Nas primeiras histórias, o Hulk era muito diferente do personagem que todos nós conhecemos. Para começar, na primeira história, o personagem era cinza. Só na segunda edição é que apareceu o verde, mas um verde tímido, muito diferente do golias esmeralda que conhecemos hoje.
Mas o tom das histórias e a personalidade do verdão também eram muito diferentes.
Para começar, havia um clima das histórias de terror da Marvel da década de 50. A segunda edição começa com o Hulk saindo do pântano, como um monstro ameaçador e invadindo uma cidade com um... pedaço de pau! O texto dizia: “Tal qual um monstro selvagem e devastador saído de algum insano mundo abissal, a aterrorizante figura do Hulk emerge repentinamente das lamacentas águas do pântano”. Parecia uma história de terror.
As primeiras histórias tinham clima de terror.
Só a aparição de Rick Jones impede que o “monstro” destrua a cidade.
Como na época não havia enrolação, tudo acontecia muito rápido. Logo uma raça de homens-sapos resolve invadir a terra e para isso sequestram o maior cientista do planeta... justamente Bruce Banner. Quando anoitece, este se transforma no Hulk e bota o terror na nave (naquela época, Banner se transformava durante as noites).
O golias esmeralda chega a usar uma das armas dos alienígenas contra eles mesmos, enquanto pensa: “Essas armas... perto delas, as nossas parecem estilingues!”. Quem poderia imaginar o Hulk que todos conhecemos usando uma arma e tendo pensamentos como esses? Mas à frente, ele afirma que vai pegar Betty Ross como... refém!
Hulk usando armas e dizendo frases inteligentes? Será que errei de revista?
A razão disso é que nessa época o personagem era muito baseado na fera do livro O médico e o monstro, de Robert Louis Stevenson, sendo muito mais cruel do que embrutecido.
Uma curiosidade: O roteiro era de Stan Lee e os desenhos de Jack Kirby, a dupla de ouro da Marvel, mas a arte-final dessa história contava com três nomes, que dão aspectos completamente diferentes para a arte: Steve Ditko, Dick Ayers, Paul Reinman. Ditko, que tinha um estilo muito pessoal, é perfeitamente reconhecível.
Todo quadrinista tem o seu personagem predileto. O de Stan Lee é, sem dúvida, o Surfista Prateado. Tanto que, em 1982, quando John Buscema resolveu fazer uma graphic novel do personagem, ninguém se atreveu a escrever o texto. Esse só podia ser um trabalho para Stan Lee.
A história traz de novo personagens já conhecidos na saga do surfista, como Galactus e Mefisto. Mas acrescenta outro: Nova, a humana que se candidatou a se tornar arauto de galactus.
A história começa com o Surfista sendo tentado por Mefisto.
Em certo momento, o Surfista e Nova se encontram e se encantam um com o outro. Nova é descrita como “Tão jovem, tão adorável, tão transbordante de vida”. A atração mútua é consequência das diferenças entre os dois. Em contraste com a natureza melancólica do surfista, Nova parece uma criança despreocupada maravilhada com o poder cósmico. Mas ambos têm algo em comum: a preocupação com a vida. A nova arauta do Galactus escolhe para ele apenas planetas que não têm vida.
O herói se encata pela nova arauta de Galactus
Mas uma trama de Mefisto faz com que ela mude completamente. Enfeitaçada pelo demônio, ela passa a levar o deus até planetas repleto de espécies vivas e cabe ao Surfista detê-la.
Um dos aspectos interessantes dessa graphic é o fato dela ter sido feita toda com quadro por página. Não é uma novidade, como diz Stan Lee em sua apresentação. No Brasil Carlos Zéfiro já fazia isso décadas antes. Mas funciona muito bem para destacar a arte do incrível John Buscema. E deve ter sido um desafio imenso colocar texto em imagens que por si só já narram a história. Um desafio que Lee supera facilmente, como se observa no trecho: “Como explicar uma batalha onde forças colidem enquanto as próprias galáxias estremecem e se convulsionam num agonizante caos? Não há palavra conhecidas por qualquer ser vivo capazes de exprimir a selvageria de tamanho espetáculo”.
Em 1961, uma partida de golfe mudaria a história dos quadrinhos de super-heróis. Os jogadores eram Martin Goodman, da Atlas (atual Marvel) e Jack Liebowitz, da National (atual DC Comics). Liebowitz comentou que a revista da Liga da Justiça, recentemente lançada, era um sucesso entre os leitores.
Goodman despediu-se e foi para a editora, pedir a Stan Lee que criasse uma cópia da Liga para aproveitar aquele interesse dos leitores por heróis clássicos reunidos num grupo.
Acontece que Stan Lee já estava de saco cheio daquilo. Ele se sentia mal, num campo editorial enfraquecido pela concorrência da televisão e perseguido por pais e professores. Além disso, queria fazer algo diferente. Ele tinha algumas idéias em mente, mas tinha medo de apresentá-las. Foi sua esposa que o convenceu que aquela era uma oportunidade de fazer o que queria: ¨Querido, se não der certo, o pior que pode acontecer será Goodman demiti-lo¨.
Então, ao invés de promover uma reunião de personagens clássicos, como Namor e o Capitão América, ele propôs algo completamente diferente. O novo grupo era um quarteto de astronautas que, ao fazer uma viagem espacial, foram bombardeados por raios cósmicos e ganharam incríveis poderes: o Quarteto Fantástico! O grupo era composto por um cientista que conseguia se esticar como elástico, uma moça que podia se tornar invisível, um rapaz que pegava fogo e virava uma tocha humana e um ser grotesco, o Coisa. Esse último personagem foi o mais diferente, e logo cativou os leitores. Até então, os heróis pareciam muito felizes com seus poderes, mas Bem Grimm não. Os raios cósmicos o haviam transformado num monstro de pedra. Inconformado, ele vivia resmungando pelos cantos e comprando brigas com os outros.
Isso era uma novidade: até então os heróis pareciam coroinhas ou escoteiros: todos muito bonzinhos e afáveis. Um herói ranzinza e um grupo que se parecia mais com uma família (inclusive com suas brigas) foi algo que provocou estranhamento, mas logo conquistou os leitores. Além disso, as histórias começaram a apresentar uma cronologia. Até então as histórias eram sempre isoladas e não havia uma continuidade. Nas histórias do Quarteto, se um personagem pegava uma gripe numa história, na história seguinte ele continuaria gripado. Para arrematar, Lee deu a seus heróis um caráter humano que permitia uma identificação dos leitores: os heróis Marvel, a despeito de seus incríveis poderes, eram pessoas normais, que levavam fora das namoradas, sentiam ciúmes, eram esnobados, ficavam doentes... e até morriam.
A revista do Quarteto Fantástico tinha desenhos de Jack Kirby, o rei dos quadrinhos de super-heróis. Seu traço expressionista influenciou praticamente todos os artistas americanos a partir de então e criou as bases do visual dos super-heróis.
Kirby era um mestre épico, das grandes sagas intergaláticas e dos heróis super-poderosos. Já Lee era o mestre do lado humano, dos dramas e comédias da vida normal. Os leitores se identificavam com a humanidade colocada nas histórias por Lee e se projetavam no grandioso, especialidade de Kirby.
Stan Lee era um roteirista e editor querido por todos os artistas. Era um um gente-boa, que dava liberdade criativa para seus artistas e conseguia deles o seu melhor. Ele também usava e abusava da promoção pessoal, colocando em destaque o seu nome e o dos artistas nas páginas das revistas. Além disso, ele criou o chamado método Marvel de escrever roteiros. Como exercia a função de editor e escrevia diversas revistas, ele não tinha tempo de produzir scripts completos, então fazia apenas um resumo da história e entregava para o desenhista. Este ilustrava, entregando depois para que Lee colocasse os textos e diálogos. Esse aspecto fez com que alguns colocassem em dúvida a verdadeira importância de Stan Lee, mas hoje são poucos os pesquisadores que descartam a relevância desse roteirista para o sucesso da editora que ficou conhecida como ¨A casa das idéias¨.
A mulher-rei, filme dirigido porGina Prince-Bythewood e estrelado por Viola Davis parte de uma situação real.
De fato, no século XIX, existiu no reino de Daomé, atual Benin, um grupo de guerreiras invencíveis, verdadeiras amazonas da África, chamadas de agojie.
A história inicia com uma incursão das agojie para libertar pessoas do reino de Daomé aprisionadas pelo império Oyo para serem vendidas como escravas.
O ataque é liderado por Nanisca, interpretado por Viola Davis. O protagonismo da história, entretanto, se equilibra entre Nanisca e Nawi, uma garota que, após atacar o velho que deveria ser seu noivo, é entregue por seu pai no castelo para se tornar uma guerreira. A história de Nawi mostra como participar das agojie poderia ser a única oportunidade de ascenção social para muitas mulheres, assim como a única forma de escaparem de um destino de eterna submissão. No castelo, onde são treinadas as agojie, só podem entrar mulheres e eunucos, de forma que ali se torna um local governado por mulheres.
Há um outro fato interessante: os habitantes de daomé cultuam um casal de gêmeos, o que faz com que todos os principais cargos, de general a rei, tivesse uma contraparte feminina.
Tudo isso é mostrado de forma muito competente no filme. Além disso, a trama envolvente: Nawi lutando para provar seu valor como guerreira e Nanisca busca de vingança contra o homem que no passado a aprisionou e a estuprou repetidas vezes. No final, descobre-se que o destino das duas é intimamente interligado.
O trailer, focado principalmente na ação, pode dar a entender que esse é o clima do filme, o que não é verdade. Há um bom equilíbrio entre cenas de ação e cenas de desenvolvimento, com uma forte caracterização de personagens. Aliás, as cenas de ação merecem destaque em qualquer resenha. Os combates ganharam uma coreografia crua, brutal, que destaca bem a sanguinolência da guerra.
Em tempo: embora seja baseado em fatos reais, A mulher rei não é totalmente fiel aos fatos históricos. O filme inclui um forte discurso anti-escravista quando na verdade, as próprias agojie foram elemento importante no aprisionamento de escravos que seriam vendidos pelo reino de Daomé para traficantes. Mas ficção é ficção, e não história. O importante é produzir uma obra que envolva e faça o expectador acreditar naqueles fatos que são mostrados na tela, o que de fato acontece nesse filme.
Parte essencial da cibernética, o estudo da informação foi consagrado pela Teoria da Informação (T.I).
A T.I. foi criada pelo matemático norte-americano Claude Shannon para resolver problemas técnicos de transmissão de informação.
Os engenheiros da época acreditavam que era apenas uma questão de tecnologia conseguir transmitir uma maior quantidade de mensagens telegráficas com maior rapidez. Shannon demonstrou que cada canal tem uma velocidade e uma quantidade limite de informações transmitidas. A partir de um certo ponto, a mensagem começa a ser dominada por ruídos que prejudicam a recepção.
Shannon também tornou possível a construção de computadores digitais ao substituir o sistema decimal pelo sistema binário. Ele foi, provavelmente, o primeiro pesquisador a tentar uma definição científica do conceito de informação: “Informação é uma redução da incerteza, oferecida quando se obtém resposta a uma pergunta”. (apud Epstein, teoria da informação, 35)
Vamos imaginar uma situação. Dois candidatos A e B estão disputando uma eleição.
O eleitor não sabe quem é o vencedor e liga o rádio para obter essa informação.Se o locutor dissesse: “O Vencedor foi A ou B”, a mensagem seria totalmente redundante, pois o ouvinte já sabe que o vencedor foi um dos dois concorrentes.
A mensagem “A venceu” seria informação, pois diminui a incerteza do receptor.
Entretanto, só há informação quando ocorre variedade de possibilidades. Quanto maior a quantidade de respostas possíveis, maior a quantidade de informação.
Se a eleição tiver um único concorrente, digamos A, a mensagem “A venceu não teria qualquer informação”.
Por outro lado, se houvessem três candidatos com chance real de se eleger, a mensagem “A venceu” seria mais informativa.
Quanto maior a quantidade de possibilidades, maior a dúvida e, portanto, maior a quantidade de informação da mensagem “A venceu”.
Imaginemos que a mensagem seja “A, B e C empataram”. Essa notícia teria muito mais informação do que “A venceu”, pois é muito improvável que três candidatos tenham exatamente o mesmo número de votos.
Quanto mais improvável um acontecimento, mais informação ele tem.
A mensagem “Há um elefante nas florestas da Índia” tem pouquíssima informação, pois há uma grande probabilidade de haver elefantes nas selvas indianas.
Entretanto, a mensagem “Há um elefante solta na Avenida Paulista” tem alta carga de informação, pois a chance de isso acontecer é mínima.
A idéia de informação está sempre ligada a algo diferente, improvável, fora do normal.
Um dos capítulos mais interessantes do livro VOCÊ - um estudo objetivo do comportamento humano, de Desmond Morris, é o que fala sobre símbolos de status. Na pré-história a simples força bruta era suficiente para mostrar quem estava por cima e quem estava por baixo. Posteriormente, com os reis, os símbolos de status eram acompanhados de grande ostentação, com muito ouro, pedras preciosas e luxo. Na nossa sociedade, no entanto, os símbolos de status se tornaram mais sutis. Morris divide aqueles que exibem status em: executivos, herdeiros e talentosos. Na categoria executivos entram, por exemplo, políticos, que, apesar de não usarem as roupas suntuosas dos reis (e não o fazem para evitar a revolta popular), usam todo um aparato, como a escolta militar. Carros, roupas e acessórios são demarcadores de status. Morris explica que esses símbolos com o tempo são apropriados por imitadores, o que obriga os detentores de status a migrarem. Lembram da época em que ter um celular era símbolo de status? Com o tempo, todo mundo tinha celular. Os detentores de status foram obrigados a migrar para o smartphone. Logo todo mundo tinha um smart, e o I-phone passou a ser o novo demarcador de status. O mesmo aconteceu com o carro: nas sociedades pobres era símbolo de status ter um carro, mesmo um barato. Com o tempo, apenas automóveis caros passaram a exercer essa função. Nas sociedes mais pobres e machistas, mulheres são proibidas de dirigir carros. Em outras, é dito que uma mulher que dirige carro está pedindo para ser estuprada. A relação entre as duas coisas pode não parecer óbvia, mas é: uma mulher que está dirigindo um carro está tirando do homem seu status e a forma dos homens responderem a isso é estuprando a mulher - uma atividade sexual de afirmação de status e sujeição da vítima. Estuprar uma mulher que dirige um carro é uma forma de colocá-la em seu lugar.
Os talentosos são aqueles que se destacam não pelo carro que usam, pelas roupas que vestem, mas pelo que fazem, por sua obra e seus feitos intelectuais. Exemplo disso são os grandes artistas. Enquanto os símbolos de status dos executivos e herdeiros desaparecem com eles, os símbolos de status sobrevivem a eles e muitas vezes continuam sendo apreciados durante centenas de anos. Como sua obra é seu status, os talentosos não se preocupam com símbolos de status transitórios. Muitos artistas e cientistas muitas vezes se vestem de maneira simples (quando não extravagante, como o caso de Salvador Dali) e dirigem carros de pouco baratos, muitas vezes tendo condições de comprar um melhor. Na verdade, a ausência deliberada de símbolos de status é, em si, uma demonstração de status.
No número 66 da série Perry Rhodan, o planeta Fera Cinzenta
já se tornara importante o bastante para se tornar uma narrativa pararela às
histórias centradas nos protagonistas.
Nos números anteriores o leitor havia acompanhado como uma
tentativa de assassinar Rhodan havia fracassado e como os integrantes dos dois
grupos envolvidos tinham sido enviados para outro planeta e como uma revolta
tinha feito com que a astronave caísse no planeta desconhecido apelidado de
Fera Cinzenta. Duas facções haviam se estabelecido em torno de dois líderes: o
despótico Hollander e o democrata Mullon. Uma vez neutralizada a ameaça de
Hollander, surge uma nova ameaça: o planeta é invadido por alienígenas
dispostos a transformar os colonos em escravos, fazendo com que eles plantem
cereais em centenas de milhares de quilômetros.
A capa original alemã.
Os invasores são chamados de peepsies e descritos dessa
forma por Kurt Mahr, autor do volume: “Tinham pelo menos dois metros de
comprimento e eram tão magros que não se compreendia como não quebravam ao meio
quando andavam eretos. Não tinham cabelos na cabeça e a caixa craniana brilhava
como se tivesse sido coberta de açúcar de confeiteiro. Os olhos pareciam muito
grandes. O nariz era ossudo e abria-se de forma grotesca na metade inferior”.
O livro gira todo em torno de uma situação de suspense: os
terranos conseguirão se livrar do jugo dos peepsies sem que seja necessário o
auxílio dos homens de Rhodan (uma nave terra foi enviada ao local para
monitorar a colônia, mas só intervir em último caso)?
Mahr, que à essa altura já tinha se tornado um autor
competente, consegue estabelecer uma narrativa interessante e verossímil, em
que os métodos de resistência criado pelos humanos parecem óbvios e fazem todo
o sentido considerando-se as fraquezas dos peepsies.
Uma
curiosidade do volume é que este é, provavelmente, o primeiro da série em que
se fala de pena de morte. É mencionado que ela foi proibida na Terra após a
unifacação e alguns argumentam que voltar a aplicá-la seria um retorno à
barbárie. Entretanto, ela é executada duas vezes. Nas duas Mahr evita
descrições detalhadas. Não sabemos nem mesmo com que método a pena foi
executada.
O interesse no estudo do processo de comunicação surge justamente no período em que, na maior parte do mundo, os meios de comunicação de massa afloraram. As análises passaram de uma visão autoritária, da mídia como toda poderosa, às propostas de meios interativos. Hoje, a linha de pesquisa em processos midiáticos abre a porta para possibilidade de ver todos os meios como interativos, inclusive aqueles que são vistos como de sentido único.
Durante muitos anos, a mídia foi vista como uma flecha, de sentido único e autoritário, a exemplo do que pregava a teoria hipodérmica. Essa visão de uma mídia toda poderosa influenciou muito a corrente apocalíptica, que via as novas mídias, tais como o cinema e o rádio, como estando a serviço do autoritarismo.
Uma tentativa de tirar das novas tecnologias esse caráter autoritário surge com as propostas de interação. Assim, se existem veículos de sentido único, existem também mídias que permite um feedeback ativo, a exemplo do MSN, do chat e do e-mail.
Esse modelo dialogal de interação será criticado por José Luiz Braga. Para ele, todos os processos midiáticos permitem interação.
Sua proposta de interação não se prende apenas à possibilidade de resposta ao emissor por parte do receptor. Existe também a possibilidade de interação receptor-produto e receptor-sociedade ou sociedade-produto.
Esse modelo quebra totalmente com a ideia hipodérmica de receptor passivo.
Uma das formas de interação pode ser configurada na apropriação. Se existem pessoas que recebem os produtos da mídia de forma passiva e a-crítica, existe aqueles que reconfiguram sua simbologia, numa atitude que lembra a música Geração Coca-cola, do Legião Urbana (Vamos cuspir de volta o lixo em cima de vocês). Utilizar um símbolo da mídia e reconfigurar seu significado, como a Coca-cola, é uma forma de interação.
Mesmo quando não é uma crítica negativa, essa resignificação pode ser uma forma de apropriação. Em um texto eu meu blog, eu faço uma relação do seriado Terra de Gigantes com paradigmas científicos, uma discussão que provavelmente não estava nos planos dos criadores do mesmo. O fato de não sabermos se os protagonistas diminuíram de tamanho e estão em um mundo de pessoas com estatura normal, ou se estão de fato numa terra de gigantes abre espaço para discutir a teoria da relatividade, a física quântica e o relativismo filosófico.
Formas mais elaboradas de interação podem ser encontradas nos fanfics, em que fãs interagem com a obra original, mostrando outras possibilidades de interpretação. O fanfic O portal das probabilidades, de minha autoria, por exemplo, introduz a teoria do caos no universo da série alemã de ficção científica Perry Rhodan.
Claro que essa possibilidade de interação com os MCM é tanto maior quanto maior for a capacidade crítica dos indivíduos. Daí a importância, levantada por Braga, da criação de um sistema crítico.
Quanto mais preparadas estiverem o indivíduo e a sociedade, melhor a sua capacidade de interação e menores as chances de manipulação ou de recepção ingênua (se está publicado, é porque é verdade). Setores organizados da sociedade podem ter importância fundamental nesse processo.
Exemplo recente dessa possibilidade de interação crítica aconteceu com a publicação de uma reportagem da Veja contrária à demarcação de terras indígenas (A farra da antropologia oportunista). Um antropólogo citado na matéria veio a público denunciar que a revista teria inventado uma entrevista com ele. A revista argumentou que a citação fora tirada de um dos livros do pesquisador. Este contra-argumentou que a citação fora deturpada para servir aos interesses da publicação.
O SBPC lançou uma nota pública de repúdio à Veja e de apoio ao antropólogo. No Twiter, surgiu a tag #boicoteveja, que pretendia aglutinar casos semelhantes de manipulação. Blogs, num processo de apropriação, fizeram capas fictícias da Veja, denunciando o perfil manipulador das matérias da revista. Numa delas, por exemplo, aparecia Darth Vader com o título “Ele salvou você”. Na mesma capa, sob uma imagem do mestre Yoda, a legenda: “Descoberto o líder espiritual dos terroristas rebeldes”.
Coringa é um filme perturbador. Um mergulho profundo na mente do mais perigoso vilão de Gothan.
Alan Moore já havia introduzido a ideia de que a personalidade louca havia surgido após um dia difícil. Frank Miller havia sugerido que ele era tão perigoso justamente por ser imprevisível: ao contrário de outros vilões que querem dinheiro ou poder, o Coringa só quer o caos.
Mas nenhum dois aprofundou tanto o personagem quanto o diretor Todd Phillips.
O diretor explora o processo de transformação de Arthur Fleck, um palhaço e humorista fracassado que aos poucos se torna um louco e imprevisível assassino.
E esse processo é um acúmulo de acertos, a começar pela ambientação nos anos 1970, que ecoa diretamente a Nova York de Taxi Drive, de Martin Scorsese. Mas Gothan do filme é uma uma Nova York ampliada à quinta potência. Uma greve de lixeiros faz com que o lixo se espalhe pelas ruas, a economia está em frangalhos, uma revolta está prestes a eclodir.
Nessa panela de pressão, o programa de maior audiência é um talk show apresentado por Murray Franklin, interpretado por Robert De Niro. A referência é óbvia: na década de 1970, De Niro fez o papel de um comediante fracasso que sequestra Jerry Lewis para aparecer em seu programa.
Há diversas outras referências: o visual final do personagem é parcialmente inspirado na maquiagem de John Wayne Gacy, o palhaço psicopata, que quando não estava matando garotos, estava se apresentando para crianças em um hospital infantil (em uma das cenas Arthur Fleck também se apresenta em um hospital infantil). Há, óbvio, a referência à Piada Mortal, de Alan Moore e o conceito de que o vilão era inicialmente um humorista fracassado que só conseguia fazer a esposa rir (mas o filme eleva ainda mais o nível de tensão ao mostrar qual é a verdadeira natureza da relação entre Fleck e sua namorada).
Outro grande acerto é conectar a origem do Coringa à origem do Batman, inclusive a suspeita do personagem de que ele poderia ser filho de Thomas Wayne.
Soma-se a isso a atuação de Joaquim Fênix, simplesmente antológica. Dizem que todos os atores que aturam como o Coringa teriam sido abalados por ele. Conta-se que Heath Ledger teria praticamente enlouquecido durante as filmagens do Cavaleiro das Trevas. Difícil não acreditar que Fênix também não tenha sido afetado. Sua atuação é perturbadora, em especial a risada, que no filme tem uma história: seria um problema neurológico, fruto de maus tratos na infância, que o fariam rir nos momentos mais inoportunos ou quando está nervoso.
Some a isso a trilha sonora, tensa, nervosa, pesada que faz com que uma simples cena de dança se torne assustadora. Aliás, o filme brinca com o expectador, fazendo-o ficar tenso em momentos cotidianos e levando-o a rir durante um assassinato.
De tudo, apenas uma coisa a lamentar: que esse filme não tenha conexões com futuras da produção da DC. Adoraria ver esse Coringa já totalmente desenvolvido em outras produções.
Ameaça a Vênus é o 20º livro da série Perry Rhodan e narra os acontecimentos posteriores ao encontro de Perry Rhodan com o planeta Peregrino, que lhe concedeu o dom da imortalidade relativa. Ao voltar à Terra, Rhodan descobre que, enquanto estava no planeta, o tempo se passou de forma diferente. O que para eles eram um mês, na terra havia se passado mais de quatro anos. Nesse período, as outras potências tinham se mobilizado e o planeta estava de novo às vésperas de um conflito nuclear. Para piorar, o bloco oriental (a forma como a série chamava a União Soviética), envia centenas de foguetes para Vênus na tentativa de tomar a base da Terceira Potência lá.
O livro conta a forma como o herói lida com a invasão.
A diferença de tecnologia entre a frota do bloco oriental e da terceira potência (que conta com tecnologia arcônida) é tão grande que o tom na maior parte da obra é de humor involuntário.
A capa original alemã.
Ao invés de simplesmente bombardear os invasores, Rhodan resolve simplesmente passar com a nave no meio do acampamento. Como é explicado no próprio volume, a nave estava a uma velocidade de 15 km por segundo. A velocidade é tão grande que o ar não tem tempo de desviar da Stardust III. A compressão é tão intensa que as moléculas ficam ionizadas e emitem radiação. Ao mesmo tempo, há uma elevação rápida da temperatura.
Como resultado, o acampamento fica arrasado e os sobreviventes surdos. Daí vem uma das cenas que mais me chamaram a atenção à época: para se comunicar com seus subordinados, o Coronel Tomisenkow colocava a testa contra a testa do outro e falava. Os sons eram transmitidos através da vibração dos ossos do crânio! Confesso que esse tipo de informação inusitada era uma das coisas que me faziam apreciar a série.
Voltando à trama, a vida do coronel e dos sobreviventes não é nada fácil. Enquanto as tropas de Rhodan parecem caminhar tranquilamente por Vênus, as tropas russas sofrem todo tipo de ataque: lagartos alados (o pterodátilo que aparece na capa), tempestades monstruosas, formigas, ursos, aranhas gigantes, tapetes brilhantes que devoram quem se aventura a entrar em lagos... vênus parece um trem do terror em forma de planeta.
Talvez o escritor Kurt Mahr tenha percebido que pesou muito na mão e resolveu introduzir um elogio ao coronel russo: “Quase duzentos quilômetros percorridos a pé na selva de Vênus, e isso com uma pistola automática”, diz Derringhouse. “Esse homem é de tirar o chapéu”, conclui Rhodan.
O personagem Wolverine representou na Marvel o pior dos quadrinhos dos anos 1990, naquela que ficou conhecida como a Era Image. Houve uma história, por exemplo, que iniciava com três páginas duplas do Dentes de Sabre pulando sobre o carcaju. Seis página de pura enrolação e dentes rangendo. História, nenhuma.
Mas antes de se tornar um personagem raso envolto em violência sem sentido, maus roteiros e páginas que eram pensadas como pôsteres para serem vendidas para colecionadores, antes disso, o Wolverine teve histórias memoráveis nas mãos de grandes mestres.
Um exemplo disso é a saga que estreou a revista do personagem na editora Abril. Publicada originalmente em 1988, na revista Marvel Comics Presents, a HQ em dez partes tinha roteiro de Chris Claremont, desenhos de John Buscema e arte-final de Klaus Jason.
O traço de Buscema com arte-final de Klaus Jason.
À primeira vista, a arte de Buscema parece não se encaixar com o traço de Jason, famoso pela dupla com Frank Miller. Mas o arte-finalista dá uma força e um dinamismo para o traço do mestre Buscema que se encaixam perfeitamente no estilo da história, em especial nas splash pages que abrem cada parte da trama.
A história se passa na cidade fictícia de Madripoor, dominada por gangues e pela máfia e tem a ver com uma história anterior dos X-men. Mas é possível ler e gostar sem saber o que aconteceu antes na complicada cronologia mutante. A cidade está vivendo uma guerra pelo controle da máfia. De um lado, o chefão O´Donnell e seu campanga Punho de Lâmina. Do outro, um misterioso personagem chamado Tigre. O Wolverine acaba sendo pego no meio dessa disputa e é preso ao se deparar com uma mutante vampira, que suga sua essência vital, deixando-o totalmente à mercê de seus inimigos.
Claremont sempre foi um bom roteirista, mas costuma abusar do tom novelesco, do excesso de texto e da cronologia mirabolante. A história não tem nenhum desses defeitos. Claremont estabelece bem a tipologia de fala do personagem, coloquial e cheia de gírais, que fica explícita na narrativa em off.
No final, tudo, desenhos, arte-final e texto, tudo se encaixa perfeitamente.
A Abril ainda fez uma capa em alto relevo, com o personagem pulando na direção do leitor com suas garras em posição. Como diz a capa, edição de colecionador.
Belém, como toda a Amazônia, é rica em tudo. Em bio-diversidade, em minérios, e até em expressões e lendas. O caso das expressões é particular porque eu acabei participando, direta ou indiretamente, da criação de algumas que se tornaram célebres. O que apresento a seguir é uma amostra de palavras e expressões relacionadas por mim e por Alan Noronha (algumas definições são dele). Tal dicionário pode ser útil, caso você tenha a temerária idéia de visitar Belém. Saber que égua não é xingamento pode ser tão útil quanto saber que, em Curitiba, salsicha é vina... Égua - essa é, depois de deveras, a única palavra brasileira que pode ser usada em qualquer situação. Você pode usar égua para expressar dor, tristeza, alegria, admiração, espanto e até mesmo enfado. Se, por exemplo, passar pela sua frente uma morena jeitosa, você pode exclamar deliciado: “Égua!”. E não se preocupe que ela não vai achar que você está chamando-a de eqüina. Se, por outro lado, descer um disco voador no seu quintal, não pense duas vezes. Grite: “Égua!”. Pai d´égua - é uma derivação do égua. Significa legal, bacana. Se um paraense gostar de você, vai dizer que é um cara pai d´égua. Sinta-se orgulhoso, pois você acaba de receber um grande elogio Já - é o primo pobre do égua. Também pode ser usado em qualquer situação, mas não tem autonomia para constituir uma frase. Geralmente é usado para dar ênfase à frase: “Mas quando, já?”; “Mas maninho, tu já bebe...”. Mofino - entristecido, quieto. Geralmente boladas no saco, foras da namorada e ônibus que não param (muito comuns em Belém) deixam o indivíduo mofino. Noiado - redução de paranóico que, com o tempo, ganhou outras significações. Usa-se para designar um indivíduo neurótico, problemático. Você, por exemplo, pode estar mofino porque é um indivíduo noiado. Mas a experiência tem demonstrado que, assim como chifre, nóia é coisa que botam na sua cabeça. Rolar o mal - jogar sinuca. Diz a lenda que um metaleiro que jogava sinuca soltava a cada dois segundos: “Pô, cara, muito mal”. Assim que ele saiu, os outros começaram a usar a expressão, por sarro, até que a expressão acabou se aplicando ao próprio jogo. Esse é um termo que surgiu num grupo de amigos meus e acabou se alastrando assustadoramente pela cidade. Estar em mal significa estar em situação de sinuca. Em Belém você pode convidar um amigo para rolar o mal, ao que ele vai responder, indignado: “Eu não. Você só gosta de deixar a gente em mal”. Ah se eu te pego, te requebro, na cabeça do meu prego - cantada sutil e malevolente. Deve ser empregada no tom de voz adequado. Pariceiro - colega, amigo. Pejorativo muito usado pelas mães em referência aos amigos do filho. Pano de bunda - trouxa, mala. Normalmente usado pelas mães que querem expulsar os filhos de casa. Exemplo: “Você só vive com esses seus pariceiros! Pega os seus panos de bunda e vai morar com eles!”. Teba - grande. Geralmente usado para aquilo. Comum a expressão “Olha a teba!”, com gesto indicativo do tamanho da coisa em questão. Miúdo - pequeno, de pouco valor. Graúdo - grande. Certa vez fui assaltado e o e ladrão, depois de examinar minha carteira, perguntou enfurecido: “Cadê o dinheiro graúdo?”. Eu só tinha dinheiro miúdo... Rolar o chocolate - fazer amor. Essa expressão surgiu depois que passou no cinema o filme Como Água para Chocolate e chegou a ter uma certa popularidade. Atualmente foi substituído por comparecer. Há também quem use conhecer, no sentido bíblico. Tocar piano - é o que você faz quando está com uma garota, mas não pode rolar o chocolate. Foi inspirada no filme O Piano. Talvez por causa da origem nobre, não chegou a ter ampla repercussão, embora fosse a expressão predileta de alguns alunos meus. Provavelmente porque eles ainda não haviam chegado na idade de rolar o chocolate. Hermético - fechado, difícil. Palavra recuperada do português formal, de uso corrente em alguns bairros. Leso - doido, abobalhado. Se, por exemplo, você tem oportunidade de rolar o chocolate com uma gatíssima, mas acaba só tocando piano, então você corre o risco de ser chamado de leso. Broca - comida. Comendo uma broca, você deixa de estar brocado. Cachorro-quente - a expressão não é pitoresca, mas o que ela representa sim. Belém é, provavelmente, o único local do Brasil onde o cachorro-quente é feito com carne-moída (chamada de picadinho). Em cada esquina de Belém há uma banca de cachorro-quente e essa é, pasmem, a razão pela qual a McDonalds demorou tanto a se instalar na cidade...
Em 1986 a DC Comics tinha acabado de sair do mega-sucesso Crise nas infinitas terras e a ideia era reformular seus principais personagens. Frank miller fez Batman ano 1, George Perez ficou responsável pela Mulher Maravilha e John Byrne foi chamado para fazer uma versão totalmente nova do homem de aço.
Para marcar esse novo momento foi criada uma nova revista, The Man of stell.
Byrne mostra uma versão diferente de Kripton.
Byrne diminuiu os poderes do personagem e recontou sua origem. Nada muito diferente do que conhecemos: Jor-El percebe que uma pressão no centro do planeta irá destruir Kripton. Ele envia seu único filho dentro de um foguete para ser criado na terra. A versão de Byrne para Kritpon é visualmente muito diferente do que até então se via nos quadrinhos e estava muito mais próxima dos filmes. Também apresenta alguns detalhes sobre a cultura local. Quando Jor-el mostra o local onde seu filho crescerá, a esposa fica horrorizada: “Ele está expondo sua pele ao vento e pisando em solo não processado!”.
Na comparação com a cultura antisséptica de Kritpon, a sequencia seguinte, com Clark Kent jogando futebol americano, é um contraste imenso.
O roteiro de Byrne é como seu desenhos: simples, mas eficiente. Não há grandes ousadias estéticas ou narrativas, só uma boa história de origem com direito a bifes (diálogos explicativos), como quando Jonathan Kent explica ao filho adotivo como ele foi achando e adotado pelo casal.
A cena em que o super experimenta a roupa é ingênua, mas combina bem com o personagem: na versão de Byrne, a mãe adotiva faz a roupa do personagem e o pai lhe ensina a pentear o cabelo de forma diferente como forma de disfarçar. No final, a história fecha com uma tremenda splah page do personagem voando na direção do leitor no melhor estilo elegante que tornou Byrne célebre.
Hoje é difícil imaginar o impacto que essa história teve sobre os leitores e até sobre quem não era fã. Para se ter uma ideia, a versão de Byrne chegou a ser capa até da revista Time em 1988, época em que o personagem completava 50 anos.
No Brasil essa história foi publicada pela abril em clássicos DC 1 e na revista Super-homem 38.