quarta-feira, fevereiro 03, 2021

Efeito Dunning-Kruger: o idiota que se acha genial

 


Em 1999 dois psicólogos da universidade de Michigan realizaram uma pesquisa sobre níveis de cognição. Foi ministrada uma aula e depois aplicada uma prova sobre o assunto ensinado. Quando saíam da sala, os participantes deveriam responder um questionário sobre como havia sido sua atuação no teste. O resultado foi surpreendente: as pessoas que diziam ter se saído melhor foram exatamente as que tiraram as piores notas e as pessoas que haviam se saído melhor no teste acreditavam que estavam na média.

Esse fonômeno ganhou o nome dos dois pesquisadores: efeito Dunning-Kruger. Significa que uma pessoa totalmente ignorante sobre um assunto será incapaz de perceber que não entende daquele assunto e se considerará mais capacidada do que os verdadeiros especialistas (e, na contramão, aqueles que de fato têm conhecimento sobre o assunto serão caracterizados pela humildade).

Os incompetentes não só falham em reconhecer sua própria incapacidade e ignorância, mas falham também em reconhecer as habilidades genuínas de outras pessoas.

Esse é um fenômeno que temos visto em profusão nas redes sociais: pessoas que não entendem nada de astronomia ou geografia contrapondo cientistas e afirmando que a terra é plana. Pessoas de movimentos anti-vacina dizendo saber mais sobre vírus do que infectologistas. Pessoas que nunca saíram de suas pequenas cidades no interior do Brasil afirmando saber mais sobre a eleição norte-americana do que jornalistas internacionais. Pessoas que abandonaram a escola na quarta série dizendo saber mais sobre educação do que doutores em educação.

Na década de 90 eu tive uma namorada psicóloga. Isso foi muito antes dos celulares ou mesmo da popularização dos telefones. Certa vez cheguei em casa e a encontrei lá, me esperando. Assim que cheguei, ela comentou: “Nunca mais venho aqui!”. O que tinha acontecido é que meu padastro, sabendo que ela era psicóloga, resolveu “ensinar” psicologia para ela. E lá se foram duas horas de aulas de psicológias lecionadas por alguém que nunca leu Freud ou Jung, que achava que Pavolv era um militante comunista e que Skinner era nome de salgadinho.

Outra vez eu o encontrei “ensinando” química para um doutor em química. Em outra, ele ensinava medicina para uma estudante de medicina. Segundo ele, o câncer se formava porque as células mortas andavam pelo organismo e, onde paravam, surgia a doença.

Essa incapacidade de perceber a própria incompetência se estende até mesmo às habilidades físicas.

Recentemente visitei um sítio onde encontramos uma pessoa que se dizia “especialista” em pesca. Essa pessoa estava montando um espinhel (uma linha grossa deixada no fundo do rio com diversos anzóis) e usava com iscas todos peixes pescados pelos outros. Eram 60 anzóis. Segundo ele, seria um bom negócio: pois pegaria 60 peixes grandes. No final, gastou todos os peixes pescados e não pecou sequer um camarão. Quando voltávamos, a voadeira deu um bug e tivemos que parar em um porto e procurar um mecânico. Enquanto o mecânico suava para tentar consertar, ele afirmava: “Vou fazer curso disso semana que vem! Se o dono tivesse um cabo, eu consertava rapidinho”.

E é impossível ensinar o que quer que seja ao incompetente. Sua incapacidade de perceber sua ignorância faz com que ele se torne refratário a qualquer aprendizado - para aprender o que quer que seja, a pessoa precisa reconhecer sua ignorância naquele assunto. Todo professor já teve alunos que não haviam entendido nada da matéria, mas mesmo assim consideravam que tinham direito à nota máxima.

Mesmo que tenha contato com grandes professores, eles serão incapazes de aprender. Podemos ver isso, por exemplo, nas pessoas que leram Cosmos, de Carl Sagan e concluíram que a terra é plana. Ou pessoas que leram o Macaco nu, de Desmond Morris, e concluíram que vacinas alteram o DNA.

Curiosamente, todas as pessoa que conheci acometidas pelo efeito Dunning-Kruger eram bolsopatas.

 

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