Cama de gato, de Kurt Vonnegut é um dos livros mais
estranhos que já li. Pensando bem, é o mais estranho com folga. Para começar, é
difícil defini-lo: é ficção científica, sátira, fantasia, biografia fake? Algo ainda
mais desconcertante é como um fato aleatório contado no livro mais tarde se
relaciona com outro, que se relaciona com outro igualmente aleatório até que
tudo parece se relacionar (o que torna praticamente impossível um resumo do
livro).
Vonnegut inventa uma religião, o bokonismo e seus
preceitos morais atravessam todo o livro, a começar pela citação d´Os livros de
Bokomon: “Todas as verdades que estou prestes a contar são mentiras descaradas”,
que poderiam se aplicar ao próprio Cama de gato.
Os bokonistas acreditam que a humanidade é dividida
em equipes (karass) que realizam a vontade de deus sem nunca entender ou
descobrir o que estão fazendo, como nos convida a cantar Bokonon:
Oh, um grande bebum
No Central Park dormindo
E um caçador de leões,
Na selva agindo
E um dentista chinês
E uma rainha inglesa...
Todos servindo
Na mesma empresa
Lindo, lindo, lindo
Tanta gente diferente
O mesmo plano cumprindo
A citação é uma boa uma descrição do emaranhado de
subtramas e personagens aleatórios se unem no final da obra.
Uma tentativa de resumo seria a seguinte: um
jornalista está escrevendo um livro intitulado “O dia em que o mundo acabou”, sobre
o dia em que a bomba atômica explodiu sobre Hiroshima. Isso o leva a manter
contato com os filhos de Felix Hoenikker, o inventor da bomba atômica e depois o
leva a uma ilha no Caribe que ninguém quer e na qual todos seguem o bokonismo. Por
trás de tudo isso parece estar uma invenção do professor Hoenikker, muito mais
perigosa que a bomba atômica.
Essa descrição pode dar a entender que Cama de gato
é um livro difícil, complexo, uma leitura para iniciados. Qual nada. Vonnegut tem
uma narrativa deliciosa, quase como estivesse batendo papo com o leitor o tempo
todo. Além disso, os capítulos são curtos e quase sempre dominados pelo humor
irônico do autor. Você pode até não entender nada, mas certamente vai se
divertir com isso.
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