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segunda-feira, setembro 01, 2025

X-men – Fênix Negra

 


“O poder corrompe, o poder absoluto corrompe absolutamente”. Essa frase, dita pelo Professor Xavier em The Uncanny X-men 135 representa muito bem a essência da saga da Fênix Negra.

No número anterior, Jean se transformara enquanto o grupo voltava para casa após enfrentar o Clube do Inferno. Sua transformação destruíra o jato dos mutantes.

E é exatamente nesse ponto que encontramos os personagens no início do número 135.

A sequência seguinte mostra os mutantes enfrentando a Fênix. “Não espere clemência da Fênix Negra, meu amor. Vocês não terão nenhuma!”. E, de fato, a personagem revela poderes avassaladores e inimagináveis, derrotando os amigos como se estivesse numa brincadeira. Wolverine e Colossus são soterrados abaixo de uma árvore de ouro. Ororo é golpeada psiquicamente e fica inconsciente. “Imagens... me atingindo pelo elo psíquico que tenho com Jean... chamas negras consumindo sua alma! Alusões místicas incompreensíveis.... sensação de perda... afogamento... solidão”, pensa Cíclope.

Ao se transformar no seu lado sombrio, Fênix destrói a nave. 


O psicólogo Carl Gustav Jung dizia que todos nós temos um lado sombra, para onde vai tudo aquilo com o qual não conseguimos lidar. O que Claremont e Byrne mostram é Jean Grey sendo consumida pelo seu lado sombra. A história lança uma questão interessante: se a inocente Garota Marvel tinha dentro de si uma vilã tão terrível, o mesmo não ocorre com cada um de nós?

Se o roteiro eleva a história muito além do nível dos quadrinhos de super-heróis, Byrne e Terry Austin mostram a transformação de Jean de forma magistral. Efeitos de sombras, áuras, hachuras... tudo é usado para demonstrar o lado sombrio de Jean transformada em vilã.

A Fênix Negra destroi um sistema solar. 


É nessa história que a Fênix faz o que decretaria sua morte. Ela vai ao espaço e consome uma estrela, matando bilhões de pessoas no processo. Quando viu essa parte da história, Jim Shooter, editor-chefe da Marvel, decidiu que a personagem tinha que morrer.

Júlio Verne, o viajante das idéias

 



Houve uma época em que milhões de crianças no mundo todo se deliciavam com viagens extraordinárias em que o mundo se revelava diante delas trazendo consigo as maravilhas de uma nova ciência: a geografia. Tudo graças a um escritor francês dotado de imaginação e rigor na busca de informações. Seu nome era Júlio Verne.
Quando Verne publicou seu primeiro romance,  Cinco Semanas Num Balão, em 1863, as descobertas científicas aconteciam a um ritmo cada vez mais rápido. Darwin publicara há cinco anos seu livro A Origem das Espécies, de Darwin. Há pouco tempo Pasteur divulgara suas descobertas, que derrubavam a teoria da geração espontânea de vida e lançava a teoria dos vermes como causadores de doenças. Entretanto, o povo, o cidadão comum, ainda via a ciência como uma desconhecida, uma curiosidade de laboratório, de interesse apenas de homens sábios. Pouco havia sido escrito que fosse do entendimento do homem comum e, principalmente, das crianças.
Cinco semanas num balão começou com o nome de A Viagem no ar. Em outubro de 1862, Júlio Verne apresentou o original para o editor Pierre-Jules Hetzel. Hetzel foi tão importante no direcionamento da carreira desse, então estreante escritor, que pode, de certa forma, ser considerado co-escritor. O livro era uma referência direta aos exploradores que revelavam os segredos da África. Nele, o doutor Samuel Fergunson, seu amigo Dick Kennefy e um empregado se aventuram do Zanzibar até o Niger em um balão, refazendo o percurso de muitos dos homens que desbravaram o continente. Hetzel fez várias sugestões para tornar a história mais palatável, inclusive a mudança do título para Cinco semanas num balão. Hetzel tinha tanta confiança no texto de Verne que o fez assinar um contrato para outros livros. O contrato dizia, abertamente que o objetivo dos livros era: “Resumir todos os conhecimentos geográficos, geológicos, físicos, astronômicos, acumulados pela ciência moderna e refazer, sob a forma atrativa e pitoresca que lhe é própria, a história do Universo”.   
Em Cinco Semanas Num Balão, Júlio Verne, com o auxílio de Hetzel, introduzira um novo tipo de novela - uma forma diferente de contar história, um misto de ficção e realidade.
Qualquer itinerário serviria para o Vitória, mas a viagem tornara-se mais real porque acompanhava claramente o percurso da expedição de 1850 levada a cabo pelos exploradores Richard Francis Burton e John Hamming Speke.
Quanto à construção do balão, Júlio Verne tornara-a perfeitamente praticável com seu complicado fogão que provocava a expansão do hidrogênio por meio de aquecimento, fazendo o aparelho elevar-se sem ser necessário sacrificar lastro. A idéia do balão duplo foi tomada de Mensnier de Laplace e Nadar; a bateria elétrica viera das experiências  de Albert Wilhehn Bursen e a luz brilhante do arco improvida para arrancar o desgraçado missionário lazarista às torturas infligidas pelos selvagens africanos viera dos manuscritos de Humphry Javoy.
Tudo isso deu à história uma verossimilhança que jamais se vira em um livro de aventuras, abrindo caminho para toda a literatura de ficção-científica do século XX. Mais: a obra de Verne se tornou a base do gênero Steampunk, um dos mais populares e importantes do século XXI.
Depois de Cinco semanas em um balão, vieram diversos outros livros, como Viagem ao centro da Terra, A volta ao mundo em 80 dias, Da Terra à Lua e, o mais famoso deles, 100 mil léguas submarinas.

Yesterday - o filme

 


Danny Boyle é um dos maiores diretores da atualidade. E uma de suas principais características é o cuidado na escolha dos roteiros. Seus filmes são irretocáveis quanto a isso, desde o primeiro, Cova Rasa, até o oscarizado “Quem quer ser um milionário”, em que toda a vida do protagonista é contada através dos flash backs provocados por questões de um programa de perguntas e respostas.
Seu novo filme, Yesterday, segue na mesma linha. A trama parte de uma pressima absolutamente original: uma realidade em que os Beatles não existiram e apenas um músico se lembra de suas composições. Boyle (com roteiro de Richard Curtis) usa essa premissa para fazer não só um musical, mas uma belíssima homenagem ao quarteto de Liverpool.
Na história, Jack Malik, um descendente de indianos, sonha em ser um músico famoso, mas sua carreira parece destinada ao fracasso. Após a participação em um festival no qual teve um público insignificante, Malik decide abandonar a música. Mas algo acontece: há um blecaute mundial e ele é atropelado. Quando acorda, descobre que está em uma realidade em que ninguém se lembra dos Beatles e decide lançar as músicas do quarteto como se fossem dele.
O filme usa esse mote para costurar uma biografia, um musical, uma homenagem de forma extremamente divertida.
Por exemplo, em determinado ponto Malik percebe que não consegue lembrar das letras e visita Liverpool, passando pelos locais que foram referências paras as músicas do Beatles. Aliás, esse “processo” é um dos pontos altos do filme, com Malik descobrindo as divergências entre as duas realidades. À certa altura ele diz: “Eu não fumo, mas um cigarro cairia bem agora”, ao que alguém retruca: “O que é um cigarro?”. Em outro ponto ele pergunta sobre o Oasis e ninguém sabe e ele conclui: “Pensando bem, é óbvio” (afinal, se não existirem os Beatles, não existe o Oasis).
Isso tudo é entremeado por apresentações musicais, críticas ácidas à indústria fonográfica (maravilhosa a cena da reunião com os marqueteiros em que eles dizem que Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band é um título grande demais) e por uma história romântica.
No final, apesar da premissa de ficção científica, Yesterday é um filme simples, quase singelo, mas bonito e, ao mesmo tempo profundo. Danny Bolyle é um daqueles caras que nunca decepcionam.

O orientador leão

 


Um lobo estava andando pela floresta quando deu de cara com um coelho. Já ia comer o bichinho quando percebeu que ele estava em frente a um notebook, digitando frenéticamente.

Curioso, resolveu perguntar o que estava acontecendo.

- Estou escrevendo minha dissertação de mestrado. - informou o coelho. Minha tese é que os coelhos são os predadores naturais.

- Isso é um absurdo. - respondeu o lobo. Os predadores naturais são os lobos. São eles que comem os coelhos.

- Você duvida? Vamos ali até aquela caverna e eu te mostro a minha prova empírica.

Os dois entraram, começou uma barulheira tremenda, gritos, uivos. Pouco tempo depois o coelho saiu e voltou a digitar no notebook.

Algum tempo depois passou por ali uma raposa. Da mesma forma que o lobo resolveu comer o coelho, mas antes disso perguntou o que estava acontecendo.

- Estou escrevendo minha dissertação de mestrado. - respondeu o coelho. Minha tese é que os coelhos são os predadores naturais.

- Isso é absurdo. - gritou a raposa. Os predadores naturais são as raposas. Elas que comem os coelhos.

- Vamos ali na caverna e vou lhe mostrar a minha prova empírica.

De novo, gritos e uivos. E de novo quem saiu de lá foi o coelho.

Então entramos na caverna. De um lado encontramos um amontoado de ossos de raposas. Do outro um lado, um monte de ossos de lobos. E no meio um leão imenso de gordo.

Moral da história: numa pesquisa o que realmente importa é o orientador.

Quarteto Fantástico – Derrotados pelo Doutor Estranho

 


Embora Fantastic Four 1 seja considerado o marco inicial da Era Marvel, foi só no número 17 que Stan Lee teve a idea de usar o termo, em um splash com grande destaque na capa.

Nessa edição, o Quarteto enfrenta, de novo, o Doutor Destino. De novo.

O Coisa confunde um ator com o Dr. Destino... 


A edição mostra também como os heróis podiam ser tapados. Quando procuravam pelo vilão, o Coisa chega a quase bater em um homem, que na verdade está caracterizado para divulgar uma peça sobre a Idade Média. Por outro lado, Destino se disfarça de um zelador e não só encontra com eles e os cumprimenta, como ainda coloca um sinalizador em cada um. O sinalizador é usado por quatro robôs que coletam a estrutura atômica dos heróis. Assim, mesmo quando a fortaleza dele é descoberta escondida em uma nuvem, eles não podem invadi-la, pois a nave está programada para desintegrar qualquer coisa que se aproxime com a estrutura atômica codificada.

Destino ainda encontra tempo para sequestrar Alícia, a amada do Coisa, e fazer um ato de terrorismo que coloca todos os aparelhos eletrônicos dos EUA em pane.

... Mas não reconhece quando encontra o Dr. Destino disfarçado. 


Aliás, nessa parte específica, há introito curioso.

Na Rússia, os generais comemoram.

- Ah, essa é a melhor notícia que recebo em semanas! Logo os países capitalistas ficarão indefesos perante nós! – diz um sujeito com a cara de Trotsky, seja lá o que Trotksy estivesse fazendo lá na Rússia anos depois de sua morte.

- Parem de tripudiar, seus cabeças-ocas! O Doutor Destino não está nos fazendo um favor! Pelo que se vê, ele pode muito bem nos atacar em seguida! – responde outro.

O que Trotksy estava fazendo na Rússia após a sua morte? 


- Você tem razão, camarada K! Nunca tinha pensado nisso!

- Ah! É por isso que você nunca será um ditador!

Aquela era uma época em que os ditadores dos gibis faziam questão de dizer que eram ditadores.

Os Passa vida, de Osmar Júnior e Rambolde Campos

 


Uma verdadeira preciosidade para quem gosta de música amapaense é o livro Então, foi assim?, de Ruy Godinho. Na obra o autor conta o processo de criação de algumas das principais musicais tucujus, entre elas Os passa vida, de Osmar Júnior e Rambolde Campos, em minha opinião a mais poética de todas, um belo exemplo de como usar vários recursos poéticos, em especial a personificação, em uma música.  
Para começar, ao contrário do que muitos imaginam, a música não é sobre Belém, embora tenha ficado famosa na versão da banda Sayonara.
Segundo o livro, a composição surgiu num momento de depressão do poeta Osmar Júnior, após o fim de um relacionamento. O amigo Rambolde Campos foi visitá-lo e, vendo-o daquele jeito, convidou-o para darem uma volta de carro. Iam andando à toa e Osmar Júnior apontando para as mangueiras e comentando o quanto elas eram bonitas.
Daí os versos “Quando o sol chegou, acendendo o dia, foi pra me socorrer da noite que eu vinha”. Aliás, quando foi gravada em Belém por Alcyr Araújo este mudou a letra para “Quando o sol chegou, iluminando dia”, um versão bem menos força poética e simbólica.  
Uma outra mudança ocorreu no trecho: “É que nessa cidade, as mangueiras falam sempre em ti. No passo da chuva nos passa a vida, é sempre assim”, Na gravação paraense ficou É que nessa cidade, as mangueiras falam sempre em ti. Na chuva da tarde os passa a vida, é sempre assim” para deixar a música mais com a cara de Belém. A mudança, no entanto, fez com que a composição perdesse força, pois perdeu-se a aliteração (Nos passos... passa vida) e simbologia.
Uma das partes mais lindas da letra, no entanto, foi preservada integralmente: “Mandei a saudade te buscar pra perto de mim”.
Para que não conhece, a personificação é uma figura de linguagem na qual se atribui características humanas a objetos, coisas. É o uso dessa figura que faz Os passa vida ser tão bonita. É o sol que acende o dia e tira o poeta da depressão da noite, são as mangueiras da cidade que falam da amada, é a saudade que vai buscar a amada de volta para o poeta.
Abaixo a letra completa:

Quando o sol chegou acendendo o dia.
Foi pra me socorrer da noite que eu vinha.
É que nessa cidade tudo ficou entre nós dois.
Uma noite em claro, e o claro da noite vem depois.
o que aperta o peito é o tempo é o cheiro, O amor é assim.
Eu quis você pra mim.
Eu quis você pra mim.
É que nessa cidade as mangueiras falam sempre em ti.
No passo da chuva, nos passa a vida, é sempre assim
Eu te procurei, te achei em minha solidão.
Ai minha solidão!
Oh minha solidão!
Peguei pra cantar na beira do rio.
Meu coração, mandei a saudade te buscar pra perto de mim
Eu me debrucei por sobre o meu verso
E o violão, um beijo no tempo segurei e guardei pra você, aqui.

Guerras Secretas – Crises internas

 


A série Guerras Secretas foi criada a partir de uma pesquisa de marketing com garotos americanos que mostrou que as palavras que mais chamavam a atenção deles eram “guerras” e “secreto”. Jim Shooter, o editor-chefe da Marvel e roteirista, fez o roteiro todo baseado nessa ideia sem se preocupar muito com detalhes ou verossimilhança. O importante era ter coisas “secretas” acontecendo e “porrada” o tempo todo. No número 3 isso fica flagrante.

A história começa com Magneto libertando Vespa, que havia sido sequestrada por ele, e entrando em um intercurso romântico com ela. 

Magneto encontra tempo para namorar. 


Saca o diálogo dos dois:

- Sentiu minha falta? Que animador!

- Não se empolgue...

- Quem sabe isso faz você mudar de ideia!

- Ei! MMMM!

- Um pequeno interlúdio de paz em meio ao caos!

- Não... não

No quadro seguinte os dois já estão aos beijos. Pense numa garota fácil de conquistar.

Duas vilãs surgem do nada. Coisa de Jim Shooter. 


Enquanto isso, Doutor Destino transformava duas mulheres em duas novas vilãs, Vulcana, com poderes térmicos, e Titânia, uma mulher super-forte. A questão aí é que não existe explicação nenhuma para isso. De onde o vilão tirou essas mulheres? Parece que o roteirista simplesmente tirou as personagens da cartola. E, se destino pode dar tamanho poder a alguém, porque ele não concede esse poder a si mesmo? Nada fazia muito sentido. Na verdade, não fazia sentido nenhum.

Nesse meio tempo, Thor encontra tempo para paquerar Encantor. Pense num rolê aleatório.

Thor encontra tempo para namorar. 


A história termina com os vilões atacando de surpresa o QG dos heróis logo depois de uma tempestade – um ataque que já tinha sido previsto pelo sentinela da liberdade. E isso acontece porque o Hulk “esquece” de avisar o Capitão América, que a tempestade havia acabado. 

Roteiro de quadrinhos: como melhorar seu texto

 

Uma pergunta comum de novos roteiristas é: como melhorar meu texto?
A resposta vale para qualquer um que escreve, seja quadrinhos, cinema, TV, livros: lendo e escrevendo.
Não existe outra forma de melhorar que não seja produzido. Quanto mais produzir, melhor ficará seu texto. 
Isso é bem óbvio no caso de roteiristas de quadrinhos que trabalharam durante anos em um único título, começando em início de carreira.
Pegue, por exemplo, uma história de Chris Claremont na sua fase inicial dos X-men. Depois compare com uma história da fase em que os desenhos eram de John Byrne, época em que o texto de Claremont já estava desenvolvido. A diferença é gritante.
Outro exemplo é Gerry Conway, escritor que começou sua carreira no Homem-aranha e foi responsável por uma das fases mais antológicas do personagem, com histórias clássicas, como a morte de Gwen Stacy. No começo, o texto de Conway parece inseguro e claramente imita o de Stan Lee. Com o tempo o texto se torna solto e vemos, a cada edição, a melhora no roteiro.
Infelizmente no Brasil não temos um mercado consolidado de quadrinhos que permita ao roteirista evoluir escrevendo um título. Mas para isso vale a boa e velha editora Gaveta. Escrever para a editora Gaveta significa escrever para engavetar, sem nenhum objetivo imediato de publicação, escrever para treinar. Pode ser que um dia você vá lá na gaveta e reaproveite alguma daquelas ideias, mas o objetivo inicial é apenas esse – escrever.
O ideal de um bom escritor é ser como um bom motorista. Um bom motorista dirige automaticamente: ele muda a marcha, acelera, diminui marcha, freia, é tudo automático. Da mesma forma, um bom escritor. Depois de algum tempo e muito treino, o texto flui automaticamente e fica bom.
Revisando O UIVO DA GÓRGONA acabei me espantando com a quantidade de figuras de linguagem e de outros elementos narrativos que coloquei na trama. Foi tudo inconsciente. Não passei horas pensando: ah, vou colocar uma metáfora aqui, ah, vamos ter uma elipse aqui. Isso surge naturalmente. O ideal é que o escritor treine, treine, treine, até chegar a esse ponto.