A
campanha do Dr. Fredric Werthan contra os quadrinhos teve um grande impacto no
Brasil por causa de uma questão política.
Segundo
Gonçalo Júnior, autor do livro A Guerra dos Gibis, embora existissem
iniciativas isoladas desde a década de 30, quando os quadrinhos de aventura
chegaram ao Brasil, a campanha contra os quadrinhos só tomou fôlego na década
de 40, graças a uma briga entre Roberto Marinho, do Jornal O Globo, e Orlando
Dantas, do Diário de Notícias. Dantas estava ganhando mercado ao promover
concursos em que os leitores do jornal concorriam a prêmios em dinheiro.
Preocupado com a concorrência, Marinho usou sua influência junto ao governo
Vargas para fazer com que fossem proibidos os prêmios em dinheiro.
Dantas, agora sem o principal atrativo de seu jornal,
passou a atacar Marinho pelo que considerou o seu ponto fraco: o fato de seu
concorrente ser um dos principais editores de histórias em quadrinhos do Brasil
(sua publicação Gibi acabou virando sinônimo de quadrinhos). Dantas,
ex-repórter de Assis Chateaubrind, sabia que a melhor forma de um jornal sair
de uma situação financeira difícil era comprar briga com um concorrente de
peso. O Diário de Notícias passou a acusar os gibis de provocarem preguiça
mental, inculcarem valores estrangeiros nos jovens e incentivarem a violência.
Na verdade, Dantas não tinha nada contra quadrinhos, e, aliás, tinha sido um
dos pioneiros a publicar tiras de jornais no Brasil (o humorístico Popeye), mas
ele logo descobriu que a melhor forma de chamar atenção para si e alfinetar o
rival era fazer acusações aos gibis.
Passou
a ser moda falar mal dos gibis. Até mesmo quem nunca tinha lido uma revista se
apressava a dar sua opinião. A jornalista Ivone Jean, do Correio da Manhã, por
exemplo, escreveu um artigo no qual pedia reconhecimento público por ter
roubado um gibi do consultório de um pediatra, impedindo assim, que as crianças
tivessem contato com a leitura. Além de se vangloriar do crime, a jornalista
admitia que sua birra se devia ao fato dela não compreender o código
quadrinístico: “Não sei ler histórias em quadrinhos! Aprendi a ler da esquerda
para a direita e linha após linha. As legendas atrapalhadas que ilustram os
desenhos são impressas em caracteres estranhos e dançam em todos os sentidos”.
Mas a campanha contra os gibis teria seu momento mais
grave a partir de 1953. Dessa vez, além de Dantas, Roberto Marinho teria contra
si Samuel Wainer, do jornal Última Hora. Assim como acontecera com o Diário de
Notícias uma década antes, o diário de Wainer estava tomando leitores de O
Globo, graças a inovações editoriais. Marinho concentrou sua artilharia no
concorrente e descobriu que Wainer não era brasileiro, pois chegara ao Brasil
com dois anos de idade. Na época a legislação proibia estrangeiros de terem
veículos de comunicação no Brasil.
Wainer vingou-se empreendendo uma dura campanha contra as
histórias em quadrinhos que durou anos. Para isso foi destacado o repórter
Pedro Morel. Este percebeu que a estratégia de maior impacto era acusar os
gibis de serem responsáveis pela criminalidade infantil. Citando as pesquisas de
Fredric Whertan, Morel defendeu que as histórias em quadrinhos ensinavam as
crianças como cometerem crimes.
Para provar o que dizia, Morel foi ao Reformatório de
menores Saul de Gusmão atrás do maior criminoso juvenil da época, um tal de
Lilico, apelidado de “Terror do subúrbio”. Para sua decepção, encontrou o rapaz
jogando futebol, e não lendo gibis. Mas nem por isso achou que seria o futebol
o responsável pelos crimes de Lilico. Os responsáveis deviam ser os gibis.
Apesar da total falta de embasamento e de serem
resultados de uma briga de mercado, as denúncias deram resultado. Nas portas
das igrejas eram distribuindo panfletos orientando pais a não deixarem seus
filhos lerem quadrinhos. Em alguns locais os professores tiravam cinco minutos
diários de suas aulas para falarem dos riscos da leitura dos gibis.
Um dos resultados dessa campanha se vê nos testes
escolares. Desacostumados a ler, os estudantes são incapazes de interpretar os
textos mais simples. Nos países em que a leitura dos gibis foi estimulada a
realidade é outra.
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