quarta-feira, abril 26, 2023

Isaac Asimov fala sobre o ensino do criacionismo nas escolas

 

Trechos de um texto de Isaac Assimov sobre o ensino criacionismo nas escolas e publicado no jornal The New York Times:

Se o governo pode mobilizar sua polícia e suas prisões para assegurar que os professores
dêem tempo igual ao criacionismo, eles podem em seguida usar a força para assegurar que os professores declarem o criacionismo como vitorioso, de forma que a evolução seja banida das salas de aula. Teremos estabelecido uma base, em outras palavras, para a ignorância legalmente estabelecida e para o controle de pensamento totalitário. E o que acontece se os criacionistas vencerem? Eles poderiam vencer, você sabe, pois há milhões que se tiverem que escolher entre a ciência e sua interpretação da Bíblia, escolherão a Bíblia e rejeitarão a ciência, apesar dos indícios.
Isso não ocorre somente devido à reverência tradicional e irracional das palavras literais da
Bíblia; existe também um desconforto – mesmo medo – da ciência que joga mesmo aqueles que se importam pouco com o fundamentalisimo nos braços dos criacionistas. Por um motivo: a ciência é incerta. As teorias estão sujeitas a revisão, as observações estão abertas a uma variedade deinterpretações, e os cientistas discutem entre si. Isso é decepcionante para aqueles não treinados no método científico, que assim, preferem se voltar para a rígida certeza da Bíblia. Existe algo de confortável sobre uma visão que não admite desvio e que poupa a pessoa da dolorosa necessidade de ter de pensar.
Em segundo lugar, a ciência é complexa e desafiante. A linguagem matemática da ciência é
compreendida por muito poucos. Os cenários que ela apresentam são assustadores – um universo enorme regido pelo acaso e por regras impessoais, vazio e indiferente, indomável e vertiginoso.
Quão confortável, por outro lado, é um mundo pequeno, com uns poucos milhares de anos, sob o cuidado pessoal e imediato de Deus; um mundo em que você conta com Seu cuidado pessoal e ondeEle não te condenará ao inferno se você for cuidadoso e seguir cada palavra da Bíblia da forma que o pastor da televisão interpretar para você.
Terceiro, a ciência é perigosa. Não há dúvida de que gás venenoso, engenharia genética,
armas nucleares e usinas de força são aterrorizantes. Pode ser que a civilização esteja se destruindo e que o mundo que conhecemos esteja chegaodo ao fim. Nesse caso, por que não se voltar para a religião e esperar pelo Dia do Julgamento, quando você e os seus companheiros crentes serão elevados ao eterno êxtase e terão ainda a alegria de ver os gozadores e descrentes se contorcerem em tormento para sempre?
Então por que eles não poderiam vencer?
Há varios casos de sociedades em que os exércitos da noite têm cavalgado triunfantes sobre
as minorias a fim de estavelecer uma ortodoxia poderosa que dita o pensamento oficial.
Invariavelmente, a cavalgada triunfante vai na direção de um desastre de longo alcance. A Espanha dominou a Europa e o mundo no século 16, mas na Espanha a ortodoxia vinha primeiro, e toda divergência de opinião era suprimida implacavelmente. O resultado foi que a Espanha ficou na obscuridade e não compartilhou do fermento científico, tecnológico e comercial que borbulhava em outras nações da Europa Ocidental. A Espanha permaneceu numa estagnação intelectual por séculos.
No final do século 17, a Franca, em nome da ortodoxia, revogou o Edito de Nantes e expulsou muitos milhares de huguenotes, que adicionaram seu vigor intelectual a terras de refúgio como a Grã-Bretanha, a Holanda e a Prússia, enquantoa Franca foi enfraquecida permanentemente.
Numa época mais recente a Alemanha perseguiu os cientistas judeus da Europa. Eles
chegaram aos Estados Unidos e contribuíram imensamente para o seu avanço científico, enquanto a Alemanha perdia tão pesadamente que não se pode dizer quanto tempo vai levar até que elarecupere sua antiga eminência científica.
A União Soviética, em sua fascinação com Lysenko,destruiu seus geneticistas, e atrasou as ciências biológicas por décadas.
A China, durante a
Revolução Cultural, voltou-se contra a ciência ocidental e ainda luta para superar a devastação resultante.
Como iremos agora, com todos esses exemplos diante de nós, cavalgar de volta ao passado
sob a mesma bandeira esfarrapada da ortodoxia? Com o criacionismo a tiracolo, a ciência
americana definhará. Criaremos uma geração de ignorantes mal-equipados para dirigir a indústria de amanha, e muito menos para gerar os novos avanços dos dias de depois de amanhã.
Vamos inevitavelmente retroceder à retaguarda da civilização e aquelas nações que
mantiverem aberto o pensamento científico tomarão a liderança do mundo e da fronteira do
progresso humano.
Não creio que os criacionistas planejem realmente o declínio dos Estados
Unidos, mas o seu patriotismo expresso em altas vozes é tão ingênuo quanto sua “ciência”. Se eles tiverem sucesso, eles irão, em sua loucura, obter o oposto do que dizem desejar.

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