sábado, fevereiro 24, 2018

Escola sem partido e o projeto de poder da bancada evangélica

É interessante notar como o projeto Escola sem partido está diretamente ligado ao projeto de poder da bancada evangélica. Exemplo disso é uma vitória da bancada evangélica: a aprovação da doutrinação religiosa nas escolas, aprovada pelo supremo e aplaudida pelos defensores do projeto. 
Esclarecendo: não estamos falando de educação religiosa: estamos falando de doutrinação religiosa. O professor pode passar os 50 minutos da aula dizendo que a religião evangélica é a única verdade as outras são do demônio. E isso recebeu aplausos da página do Escola sem partido sob o argumento de que a presença na disciplina não é obrigatória. Como tudo no Escola sem partido, a coisa é muito bem pensada: todos sabem que não existe opção de disciplina e aluno não pode ficar no corredor. No final, todos os alunos são obrigados a assistir a aula de doutrinação religiosa. 
O crescimento da comunidade evangélica é vertiginoso e a bancada evangélica já é a segunda maior bancada do congresso, sendo superada apenas pelo MDB e seu objetivo é usar a escola para aumentar ainda mais esse poder e seu rebanho. 
Lendo o projeto, percebe-se claramente que o objetivo é difundir o criacionismo e a visão evangélica de mundo, transformando as escolas em locais de doutrinação religiosa e proibindo ensinar o qualquer conteúdo que vá contra seus dogmas.
Vejam o artigo terceiro: 

"Art. 3º. São vedadas, em sala de aula, a prática de doutrinação política e ideológica BEM COMO A VEICULAÇÃO DE CONTEÚDOS OU A REALIZAÇÃO DE ATIVIDADES QUE POSSAM ESTAR EM CONFLITO COM AS CONVICÇÕES RELIGIOSAS OU MORAIS DOS PAIS OU RESPONSÁVEIS PELOS ESTUDANTES".
Leiam a parte em destaque. O professor fica proibido de veicular qualquer conteúdo ou realizar qualquer atividade que vá contra as convicções religiosas ou morais dos pais ou responsáveis. 
Recentemente, em Manaus, alunos evangélicos se recusaram a fazer um trabalho sobre a África e ler clássicos como Iracema e Macunaína alegando convicções religiosas. Se a lei já estivesse em vigor, a situação se enquadraria perfeitamente na veiculação de conteúdos e atividades que entram em conflito com as convicções religiosas dos alunos. 
No site da Escola sem partido há um modelo de notificação extra-judicial que pode ser usada pelos pais para ameaçar professores. No item 15 é dito que até conteúdos científicos (aqui provavelmente se referindo às ciências chamadas "duras", como física, biologia etc) deve-se tomar o máximo de cuidado para não desagradar pais de alunos: 

"15.    Nesse domínio, ademais, a linha que separa a ciência da moral, além de não ser muito nítida, pode variar de indivíduo para indivíduo, conforme o estágio de amadurecimento, a sensibilidade e a formação de cada um. Portanto, ATÉ MESMO PARA FAZER UMA ABORDAGEM ESTRITAMENTE CIENTÍFICA, O PROFESSOR DEVERÁ ATUAR COM O MÁXIMO DE CUIDADO, SOB PENA DE DESRESPEITAR O DIREITO DOS ESTUDANTES E O DE SEUS PAIS."
Na mesma notificação extra-judicial, os professores que fizerem ou abordarem qualquer assunto que desagrade os pais são chamados de "abusadores de crianças" e ameaçados com prisão, demissão e perda dos bens: 
"9.    Junto com a liberdade e o cargo ou emprego, esses abusadores de crianças e adolescentes podem perder ainda o seu patrimônio, caso os pais dos seus alunos ‒ que são muitos ‒ decidam processá-los por danos morais". 
Em outras palavras: no futuro da escola sem partido, um professor poderá ser preso, demitido e até perder os bens apenas porque mandou um aluno ler livros como Iracema ou ensinou teoria da evolução. 
Além dos péssimos salários, das escolas sucateadas, agora mais essa para os professores: a constante ameaça de demissão, prisão e perda dos bens por terem feito ou ensinado algo que desagradou os pais. 

Ps: Vale lembrar que o projeto permite uma brecha que foi aproveitada pelo próprio autor da PL: político pode fazer campanha política em escolas. Leia aqui a matéria. 

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