terça-feira, outubro 15, 2019

O terror da EC

 
No início dos anos 1950, a nona arte viu nascer e morrer a melhor edi­tora de HQs de todos os tempos: a EC.
A editora tinha surgido no início da década de 40, publicando coisas insossas, como adaptações da Bíblia e coisas do gênero. Com a morte de Max Gaimes, em 1947, seu filho, William Gaines, foi obrigado a assumir a editora. Nessa época ele foi procurado pelo desenhis­ta e roteirista All Feldstein que tinha uma proposta completamente inova­dora. Em maio de 1950, Gaines e Feldstein lançaram uma nova linha de gibis: dois de histórias de crimes, dois de guerra e três de terror. Nes­sas revistas desfilaram os melhores artistas da época, de Joe Orlando a All Williamson.
O sucesso foi imediato. Milhares de garotos americanos passaram a devorar sua dose mensal de horror e fantasia. Escritores famosos, como Stephen King, eram fanáticos pela EC quando crianças. No filme “Con­ta comigo’ baseado num livro de King, um dos garotos aparece lendo uma revista da EC. Gente famosa, co­mo o escritor Ray Bradbury, colabo­rava com a EC.
Até aí, tudo bem. O problema é que a EC era uma editora crítica, tal­vez a primeira da historia dos quadri­nhos. A EC fazia propaganda pacifista durante a guerra da Coréia, questio­nava os heróis e as instituições ame­ricanas. Numa das histórias um homem é encontrado próximo de uma moça atropelada e é torturado uma noite inteira até admitir que cometeu o cri­me. No final da história o policial que o torturou vol­ta para casa e trata de limpar a mancha de sangue no pára-brisa de seu carro. Ele era o assassino...
A revolução da EC, entretanto, não ficou só no conteúdo. Mudou também a forma. Todas as histórias da EC seguiam um certo ritmo óbvio até o final - quando davam uma guina­da de 180 graus, numa conclusão totalmente imprevista. Isso desconcertava o leitor, levando-o a uma leitura criti­ca da realidade (se alguém se lembrou dos filmes de M. Night Shyamalan, acertou – o diretor de Sexto Sentido sempre foi fã de quadrinhos e transformou essa “virada” final na sua marca pessoal).
A festa não durou muito. Gaines foi chamado para depor numa comis­são do Senado americano liderada por Frederick Wethan e fez o que pôde para defender suas publicações. Não adiantou muito: as editoras (para as­segurar suas vendas) criaram um có­digo de ética que praticamente proibia as revistas da EC. O resulta­do foi uma das épocas mais medío­cres da história dos quadrinhos. Os grandes artistas, desiludidos com o fim da EC, deixaram de lado os qua­drinhos, indo a maioria parte deles pa­ra a publicidade.
      Das revistas da EC, a única a per­manecer foi a MAD — durante décadas uma das revistas mais vendidas nos EUA e no mundo. O curioso é que ela é pu­blicada pelo mesmo grupo proprietá­rio da DC — a editora que liderou o levante contra as revistas de Gaines...

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