Coringa é um filme perturbador. Um mergulho profundo na mente do
mais perigoso vilão de Gothan.
Alan Moore já havia introduzido a ideia de que a personalidade
louca havia surgido após um dia difícil. Frank Miller havia sugerido que ele
era tão perigoso justamente por ser imprevisível: ao contrário de outros vilões
que querem dinheiro ou poder, o Coringa só quer o caos.
Mas nenhum dois aprofundou tanto o personagem quanto o diretor Todd Phillips.
O diretor explora o processo de transformação de Arthur Fleck, um
palhaço e humorista fracassado que aos
poucos se torna um louco e imprevisível assassino.
E esse processo é um acúmulo de acertos, a começar pela
ambientação nos anos 1970, que ecoa diretamente a Nova York de Taxi Drive, de
Martin Scorsese. Mas Gothan do filme é uma uma Nova York ampliada à quinta potência.
Uma greve de lixeiros faz com que o lixo se espalhe pelas ruas, a economia está
em frangalhos, uma revolta está prestes a eclodir.
Nessa panela de pressão, o programa de maior audiência é um talk
show apresentado por Murray Franklin, interpretado por Robert De Niro. A referência
é óbvia: na década de 1970, De Niro fez o papel de um comediante fracasso que
sequestra Jerry Lewis para aparecer em seu programa.
Há diversas outras referências: o visual final do personagem é
parcialmente inspirado na maquiagem de John Wayne Gacy, o palhaço psicopata,
que quando não estava matando garotos, estava se apresentando para crianças em
um hospital infantil (em uma das cenas Arthur Fleck também se apresenta em um hospital infantil). Há,
óbvio, a referência à Piada Mortal, de Alan Moore e o conceito de que o vilão
era inicialmente um humorista fracassado que só conseguia fazer a esposa rir
(mas o filme eleva ainda mais o nível de tensão ao mostrar qual é a verdadeira
natureza da relação entre Fleck e sua namorada).
Outro grande acerto é conectar a origem do Coringa à origem do
Batman, inclusive a suspeita do personagem de que ele poderia ser filho de
Thomas Wayne.
Soma-se a isso a atuação de Joaquim Fênix, simplesmente antológica.
Dizem que todos os atores que aturam como o Coringa teriam sido abalados por
ele. Conta-se que Heath Ledger teria praticamente enlouquecido durante as
filmagens do Cavaleiro das Trevas. Difícil não acreditar que Fênix também não
tenha sido afetado. Sua atuação é perturbadora, em especial a risada, que no
filme tem uma história: seria um problema neurológico, fruto de maus tratos na
infância, que o fariam rir nos momentos mais inoportunos ou quando está
nervoso.
Some a isso a trilha sonora, tensa, nervosa, pesada que faz com
que uma simples cena de dança se torne assustadora. Aliás, o filme brinca com o
expectador, fazendo-o ficar tenso em momentos cotidianos e levando-o a rir
durante um assassinato.
De tudo, apenas uma coisa a lamentar: que esse filme não tenha
conexões com futuras da produção da DC. Adoraria ver esse Coringa já totalmente
desenvolvido em outras produções.
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