A década de 60 abalou o mundo. Foi a época dos Beatles, dos hippies, da chegada do homem à lua e do movimento underground. Subterrâneo, aquilo que está fora do sistema, esse movimento representou uma ruptura total com o que se fazia na mídia.
Os artistas passaram a participar de todo o processo, desde a criação da obra até a sua distribuição. Nas histórias em quadrinhos isso foi uma verdadeira revolução. As revistas das grandes editoras estavam sob a censura do código de ética, que restringia completamente a liberdade do artista, mas nessas novas revistas, que não passavam pelo crivo das editoras, imperava a total liberdade. Falava-se sexo, drogas, rock e política. Isso chamou a atenção especialmente do público jovem, cansado dos quadrinhos pasteurizado das grandes editoras.
O grande astro desse novo tipo de HQ foi um rapaz baixinho, narigudo e extremamente tímido. Chamava-se Robert Crumb e escrevia, desenhava, publicava e vendia suas histórias. Influenciado pelos quadrinhos Disney, Crumb tinha um traço que oscilava entre o infantil e o burlesco, que serviu muito bem ao tipo de sátira social que ele pretendia fazer. Seu primeiro personagem foi Mr. Natural, uma sátira aos gurus que fizeram a cabeça da geração hippie.
Muitos já tentaram, mas não conseguiram definir o personagem. Ele seria um charlatão que se aproveita da credulidade alheia ou um verdadeiro sábio, que atingiu uma compreensão profunda do mundo?
A biografia inventada por Crumb para ele não esclarece muito. Ele teria se envolvido com o tráfico de bebidas durante a leia seca, passando um tempo na cadeia e reaparecendo com o mágico Mr. Natural, o Magnífico. Depois tornou-se músico e montou a big band Mr. Natural e seus libertinos líricos. Ficou rico com a vida artística, mas abandonou tudo para andar pela América como vagabundo. Foi encontrado depois na Califórnia, cercado de discípulos. Já na década de 1970, foi internado por ex-discípulos num manicômio, o que mostrava a decepção da geração anos hippie com seus gurus.
Outro personagem de sucesso de Crumb foi Fritz, the cat, um gato sem vergonha, que adora transar, tomar drogas e curtir a vida. Em suas aventuras ele se envolvia com todo tipo de gente, incluindo terroristas. O sucesso do personagem foi tão grande que Crumb resolveu matá-lo, para evitar que ele se tornasse mais um produto, apropriado pela Indústria cultural. Como se vê, Crumb em si já era um personagem interessante. Quando a revista Village Voice o convidou para fazer tiras pagas, ele topou, mas depois fez uma história em que satirizava os editores e ainda pedia demissão ¨ao vivo¨, na história. Ele também se recusava a dar autógrafos e costumava fica nervoso quando encontrava com um fã.
Por fim, Crumb percebeu que ele mesmo era o melhor personagem que já criara e passou a fazer histórias auto-biográficas. Numa série dessas histórias, intitulada ¨Minha Mulheres¨ ele conta que era desprezado pelas garotas e só beijou uma aos 19 anos. Quando se tornou famoso com os quadrinhos, dezenas de mulheres disputavam sua atenção e ele se vingava humilhando-as.
Crumb abriu caminho para todo uma nova visão dos quadrinhos, mostrando que não havia limites de temas a serem trabalhados, inclusive os auto-biográficos. Muitos quadrinistas foram fortemente influenciados por ele. No Brasil, o quadrinista Angeli é o mais famoso seguidor do mestre underground.
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