A grande maioria das pessoas tem
a noção de que existe um mundo real, exterior a todos nós, compartilhado por
todos. Uma cadeira é uma cadeira, em qualquer situação, para qualquer pessoal.
É isso que nos diz o senso comum.
No entanto,
os avanços da ciência têm demonstrado que o processo de percepção tem menos a
ver com o objeto observado do que com as interações internas que fazemos na
hora de ver algo.
O cientista
chileno Humberto Maturana realizou algumas pesquisas interessantes com
salamandras que ajudaram a desvendar essa área do conhecimento. A salamandra
tem grande capacidade de regeneração. Você corta uma perna dela e nasce outra.
Da mesma forma, se retirarmos seu olho e colocarmos de volta, ele se regenera.
O que o Maturana fez foi retirar o olho e, na hora de colocá-lo de novo,
inverteu a posição. A salamandra, na hora de caçar, joga sua língua sobre o
inseto e é certeira: a língua sempre acerta seu alvo. Mas quando seu olho é
invertido, ela joga a língua para o lado oposto ao inseto.
A conclusão
é de que, na hora de ver, valem mais as conexões internas do que os objetos em si. Alguns cientistas,
inclusive, afirmam que vemos com o cérebro, não com o olho. Experiências
demonstram, por exemplo, que ao lembrarmos de um objeto acionamos as mesmas
áreas do cérebro que usamos quando vemos esse objeto. Ou seja, para nosso
cérebro não existe diferença entre ver algo e lembrar de algo.
Assim, não existe uma realidade
externa, exterior ao observador, que possa ser captada. Toda percepção é um
processo de reelaboração. Nós olhamos para algo e vemos não o que de fato é o
objeto, mas aquilo que nosso cérebro, baseado inclusive nos nossos modelos de
mundo, nos diz que ele é.
Só
reconhecemos uma cadeira porque temos um modelo de como deve ser uma cadeira. E
só nos sentamos nela porque temos expectativas a respeito de sua
funcionalidade.
O filósofo
T.S. Kuhn demonstrou no livro A estrutura das revoluções científicas diz que os
cientistas se tornam cegos para fatos que não se encaixam em seus paradigmas.
Em uma pesquisa citada por Kuhn, foram mostradas diversas cartas para várias
pessoas. Algumas dessas cartas eram anômalas, como um quatro de copas preto,
mas os sujeitos adequavam essas cartas às suas expectativas sobre o baralho,
fazendo com que o quatro de copas preto fosse tomado com um quatro de espadas.
Da mesma forma, o cientista, ao ver um fato anômalo, tem a tendência ou de
ignorá-lo inconscientemente ou de adequá-lo a uma situação normal.
Cotidianamente
podemos perceber essa diferença de percepção. Uma moça que é indiferente para
um rapaz pode ser apaixonante para outro. Um local agradável para uns pode ser
desagradável para outros.
Quando
alguém acha o ser amado bonito, a beleza está muito mais nele mesmo e nas suas
lembranças dos bons momentos que passaram juntos do que na realidade exterior. A idéia de que existe um mundo pronto e
acabado, fixo, está, quase sempre relacionada a regimes totalitários. Para
muitas pessoas o mundo é como elas o vêm e, percebendo que as outras pessoas
têm percepções diferentes, acreditam que sua visão é a mais correta e querem
impor essa visão aos outros. Esses costumam ser os grandes ditadores.
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