segunda-feira, março 06, 2017

O uivo da górgona


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O grupo compacto se arrastava pela rua, como se fosse um só corpo. Havia homens, mulheres, crianças, idosos, entre eles. Parecia um enorme grupo de mendigos. Estavam todos maltrapilhos, suas roupas sujas, seus cabelos desgrenhados. Andavam como se não soubessem para onde ir, como se apenas um estivesse acompanhando o outro. Tinham olhares perdidos, vagos, como se a alma lhes tivesse sido arrancada e não sobrasse nada além de uma casca. Uma menina de uns seis anos andava entre eles, ia andando e arrastando uma boneca pelos pés. O cabelo da boneca era como uma vassoura limpando asfalto sujo, mas a menina parecia não se importar. Sua roupa estava muito imunda e havia uma grande mancha marrom em sua calcinha de renda.
Uma das pessoas, um velho, se aproximou demais de um rapaz e foi empurrado. Ele se levantou e rosnou para este, como um cachorro que rosna para outro. Os dois se encararam, mas um segundo depois pareceram esquecer isso e voltaram a se juntar ao coro.
Em outro canto, uma velha usava apenas um lado de uma pantufa, o outro pé arrastando uma meia encardida. Um óculo quebrado pendia de seu rosto, preso apenas por uma orelha, mas ela não fazia qualquer gesto para tirá-lo ou colocá-lo de volta.
(zumbis, pensou Edgar, parecem zumbis)

Então se ouviu um grito e uma mulher correu, atravessando a rua pouco à frente do grupo. 

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