2008 foi o ano da crise, uma crise financeira tão profunda e tão grave que, na opinião de alguns, é equivalente ao crash de 1929. Essa crise parece ter sido não só na economia, mas no meio-ambiente e até mesmo na cultura.
No Brasil, tivemos a tragédia em Santa Catarina, que matou dezenas de pessoas e deixou milhares sem casa. Muitos cientistas dizem que os acontecimentos de Santa Catarina estão diretamente relacionados ao aquecimento global, que foi tema da minha primeira colaboração com o especial de final de ano. Em 2005, o destaque era a seca do rio Amazonas, agora é a enchente em Santa Catarina. Nesses quatro anos, a situação do aquecimento global só piorou e pouca coisa foi feita de concreto para reverter a situação. A Amazônia foi mais devastada do que nunca e Bush ainda continua com sua política de ignorar tratados, como o Protocolo de Kioto.
2008 foi o ano da crise e essa crise parece ter se estendido à área cultural.
O filme Espartalhões, de Jason Friedberg e Aaron Seltzer simbolizou bem o espírito desse ano de crise: sátira do filme 300, baseado na HQ de Frank Miller, Espartalhões é o ponto mais baixo do humor. Quando um filme todo só vale pela coreografia dos espartanos cantando I´ll survive, é porque o fim dos tempos está próximo. Ao assistir as tentativas insanas dos diretores de fazer humor com líquidos corporais e nojeiras, é inevitável uma saudade dos tempos de boas sátiras, como Apertem os cintos, o piloto sumiu.
Na área de quadrinhos, tivemos a morte de três grandes mestres brasileiros: morreram Gedeone Malagola, Cláudio Seto e Eugênio Colonnese.
Malagola criou um dos mais famosos super-heróis brasileiros, o Raio Negro. Entre histórias de super-heróis, de terror e até infantis, ele escreveu ou desenhou mais de duas mil histórias.
Colonnese era italiano, mas radicou-se no Brasil na década de 1960, onde especializou-se em histórias de terror e guerra, embora tenha emprestado seu traço aos mais variados gêneros. Sua personagem Mirza é considerada a primeira mulher-vampiro dos quadrinhos, sendo anterior, inclusive à norte-americana Vampirella.
Cláudio Seto, descendente de japoneses, foi um dos primeiros a produzirem mangás no Brasil. No final dos anos 1960 ele criou o personagem O Samurai, uma inovação num país que desconhecia quase que completamente a cultura oriental. Também era especialista em erotismo. Sua personsagem Maria Erótica enfrentou a censura da ditadura. Militares chegaram a invadir a editora para prendê-lo, mas, como não o encontraram, levaram os originais de Maria Erótica e os deixaram presos em uma cela. No final dos anos 1970, Seto capitaneou a editora curitibana Grafipar, que fez grande sucesso e atraiu os melhores roteiristas e desenhista da época. A capital paranaense chegou a ter uma vila de quadrinistas graças ao trabalho de Seto.
A morte desses três quadrinistas deixou o quadrinho nacional órfão de alguns dos seus mais importantes talentos.
Mas nem tudo está perdido. Barack Obama foi eleito presidente dos EUA (e espera-se que ele seja em tudo oposto a Bush) e 2008 até que teve alguns destaques positivos em termos culturais.
O primeiro que nos vem à mente é o ótimo filme Batman, o cavaleiro das trevas, de Christopher Nolan. Não é a melhor adaptação de uma história em quadrinhos. Esse posto é disputado pelo Superman de 1978, de Richard Donner e pelo Homem-Aranha 2, de Sam Raimi. Mas o Cavaleiro das Trevas levou os filmes de super-heróis a um novo patamar, inclusive psicológico, tornando-se, desde já, um clássico.
Um livro obrigatório para quem gosta de quadrinhos é o A era de bronze dos super-heróis, de Roberto Guedes (HQM). A era de bronze é um período que vai do final dos anos 1960 a meados da década de 1980. Nessa época, os fãs de quadrinhos começaram a trabalhar nas editoras e revolucionaram o mercado com histórias que falavam diretamente aos jovens. A maioria dos leitores que tem mais de 30 anos começou lendo histórias da era de bronze e é fascinante descobrir detalhes sobre os gibis que marcaram a nossa infância. É um livro único no mundo.
Outra boa iniciativa de 2008 foi a coleção Cinemateca Veja, uma coleção tão boa quanto a revista é ruim. De fato, apesar do arroz de festa Titanic, a coleção traz filmes que merecem ser assistidos, que marcaram profundamente a indústria cinematrográfica.
Para mim foi uma surpresa redescobrir A morte pede carona, escrito por Eric Red, com direção de Robert Harmon . Para quem nunca assistiu ao filme, é a história de um garoto que dá carona para um psicopata e, quando vai ser morto, o empurra na estrada. Ele continua normalmente a viagem, até ver um carro passar por ele com uma família. O desespero toma conta do rapaz ao descobrir que o psicopata está lá dentro, no banco traseiro, brincando com as crianças. Ao tentar avisar o motorista, ele quase bate num ônibus. A sequência em que o rapaz encontra o carro da família é uma aula de cinema. Um plano mais aberto mostra ele olhando para o vidro e depois a câmera dá um plano detalhe no tênis do garoto, com o sangue pingando nele. A partir daí, o garoto passa a ser perseguido pelo psicopata num jogo de gato e rato que nunca acaba.
Assisti esse filme quando era jovem e, por essa razão, ele ficou na minha mente como um triller adolescente. Ao assitir novamente, percebi que A Morte pede carona é um curioso estudo psicológico de uma relação doentia. Até hoje, muitos anos depois, impressiona.
A coleção ainda traz vários outros filmes obrigatórios, como Um convidado bem trapalhão, humorístico campeão das sessões de sábado na Globo, e que um figurante indiano (Peter Sellers) destrói uma festa de granfinos. O filme junta hippies, protestos, um elefante pintado, espuma, um banheiro sendo destruído... Caramba, hoje em dia um filme desses nunca passaria do projeto.
Na música, o disco Vou tirar você desse lugar, homenagem a Odair José, foi o grande destaque. A proposta era inusitada: colocar músicos envolvidos com o rock ou com o alternativo para fazer versões das músicas do rei do brega. O resultado ficou muito bom. É surpreendente descobrir que, por trás dos arranjos bregas, há boas letras, como ¨Eu queria ser John Lennon¨, que ganha no disco uma vesão inpiradíssima do grupo Colúmbia. A coletâne também teve a participação de famosos, como Paulo Miklos, Pato Fu e Zeca Baleiro.
No cinema, 2008 trouxe ainda duas boas surpresas. A primeira foi a volta de M. Night Shyamalan, com Fim dos Tempos, que parece ter reaprendido a fazer bons filmes de suspense depois do fiasco de A dama da água. Outro foi Wall-E, a mais recente animação da Pixar-Disney, um belíssimo filme.
Curiosamente, tanto Wall-E quanto Fim dos tempos falam do mesmo assunto: da crise ambiental provocada pela poluição e destruição da natureza. Quem sabe os livros de história, no futuro, digam que a grande crise de 2008 não foi econômica, mas ambiental...
No Brasil, tivemos a tragédia em Santa Catarina, que matou dezenas de pessoas e deixou milhares sem casa. Muitos cientistas dizem que os acontecimentos de Santa Catarina estão diretamente relacionados ao aquecimento global, que foi tema da minha primeira colaboração com o especial de final de ano. Em 2005, o destaque era a seca do rio Amazonas, agora é a enchente em Santa Catarina. Nesses quatro anos, a situação do aquecimento global só piorou e pouca coisa foi feita de concreto para reverter a situação. A Amazônia foi mais devastada do que nunca e Bush ainda continua com sua política de ignorar tratados, como o Protocolo de Kioto.
2008 foi o ano da crise e essa crise parece ter se estendido à área cultural.
O filme Espartalhões, de Jason Friedberg e Aaron Seltzer simbolizou bem o espírito desse ano de crise: sátira do filme 300, baseado na HQ de Frank Miller, Espartalhões é o ponto mais baixo do humor. Quando um filme todo só vale pela coreografia dos espartanos cantando I´ll survive, é porque o fim dos tempos está próximo. Ao assistir as tentativas insanas dos diretores de fazer humor com líquidos corporais e nojeiras, é inevitável uma saudade dos tempos de boas sátiras, como Apertem os cintos, o piloto sumiu.
Na área de quadrinhos, tivemos a morte de três grandes mestres brasileiros: morreram Gedeone Malagola, Cláudio Seto e Eugênio Colonnese.
Malagola criou um dos mais famosos super-heróis brasileiros, o Raio Negro. Entre histórias de super-heróis, de terror e até infantis, ele escreveu ou desenhou mais de duas mil histórias.
Colonnese era italiano, mas radicou-se no Brasil na década de 1960, onde especializou-se em histórias de terror e guerra, embora tenha emprestado seu traço aos mais variados gêneros. Sua personagem Mirza é considerada a primeira mulher-vampiro dos quadrinhos, sendo anterior, inclusive à norte-americana Vampirella.
Cláudio Seto, descendente de japoneses, foi um dos primeiros a produzirem mangás no Brasil. No final dos anos 1960 ele criou o personagem O Samurai, uma inovação num país que desconhecia quase que completamente a cultura oriental. Também era especialista em erotismo. Sua personsagem Maria Erótica enfrentou a censura da ditadura. Militares chegaram a invadir a editora para prendê-lo, mas, como não o encontraram, levaram os originais de Maria Erótica e os deixaram presos em uma cela. No final dos anos 1970, Seto capitaneou a editora curitibana Grafipar, que fez grande sucesso e atraiu os melhores roteiristas e desenhista da época. A capital paranaense chegou a ter uma vila de quadrinistas graças ao trabalho de Seto.
A morte desses três quadrinistas deixou o quadrinho nacional órfão de alguns dos seus mais importantes talentos.
Mas nem tudo está perdido. Barack Obama foi eleito presidente dos EUA (e espera-se que ele seja em tudo oposto a Bush) e 2008 até que teve alguns destaques positivos em termos culturais.
O primeiro que nos vem à mente é o ótimo filme Batman, o cavaleiro das trevas, de Christopher Nolan. Não é a melhor adaptação de uma história em quadrinhos. Esse posto é disputado pelo Superman de 1978, de Richard Donner e pelo Homem-Aranha 2, de Sam Raimi. Mas o Cavaleiro das Trevas levou os filmes de super-heróis a um novo patamar, inclusive psicológico, tornando-se, desde já, um clássico.
Um livro obrigatório para quem gosta de quadrinhos é o A era de bronze dos super-heróis, de Roberto Guedes (HQM). A era de bronze é um período que vai do final dos anos 1960 a meados da década de 1980. Nessa época, os fãs de quadrinhos começaram a trabalhar nas editoras e revolucionaram o mercado com histórias que falavam diretamente aos jovens. A maioria dos leitores que tem mais de 30 anos começou lendo histórias da era de bronze e é fascinante descobrir detalhes sobre os gibis que marcaram a nossa infância. É um livro único no mundo.
Outra boa iniciativa de 2008 foi a coleção Cinemateca Veja, uma coleção tão boa quanto a revista é ruim. De fato, apesar do arroz de festa Titanic, a coleção traz filmes que merecem ser assistidos, que marcaram profundamente a indústria cinematrográfica.
Para mim foi uma surpresa redescobrir A morte pede carona, escrito por Eric Red, com direção de Robert Harmon . Para quem nunca assistiu ao filme, é a história de um garoto que dá carona para um psicopata e, quando vai ser morto, o empurra na estrada. Ele continua normalmente a viagem, até ver um carro passar por ele com uma família. O desespero toma conta do rapaz ao descobrir que o psicopata está lá dentro, no banco traseiro, brincando com as crianças. Ao tentar avisar o motorista, ele quase bate num ônibus. A sequência em que o rapaz encontra o carro da família é uma aula de cinema. Um plano mais aberto mostra ele olhando para o vidro e depois a câmera dá um plano detalhe no tênis do garoto, com o sangue pingando nele. A partir daí, o garoto passa a ser perseguido pelo psicopata num jogo de gato e rato que nunca acaba.
Assisti esse filme quando era jovem e, por essa razão, ele ficou na minha mente como um triller adolescente. Ao assitir novamente, percebi que A Morte pede carona é um curioso estudo psicológico de uma relação doentia. Até hoje, muitos anos depois, impressiona.
A coleção ainda traz vários outros filmes obrigatórios, como Um convidado bem trapalhão, humorístico campeão das sessões de sábado na Globo, e que um figurante indiano (Peter Sellers) destrói uma festa de granfinos. O filme junta hippies, protestos, um elefante pintado, espuma, um banheiro sendo destruído... Caramba, hoje em dia um filme desses nunca passaria do projeto.
Na música, o disco Vou tirar você desse lugar, homenagem a Odair José, foi o grande destaque. A proposta era inusitada: colocar músicos envolvidos com o rock ou com o alternativo para fazer versões das músicas do rei do brega. O resultado ficou muito bom. É surpreendente descobrir que, por trás dos arranjos bregas, há boas letras, como ¨Eu queria ser John Lennon¨, que ganha no disco uma vesão inpiradíssima do grupo Colúmbia. A coletâne também teve a participação de famosos, como Paulo Miklos, Pato Fu e Zeca Baleiro.
No cinema, 2008 trouxe ainda duas boas surpresas. A primeira foi a volta de M. Night Shyamalan, com Fim dos Tempos, que parece ter reaprendido a fazer bons filmes de suspense depois do fiasco de A dama da água. Outro foi Wall-E, a mais recente animação da Pixar-Disney, um belíssimo filme.
Curiosamente, tanto Wall-E quanto Fim dos tempos falam do mesmo assunto: da crise ambiental provocada pela poluição e destruição da natureza. Quem sabe os livros de história, no futuro, digam que a grande crise de 2008 não foi econômica, mas ambiental...
2 comentários:
Feliz Ano Novo! me chamo claudio do www.voluntariadoamazonia.rg3.net
e por falar em crise 2008, me informaram que você está finalizando um relatório sobre o encontro de responsabilidade social realizado no auditório do sesi em 2008. Se já foi finalizado como posso conseguir uma cópia;
muito obrigado!
Cláudio,
o livro está pronto, diagramado. Só falta a apresentação do Sesi Nacional. Estamos esperando só isso para mandar para a gráfica.
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