O filme Contato, baseado em um livro homônimo de Carl Sagan, expõe uma das grandes questões do mundo atual: a religião da ciência. Sabe-se que a ciência acabou ocupando o lugar da religião em grande parte dos corações humanos.
Há dois principais problemas na chamada religião da ciência. O primeiro deles, o fato da ciência se auto-proclamar como a única via de acesso à verdade. Herança da filosofia positivista, essa noção relega todos os outros conhecimentos à condição de superstições. “Só acredito em fatos. Só acredito em algo que possa ser provado”, dizem os
adeptos desse ponto de vista. Isso deixa de lado não só a religião e os conhecimentos populares, como também a filosofia. Isso porque a filosofia trabalha com hipóteses que não podem ser provadas empiricamente. Ela trabalha com elaborações mentais. Rousseau, por exemplo, dissertou sobre a origem do homem e da sociedade sem nunca ter feito qualquer descoberta científica. Sua única ferramenta era a lógica. Da mesma forma, é impossível provar, de fato, que o mundo das idéias de Platão existe. Assim, ciência seria a única capaz de formular um pensamento que pode ser provado,um pensamento invariável, certo, seguro.
O outro problema é o fato da ciência achar que não comunga de aspectos da religião, tais como a fé e o dogma.
Para começo, a ciência não é um conhecimento tão certo e objetivo assim. O filósofo T.S. Kuhn demonstrou que os cientistas seguem aquilo que ele chamou de paradigmas, visões de mundo que orientamsua pesquisa. Assim, o que é verdade para um paradigma, pode ser
ridículo para outro. Para o paradigma aristotélico, uma pedra caía porque estava voltando para o seu estado natural: o chão. Para um newtoniano, a pedra caí por causa da lei da gravidade. Duas explicações completamente diferentes para o mesmo fenômeno, ambas corretas, para suas visões da natureza.
O paradigma também demonstra que o cientista acredita em algo que não sejam apenas fatos. Os cientistas também têm fé e, de certa forma, um dogma: o paradigma. Claro que o dogma científico não é como o religioso, imutável, inquestionável. A história tem demonstrado que quanto mais aberto e flexível um paradigma, maior a sua sobrevivência.
Das três grandes revoluções do século passado, a psicanálise, o marxismo e o darwinismo, a que mais sobreviveu foi a última. Não porque fosse a mais científica, mas porque era a mais aberta, com mais possibilidade de aplicação em diversas áreas. Tanto que o paradigma Darwiniano já penetrou até mesmo na psicologia. A psicologia evolucionista procura explicar aspectos do comportamento humano através da teoria da evolução.
Ainda quanto à fé, gosto especialmente de uma das últimas cenas do filme Contato, quando a personagem de Judie Foster está sendo interrogada pelos senadores. Ela percebe que não tem como provar que realizou realmente sua viagem, mas, ainda assim, acredita. E ela
percebe que sua experiência não teve muita diferença da experiência religiosa de um padre. Ainda que céptica, ela tinha fé, uma crença.
Giordano Bruno não tinha como provar que a Terra rodava ao redor do Sol. Ainda assim morreu por sua crença. O que o difere, realmente, dos mártires dos primeiros anos do cristianismo?
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