segunda-feira, maio 08, 2023

A filha do Capitão, de Alexandre Pushkin



Alexandre Pushkin é considerado por muitos o criador da literatura russa moderna. Foi não só o mestre de Nicolai Gógol como ainda lhe deu a ideia para duas de suas obras mais importantes, O inspetor Geral e Almas Mortas. Mas a sua obra era relativamente desconhecida no Brasil, algo que vem sendo aos poucos revertido, com vários lançamentos.

Uma boa dica para os que querem conhecer esse gigante da literatura é o livro A filha do capitão, lançado em edição popular pela Principis.

Pushkin se notabilizou por misturar humor, aventura e drama, em histórias com fundo romântico e todas essas características podem ser percebidas em A filha do capitão.

A primeira parte da obra, focada na infância e na adolescência do protagonista é um ótimo exemplo de humor refinado, que caracterizaria muitos dos autores russos. O personagem ainda nem nascera e já fora nomeado sargento e considerado sob licença até a conclusão de estudos. “Aos 5 anos de idade fui entregue às mãos do cavalariço Savélitch, condecorado meu preceptor por sua conduta abstênia. Sob sua tutela, ao 12 anos estava alfabetizado em russo, e podia julgar com muito senso as qualidades de um cão borzói”.

É uma vida boa, ainda mais quando o garoto recebe um preceptor francês, encomendado de Moscou junto com o estoque anual de vinho e azeite. Este “não era inimigo da garrafa” e depois de aprender uma ou duas tagarelices em russo com seu aluno, o deixava solto.

Tudo muda quando o pai resolve que é hora do filho assumir suas funções militares. O garoto é enviado para uma fortaleza distante e meio abandonada.

No caminho, conhecemos outro dos trunfos de Pushkin: a habilidade de descrever cenas de tensão e drama. Isso é perceptível quando a carruagem em que está o rapaz é colhida por uma tempestade de neve, que torna impossível encontrar o caminho: “O vento uivava, formara-se uma nevasca. Em um instante, o céu escuro confundiu-se em um mar de neve. Tudo desapareceu”. Quem os salva é um mendigo, que consegue leva-los para uma estalagem – um fato isolado, que passa despercebido pelo leitor, mas que se mostra essencial no decorrer da trama.

Na fortaleza, o garoto apaixona-se pela filha do capitão (daí o título do livro) e passa a viver uma vida monótona, monotonia só quebrada pela descoberta de que outro dos oficiais é apaixonado pela menina. Aliás, o diálogo no qual ele descobre isso é um ótimo exemplo do fino humor do autor russo:

“- Tenho a impressão de que ele gosta de mim.

- Por que tem essa impressão?

- Por que ele me pediu em casamento”.

A trama de fato começa quando eclode uma revolta liderada pelo cossaco Emilian Pugatchov, um personagem real, que de fato liderou uma grande revolta no século XVIII, se auto-proclando Czar.   

A partir daí, o personagem principal precisará não só sobreviver, como ainda salvar sua amada Macha, apelido de Maria Ivánovna.

Não se deixe enganar por essa trama romântica – que certamente agradará adolescentes. A filha do capitão é principalmente um livro muito bem escrito, que em camadas mais profundas pode ser lido como uma sutil crítica à burocracia russa. E sua influência é avassaladora. Outros autores seguiram o caminho de Pushkin e fizeram obras fundamentais que uniam diversos gêneros em um só. O mais brilhante deles, obviamente, é Gógol. Gógol inclusive escreveria uma obra, Taras Bulba, que se assemelha muito ao A filha do capitão. Com uma diferença: enquanto na obra de Pushkin os cossacos eram os vilões, em taras bulba os cossacos são os protagonistas.


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