domingo, dezembro 31, 2023

A pantera cor-de-rosa

 


O desenho animado da pantera cor-de-rosa surgiu de forma curiosa. Em 1963 foi lançado o filme A pantera cor-de-rosa, com Peter Sellers no papel principal. O filme contava a história de um inspetor que tentava impedir o roubo do diamante Pantera cor-de-rosa. Para tornar mais interessantes os créditos, o diretor resolveu trazer uma pantera animada. Usando monóculo e piteira, a pantera foge do inspetor, bagunça os créditos, trocando letras de lugar, é expulsa, volta e continua aprontando confusões.

Essa introdução fez tanto sucesso que surgiu a ideia de fazer uma série animada com a personagem. Foi feita uma série de curtas-metragens produzidos pela DePatie-Freleng Enterprises e exibidos inicialmente no cinema e depois na TV.

A pantera do desenho é apaixonada pela cor rosa e tem boas intenções, mas sempre coloca os outros em apuros graças às suas trapalhadas.

No primeiro episódio produzido, por exemplo, um pintor começa a pintar uma casa de azul, mas é atrapalhado pela pantera, que pinta de rosa. Começa uma disputa entre os dois, um pintando de azul e outro de rosa.

Em outro episódio, o cachorro de um caçador descobre a pantera e tenta avisá-lo para caçá-la, mas no processo o caçador acaba sempre terrivelmente machucado.

Em outro, a pantera constrói uma moto, mas passa a ser perseguida por um policial ao exceder involuntariamente o limite de velocidade. Claro que o policial acaba se dando mal das mais diversas formas possíveis.

Em todos esses episódios sempre aparecia um personagem narigudo que fazia o papel de pintor, caçador ou policial.

Como nos episódios clássicos a pantera não diz uma única palavra, o desenho se construía no humor visual. Contribuía muito para isso a inesquecível música composta por Henry Mancini. As gags geralmente eram todas encaixadas na música.

O desenho chegou a ganhar o Oscar da Academia em 1965 com o episódio "The Pink Phink".

O bom professor

 


Tenho percebido que em muitas instituições tem havido uma valorização excessiva de itens como cumprimento de prazos acadêmicos. O bom professor, para essas instituições, é aquele inicia suas aulas sempre exatamente no horário, sempre termina exatamente no horário, entrega as notas exatamente dentro do prazo. Até mesmo os questionários de avaliação dos professores reforçam essa filosofia. A maioria das perguntas são do tipo: o professor começa suas aulas sempre no horário correto? O professor nunca falta? O professor entrega as notas na secretária dentro do prazo estipulado pelo calendário acadêmico?
É claro que um professor relapso, que falta, chega sempre atrasado, não cumpre prazos, na maioria das vezes é totalmente descomprometido com a educação e dificilmente irá acrescentar algo ao aluno. Mas reduzir a importância do professor a esses itens é esquecer os significado da educação.
A teoria dos modelos mentais, da psicologia cognitivista, nos apresenta uma definição interessante de aprendizado. Para ela, percebemos o mundo através de modelos. A perceberemos uma nova informação a encaixamos dentro de um modelo já existente. Ao ver um beija-flor a pessoa a encaixará em seu modelo mental de pássaro. O aprendizado, segundo essa teoria, consiste na melhora, no enriquecimento de modelos mentais.
Imaginemos um indivíduo que desconhece completamente o que é um avião. Ao ver uma aeronave, sua tendência será encaixar essa nova informação em um de seus modelos. O avião, portanto, é um pássaro. Mas, conforme tiver conhecimentos sobre o assunto, esse modelo irá evoluir para pássaro de metal e finalmente para uma nova categoria, a de coisas que voam, mas não são pássaros. O exemplo demonstra a evolução de um modelo mental, e, portanto, de aprendizado.
Segundo Nilson Lage, enquanto o marketing objetiva, em geral, a atualização de modelos mentais pré-existentes, com preferências pelos mais gerais e primitivos, a educação pretende algo além disso. Quer influir sobre os modelos mentais de modo a modificá-los radical e duravelmente.
Raramente as avaliações institucionais são capazes de perceber essa dimensão, especialmente em decorrência de sua ênfase sobre a norma.
Há momentos em que aprender significa fugir da norma e, portanto, dos modelos mentais pré-estabelecidos. Certa vez faltou energia no horário de uma de minhas aulas. Como a sala estava excessivamente quente, levei meus alunos para debaixo de uma árvore e continuamos ali, em círculo. Poucas vezes tive uma aula com tanta participação de meus alunos e, curiosamente, essa turma se saiu muito melhor na prova do que as outras, que haviam tido aula na sala. Nesse caso, aprender significou também mudar o modelo mental de que só se aprende em sala de aula.
Sócrates não cumpria carga horária, ou entregava diários de classe na secretária, ou começava e terminava suas aulas sempre no mesmo e específico horário. Entretanto, alguém duvida de que ele foi uma das figuras universais mais eficientes em mudar os modelos mentais de seus alunos?
No livro Como Se Faz uma Tese, Umberto Eco nos diz que seu modelo ideal de aula seria aquele em que o professor ministrasse uma conferência, seguida de um momento em que cada aluno, de acordo com seu interesse, o procurasse para discutir o assunto.
Muitas vezes o aluno aprende através de um livro que um professor indica, ou uma conversa de corredor. Boa parte do que aprendi com meu orientador de mestrado, aprendi em conversas durante o almoço. Sem a obrigatoriedade de seguir um conteúdo programático, suas observações eram guiadas pela minha curiosidade sobre o assunto.
Claro que não se trata de propor uma escola em que não haja nenhum compromisso com horários ou prazos, mas o grande problema é que a ênfase da maioria das escolas tem dado apenas para esse aspecto. Para essas instituições, o bom professor é aquele que chega exatamente no horário, termina exatamente no horário e entrega suas notas em dia na secretaria. Se houve aprendizado é irrelevante. Normalmente, esse ponto de vista, positivista na sua essência, é justificado, nas faculdades particulares, com o argumento de que o aluno paga para ter 50 minutos de aula. Isso não é verdade. Ele paga para aprender. Seja debaixo de uma árvore ou dentro da sala de aula. Seja nos 50 minutos de aula ou em uma conversa na lanchonete.

1899 - seriado questiona o que é real

 


Os alemães Jantje Friese e Baran bo Odar foram responsáveis por Dark, uma das mais famosas e enigmáticas série da Netflix. Assim, é natural que uma nova série da dupla chamasse muita atenção e gerasse muitas teorias. É o que tem acontecendo com 1899.

Na história, um grupo embarca numa viagem rumo à América. Cada um deles parece esconder algo a respeito de sua vida passada e até de sua identidade. A situação, entretanto, muda completamente quando o capitão recebe as coordenadas que podem ser de um navio desaparecido há quatro meses. A descoberta do navio faz com que o fantástico irrompa nesse micro-mundo, com pessoas que deveriam estar mortas aparecendo, por exemplo.

A questão da identidade, que permeia todos os personagens importantes – e cujos histórias são reveladas através de flash backs revela a maior influência de 1899: a série Lost. Mas, mais do que isso, é um índice, algo que indica o tema trabalhado no seriado. Todos ali parecem ter adotado uma identidade simulacro: a prostituta japonesa que não é japonesa e não é prostituta, o oficial francês que, na verdade adotou a identidade de outra pessoa, o padre que não é padre.

Se Dark lidava com nossa noção do tempo, 1899 lida com nossa noção de realidade. Não por acaso, a alegoria da caverna, de Platão, é constantemente citada durante os episódios. Nessa história criada pelo filósofo grego, pessoas vivem presas numa caverna e acreditam que as verdadeiras formas do mundo são as sombras que vêem na parede.

Platão levantou a questão, depois abordada por muitos outros filósofos, de que talvez o que vemos não seja a realidade. Assim, como confiar nossos sentidos? E é exatamente essa a sensação percebida pelos personagens de 1899. Tudo que eles vivem parecem tão fora da realidade que num determinado ponto é difícil distinguir o que é real e o que não é, levantando outra questão: talvez nada seja real.

Como se vê, 1899 aborda tantas questionamentos filosóficos e científicos quanto Dark. A grande questão é o que a série faz com esses questionamentos. O final da temporada traz uma solução narrativamente pouco inspirada, que fica muito aquém dos problemas apresentados sobre a realidade. Resta saber se a segunda temporada seguirá esse caminho fácil ou continuará surpreendendo.

Cultura Pop

 

Cultura pop é uma antologia com artigos meus sobre os mais variados assuntos  ligados à área de comunicção. O livro é dividido em quatro capítulos: cultura pop, mundo cibernético, a ciência na cultura pop e guerrilheiros culturais.
A parte inicial é uma crítica às correntes apocalípticas da comunicação, segundo as quais os meios de comunicação de massa são incapazes de trazer qualquer conteúdo relevante ou crítico daí o conceito de cultura pop, que teria como características: inovação com relação a seus congêneres; apresentar uma leitura crítica do mundo e ter um conteúdo arquetípico.
O livro foi lançado em 2002 por uma faculdade na qual eu trabalhava na época e, apesar da tiragem pequena (200 exemplares) teve uma boa repercussão ao ser enviado para bibliotecas universitárias. Na época cheguei a receber e-mails de professores que estavam usando o livro em sala de aula e de alunos que haviam emprestado o livro na biblioteca e gostado (certa vez recebi até a visita de dois estudantes e comunicação que estavam de passagem por Macapá, leram o livro e queriam conversar comigo).

Monstro do Pântano – Rito de primavera

 


Grande parte dos heróis principalmente da DC Comics são tudo, menos humanos: extraterrestres, deuses, seres artificiais. No entanto, nunca estranhamos ao vê-los se envolvendo com humanos.

Alan Moore colocou o dedo na ferida em Swamp Thing 34, a edição em que Abbe Cable declara seu amor pelo Monstro do Pântano.

Essa é também a primeira edição a mostrar explicitamente que o personagem muda de estação para estação. Como a história se passa na primavera, seu corpo está repleto de flores.

A primeira referência explícita ao fato de que o Monstro do Pântano muda conforme as estações. 


Em meio a um diálogo constrangido, a garota de cabelos prateados revela que ama o protagonista da série: “Mas você é uma planta! Caramba, só de falar isso em voz alta já é cômico. Como poderia me amar?”. E ele responde: “Profundamente. Em silêncio. Por muito tempo... anos demais”.

Mas como realizar esse amor? O sexo parece impossível, mas é necessário algum tipo de conexão. O Monstro então tira um tubérculo de seu peito e pede que ela coma. “Hm... é bom demais Você quis fazer isso como um... ato simbólico?”, pergunta Abbe. “Não, não apenas”, responde ele... e o mundo explode em uma realidade lisérgica.

Um beijo polêmico. 


Para representar isso, Steve Bissette e John Totleben fizeram ilustrações horizontais, forçando o leitor a virar a página, como se o obrigasse a adquirir um novo ponto de vista.

A narração de Moore dessa relação sexual inusitada é um dos momentos mais poéticos da série: “Chegou a primavera, e tudo no mundo acordou. Eu estilhaço a piscina com a mão e cem contas de luz saem explodindo entre os dedos. Um colar anti-gravidade me pousa brevemente na garganta, se desmancha e se dispersa em gotinhas quentes”.

Essa HQ é uma das mais poéticas da série. 


Moore antecipou a polêmica que a história provocaria e deixou o gancho para uma saga futura, em que Abbe é presa por ter relação sexual com uma planta, o que seria proibido por lei.

Essa história foi publicada em Superamigos 34 e dizem que foi a razão pela qual a Abril deixou de publicar a série. Alguém da direção do departamento de quadrinhos não gostou da insinuação sexual entre os dois e mandou parar com as histórias. A editora só voltaria a publicar o personagem depois, em revista própria, quando a Globo estava fazendo sucesso com Sandman e a Abril precisava de um concorrente.

Mas, ao final, essa história deixa um questionamento: qual a diferença entre a relação entre o Monstro do Pântano e Abbe e a relação entre o alienígena Super-homem e a humana Lois Lane?

Cisco Kid

 


 

Cisco Kid surgiu em 1907, em uma novela de O´Henry. Fez tanto sucesso que logo foi convertido para o cinema em vários filmes. O personagem era um típico cowboy clássico, com sua roupa preta, seu chapelão de abas largas e Pancho, seu companheiro bonachão, inspirado em Sancho Pança. Em 1944 a editora Comic Book tentou adaptá-lo para os quadrinhos, sem sucesso. Em 1948 um novo filme do personagem fez um sucesso estrondoso e levou ao surgimento de uma série de TV. O interesse pelo personagem era maior do que nunca e a Dell resolveu investir na adaptação para quadrinhos. O roteiro ficou a cargo de Rod Reed e as histórias eram desenhadas por Alberto Giolitti. Dessa vez o sucesso do gibi foi imediato, chamando a atenção da King Features Syndicate, que contratou Reed para escrever as tiras do personagem e um desenhista argetino, José Luís Salinas, para ilustrar. Era uma dupla perfeita. O texto de reeed era ingênuo e otimista sem ser infantil e Salinas, um fiel seguidor de Hall Foster conseguiu captar perfeitamente a essência do personagem. 

Na primeira história, Cisco ajuda um fazendeiro cujo gado está sendo roubado. 


No Brasil, algumas dessas tiras foram publicadas num álbum da LPM em 1987. O álbum reúne duas aventuras do personagem. Na primeira, um fazendeiro está tendo seu gado roubado e contrata vários pistoleiros para ajudarem a pegar os ladrões. Ocorre que os pistoleiros são justamente os que estão roubando o gado, a pedido do vizinho “melhor amigo” do fazendeiro. 

Tudo parece estar dando certo até o aparecimento de Cisco Kid e Pancho. Cisco salva o fazendeiro de uma emboscada, a filha do fazendeiro se apaixona por ele e ele promete ajudar a descobrir quem está roubando o gado em sequências maravilhosas de ação com desenho inspirado de Salinas e diálogos afinados de Reed. O maior problema aí é o formato das tiras, que não permitem ver a arte como essa merecia. Páginas dominicais funcionariam muito melhor. Mas de resto, tudo funciona. Destaque para o humor. À certa altura, o vizinho inventa que Cisco Kid está sendo procurado por três xerifes, ao que ele retruca que na verdade são seis. No final, descobre-se que os xerifes estão de fato à procura dele, mas para condecorá-lo.
Na segunda história, ladrões roubam o trem se fazendo passar por Cisco. 


Na segunda história, o dono de uma companhia de diligências está indo à falência devido à concorrência da estrada de ferro e decide chamar Cisco Kid para ajudá-lo. A história, embora seja uma aventura, tem um tom de comédia de erros. A chegada de Cisco na cidade faz todos acharem que ele irá realizar algum atentado contra a locomotiva. Dois badidos resolvem aproveitar a situação e vestindo-se como Cisco e Pacho e roubam o trem, colocando a culpa nos heróis. Segue-se uma série de equívocos que levam Cisco à prisão, mas depois à elucidação do caso, com o típico final feliz. No meio de tudo isso, claro, a filha do dono das diligências se apaixona por Cisco Kid. O destaque negativo da edição vai para a capa. Com tantas ótimas imagens de Cisco no traço de Salinas, a LPM escolheu logo uma em que o herói mal aparece.

Perry Rhodan – Ultimos dias de Atlântida

 
Atlan é o personagem mais misterioso dos segundo ciclo da série Perry Rhodan. Como ele veio parar na Terra? Como ele conseguiu um ativador celular o torna praticamente imortal? Como ele se tornou o único arcônida na Terra? Como ele ficou preso em nosso planeta?

A maioria dessas perguntas é respondida no número 70 da série. Escrito por K. H. Scheer, o volume é divido em duas partes. Na primeira parte, acontece algo com Bell quando ele passa pela ducha celular e, ao invés de suas células pararem de envelhecer, elas passam a rejuvenescer. O problema é que esse processo pode continuar infinitamente, fazendo com que ele regrida a nível celular.

Para tentar reverter o processo, Atlan sugere que Bell receba novamente a ducha, mas no universo dos druffs.

Tirando uma ou outra sequência interessante (a tempestade que eles enfrentam na outra dimensão é muito bem descrita) e por mostrar o quanto Gucky é apegado a Bell, essa é uma parte totalmente descartável do livro, que parece ter sido colocada apenas porque Scheer achou que a parte principal não teria tamanho para completar o volume.

A história começa de fato quando Atlan começa a se lembrar do primeiro contato que tivera com os druffs. Isso acontecera na aurora da humanidade e naquela época os vilões da outra dimensão pareciam interessados em invadir nossa dimensão com naves ao invés de simplesmente transferir pessoas para a dimensão deles (como fazem na época em que se passa a trama principal).

A capa alemã. 


O volume explica, de forma rápida, como Atlan recebera o ativador celular, através de um robô vindo numa nave misteriosa, que ele conclui, agora, que vinha do planeta Peregrino.

Explica também algo que acontece lá num dos primeiros livros da série, Base em vênus, quando os terranos chegam em Vênus e encontram só o computador arcônida, o que se revela um grande mistério: para onde teriam ido os construtores da base e do computador? A razão é que os arcônidas do planeta haviam sido sequestrados pela dimensão dos druffs.   Há aqui um ótimo exemplo de como Scheer, que escrevia os resumos à época, tinha uma visão ampla da história a ponto dos volumes 8 e 70 serem conectados.

O livro também explica como Atlan acaba ficando sozinho no planeta, algo aparentemente incompreensível, já que, como é dito no início, a colônia arcônida na Terra contava com milhares de pessoas. E a explicação é totalmente verossímil.

A edição ainda conta com ótimas narrativas de cenas de guerra, que eram uma especialidade de Scheer.

Não fosse pela metade descartável, esse seria um dos melhores volumes do segundo ciclo.

Karl Popper: a ciência é caracterizada pelo falseamento

 


Para Karl Popper, a ciência é caracterizada pelo falseamento. Ou seja, uma teoria só é científica se for possível provar que ela está errada.

         Assim, seria não-científico afirmar que vai chover amanhã. É certo que amanhã vai chover em algum lugar do planeta, em algum horário.

         É científico dizer que vai chover amanhã às 17 horas em Macapá, pois essa afirmação é passível de falseamento.

         A ciência não aceita formulações vagas, que não podem ser falseadas, características dos videntes e cartomantes: “Você vai viver um grande amor”; “Um grande reino vai cair”. É impossível provar que essas afirmações são falsas. Em algum momento a pessoa vai viver um grande amor e em uma guerra, inevitavelmente um reino irá ser derrotado.
         Para Popper, O cientista não deveria procurar fatos que comprovassem sua tese, mas fatos que o falseassem, que provassem que ela é falsa.

Imaginemos que estejamos estudando as galinhas. Pesquiso uma e descubro que ela bota ovos. Encontro outra galinha e observo o mesmo comportamento. Por indução, chego à conclusão de que todas as galinhas botam ovos. Para Popper isso não é científico, pois se eu encontrar uma única galinha que não bote ovos, minha tese cai por terra.

Para Popper, a indução é falha e a única maneira de sermos científicos é usarmos a dedução.

         Assim, eu crio uma lei geral: todas as galinhas botam ovos. Então pego uma galinha ao acaso e verifico se ela bota ovos. Se isso ocorrer, a tese está correta, por ora. Se um dia aparecer uma galinha que não bote ovos, a tese será falseada.

Popper nos ensinou que as verdades científicas são provisórias. São apenas hipóteses esperando pelo falseamento.

sábado, dezembro 30, 2023

Quadrinhos hiper-reais na revista Nós

 


A revista Nós, da Universidade Estadual de Goiás, dedicou um de seus números mais recentes aos quadrinhos. Entre vários artigos de alguns dos principais pesquisadores de quadrinhos do Brasil, um texto meu sobre a hiper-realidade e simulacro nos quadrinhos do Capitão Gralha.
Para acessar a revista, clique aqui.

Depois do fim do mundo, de John Byrne

 


John Byrne é uma das figuras mais importantes dos quadrinhos de super-heróis norte-americanos a ponto de não conseguirmos imaginá-lo em outro gênero. Mas quem comprar Depois do fim do mundo, lançado em 2018 pela Mythos, verá que ele consegue se sair bem em um tipo completamente diferente de história: o pós-apocalíptico.
Na história, a humanidade é arrasada por uma monstruosa erupção solar, que destrói boa parte do planeta. A história é contada do ponto de vista de um grupo de astronautas, que consegue fugir do fenômeno e, voltando à terra, encontra o planeta devastado.
Byrne maneja bem o roteiro, criando situações interessantes, como uma cidade em que os únicos sobreviventes parecem ser ratos e baratas multiplicados aos milhões ou um penitenciária em que os detentos tomaram o poder.
Era de esperar que Byrne, acostumado ao gênero super-herói, exagerasse em algumas situações ou até mesmo destacasse a atuação de heróis salvadores, mas a história é bastante comedida nesse sentido.
Na série, Byrne revisita o seu primeiro trabalho. 


Outro aspecto interessante é a narrativa, com capítulos inciando após um salto temporal e flash backs explicando o que veio antes.
Uma curiosidade é que esse álbum, embora pareça um trabalho totalmente fora da curva do estilo de John Byrne, é, na verdade, uma volta do artista ao seu primeiro trabalho, Doomsday, publicado pela Charlton Comics em the 1976. A história original, entretanto, era bem menos realista, com o grupo de astronautas enfrentando robôs, sereias e aliens.
De negativo, a capa, com a estátua da liberdade encoberta por sombras, que diz muito pouco sobre a série.

A teoria hipodérmica da mídia

 


A teoria hipodérmica surgiu no início do século XX, com forte influência da psicologia comportamental. Foi a primeira tentativa de explicar os efeitos dos Meios de Comunicação de Massa sobre a sociedade.
Amparada nos exemplos do uso da propaganda por regimes totalitários e pelo pânico provocado pela transmissão radiofônica do romance A Guerra dos Mundos, de H.G. Wells, dirigida por Orson Welles, esse modelo comunicacional via a mídia como uma agulha que injetava seus conteúdos no receptor sem qualquer tipo de barreira, criando um estímulo que provocava uma resposta imediata e positiva por parte dos receptores, vistos como atomizados e idiotizados.
Sua influência sobre os estudos a respeito da comunicação massiva foi enorme, o que alimentou a imaginação popular com a ideia de que a mídia tem um poder absoluto sobre sua audiência.
A teoria hipodérmica (ou da bala mágica, como também é conhecida) influenciou até mesmo um subgênero da ficção-científica, as distopias. Em obras como 1984, de George Orwell, Fahrenheit 451, de Ray Bradbury, e Admirável mundo novo, de Adous Huxley, a televisão, o cinema e outras mídias são usados para massificar e idiotizar os indivíduos, tirando-lhes a capacidade crítica.
Na experiência de Pavlov, o cachorro passa a salivar mesmo sem a comida, apenas com o estímulo sonoro.

                A teoria utilizava o esquema estímulo – resposta da psicologia behavorista. A experiência de Pavlov com um cachorro seria a base da análise dos fenômenos midiáticos.
Pavlov observou que o animal salivava toda vez que lhe era apresentada a comida, um ato instintivo do organismo, preparatório para a digestão. Assim, toda vez que ia alimentar o animal, o cientista tocava uma sineta. Por fim, tocava apenas a sineta. Mesmo não havendo comida, o cão respondia ao estímulo (som da sineta) com uma resposta (salivando).
Por analogia, esse esquema foi utilizado no campo da comunicação de modo que as mensagens enviadas pela mídia seriam o estímulo que levaria uma resposta certa e imediata por parte dos receptores, vistos como atomizados, acríticos e condicionados.
Na perspectiva hipodérmica os efeitos são dados como certos, inevitáveis e instantâneos. Se uma pessoa é apanhada pela propaganda, passa a ser controlada e manipulada, leva a agir.
Os estudiosos viam os indivíduos como átomos isolados, com pouca influência dos grupos sociais e altamente manipulados pela mídia. Nessa perspectiva, seriam impensável respostas individuais ou que discordassem do estímulo midiático.
O nome, inclusive, refere-se à agulha usada para injetar medicamentos abaixo da pele do paciente, assegurando assim um resultado imediato. De fato, a agulha hipodérmica, é a usada por médicos em hospitais para injetarem medicamentos nos pacientes (hipo é abaixo e derme é pele), assegurando uma resposta mais rápida do paciente à medicação. Assima mídia é vista como uma agulha, que injeta seus conteúdos diretamente no cérebro dos receptores, sem nenhum tipo de barreira ou obstáculo.
Nessa percepção, o processo de comunicação é totalmente assimétrico, com um emissor ativo, que produz o estímulo e os destinatários são vistos como uma massa passiva à qual só resta obedecer ao estímulo. Os papeis emissor – receptor surgem isolados de qualquer contexto social ou cultural. 
                Pelo menos dois fatos contribuíram para a popularidade dessa teoria entre os intelectuais da primeira metade do século XX: o uso da propaganda por regimes totalitários e o pânico Guerra dos Mundos.
O pânico guerra dos mundos ajudou a popularizar a teoria hipodérmica.

Na noite do dia 30 de outubro de 1938, rádio CBS (Columbia Broadcasting System) interrompeu sua programação musical para noticiar uma invasão extraterrestre iniciada na cidade de Grover´s Mill, no estado de New Jersey.
O programa era, na verdade, uma adaptação do livro A guerra dos mundos, de H. G. Wells. O diretor, Orson Welles, organizou a adaptação como uma grande cobertura jornalística com reportagens externas, entrevistas com testemunhas, opiniões de peritos e autoridades, efeitos sonoros, sons ambientes, gritos e repórteres emocionados.
Muitas pessoas ligaram o rádio no meio da programação e acharam que estavam de fato diante de uma invasão extraterrestre. Os serviços telefônicos ficaram congestionados. Nas grandes cidades houve engarrafamentos devido às pessoas que tentavam fugir dos alienígenas.
O medo paralisou três cidades.  Houve pânico principalmente em localidades próximas a Nova Jersey. Além disso, houve fuga em massa e desespero em cidades como Nova York.
Na cidade mais próxima do suposto local da batalha, Newsmark, 50 mil pessoas fugram de suas casas, procurando abrigo na floresta. Pessoas se jogavam das janelas dos prédios. Outras saíam de casa atirando.
                O pânico total, provocado por um fato criado pela mídia convenceu pesquisadores de que esta tinha um poder absoluto sobre sua audiência. A audiência passou a ser vista como uma massa amorfa, que apenas respondia, passivamente, os estímulos dos meios de comunicação.
Outro fato fundamental para a popularidade da teoria hipodérmica  foi a maneira como os regimes totalitários utilizaram os meios de comunicação para manipular a população.
O nazismo, por exemplo, usou amplamente o cinema, o rádio e os jornais como veículos de doutrinação. Até mesmo os encontros do partido eram organizados no sentido de intensificar o sentimento de massa.
Goebbels, ministro da propaganda de Hitler, afirmava que o cinema era um dos meios mais modernos e científicos de influenciar as massas. Dava tal importância ao mesmo que as filmagens continuaram até quando os russos já estavam às portas de Berlin, pois acreditava-se que a única forma de reverter a derrota era através da propaganda.
Filmes como O judeu Suss ampliaram o sentimento anti-semita entre os alemães.

O princípio básico de  Goebbels era unir propaganda e diversão de modo que o receptor não conseguisse diferenciar um do outro. O filme Os Rothschild (dirigido por Erich Waschmeck, 1940), por exemplo, conta como uma família de judeus ingleses enriquece graças às guerras napoleônicas. O judeu Suss (1940) mostrava um ministro das finanças ambicioso e libidinoso que se apaixona por uma moça ariana e faz de tudo para separá-la de seu amado, igualmente ariano. O filme, um enorme sucesso na época, era exibido no leste europeu, para soldados responsáveis pelo fuzilamento de judeus e para guardas de campos de concentração. O diretor, Veit Varlan, chegou a ser processado pelo Tribunal Estadual de Hamburgo por crime contra a humanidade.
Um dos clássicos da propaganda nazista é O triunfo da vontade, filme de Leni Riefenstahl sobre o congresso nazista de 1936. Em uma das cenas mais emblemáticas, o avião que traz Hitler plana sobre as nuvens, que se abrem enquanto ele desce sobre a cidade, como se o líder estivesse trazendo o sol para a Alemanha.
Filmes como esse tiveram importância fundamental na sustentação do regime nazista alemão.
                Embora seja um dos paradigmas mais difundidas na área de comunicação e também a que mais influência teve, a teoria hipodérmica é também a mais criticada.
Dentro da própria corrente funcionalista (Laswell, criador do da teoria hipodérmica, era funcionalista) surgiram pesquisas que colocariam em questão o princípio mecanicista de efeito direto e indiferenciado. Lazzarsfeld, por exemplo, descobriu que líderes de grupos primários poderiam até mesmo modificar o significado da propaganda, fazendo-a se virar contra os emissores.
Esses líderes de opinião influenciam o pensamento de sua comunidade e relativizariam o poder dos meios de comunicação.
                Mesmo a mídia traz os mais diversos tipos de estímulos, muitos contraditórios, como as campanhas contra o consumo de álcool por motoristas e as propagandas de cerveja. 
A campanha da antarctica chocou-se com o sentimento religioso da população.

                Existem também fatores externos, culturais, sociais e religiosos, que influenciam o consumidor, enviando estímulos diversos daqueles veiculados na mídia. Exemplo disso foi a campanha “Do jeito que o Diabo gosta”, da cerveja Antarctica, em que a personagem Feiticeira protagonizava uma diabinha.  A campanha, um sucesso em metrópoles, como Rio de Janeiro e São Paulo, foi rejeitada em cidades das regiões Norte e Nordeste. Muitos donos de bares se negavam até mesmo a pregar cartazes da campanha, oem protesto. Nesse caso, o estímulo da mídia chocou-se com o estímulo religioso, que vê a palavra “Diabo”, como algo negativo. Se nos grandes centros, o público interpretou a propaganda como uma brincadeira, nas cidades mais conservadoras, o público preferiu alinhar-se aos estímulos religiosos.

Homem-coisa - pelas mãos do destino

 

Se há um personagem subestimado na Marvel é o Homem-Coisa. Ele foi criado na mesma época que o Monstro do Pântano e há quem diga que o Monstro do Pântano é cópia dele (Gerry Conway, o criador do Homem-coisa dividia apartamento com Len Wein, o criado do Mostro do Pântano e os dois conversavam sobre as histórias que estava produzido, de modo que é quase impossível determinar quem veio primeiro).

O personagem teve uma fase de sucesso nos anos 1970, mas nos anos 80, época em que o Monstro do Pântano alcançava o estrelato nas mãos de Alan Moore, sua contraparte na Marvel não tinha mais revista própria e sobrevivia apenas fazendo aparições em conjunto com outros heróis da editora.

Exemplo disso é “Pelas mãos do destino”, crossover da criatura dos pântanos com o Homem-aranha publicado em Marvel Team-Up 122.


Na trama, Iam Destino aparece no pântano. O personagem é um jornalista cuja família foi assassinada por mafiosos e, para se vingar estudou artes místicas a ponto de se tornar extremamente poderoso.  

E ele resolve levar o Homem-coisa para Nova York e mais especificamente para o Clarin Diário, aparentemente com o ituito de produzir matérias positivas, que elevem a humanidade. Mas, uma vez no Clarin, o monstro provoca reação de medo generalizada e sai do controle (o medo machuca o Homem-coisa e, ao tocar em uma pessoa que sente medo, ele a mata).

É uma trama fraca e o plano de Destino não só não fazo menor sentido. Da mesma forma, o leitor ainda fica sem entender qual a função do Homem-coisa na trama.

Ainda assim, o texto de JM DeMatteis e o desenho competente de Kerry Gammill conseguem dar verossimilhança à história. DeMatteis era um especialista em humanizar os heróis da Marvel e consegue fazer isso mesmo com um personagem irracional como o Homem-coisa.

No Brasil essa história foi publicada em Superaventuras Marvel 50.

A arte incrível de Mike Grell

 


Mike Grell é mais conhecido por seu longo relacionamento com a DC para a qual trabalha desde a década de 1970. Ele desenhou personagens como Aquaman e a série do Laterna e Arqueiro Verde. Em 1976 ele criou a série Warlord, conhecida no Brasil como Guerreiro, que o tornou extremamente popular entre os fãs, sendo o único quadrinhos de espada e magia da DC a fazer grande sucesso. Na década de 1980 ele criou, para a editora First, o personagem Sable, um caçador que se torna um mercenário. Em 1987 produziu uma minissérie em três edições do Arqueiro Verde chamada Caçadores que reformulou completamente o personagem. Ele deixou de enfrentar vilões fantasiados e passou a combater assassinos em série, terroristas e mafiosos. Grell aboliu as flechas “especiais” e o personagem passou a usar apenas flechas comuns. Essa série marcou profundamente o personagem deu origem a uma revista mensal também escrita e desenhada por Grell.