Os psicopatas assassinos não são uma realidade apenas dos EUA, como durante muito tempo se acreditou. Eles estão aí, em todas as sociedades e, ao contrário do que se pensa, são, na grande maioria das vezes, indivíduos perfeitamente ajustados à sociedade, pais de família, simpáticos, pessoas acima de qualquer suspeita. Saber sobre eles, como eles são e como agem é a melhor forma de se prevenir contra eles. Assim, é bem-vindo o fato de que cada vez mais surgem nas livrarias obras especializadas no assunto. Entre elas, uma das mais interessantes é Predadores Humanos, de Janire Rámila (editora Madras, 216 páginas).
Janire parece ser uma pessoa indicada para a empreitada. É jornalista com mestrado em criminologia. É colaboradora de revistas como a Muy Interessante (versão original da nossa conhecida Superinteressante) e autora dos livros La maldición de Whitechapel e La ciência contra el crimen.
O interessante do livro de Janire é que, ao contrário da grande maioria das obras sobre o assunto, não se limita a apenas narrar casos famosos. Sua análise vai desde a definição de serial killer (alguém que matou ao menos três vezes, em momentos e lugares diferentes) até a discussão sobre o que fazer com eles.
O livro inicia pela diferenciação entre psicopata e psicótico, uma confusão comum tanto na imprensa como nos tribunais, já que muitos advogados de serial killeres tentam convencer o júri de que seus clientes são doentes mentais.
Segundo a autora, psicose é uma doença mental que provoca em quem a tem uma alteração do sentido de realidade: “O psicótico constrói um mundo próprio no qual o bem e o mal se fundem, levando o indivíduo a não ser consciente de seus atos”. Ou seja: o psicótico é um doente, que não tem consciência de seus atos e, portanto, não pode ser responsabilizado por eles.
Já os psicopatas são pessoas perfeitamente integradas à sociedade, capazes de distinguir o certo do errado. São frios e calculistas. Ao contrário dos psicóticos, que geralmente matam num ataque de fúria descontrolada, os psicopatas planejam seus atos. São também superficialmente simpáticos e agradáveis – uma máscara criada para ser mostrada para a sociedade. Psicopatas também são mestres da mentira, capazes de enganar e manipular suas vítimas.
Um quadro apresentado pela autora mostra as diferenças radicais entre psicopatas e psicóticos: enquanto os primeiros são aparentemente ajustados à sociedade, os segundos são socialmente imaturos e reservados; enquanto os primeiros têm forte auto-controle e auto-estima, os segundos têm personalidade frágil e mostram precisar de ajuda; enquanto os primeiros têm controle durante o assassinato, chegando a alterar a cena do crime para esconder provas ou mandar mensagens, os segundos são descuidados e atabalhoados; enquanto os primeiros seguem os meios de comunicação e normalmente fazem recortes sobre seus crimes, os segundos não acompanham as notícias; enquanto os primeiros são presos-modelo (pois sabem que isso diminuirá sua pena), os segundos têm comportamento violento e conflituoso quando são presos.
O capítulo mais interessante do livro, pouco abordado em outras obras, é “O problema do tratamento”, que inicia com uma pergunta instigante: o que podemos fazer para evitar que o assassino serial volte a matar?
O problema é mais complexo do que aparenta. Primeiro porque o psicopata não é um doente mental, como tal, não pode ser internado em centros psiquiátricos e, se o forem, podem facilmente manipular os psicólogos para fazerem crer que estão curados (uma das principais características dos psicopatas é a sua capacidade de mentir e manipular). Por outro lado, se forem presos junto com os criminosos comuns, têm os mesmos direitos de redução de pena de qualquer outro preso e, como sempre são presos exemplares, de ótimo comportamento, conseguem facilmente a redução da pena. Além disso, a mentalidade atual é de que as prisões servem como meio de reabilitar o detento e reincorpora-lo à sociedade. “Até agora, não se conseguiu inserir um só assassino ou estuprador serial”, afirma a autora “Por quê? Simplesmente porque já são velhos para aprender a sentir esse carinho que nunca demonstraram em relação aos seus semelhantes estando livres. Não se pode transformar um feroz assassino em um vizinho amável mediante reuniões de grupo”.
Além disso, os psicopatas assassinos são uma exceção às teorias mais convencionais sobre o crime. Um exemplo: pesquisas realizada nos EUA em 2005 mostram que as vítimas de assassinato são preferencialmente homens negros e as mulheres brancas são o tipo com menor probabilidade de serem assassinado. Quando se trata de assassinos seriais, a estatística se inverte: as mulheres brancas são o grupo mais propenso a morrer e os homens negros os menos propensos. Enquanto, na maioria das vezes, os criminosos são homens negros e pobres (reflexo direto de suas condições sociais), entre os psicopatas assassinos, geralmente são homens brancos, de classe média, com empregos estáveis e muitas vezes donos de seus próprios negócios.
Esses dados demostram o quanto o tema é importante nos dias atuais. Só com conhecimento a sociedade pode discutir soluções para esse problema. Nesse sentido, livros como Predadores humanos podem ser uma grande contribuição.
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