O golpe militar de março de 1964, que começou como uma ditadura
envergonhada, firmou-se a partir de 1968, com a instalação do AI-5. Mas foi a
partir da tortura que a ditadura se escancarou. Foi o mais duro período da mais
longa ditadura militar brasileira. É justamente sobre esses anos de chumbo que
Elio Gaspari trata no livro da série Ilusões Armadas. A Ditadura Escancarada
vai do AI-5 ao fim da guerrilha do Araguaia, em 1974.
O livro é uma mistura de reportagem histórica com ensaio filosófico. Gaspari explica que a tortura foi instalada no Brasil sob desculpa de que havia um movimento terrorista que deveria ser combatido a todo custo. Era necessário conseguir confissões para destruir a teia subversiva. E, como disse um bispo na época, confissões não se consegue com bombons.
O terrorismo foi apenas desculpa para recrudescimento do regime. Em comparação, só no segundo semestre de 1970 explodiram 140 bombas nos EUA, mais do que todas as bombas explodidas no Brasil no período. E, em nenhum momento nos EUA a tortura foi considerada um método legítimo de se conseguir informações.
A tortura traz resultados rápidos e eficientes, mas a grande custo. Seu uso exige dois tipos de agentes. No primeiro degrau estão aqueles que se beneficiam da tortura, mas não sujam as mãos. Ministros, presidentes, generais usam as informações conseguidas através da tortura para dizimar seus adversários políticos. No degrau de baixo estão os torturadores, que precisam ser incentivados a praticarem atos de barbarismo. No Brasil, esse reconhecimento vinha na forma de promoções e, ironicamente, da Medalha do Pacificador, o mais alto grau do Exército. O tenente Ailton, que dava aulas de tortura nos quartéis, recebeu a sua em 1970. O delegado Fleury que, quando não estava torturando presos políticos, usava seu tempo livre trabalhando para o tráfico de drogas, ganhou sua medalha em 1971.
A grande lição de A Ditadura Escancarada é que o uso da tortura é um círculo vicioso. Começa-se usando-a para acabar com o terrorismo. No final, os próprios torturadores tornam-se também eles terroristas. É que a repressão violenta à subversão traz inegáveis vantagens ao degrau inferior e, quando o degrau superior decide acabar com ele, a "tigrada" não aceita. Foi o que aconteceu na Argélia, em que o governo francês deu permissão para que o exército usasse a força contra terroristas que queriam a independência do país. Quando De Gaulle quis retomar o poder, os militares se organizaram em um grupo terrorista e mataram mais de cinco mil pessoas. No Brasil, a linha dura da ditadura, quando percebeu que perdia poder, voltou-se também ela para o terrorismo. Prova disso foi o atentado no Rio-Centro, que teria matado dezenas de pessoas, não fosse a incompetência da tigrada, que se dava melhor com paus de arara do que com bombas.
Elio Gaspari é a pessoa apropriada para escrever a história desse período. Na época em que ainda era repórter, foi entrevistar o general Golbery do Couto e Silva, fundador do SNI e ideólogo do regime. Logo percebeu que estava diante de um figura-chave da Ditadura. Como desculpa para voltar outra vez, pediu um livro emprestado, sobre o assunto da matéria. Tornou-se amigo do militar até sua morte e ganhou dele um arquivo com vários documentos importantes. Também era amigo do general Ernesto Geisel, com os quais conseguiu muitas das informações que constam nesses volumes. Além disso, leu tudo que se publicou sobre o período e fez um arquivo de 30 mil fichas. Tal trabalho de pesquisa faz com que esse livro, assim como os outros dois da coleção, seja essencial para compreender os anos de chumbo.
O livro é uma mistura de reportagem histórica com ensaio filosófico. Gaspari explica que a tortura foi instalada no Brasil sob desculpa de que havia um movimento terrorista que deveria ser combatido a todo custo. Era necessário conseguir confissões para destruir a teia subversiva. E, como disse um bispo na época, confissões não se consegue com bombons.
O terrorismo foi apenas desculpa para recrudescimento do regime. Em comparação, só no segundo semestre de 1970 explodiram 140 bombas nos EUA, mais do que todas as bombas explodidas no Brasil no período. E, em nenhum momento nos EUA a tortura foi considerada um método legítimo de se conseguir informações.
A tortura traz resultados rápidos e eficientes, mas a grande custo. Seu uso exige dois tipos de agentes. No primeiro degrau estão aqueles que se beneficiam da tortura, mas não sujam as mãos. Ministros, presidentes, generais usam as informações conseguidas através da tortura para dizimar seus adversários políticos. No degrau de baixo estão os torturadores, que precisam ser incentivados a praticarem atos de barbarismo. No Brasil, esse reconhecimento vinha na forma de promoções e, ironicamente, da Medalha do Pacificador, o mais alto grau do Exército. O tenente Ailton, que dava aulas de tortura nos quartéis, recebeu a sua em 1970. O delegado Fleury que, quando não estava torturando presos políticos, usava seu tempo livre trabalhando para o tráfico de drogas, ganhou sua medalha em 1971.
A grande lição de A Ditadura Escancarada é que o uso da tortura é um círculo vicioso. Começa-se usando-a para acabar com o terrorismo. No final, os próprios torturadores tornam-se também eles terroristas. É que a repressão violenta à subversão traz inegáveis vantagens ao degrau inferior e, quando o degrau superior decide acabar com ele, a "tigrada" não aceita. Foi o que aconteceu na Argélia, em que o governo francês deu permissão para que o exército usasse a força contra terroristas que queriam a independência do país. Quando De Gaulle quis retomar o poder, os militares se organizaram em um grupo terrorista e mataram mais de cinco mil pessoas. No Brasil, a linha dura da ditadura, quando percebeu que perdia poder, voltou-se também ela para o terrorismo. Prova disso foi o atentado no Rio-Centro, que teria matado dezenas de pessoas, não fosse a incompetência da tigrada, que se dava melhor com paus de arara do que com bombas.
Elio Gaspari é a pessoa apropriada para escrever a história desse período. Na época em que ainda era repórter, foi entrevistar o general Golbery do Couto e Silva, fundador do SNI e ideólogo do regime. Logo percebeu que estava diante de um figura-chave da Ditadura. Como desculpa para voltar outra vez, pediu um livro emprestado, sobre o assunto da matéria. Tornou-se amigo do militar até sua morte e ganhou dele um arquivo com vários documentos importantes. Também era amigo do general Ernesto Geisel, com os quais conseguiu muitas das informações que constam nesses volumes. Além disso, leu tudo que se publicou sobre o período e fez um arquivo de 30 mil fichas. Tal trabalho de pesquisa faz com que esse livro, assim como os outros dois da coleção, seja essencial para compreender os anos de chumbo.
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