Alexandre Pushkin é considerado por muitos o criador da literatura russa moderna. Foi não só o mestre de Nicolai Gógol como ainda lhe deu a ideia para duas de suas obras mais importantes, O inspetor Geral e Almas Mortas. Mas a sua obra era relativamente desconhecida no Brasil, algo que vem sendo aos poucos revertido, com vários lançamentos.
Uma boa dica para os que querem conhecer esse gigante da
literatura é o livro A filha do capitão, lançado em edição popular pela Principis.
Pushkin se notabilizou por misturar humor, aventura e drama,
em histórias com fundo romântico e todas essas características podem ser
percebidas em A filha do capitão.
A primeira parte da obra, focada na infância e na
adolescência do protagonista é um ótimo exemplo de humor refinado, que
caracterizaria muitos dos autores russos. O personagem ainda nem nascera e já
fora nomeado sargento e considerado sob licença até a conclusão de estudos.
“Aos 5 anos de idade fui entregue às mãos do cavalariço Savélitch, condecorado
meu preceptor por sua conduta abstênia. Sob sua tutela, ao 12 anos estava
alfabetizado em russo, e podia julgar com muito senso as qualidades de um cão
borzói”.
É uma vida boa, ainda mais quando o garoto recebe um
preceptor francês, encomendado de Moscou junto com o estoque anual de vinho e
azeite. Este “não era inimigo da garrafa” e depois de aprender uma ou duas
tagarelices em russo com seu aluno, o deixava solto.
Tudo muda quando o pai resolve que é hora do filho assumir
suas funções militares. O garoto é enviado para uma fortaleza distante e meio
abandonada.
No caminho, conhecemos outro dos trunfos de Pushkin: a
habilidade de descrever cenas de tensão e drama. Isso é perceptível quando a
carruagem em que está o rapaz é colhida por uma tempestade de neve, que torna
impossível encontrar o caminho: “O vento uivava, formara-se uma nevasca. Em um
instante, o céu escuro confundiu-se em um mar de neve. Tudo desapareceu”. Quem
os salva é um mendigo, que consegue leva-los para uma estalagem – um fato
isolado, que passa despercebido pelo leitor, mas que se mostra essencial no
decorrer da trama.
Na fortaleza, o garoto apaixona-se pela filha do capitão
(daí o título do livro) e passa a viver uma vida monótona, monotonia só
quebrada pela descoberta de que outro dos oficiais é apaixonado pela menina. Aliás,
o diálogo no qual ele descobre isso é um ótimo exemplo do fino humor do autor
russo:
“- Tenho a impressão de que ele gosta de mim.
- Por que tem essa impressão?
- Por que ele me pediu em casamento”.
A trama de fato começa quando eclode uma revolta liderada
pelo cossaco Emilian Pugatchov, um personagem real, que de fato liderou uma
grande revolta no século XVIII, se auto-proclando Czar.
A partir daí, o personagem principal precisará não só sobreviver,
como ainda salvar sua amada Macha, apelido de Maria Ivánovna.
Não se deixe enganar por essa trama romântica – que
certamente agradará adolescentes. A filha do capitão é principalmente um livro
muito bem escrito, que em camadas mais profundas pode ser lido como uma sutil
crítica à burocracia russa. E sua influência é avassaladora. Outros autores
seguiram o caminho de Pushkin e fizeram obras fundamentais que uniam diversos
gêneros em um só. O mais brilhante deles, obviamente, é Gógol. Gógol inclusive
escreveria uma obra, Taras Bulba, que se assemelha muito ao A filha do capitão.
Com uma diferença: enquanto na obra de Pushkin os cossacos eram os vilões, em
taras bulba os cossacos são os protagonistas.
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