Existem
obras tão fundamentais para se compreender a linguagem dos quadrinhos que se
transformam em verdadeiras aulas de quadrinhos. Exemplo disso é o álbum Nova
York – a vida na grande cidade, de Will Eisner.
O
álbum reúne anotações do artista sobre a metrópole e as histórias geradas a
partir dessas observações. Nesse sentido a capa, com Eisner desenhando uma
multidão é a perfeita síntese da obra.
Eisner
não foi só um dos primeiros a refletirem sobre a linguagem característica da
nona arte – foi uma das pessoas que estabeleceram essa linguagem e isso fica
implícito nas 439 páginas do álbum. Está tudo ali: elipses, tempo narrativo,
diálogos, o desenho contando por si só a história, plots e reviravoltas,
estudos de personagens. Aliás, a própria metodologia do livro é uma lição: não
há nada melhor para criar quadrinhos do que observar o mundo à nossa volta e
usar a imaginação para complementar aquilo que não podemos ver.
O
livro é dividido em quatro capítulos: Nova York, a grande cidade; O Edifício;
Caderno de tipos urbanos e Pessoas invisíveis.
O
primeiro capítulo é dedicado às observações de cenários da cidade e o exercício
criativo resultante delas. Em um desses exercícios, Eisner desenha um bueiro e
imagina todas os dramas possíveis que poderiam ser protagonizados por esse
cenário: a prostituta que joga ali um anel de noivado, o homem que perde uma
moeda, o assaltante que se livra da faca, uma mulher que perde ali a chave do
apartamento no qual vai se encontrar com o amante e, finalmente, os garotos que
tentam resgatar esses tesouros.
Outros
cenários vão se sucedendo, cada um com suas histórias e dramas: uma escadaria,
o metrô, uma lata de lixo.
O
Edífício é provavelmente a parte do livro mais conhecida no Brasil, pois essa
parte foi separada e publicada pela editora Abril na coleção Graphic Novel. A
história gira em torno de um prédio no cruzamento de duas ruas de Nova York e
as histórias que se cruzam com a história do edifício.
A
história começa com o local sendo derrubado e substituído por um prédio moderno
e os fantasmas de quatro pessoas. Se o capítulo anterior é um ótimo exemplo de
exercício criativo, este é uma aula de roteiro: Eisner narra a história de cada
um desses fantasmas e amarra seus dramas ao próprio edífício, fazendo com que
essas diversas tramas paralelas convirjam no final.
Caderno
de tipos urbanos é o que o próprio nome diz: uma galeria de tipos de
observações de comportamentos, um verdadeiro exercício antropológico. Eisner
observa, por exemplo, que o espaço urbano parece afetar a concentração e o
contato visual entre as pessoas, fazendo que até mesmo o tema mais pesado e
sério pareça uma conversa casual.
Nessa verdadeira obra-prima
de quase 500 páginas, Pessoas invisíveis se destaca, em especial a história
Santuário. A HQ narra o drama de Pincus Pleatnik, um homem tão invisível que,
quando o jornal por engando publica a informação de que ele morreu, todos
passam a acreditar que ele de fato está morto.
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