O roteiro aproveita duas paixões de Uderzo: humor e aviões. |
sábado, abril 30, 2022
Tanguy e Laverdure
O último mamífero do Martinelli
Revista Imaginário traz artigo de Gian Danton sobre a evolução do texto nos quadrinhos americanos
A revista Imaginário é uma das mais importantes publicações acadêmicas do Brasil sobre quadrinhos e cultura pop. No número 21 ela trouxe um artigo meu, escrito em parceria com Rodrigo Bandeira, sobre como texto evoluiu nos quadrinhos americanos, indo desde a abordagem redundante em que texto e desenhos competiam para transmitir as mesmas informações, até o uso criativo e revolucionário do texto.
Leia mais sobre essa edição:
Abrimos esse número mais uma vez com o texto de Daniel Baz dos Santos, em análise aprofundada da obra de Sergio Toppi. Segue com a reflexão de Robson Carlos da Silva sobre a HQ “As aventuras de Machado de Assis, caçador de monstros”, com foco na excepcionalidade do protagonismo de um personagem negro e capoeirista.
Temos ainda estudo sobre “Jessica Jones e o protagonismo feminino: uma narrativa sobre Sororidade e o ‘pseudo-herói’ de gênero”, por Marcelo Bolshaw Gomes; “O arco ‘Corporação Batman’ e as novas relações do sistema do capital”, por Romir de Oliveira Rodrigues.
Fechando a edição, temos “O artista e sua interpretação do mundo”, entrevista com Edgar Vasques proposta por Marcelo Engster; resenha do fanzine QI e prancha com a personagem “Maria”, por Magalhães.
Para acessar a revista clique aqui.
Para ir direto ao meu artigo, clique aqui.
A arte espetacular de John Harris
A criatividade é o oposto da burocracia
O conceituado sociólogo italiano Domenico De Masi afirma que o século XXI será o século da criatividade. De fato, mais que qualquer bem material, a criatividade é um dos bens mais valiosos da atualidade.
Vejam, por exemplo, Bill Gates. O que fez dele o homem mais rico do mundo? Terras? Ouro? Fábricas? Não. O que ele tinha era uma idéia que facilitava o uso dos computadores.
A primeira e mais importante coisa para se dizer a respeito da criatividade é que ela é o oposto da burocracia.
O burocrata faz sempre as mesmas coisas, do mesmo jeito, e nunca erra, mas também não cria nada.
Você já reparou que quando um time está sendo incapaz de inovar, de surpreender o adversário, o locutor diz que a equipe está jogando um "futebol burocrático" ? E é isso mesmo: o burocrata é aquela pessoa incapaz de encontrar soluções novas para os problemas, seja um jogador de futebol ou um político.
A burocracia surge onde há o medo de errar.
Há chefes que dizem aos seus subordinados: "Não admito erros!". Se alguém lhe mostra um trabalho que apresenta algum problema, ele a repreende severamente.
Outros dizem: "Tenho sempre razão e demito qualquer funcionário que me disser o contrário".
Chefes assim são criadores de burocratas, pois seus subordinados, com medo da bronca, vão sempre fazer as mesmas coisas que já deram certo anteriormente e vão sempre concordar com ele. Ou seja, serão incapazes de criar.
Santos Dumont errou muito antes de inventar o avião. |
Os exemplos de invenções que começaram com erros são inúmeros. Santos Dumont, por exemplo, passou por vários vexames antes de conseguir criar um avião capaz de voar.
Muitas vezes o novo surge justamente do erro. O Champagne foi um vinho que fermentou. Cristóvão Colombo achava que chegaria às Índias navegando para o oeste. Errou feio, mas descobriu a América.
E quantas outras invenções e descobertas não surgiram em decorrência do erro?
Mas quem tem medo de errar, e incute esse medo em seus funcionários, fica parado, não evolui, e leva a breca.
Há algum tempo a revista Exame publicou uma matéria intitulada "A excelência mata". Nela, temos contato com vários casos de empresas que fracassaram por serem certinhas demais, em outras palavras, burocráticas.
Um ótimo exemplo é a Olivetti. Ela durante muito tempo dominou completamente o mercado de equipamentos para escritórios, fabricando máquinas de escrever.
Quando surgiram os primeiros computadores pessoais, os PCs, ela resolveu não investir. Afinal, os computadores eram caros e na época só os nerds pareciam se interessar por eles.
A Olivetti teve medo de errar e hoje está com um mercado que em breve não terá mais demanda.
Claro que passar o resto da vida se conformando com os próprios erros não vai tornar ninguém mais criativo, mas compreender que o erro é um risco quando se quer ser criativo, já é bom caminho.
Nas palavras de Domenico de Masi: "Enquanto o burocrata tem razão nove vezes em dez, o criativo, erra nove vezes, mas quando acerta uma vez, está abrindo novos caminhos para a humanidade. Na sociedade pós-industrial haverá cada vez menos lugar para burocratas".
A fantástica fábrica de chocolate
Conan – Caos no país de Kush
Belas mulheres, uma ameaça
sobrenatural e intrigas palacianas. Esse seria um bom resumo da história “Caos
no país de Kush”, baseada num conto de L. Sprangue de Camp e Lin Carter e
publicada em Conan the barbarian 106 e 107.
Na história, escrita por
Roy Thomas e desenhada por John Buscema e Ernie Chan, Conan chega na cidade de
Meroé, no reino negro de Kush a tempo de salvar a rainha, que está sendo atacando
por uma turba enraivecida.
Tudo, na verdade, é parte
do plano de um nobre, Lorde Tuthmes, que usou um demônio para matar um
prisioneiro do palácio real, fazendo o povo achar que a rainha é uma feiticeira.
Ao salvar a governante,
Conan se torna o capitão de sua guarda-real. Mas Tuthmes, vendo que a rainha não
foi morta, resolve introduzir uma espiã no palácio, uma escrava da nemédia
chamada Diana.
A rainha sádica e a assustada escrava. |
É aqui que a trama ganha fôlego,
ao contrapor duas mulheres igualmente belas: a rainha negra e a escrava loira. O
ponto alto da história é quando a rainha, com nítido prazer, tortura a escrava,
tentando arrancar dela a razão pela qual o nobre a havia presenteado. Mas a
garota não pode dizer nada, assustada que está com a possibilidade de ser morta
pelo ser sobrenatural do início da história. O único ponto comum entre as duas é
a beleza.
Claro que a escrava acaba
sendo salva por Conan, o que se torna o centro da narrativa.
Os diálogos desse trecho
revelam como Thomas sabia lidar com o texto. “Você é corajosa, mas vamos ver
quanto tempo isso dura!”, diz a rainha, com um chicote longo nas mãos. “Não, não
vamos”, diz Conan. “Quê? Como ousa se intrometer aqui, Conan da Ciméria? Vá
embora ou provará meu chicote antes dela”, ameaça a soberana, ao que o outro
responde, despreocupado: “Gostaria de vê-la tentar, Rainha”.
Saber desenhar cavalos é um atributo básico para histórias de espada e magia. |
John Buscema era um mestre
em desenhar mulheres, o que contribuiu muito para que a história funcione. Mas logo
no primeiro quadro da história, uma bela splash page, revela uma outra aptidão
essencial para um artista de espada e magia: saber desenhar cavalos.
No Brasil essa história
foi publicada pela editora Abril em Conan, o bárbaro 3.
sexta-feira, abril 29, 2022
A maldição do Onde
Vingadores ultimato
Como funciona o método científico?
Morreu Neal Adams
Neal Adams, a lenda dos quadrinhos, morreu hoje, aos 80 anos, vítima de complicações de sepse.
Adams, junto com o roteirista Denny O´Neil
revolucionaram o Batman, distanciando-o da versão humorística e infantizada do
seriado de TV. Foi graças aos dois que personagem se tornou um detetive sombrio,
abrindo caminho para versões mais adultas, como Cavaleiro das Trevas e Batman
ano 1. Se O´Neil deu profundidade ao personagem, Adams revolucionou visualmente
o personagem com diagramação inovadora e ângulos inusitados.
Adams me marcou por um outro trabalho: o título
Lanterna Verde e Arqueiro Verde, também em parceria com Deny O´Neil.
As histórias da dupla eram publicadas em
Heróis em Ação e depois Superamigos e eu, então um moleque de 13 anos
anos, fiquei impressionado com histórias que reverberavam problemas reais, como
a fome, a exploração de trabalhadores e as drogas.
Lembro que na época escrevi um trabalho
para a escola (provavelmente para a disciplina de Artes) no qual dizia que
quadrinhos eram uma arte e que uma das maiores provas disso era a série do
Lanterna e do Arqueiro da dupla Adams – O´Neil.
Embora eu tenha escrito isso há quase 40
anos, ainda concordo. Neal Adams foi uma das pessoas que ajudaram a transformar
os quadrinhos em um arte.
A indústria cultural
Super-homem – um amigo em apuros
Para comemorar os 50 anos do Homem de aço, a DC fez uma edição especial da revista Action Comics. A primeira parte dessa edição foi um encontro do personagem com a Mulher Maravilha, cortesia da dupla Byrn-Perez. A segunda parte ganhou roteiro de John Byrne e Roger Stern desenhos de dois clássicos desenhistas da DC (Kurt Schaffenberger e Curt Swan) e um novo talento que estava depontando, Mike Mignola.
Curt Swan foi o mais importante desenhista do Super-homem na era de prata. |
Na primeira parte da história, Lois Lane está, como sempre, se arriscando para conseguir uma matéria e, ao chegar na redação, descobre que seu furo de reportagem não será manchete porque a atenção de todos está no suposto romance entre o Super-homem e a Mulher Maravilha (uma referência à primeira história do especial). Clark Kent sabe a verdade e tenta apaziguar a jornalista, mas é obrigado a socorrer o amigo Jimmy Olsen, envolvido, como sempre, em um grande perigo.
Até aí o roteiro parece uma bela homenagem às aventuras clássicas do personagem, com situações que se repetiram à exaustão durante décadas.
O Super-homem embarca numa jornada psicológica. |
A reviravolta acontece quando o herói começa a passar mal diante de uma onda de radiação de kriptonita que parece estar banhando o planeta. Olsen o ajuda a entrar em uma caverna, onde ele teria alguma proteção contra a radição e é quando a história se torna um delírio e uma jornada de auto-realização que envolverá desde uma briga com o Morcego humano até uma ida ao que sobrou de Kripton e um delírio no qual todos os kriptonianos tiveram tempo de se salvar indo para o planeta terra (bem ao estilo da revista Marvel “O que aconteceria se...”).
Apesar de todo o conteúdo psicológico subjacente, Byrne consegue contar uma história simples, fácil de ser entendida, com uma narrativa fluída – algo que talvez tenha se perdido nos últimos tempos.
Mignola é o grande destaque da história. |
É sempre um prazer ver Curt Swan desenhando o superman, mas o destaque da história sem dúvida é Mignola, especialmente quando este desenha Gavião Negro e sua esposa. O traço limpo, repleto de contrastes e elegante funciona muito bem aqui.
Além disso, a história fecha com uma bela reflexão: “Talvez eu precise de kriptonita para nunca esquecer da minha própria mortalidade. Um importante lembrete de que ser um homem é muito importante do que ser... um super-homem”.
No Brasil essa história foi publicada em Super-powers 16.