terça-feira, julho 23, 2019

O Cavaleiro das Trevas



No início da década de 1980, Frank Miller era o grande nome dos quadrinhos americanos. Depois de salvar a revista do Demolidor do cancelamento, transformando-a num campeão de vendas, ele foi contratado para a DC Comics na qualidade de astro.
Seu primeiro trabalho para a editora, Ronin, foi aplaudido pela crítica, fez sucesso e abriu as portas para a invasão dos mangás, mas não chegou a ser algo bombástico. O grande sucesso mesmo viria com a minissérie Batman - Cavaleiro das Trevas, de 1986.
Cavaleiro das Trevas foi um arrasa-quarteirão que mudaria para sempre a história dos quadrinhos de super-heróis, a começar pelo formato de luxo em que foi lançado, chamando atenção dos leitores adultos e da imprensa.
A história se passa em um futuro em que os super-heróis foram proibidos. Aposentado após a morte de seu parceiro Robin, Bruce Wayne é um homem amargurado pelos fantasmas do passado e pela percepção de que a cidade que protegeu durante anos está se transformando em um completo caos de violência urbana.
Sua volta à ação marca também o retorno dos vilões Duas Caras e Coringa e a tensão com o Super-homem, o único herói com autorização para agir.
Miller foi revolucionário em tudo, a começar pela forma de contar a história, usando e abusando das elipses. Elipses são pulos na narrativa, partes não mostradas pelo quadrinistas e que são completadas pelo leitor. Os quadrinhos usam as elipses o tempo todo: o personagem se levanta da cadeira, no quadro seguinte está na porta de casa: todo o trajeto entre uma ação e outra é completado pela imaginação do leitor. Miller levou o recurso a patamares nunca explorados em especial na sequência em que o Batman volta à ação: o leitor nunca vê o herói, e sim as consequências de sua ação. Quando ele finalmente surge é numa grandiosa splash page, de enorme impacto.
Outra revolução de Miller foi introduzir quadros televisivos como elementos narrativos. Quando vemos Batman pela primeira vez, por exemplo, as telas mostram pessoas comuns comentando sua aparição. Além disso, a narrativa televisiva muitas vezes ajudando o leitor a entender as elipses – exemplo disso é a mulher cuja bolsa é revistada pela gangue mutante e que sai feliz ao descobrir que não foi roubada – na sequência, uma jornalista informa: “Mulher explode numa estação de metrô! Noticiário completo às onze...”.
As telas de televisão também funcionam como um acréscimo de aprofundamento ao mostrar debates sobre a ação do herói. É nesses inserts que Miller irá colocar uma das questões mais interessantes da obra: seriam os vilões uma consequência dos super-heróis? Ou seria o contrário? A obra não dá respostas fáceis, deixando muito mais perguntas que certezas.
Outra inovação de Miller foi mostrar o Batman como alguém que capaz de qualquer coisa para conseguir seus objetivos – inclusive usar uma criança como aliada no combate ao crime ou torturar um bandido para conseguir uma informação. Maníaco? Visionário? Herói? Vilão? Junto com A Piada Mortal, de Alan Moore e Brian Bolland, Cavaleiro das Trevas transformou o Batman em um herói tridimensional, um dos mais complexos do universo DC.
Miller continuou sua abordagem sobre o personagem em uma outra série, Batman ano um, com desenhos de David Mazzuchelli, em que contava os primeiros anos do herói.
Como resultado, Batman se tornou o herói mais popular da época, uma verdadeira mania, com várias revistas derivadas e especiais.
No Brasil, Cavaleiro das Trevas foi a obra que inaugurou a era das graphic novels. O sucesso da série fez com que a Abril lançasse várias outras minisséries de luxo e até uma coleção, Graphic Novel, apenas com histórias fechadas, em papelo gouchê.

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