A saga do clone é um dos momentos mais controversos
da história do aracnídeo. Arrastada, complicada, quase incompreensível, era um
ótimo exemplo do que de pior a Marvel produziu na década de 1990. Entretanto,
ela é baseada em uma ótima HQ, publicada aqui pela editora Salvat na coleção
definitiva do Homem-aranha.
Escrita por Gerry Conway e desenhada por Ross
Andru, uma das melhores duplas já reunidas no título do Aranha, a saga surgiu
para resolver um problema: Gwen Stacy, a namorada do herói, havia morrido em um
dos momentos mais dramáticos dos quadrinhos de todos os tempos. Mas Stan Lee,
que não tinha sido consultado, não gostou. E exigiu que a equipe trouxesse a
personagem de volta. Hoje em dia é comum um herói morrer de manhã e aparecer à
tarde tomando café, mas naquela época, na Marvel, quando alguém morria, morria
mesmo. Trazer de volta alguém que havia batido as botas era considerado uma
quebra do pacto de verossimilhança.
Então, a solução foi trazer Gwen de volta na forma
de um clone.
A solução poderia parecer forçada nas mãos de uma
equipe menos habilidosa. Mas Conway e Andru transformaram isso num verdadeiro
clássico dos quadrinhos, a começar por todo o suspense. O clone é apresentado
aos poucos, deixando o leitor indeciso sobre o que está vendo.
O álbum da Salvat inicia com uma edição anterior,
Spiderman 129, que apresenta o personagem Chacal. Depois pula para uma história
em que Peter Parker viaja para Paris e enfrenta um vilão chamado Ciclone.
Geralmente essa história em duas partes é pulada e não sem razão: é um ponto
fora da curva, com um vilão ridículo, que o aracnídeo derrota usando um
ventilador!
Mas na edição seguinte, vemos a dupla Conway-Andruu
no seu melhor, a começar pela splash page na qual Peter Parker, ao ver Gwen,
acha que enlouqueceu.
Andru é um especialista na figura humana e sua
composição é perfeita, com Peter Parker no centro, sentado no degrau da escada,
os olhos vidrados, em posição fetal, sendo atormentado pela figura espectral do
Homem-aranha, que lhe diz coisas como: “Finalmente aconteceu, não é? Depois de
todos esses anos, depois de todas essas batalhas que lutou sendo eu... você
finalmente surtou”. E, ao fundo, Gwen Stacy estática, como um fantasma
assombrando Parker.
O texto de Conway é fluído, parecendo ter sido
escrito de maneira automática, e explora bem tanto a ação quanto os aspectos
psicológicos do personagem. E a arte de Andru contribui para ainda mais para
isso.
É interessante notar, por exemplo, porque Conway
gostava mais de Mary Jane: Gwen Stacy parece uma garota dos anos 1960, enquanto
Mary Jane é uma descolada garota dos anos 1970. Essa diferença entre elas fica
nítida tanto nas roupas que usam quanto na personalidade.
Lendo esse álbum percebemos porque a revista do aracnídeo
se tornou a mais vendida da Marvel. Pena que essa obra-prima tenha dado a
origem a um dos momentos mais constrangedores da história do Homem-aranha de
todos os tempos.
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