conseguiram ligar esse episódio a um conto de Sandman no qual ele encontra o homem que não morre. As duas histórias têm o mesmo tom emotivo e sensível.

Embora o seriado seja muito fiel aos quadrinhos, temos visto muitas pessoas reclamando das “mudanças”, que na visão delas “estragariam” essa versão.  Neil Gaiman tem dito que quem está reclamando das mudanças ou não leu, ou não entendeu os quadrinhos – e minha tendência é concordar com ele. Todas as mudanças no seriado já estavam implícitas na obra original.

Nos quadrinhos, os perpétuos são mostrados como seres antropormóficos que são vistos de forma diferente ao longo da série: negros, brancos, asiáticos. Aliás, até mais que antropormóficos, já que em um dos episódios mais célebres, “Um sonho de mil gatos”, Morpheus é mostrado como um gato. Diante disso, é difícil entender quem reclama que a Morte seja interpretada por uma atriz negra. Ela poderia ser interpretada por uma atriz latina, asiática, marciana – e ainda continuaria sendo a Morte. Aliás, Gaiman tem afirmado que escolheu a atriz pelo teste de câmera: ela foi quem se saiu melhor, o que percebemos por sua atuação soberba no episódio seis.

Em alguns casos as mudanças foram uma necessidade da produção, como aconteceu com John Constantine, que já estava comprometido com outra série e não poderia ser usado em Sandman. Gaiman trocou-o por Joana Constantine, uma personagem que já tinha aparecido nos quadrinhos. Aliás, a personagem agradou a ponto de muitos estarem sugerindo uma série prequel com ela – essa proposta tem todo o meu apoio.

Outra crítica comum é dizer que o seriado estaria forçando na lacração, como em colocar Joana Constantine como lésbica. Quem faz essa crítica esquece que Sandman foi o primeiro quadrinho do mercado de comics a mostrar uma personagem abertamente lésbica, isso no número 6 da revista, portanto no primeiro arco.

Sejam por necessidade ou não, a maioria das mudanças ou é indiferente ou acrescentou algo ao material original.

Em tempo: Sandman  parece estar agradando. O seriado está em primeiro lugar na Netflix em dezenas de países.  O lado ruim disso é que com certeza agora os quadrinhos ficarão ainda mais caros. Quem tem a coleção original da editora Globo, como eu, que guarde bem guardado.

Homem-aranha – O sinistro Shocker

 


Uma das razões pelas quais o título do Homem-Aranha se tornou um dos mais queridos dos leitores foram os diálogos inspirados escritos por Stan Lee, especialmente na interação de Peter Parker com o ranzinza JJ. Jameson, a exemplo do que vemos na história publicada em The Amazing Spiderman 46.

Na história, o aracnídeo se depara com um novo vilão, capazes de provocar tremores suficientes para arrombar um cofre de banco. O herói tira as fotos do confronto do aranha com Shocker e leva para o dono do Clarin, que fica maravilhado com as mesmas.

- Parece um pirado... mas com certeza venderá jornais! – exclama o sovina.

- Foi o que pensei! Então que tal umas verdinhas? – sugere Parker.

- Se quer salada, vá à cantina lá embaixo... e ponha na minha conta!

- Estava me referindo a grana... dindin... bufunfa... dinheiro, senhor!

- Dinheiro? Não confia em mim, Parker?

- Uma pergunta dessas pode arruinar um ótimo relacionamento, JJ.

Os encontros de Parker com JJ Jameson sempre davam origem a diálogos divertidos. 


No final, o dono do Clarin acaba dando um cheque para seu fotógrafo freelancer favorito. Crédito para o ótimo trabalho do tradutor Mário Luiz Barroso que conseguiu captar perfeitamente o espírito do diálogo.

Algo curioso na história é que o herói está usando uma tipóia, consequência de uma história anterior, em que ele enfrentou o Lagarto. Parecia que Stan Lee passava o dia pensando em que tipo de roubada iria colocar o cabeça de teia: quando não era uma gripe, um pé inchado ou uma torção no braço, quando não eram problemas físicos, eram problemas psicológicos... a vida de Parker nunca parecia estar bem, o que certamente aumentava a identificação dos leitores com o mesmo.

O herói estava usando uma tipóia... 


Mas a tipóia cria um problema de verossimilhança na história.

À certa altura, Parker é seguido pelo caolho, um repórter do Clarin interessado em descobrir o segredo da relação do fotógrafo com o herói. O caolho vê Parker entrando num beco e depois o homem-aranha saindo e conclui que os dois são a mesma pessoa.

... mas isso cria um problema de verossimilhança. 


Para solucionar a situação, Parker simula uma conversa do aranha com ele mesmo, depois faz um boneco que sai balançando numa teia. Um boneco balançando numa teia conseguiria ser convicente para o olhar de um jornalista? Mas, mesmo que esqueçamos isso, tanto o aranha quanto Parker estão com uma tipóia exatamente no mesmo braço! É preciso ser muito idiota para acreditar que duas pessoas no mesmo lugar coinscidentemente haviam se machucado da mesma forma.

Oliver Twist

 


Já vi gente dizendo que queria ser roteirista de quadrinhos, mas não lia, ou lia apenas quadrinhos e, pior, só lia quadrinhos de super-heróis, ou só manga. Não é possível escrever, o que quer que seja, com o mínimo de competência, sem ser um leitor voraz, inclusive de livros.

E, entre todos os livros, existem aqueles que são leitura obrigatória por terem definido formas de narrativa. Entre eles, Oliver Twist, de Charles Dickens. O livro foi publicado em capítulos em jornais no ano de 1837, quando o autor tinha apenas 25 anos reflete a vida do próprio Dickens, cuja família passou necessidades na época em que seu pai foi preso por dívidas e os filhos tiveram que trabalhar.
O livro se passa em plena era vitoriana, quando o império britânico era o maior e mais poderoso do mundo. Mas todo esse poder e riqueza não se refletia sobre a população, que, em grande parte vivia na miséria. As péssimas condições de vida da época da são demonstradas na figura de um pequeno órfão, Oliver Twist, cuja mãe morreu de seu parto e passou a ser criado em um orfanato onde passava fome e era submetido a maus-tratos. Seguindo a ideologia científica da época, muitos dizem que Oliver, por ser filho de uma mulher sem virtudes, se tornará um ladrão e acabará na forca.
Uma das cenas mais antológicas do livro e certamente a de imagem mais forte, é a do refeitório, no qual as crianças, ao perceberem que vão morrer de fome, sorteiam um deles para pedir mais sopa (uma papa rala de cereais com cebola duas vezes por semana). O pequeno órfão é encarcerado e a reclamação é vista como mais um exemplo de que sua inclinação ao crime o levará à forca.
Depois disso, Oliver é quase colocado como limpador de chaminés (um dos trabalhos mais cruéis executados por crianças na época, já que elas eram descidas de cabeça para baixo e muitas vezes morriam por causa da fumaça ou do fogo) e acaba como aprendiz de um agente funerário, de onde acaba fugindo depois de ser vítima de uma armação.
Em sua fuga, o pequeno Oliver acaba indo parar em Londres e mas garras de um receptador especializado em adestrar crianças na arte do roubo, Fagin, o judeu (um personagem tão forte que posteriormente Dickens teve que escrever um texto tentando desfazer o anti-semitismo que o seu romance involuntariamente provocara).
E, mesmo em meio às desgraças, Oliver mantém-se sempre honesto e bom.
O livro vale tanto pela denúncia das condições sociais da época da Inglaterra à época da revolução industrial quanto pela genialidade do autor em sua narrativa repleta de ironia. Dickens é o mestre absoluto do recurso, como se observa no trecho a seguir: “Nos primeiros seis meses, após a mudança de Oliver Twist, o sistema esteve em pleno funcionamento. Foi um pouco dispendioso, a princípio, em consequência do aumento na conta do agente funerário e da necessidade de apertar as roupas de todos os indigentes, que flutuavam soltas nas suas formas encolhidas, mirradas, depois de uma semana ou duas de papas. Mas o número de inquilinos do asilo tornou-se dessa maneira reduzido; e o conselho muito se alegrou com esse resultado”.
O esquema de folhetins, precursores das atuais telenovelas, e dos quadrinhos, já existia, mas Dickens transformou-o em verdadeira literatura numa trama repleta de reviravoltas e suspense, com um protagonista ingênuo, mas bom, que se vê envolto por um destino cruel, mas triunfa no final graças à sua pureza de caráter. Lembra muito a estrutura das telenovelas clássicas, que lhe devem muito, mas nenhuma telenovela igualou-se a Dickens na crueza das descrições, nos perfis detalhados dos personagens, na crítica social e até mesmo no poder narrativo.
A sequência em que um ladrão assassina sua consorte está entre as páginas mais poderosas já escritas em todos os tempos. Os pequenos gestos, executados instintivamente, desvelam o conflito interno do personagem de forma muito mais efetiva que vários tratados de psicologia.

Existem várias versões reduzidas do livro à venda, inclusive uma da coleção O prazer da leitura, da editora Abril, que foi vendida em bancas e pode ser facilmente encontrada em sebos. Mas se puder, leia a versão integral (é possível conseguir em sebos). A necessidade de reduzir o texto faz com que a maioria das versões condensadas deixe de lado exatamente o que Dickens tem de melhor: sua fina ironia e as descrições detalhadas de personagens e ações. Mas, se não encontrar uma versão integral, leia a versão condensada: o livro é uma aula de como prender o leitor com uma narrativa folhetinesca. 

X-men – O inferno não pode esperar!

 



Na Marvel era comum vilões se transformarem em heróis. Se os leitores simpatizassem com eles e expressassem isso com cartas, Stan Lee prontamente fazia com que eles mudassem de lado. Isso aconteceu com a Viúva Negra e o Gavião Arqueiro. Mas heróis que se transformavam em vilões era algo muito raro. Na década de 1970 Jim Starlin fez com que Warlock enfrentasse uma versão maligna de si mesmo do futuro. Mas não era mostrado o processo em que o herói se transformava em vilão.

Talvez por isso, por detalhar todo esse processo, a transformação da Fênix em vilã foi o um evento que marcou muito os fãs.

O momento em que a Rainha Negra aparece pela primeira vez é um dos mais marcantes da saga. 


A personagem vinha sendo tentada por supostas recordações de uma antepassada escravista nas edições anteriores. Mas foi em The Uncanny X-men 132 que a personagem de fato foi mostrada como vilã, a Rainha Negra. Foi esse número que sacudiu o universo Marvel e transformou definitivamente os mutantes nos personagens mais populares da casa.

A capa da edição já causava um grande impacto, ao mostrar os X-men derrotados pelo Clube do Inferno em um desenho no melhor estilo John Byrne.

A edição também marca o protagonismo de Wolverine. 


Na história, os X-men, que haviam sido atacados pelo Clube nas edições anteriores, resolvem invadir uma festa de forma anônima. Mas são reconhecidos e atacados pelos vilões. Mesmo assim, eles venceriam facilmente não fosse por um fator: em determinado momento Jean Grey, influenciada pelo Mestre Mental, une-se ao Clube, tornando-se a Rainha Negra, e ajuda a derrotar os amigos.

O momento em que ela, usando uma roupa fetichista (que destoa completamente da personalidade meiga de Jean Grey) derruba o amado Cíclope é um dos mais impressionante dos quadrinhos de heróis de todos os tempos.

Confira o processo de produção da primeira história do Cabano

 



Cabano é um personagem  surgido no meu livro Cabanagem. Este ano, o herói ganhou sua versão em quadrinhos desenhado pelo grande Juliano Kaapora e publicado na revista Mestres do Terror (pedidos podem ser feitos pelo e-mail revistacalafrio@gmail.com). Na primeira história ele enfrenta a Cobra Grande. Em histórias futuras ele encontrará com diversos outros seres da floresta, entre eles o Curupira, a Matinta, o Mapinguari, entre outros. 

Confira abaixo como foi o processo de produção de uma página da HQ. 


O roteiro 

O roteiro descreve as cenas para o desenhista e apresenta os diálogos e textos. É o primeiro passo da produção de uma história em quadrinhos. Aqui pegamos o roteiro da página 4.  


Página 4

Q1 – O cabano fugindo, mas vemos ao fundo duas luzes, como se fossem dois faróis, mas são os olhos da cobra grande.

Texto: Seus pés tocam rápido a terra escavada há milênios enquanto o pesadelo vivo o persegue implacavelmente.

Texto: Embora não o veja, o cabano sabe que ele está ali, aproximando-se rapidamente.

Q2 – O cabano atirando. Minha ideia é mostrar ele de frente, como se o leitor estivesse na frente dele.

Texto: Ele se vira e atira.

Q3 – O cabano correndo pelos túneis.

Texto: Ele sabe que o tiro não irá matar a criatura. Talvez ela nem mesmo possa ser morta. Talvez seja mais velha que o tempo. Mas talvez lhe dê alguns segundos preciosos.

Q4 – O cabano fugindo e, na frente dele uma luz, como se fosse uma saída do túnel para o ar livre.

Texto: Luz. Há uma saída. Ele apressa o passo, o ar queimando em seus pulmões, rezando para que ainda haja tempo.  Ele pode ouvir o arrastar demoníaco da serpente cada vez mais próximo.


O rafe 

O rafe é um esboço do desenho. Serve como guia para a produção da história. Nesse caso, o rafe foi enviado para mim e eu e o desenhista discutimos mudanças. 


A página finalizada 

Aqui temos a página já com arte-final. Observe que o rafe foi seguido, exceto no terceiro quadro. A ideia de fazer a cobra se enrolando no quadro e vermos o Cabano através dela deu mais dinamismo e grandiosidade para a cena. 

Fundo do baú - Daniel Boone

 

Daniel Boone foi um caçador norte-americano que explorou as florestas ocupadas por indígenas no século XVIII. Em 1964 o personagem se transformou em uma série de grande sucesso estrelada por Fess Parker e produzida pela 20th Century Fox Television.

O ator já tinha feito o papel de Davy Crockett, um dos pioneiros do início dos Estados Unidos, em um seriado da Disney. A ideia da Fox era usá-lo novamente para interpretar Crockett, mas, como a Disney se recusou a ceder os direitos, a solução foi procurar um personagem histórico semelhante.

Parker usou no novo papel o mesmo chapéu de pele de guaxinim que caracterizara seu personagem anterior.

A série se passava em um período pouco anterior à revolução americana e era ambientada em Boonesborough, uma vila de pioneiros liderados por Boone. O protagonista era casado com a bela Rebecca, interpretada por Patricia Blair e tinha dois filhos, com destaque para o garoto Israel, interpretado por Darby Hinton.

A abertura do seriado mostrava Boone atravessando um riacho, montando uma armadilha e jogando uma machadinha contra um tronco que se abria ao meio revelando o nome do personagem e da série. A machadinha seria a arma símbolo do personagem, o que parece estranho, já que ela é historicamente associada aos índios. A música folclórica exaltava o personagem como um ser lendário: “Daniel Boone era um homem/sim, um grande homem! Com o olho de águia/era tão alto como uma montanha/Daniel Boone era um homem/sim, um grande homem! Ele era corajoso, ele era destemido/ e tão forte quanto um poderoso carvalho!”.

Algo que me chamava atenção, além do caráter nostálgico do seriado (ressaltado pela trilha sonora) era a forma como os indígenas eram retratados. Numa época em que filmes e seriados mostravam índios como vilões desalmados que atacavam em bandos inocentes caravanas, Daniel Boone mostrava uma versão mais simpática dos mesmos. O protagonista tinha, inclusive um amigo índio, Mingo.

No episódio O império da Perda, por exemplo, um coronel do exército britânico sequestra toda a população de Boonesborough como forma de obrigar Boone a assinar uma escritura, passando para ele a posse das terras da região para ele. Ao mesmo tempo, faz um acordo com índios segundo o qual entregaria os colonos para estes, mas era uma armadilha: quando fossem pegar os prisioneiros, os indígenas seriam bombardeados com canhões. Boone consegue convencer os índios de estão caindo numa armadilha e o filho do chefe o ajuda a danificar os canhões. No final, colonos e índios fazem um acordo de paz. A mensagem subliminar aí é bem apropriada para uma série que se passava num período pouco anterior à independência norte-americana: o verdadeiro inimigo são os exércitos ingleses.

Daniel Boone teve seis temporadas, com 165 episódios.

Camelot 3000 – Vida longa ao rei

 

O capítulo 12 da série Camelot 3000 começa desesperador. Os cavaleiros da Távola Redonda haviam invadido o décimo planeta, mas a empreitada parecia destinada ao fracasso. Lancelot havia sido, aparentemente, morto por Mordred, Tristão estava sendo esganado pelo seu antigo noivo e as tentativas de invadir o palácio de Morgana pareciam destinadas ao fracasso.

Tudo parece perdido. 


Como em toda boa história, os heróis vão do fracasso ao sucesso em poucas páginas e de maneira verossímil e empolgante (não, eu não vou dar spoiler de como isso acontece). Tudo que posso dizer é que é um final à altura dessa série, tanto em termos de desenho quanto de roteiro.

Merlim é libertado - uma das cenas mais impactantes da série. 


Mas, para além da qualidade do material original, algo que chama atenção é a forma como a Abril publicou essa história em Superamigos 6, a começar pela capa, que, ao invés de usar a capa original, usa uma colagem de duas cenas internas. Curiosamente, a colagem ficou boa, já que as duas cenas escolhidas estavam entre as mais impactantes da saga.

A história recomeça em um planeta alienígena. 


No entanto, a mudança que mais chama atenção foi a supressão de trechos da história original, mais especificamente do encontro final entre Tristão e Isolda. No final, Tristão aceita seu corpo feminino e ele e Isolda têm uma noite de amor. 

O final entre Tristão e Isolda... 


A cena original já era bastante sutil, mostrando apenas as duas deitadas na cama, de roupa, e abraçadas com alguns quadros menores que insinuavam uma relação sexual, mas os editores da Abril devem ter achado que teriam problemas e simplesmente cortaram o quadro. 

... foi censurado pela Abril. 


Para isso, eles fizeram uma montagem, juntando duas páginas em uma. Posteriormente, quando a série foi lançada em uma série em três partes, a Abril publicou a história sem cortes.