Há Quem diga que Giancarlo Berardi é o melhor roteirista de quadrinhos da atualidade. Histórias como “De má-fé”, publicadas no número da revista 190 da revista mostram que ele pode até não ser o melhor, mas certamente está no páreo dos melhores de todos os tempos.
Na trama uma jovem mulher é encontrada morta na beira de um rio em Garden City. O corpo foi queimado, mas uma tatuagem indica que ela é de origem russa ou ucraniana.
Em paralelo a isso, Júlia ajuda uma mulher a encontrar um homem desaparecido. Esses dois fatos, que aparentemente não têm relação nenhuma, acabam se mostrando parte de uma trama maior, que envolve imigração ilegal, prostituição e golpes pela internet.
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Uma mulher é encontrada morta... |
Dois aspectos chamam atenção. O primeiro deles é como Berardi faz com que essa trama aparentemente simples, sem grandes atrativos, torne-se uma história envolvente, do tipo que lemos de um só fôlego.
A segunda são os diálogos. Berardi é um mestre dos diálogos a ponto de parecer que estamos vendo de fato pessoas conversando. E, ao contrário de outros roteiristas que usam a habilidade para o diálogo como uma forma de exibicionismo, o roteirista italiano usa isso a favor da história.
Uma das técnicas usadas é fazer os personagens constantemente fugirem, mesmo que momentaneamente, do assunto principal.
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... e um homem desaparece. Qual a relação entre os dois fatos. |
Um exemplo dessa habilidade do.momento em que Julia interroga uma das prostitutas:
Júlia: A coisa não envolve só prostituição. Nós temos um crime.. .
Prostituta: Eu fala com advogado…
Júlia: Aposto que é o mesmo das outras.
Prostituta: Somos grupo unido.
Júlia: O aluguel é pago pela organização que fez vocês entrarem clandestinamente nos Estados Unidos, certo?
Prostituta: Advogado se chama Garfield, tenho número na bolsa.
Júlia: Quem pode ter matado sua amiga Glenda?
Prostituta: Não sei mesmo…
Júlia: E o senhor Reginald Wood, o que houve com ele?
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Berardi é um mestre dos diálogos. |
Esse trecho simples é repleto de subtextos. A prostituta usa as falas sobre o advogado para fugir das perguntas. Mas Julia também usa a mesma estratégia. A pergunta sobre o aluguel não está diretamente ligada ao assunto, e é uma tentativa de encurralar a depoente. Ela, entretanto, só consegue isso quando foge novamente do assunto, perguntando sobre o homem desaparecido.
Tal habilidade na condução dos diálogos parece essencial em gênero como o policial em que uma pista que muitas vezes pode levar a solução de um caso pode estar em uma fala aleatória.
Em tempo: o roteiro chama tanta atenção que acabei esquecendo de comentar sobre o desenhista Roberto Zaghi, que faz um ótimo trabalho na edição.
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