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Edgar encostou-se à parede do
mercado, entre os sacos de salgados e os refrigerantes, e segurou a respiração.
Em seus braços, a menina o olhava, aterrorizada e ameaçava chorar (oh, Deus,
faça com que ela não chore, pensou ele. Não agora).
- Estão passando. – anunciou
Jonas.
Ele podia ouvi-los. Podia ouvir
seus pés arrastando pelo chão de asfalto, os grunhidos terríveis que soltavam,
um ou outro rosnar. Era como uma maré de
ódio, fedor e caos.
Era irônico que para ele tivesse
começado tudo com silêncio.
Apesar do quarto com isolamento acústico, que mantinha todo o barulho
lá fora, tinha sido uma noite terrível, repleta de pesadelos. Em seu sonho
havia uma música (não, não era uma música, um barulho, apenas um barulho)
muito, muito alta. E, diante dele, seguia uma procissão de loucos e
acontecimentos vistos rapidamente, como flashes sem sentido. Uma mulher grávida
rasgava o próprio ventre, retirava o feto e o comia. Homens agrediam-se uns aos
outros, que agrediam outros e outros e outros e outros, até que sobrasse apenas
uma luta insana.
Quando acordou, percebeu que a
cama estava molhada de suor. O ar condicionado não estava funcionando.
Sem energia num dia de calor,
pensou ele, enquanto ia ao banheiro lavar o rosto.
De fato, só percebeu que havia
algo errado quando saiu do quarto. Ficou por um instante parado, no meio da
sala, tentando descobrir o que havia de estranho Então percebeu: o silêncio.
Não havia barulhos lá fora.
(Estamos sem energia, pensou ele, é apenas isso, mas
uma parte de sua mente dizia que não era só isso)
Não havia barulho algum. Nem mesmo
um rádio, a vizinha gritando com o filho, nada.
No quintal, a mesma coisa: apenas
o silêncio. Um pássaro aproximou-se, pousou no muro, olhou para ele, e foi
embora, sem emitir qualquer barulho.
Ao sair na rua, espantou-se ao
descobrir que ela se tornara um deserto. Olhou no relógio: oito horas. Nesse
horário a rua costumava estar movimentada. Mães que retornando depois de levar
seus filhos no colégio, vendedores, vizinhas fofocando. Mas não, não havia nada
ali. Nenhum barulho, nenhuma pessoa. Como se toda a vida humana da terra
tivesse desaparecido de um momento para o outro.
Duas ou três casas depois que
ouviu o primeiro som, dentro de uma casa de muro alto e portão fechado. Vidro
quebrado. Parecia uma vidraça sendo estilhaçada. O som foi acompanhado de um
urro de dor e depois de outro barulho de vidro. Quem estaria fazendo aquilo?
Alguém deixara cair uma placa de vidro e se machucara no processo? Mas porque o
som continuara?
Edgar aproximou-se, mas o portão
não permitia ver nada lá dentro. Assim, avançou e dobrou a esquina. Estava
apenas de short e camiseta e não tinha a mínima ideia de porque estava fazendo
aquilo, andando na rua, sem destino aparente, mas algo dentro dele lhe dizia
que algo estava muito, muito errado.
Estava próximo ao mercado quando
viu um grupo de pessoas se aproximando ao longe. Deviam ser umas vinte ou
trinta e andavam lentamente, lado a lado uma com a outra.
Foi quando algo pegou em seu
ombro.
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