Foi protocolado na Controladoria Geral da União um recurso contra distribuição do livro Negrinha, de Monteiro Lobato, nas escolas.
Negrinha foi escrito por Lobato para mostrar que, apesar da abolição das escravatura, os negros continuam vendo tratados de forma desumana. A negrinha do título é uma filha de escravos adotada por uma senhora sádica, que a tortura até matá-la, sob a anuência da sociedade, até do padre, que fecha os olhos para as maldades da senhora.
O problema é que Lobato, para salientar a hipocrisia da sociedade da época, usou da ironia: "Gorda, rica, dona do mundo, animada dos padres, com lugar certo na igreja e camarote de luxo reservado no céu. [...] Uma virtuosa senhora, em suma – ‘dama de grandes virtudes apostólicas, esteio da religião e da moral’, dizia o reverendo".
Os autores da ação (que pode ser lida aqui) argumentam que Lobato usa adjetivos favoráveis à Dona Inácia (embora eu tenha minhas dúvidas se gorda possa hoje ser considerado um adjetivo favorável) e negativos com relação à menina: "Negrinha era uma pobre órfã de 7 anos. Preta? Não, fusca, mulatinha escura, de cabelos ruços e olhos assustados. O corpo de Negrinha era tatuado de sinais, cicatrizes, vergões. Batiam nele os da casa todos os dias, houvesse ou não motivo".
A frase acima seria prova de que Lobato era racista e sexista e usou o conto para diminuir a imagem da mulher negra. Sinceramente, até uma criança recém-alfabetizada consegue entender que Lobato está apenas descrevendo os maus-tratos sofridos pela pobre negrinha. E o livro foi escrito por adultos e foi comprado pelo MEC para ser alunos do ensino médio, alunos, que, teoricamente, conseguem entender uma ironia.
Mas o requerimento vai além, pede a punição dos pareceristas do MEC que liberaram a obra para distribuição nas escolas: "sujeitando-se seus autores a responsabilidade em face da contratação
acertada ou equivocada".
Para os autores da representação, a compra do livro Negrinha deveria ser suspensa e os exemplares já comprados só poderiam ser lidos sob a ótica do racismo e do sexismo. Ou seja: os alunos só poderiam ler o livro por ordem do professor e para provar que o livro é racista e sexista.
Ou seja: os autores da representação se acham donos do sentido da obra, qualquer um que tenha qualquer leitura diferente da deles deve ser punidos e deve ser garantido que alunos que tenham contato com a obra tenha apenas uma possibilidade de interpretação do livro.
Em que mundo estamos vivendo?
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