segunda-feira, março 05, 2018

Projeto de pesquisa: revisão de literatura


A revisão de literatura não é uma simples relação de obras. É um texto que resume o pensamento dos principais autores que trataram do assunto.

Serve para demonstrar que o aluno teve contato com os conceitos e teorias básicas sobre o tema e está preparado para iniciar o trabalho.

Também serve para demonstrar que ao orientador ou à banca que o aluno não pretende reinventar a roda (ou seja, fazer uma pesquisa que já foi realizada).

EXEMPLO DE REVISÃO DE LITERATURA

A revisão de literatura abaixo trata do tema hipótese. Veja como o texto apresenta uma visão ampla sobre o assunto, com destaque para os avanços mais recentes nessa área de conhecimento.

A visão que positivista da ciência excluiu a ciência qualitativa em favor de uma ciência empírica de base indutiva, provavelmente baseada na frase de Newton hypotheses non fingo, “não formulo hipóteses”. No livro Princípios Matemáticos, no capítulo Escólio geral, Newton assim se manifestou sobre o assunto:
Mas até aqui não fui capaz de descobrir a causa dessas propriedades da gravidade a partir dos fenômenos, e não construo nenhuma hipótese; pois tudo que não é deduzido dos fenômenos deve ser chamado uma hipótese; e as hipóteses, quer metafísicas ou físicas, quer de qualidades ocultas ou mecânicas, não têm lugar na filosofia experimental. Nessa filosofia as proposições particulares são inferidas dos fenômenos, e depois tornadas gerais pela indução.
(NEWTON, 2000, p. 258)
Assim, a não criação de hipóteses levava o cientista a lidar diretamente com os fatos, sem pré-conceitos a respeito deles, numa atitude considerada neutra.
Tal visão foi fundamental para a epistemologia desenvolvida pelo Círculo de Viena. Essa corrente de pensamento expressou a convicção de que apenas o método indutivo poderia diferenciar a ciência do pensamento especulativo da pseudo-ciência (JAPIASSU, 1988).
No método indutivo, o cientista tem apenas a pergunta, mas não a resposta. Ele pesquisa um assunto estudando caso após caso, esperando que a ciência lhe dê a resposta na forma de uma generalização que possa vir a ser aplicada a todos os casos posteriores.
Karl Popper, no entanto, demonstrou que a via da indução levava a ciência a um impasse. Ele se perguntou como é possível que casos singulares possam ser usados para a criação de uma teoria geral.
A essa questão, Popper responde dizendo que, por maior que seja o número de enunciados observacionais verificados, não temos o direito de concluir pela existência da verdade de uma teoria universal. E a razão que ele dá é a seguinte: uma teoria universal afirma algo que ultrapassa, de muito, aquilo que pode ser expresso numa enorme quantidade de enunciados observacionais. (JAPIASSU, 1988, p. 94).
Em lugar da indução, Popper propõe, como princípio científico, o método hipotético dedutivo.  “A partir de uma idéia nova, formulada conjecturalmente e ainda não justificada de algum modo – antecipação, hipótese, sistema teórico ou algo análogo – podem-se tirar conclusões por meio da dedução lógica”. (POPPER, 2003, p. 33).
A visão epistemológica de Popper baseia-se no princípio do falseamento, segundo o qual só é científico o enunciado que possa vir a ser falseado. Assim, cabe ao cientista realizar uma hipótese dedutiva e coloca-la à prova. à prova, confrontando-a com os dados empíricos. “Daí se segue que todo teste genuíno de uma teoria é uma tentativa de refutá-la. Uma teoria é testável na medida em que for possível dizer em que condições ela seria dada como falsa.” (CARVALHO, 1994, p. 70)
A partir de Popper, a hipótese passou a ser parte fundamental do trabalho científico a ponto de alguns autores afirmarem que um trabalho não é científico se não tiver por base uma hipótese.
         Valdir Viegas afirma que a hipótese é a ferramenta do cientista:
Hipóteses desempenham papel importante no processo de pesquisa científica, quer do ponto de vista pragmático, quer do ponto de vista lógico. Pragmaticamente, a hipótese é uma garantia de via metódica na busca da explicação, evitando a dispersão do pesquisador; sob o aspecto lógico, ela tende a conduzir o pesquisador com mais eficácia até as causas de um fenômeno. (VIEGAS, 1999, p78).
Segundo Köche (2002, p.109), “O principal objetivo da investigação científica é, justamente, o de saber se essa sugestão apresentada, isto é, essa hipótese, enquanto enunciado objetivo e independente do pesquisador, será corroborada ou faseada.”.
Kerlinger (1980, p. 38) afirma que “Problemas e hipótese são semelhantes. Ambos anunciam relações, só que os problemas são sentenças interrogativas e as hipóteses são sentenças afirmativas. Às vezes são idênticos em substância.”. Para esse autor, a diferença entre os dois está na especificidade. Hipóteses são mais específicas, o que, aliás, lhes confere a possibilidade de falseamento. Assim, hipóteses generalistas, como “Vai chover amanhã” não são científicas.
Para Rúdio (2002), a hipótese deve ter as seguintes características: plausível; consistente; específica; verificável; clara; simples; econômica e explicativa.   
Eva Maria Lakatos e Marina de Andrade Marconi, no livro Metodologia do trabalho científico, afirmam que as hipóteses podem ser básica e secundária. “A principal hipótese é denominada hipótese básica, podendo ser complementada por outras, que recebem a denominação de secundárias.”(LAKATOS; MARCONI, 1991, p. 104). Para as autoras, as hipóteses secundárias são afirmações complementares à básica, abarcando em detalhes o que a hipóteses afirma em geral, englobando aspectos não especificados na básica, identificando relações deduzidas na primeira, decompondo em pormenores a afirmação geral e apontando outras relações possíveis de serem encontradas. 

REFERÊNCIAS

CARVALHO, Maria Cecília M. de (Org.). Construindo o saber. Campinas: Papirus, 1994.
CERVO, A. L. ; BERVIAN, P. A. Metodologia científica. São Paulo: McGraw-hill, 1983.
JAPIASSU, Hilton. Introdução ao pensamento epistemológico. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1988.
KERLINGER, Fred N. Metodologia da pesquisa em ciências sociais. São Paulo: EPU, 1980.
KÖCHE, José Carlos. Fundamentos de metodologia científica. Petrópolis: Vozes, 2003.
LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Metodologia do trabalho científico. São Paulo: Atlas, 1991.
NEWTON, Isaac. Princípios matemáticos, Óptica, o peso e o equilíbrio dos fluídos. São Paulo: Nova Cultural, 2000.
POPPER, Karl. A lógica da pesquisa científica. São Paulo: Cultrix, 2003.
RÚDIO. Franz Victor. Introdução ao projeto de pesquisa. Petrópolis: Vozes, 2002.

Sem comentários: