quinta-feira, novembro 30, 2023

Feliz Natal!

 


Os quadrinhos underground

 

A década de 60 abalou o mundo. Foi a época dos Beatles, dos hippies, da chegada do homem à lua e do movimento underground. Subterrâneo, aquilo que está fora do sistema, esse movimento representou uma ruptura total com o que se fazia na mídia.
       Os artistas ­passaram a participar de todo o processo, desde a criação da obra até a sua distribuição. Nas histórias em quadrinhos isso foi uma verdadeira revolução. As revistas das grandes editoras estavam sob­ a censura do código de ética, que restringia completamente a liberdade do artista, mas nessas novas revistas, que não passavam pelo crivo das editoras, imperava a total liberdade. Falava-se sexo, drogas, rock e política. Isso chamou a atenção especialmente do público jovem, cansado dos quadrinhos pasteurizado das grandes editoras.
       O grande astro desse novo ti­po de HQ foi um rapaz baixinho, narigudo e extremamente tímido. Chamava-se Robert Crumb e escrevia, desenhava, publicava e vendia suas histórias. Influenciado pelos quadrinhos Disney, Crumb tinha um traço que oscilava entre o infantil e o burlesco, que serviu muito bem ao tipo de sátira social que ele pretendia fazer. Seu primeiro personagem foi Mr. Natural, uma sátira aos gurus que fizeram a cabeça da geração hippie.
       Muitos já tentaram, mas não conseguiram definir o personagem. Ele seria um charlatão que se aproveita da credulidade alheia ou um verdadeiro sábio, que atingiu uma compreensão profunda do mundo?
       A biografia inventada por Crumb para ele não esclarece muito. Ele teria se envolvido com o tráfico de bebidas durante a leia seca, passando um tempo na cadeia e reaparecendo com o mágico Mr. Natural, o Magnífico. Depois tornou-se músico e montou a big band Mr. Natural e seus libertinos líricos. Ficou rico com a vida artística, mas abandonou tudo para andar pela América como vagabundo. Foi encontrado depois na Califórnia, cercado de discípulos. Já na década de 1970, foi internado por ex-discípulos num manicômio, o que mostrava a decepção da geração anos hippie com seus gurus.
       Outro personagem de sucesso de Crumb foi Fritz, the cat, um gato sem vergonha, que adora transar, tomar drogas e curtir a vida. Em suas aventuras ele se envolvia com todo tipo de gente, incluindo terroristas. O sucesso do personagem foi tão grande que Crumb resolveu matá-lo, para evitar que ele se tornasse mais um produto, apropriado pela Indústria cultural. Como se vê, Crumb em si já era um personagem interessante. Quando a revista Village Voice o convidou para fazer tiras pagas, ele topou, mas depois fez uma história em que satirizava os editores e ainda pedia demissão ¨ao vivo¨, na história. Ele também se recusava a dar autógrafos e costumava fica nervoso quando encontrava com um fã.
       Por fim, Crumb percebeu que ele mesmo era o melhor personagem que já criara e passou a fazer histórias auto-biográficas. Numa série dessas histórias, intitulada ¨Minha Mulheres¨ ele conta que era desprezado pelas garotas e só beijou uma aos 19 anos. Quando se tornou famoso com os quadrinhos, dezenas de mulheres disputavam sua atenção e ele se vingava humilhando-as.
       Crumb abriu caminho para todo uma nova visão dos quadrinhos, mostrando que não havia limites de temas a serem trabalhados, inclusive os auto-biográficos. Muitos quadrinistas foram fortemente influenciados por ele. No Brasil, o quadrinista Angeli é o mais famoso seguidor do mestre underground.

O fim da eternidade, de Isaac Asimov

 

Quando pensa em ficção científica, a grande maioria das pessoas costuma lembrar em grandes batalhas espaciais e tramas repletas de ação. Existem obras, no entanto, que se baseiam principalmente nas questões lógicas e científicas relacionadas ao desenvolvimento tecnológico. São obras que têm como principal objetivo desafiar o leitor, estimular sua imaginação e raciocínio. O fim da eternidade, de Isaac Asimov (lançado no Brasil pela editora Aleph), é um ótimo exemplo disso.
Publicado originalmente em 1955, O fim da eternidade trata de viagens no tempo. Mas o enfoque é totalmente original. Imagine se o ser humano, ao descobrir as viagens temporais, não se contentasse em vagar para o passado ou futuro, mas se dedicasse a mudar a história. Pequenas modificações poderiam criar novas realidades, menos danosas ao ser humano. Para isso, é fundada toda uma sociedade de viajantes do tempo, centrada nos observadores, técnicos e computadores (a expressão aqui não é no sentido de pessoas que coordenam todo o processo de mudança da realidade).
Ao contrário do que a maioria das pessoas poderia imaginar, as mudanças na realidade têm como base pequenas, sutis modificações.
Um exemplo:
“Ele havia alterado a realidade. Havia adulterado um mecanismo (a embreagem de um carro) por alguns minutos do século 223 e, como resultado, um jovem não conseguiu assistir a uma palestra sobre mecânica à qual deveria ter comparecido. Nunca estudou engenharia solar e, em consequência, um invento perfeitamente simples teve seu desenvolvimento adiado por dez anos cruciais. Uma guerra no 224, espantosamente, sumiu da realidade como resultado”.
Asimov, muito à frente de seu tempo, antecipa alguns conceitos fundamentais da teoria do caos, como o efeito borboleta, também chamada de dependência sensível das condições iniciais. Esse conceito costuma ser exemplificado com a frase: uma borboleta batendo suas asas na mulhara da China pode provocar uma tempestade em Nova York.
O interessante é que esse fenômeno só foi observado pela primeira vez pelo metereologista Edward Lorenz, em 1963, e só se tornaria popular com o coletivo de sistemas dinâmicos, na década de 1970. Ou seja: Asimov antecipa, na ficção, o que a ciência só viria a observar de fato, quase dez anos depois. Mais, ele lança a ideia, hoje comum nos meios científicos, de que a realidade é feita de diversas bifurcações, pequenas escolhas. Eu vou para o trabalho usando a rua da esquerda ou da direita? O resultado dessa escolha pode provocar grandes alterações na realidade. A cada bifurcação, é como se uma nova realidade estivesse sendo escolhida. Então, o real seria resultado de uma quantidade infinita de bifurcações e, portanto, de uma infinidade de realidades paralelas.
O fim da eternidade, é, portanto, um livro sobre lógica e sobre como o desenvolvimento tecnológico afeta a realidade. O conflito aqui não está na ação, no embate de punhos, mas no embate de ideias, teorias e conceitos. Asimov se aventura até mesmo na teoria da evolução, ao postular que as constantes mudanças na realidade, ao criarem as melhores condições para a humanidade, emperrariam a evolução do ser humano, uma vez que a evolução decorre do ajustamento às situações ambientais desfavoráveis.
Surpreendentemente, o autor consegue transformar essa trama puramente cerebral em um verdadeiro triller de suspense. Passadas as primeiras páginas, dedicadas quase que exclusivamente à descrição da eternidade e seus agentes, o leitor logo se vê em uma trama complexa cheia de reviravoltas.
O fim da eternidade é um daqueles livros que exercitam o cérebro.

Abapuru, de Tarsila do Amaral

 

Abapuru é o quadro mais famoso e importante da arte brasileira. Ele foi pintado em segredo por Tarsila do Amaral e dado de presente para seu esposo no dia de seu aniversário, em 11 de janeiro de 1928.
Oswald de Andrade ficou fascinado com o quadro e mostrou para o poeta Raul Bopp. Juntos começaram a analisar a imagem e ver ali um índio canibal, aquele que iria devorar a cultura vinda de fora para apossar-se dela e reinventá-la.
Tarsila procurou um dicionário de tupi e encontrou ali as palavras “aba” e “poru”, homem que come. Assim foi batizado o que se tornaria o quadro mais importante da arte brasileira.
Oswald usou o quadro como exemplo de sua proposta para a arte brasileira: ao invés de imitar os europeus, como se fazia até então, procurar uma arte nacional através da assimilação de vários elementos e reinvenção dos mesmos.
Quando o casal se separou, Tarsila quis ficar com o quadro – e ofereceu para Oswald um outro quadro seu, na época mais valioso.
Conforme participava de exposições no Brasil e no exterior, Abapuru foi ganhando fama.
Nos anos 1960, Tarsila vendeu o quadro para o crítico de arte  Pietro Maria Bardi, fundador do MASP. Sua ideia era que o quadro passasse a integrar o acervo do Museu. Mas Bardi preferiu ganhar dinheiro. O quadro foi vendido e revendido, tornando-se mais valioso a cada ano, até ir parar nas mãos de um colecionar argentino, que o colocou no acervo de um museu de Buenos Aires.
A volta do quadro para o Brasil em 2019, em uma exposição temporária no MASP, levou uma verdadeira multidão para o museu (foi quando tirei essa foto).
Uma curiosidade é que o quadro surge depois de uma visita do casal Tarsila-Oswald para as cidades históricas de Minas Gerais. Tarsila ficou encantada com a cultura local, principalmente as cores e passou a incorporá-la nas suas pinturas. Há um depoimento dela segundo o qual ao estudar na Europa ela aprendeu que as cores vivas eram feias e deviam ser evitadas, e depois dessa visita a Minas ela deixou de se envergonhar de usá-las em seus quadros.
Aliás, essa proposta lembra muito as ideias de um amigo do casal, Monteiro Lobato, segundo o qual os artistas brasileiros deveriam deixar de simplesmente imitar os europeus e buscar em nossas raízes populares o norte para uma arte brasileira.  

Batman – Gotham 1889

 


 

Lançado no ano de 1989, Gotham By Gaslight: An Alternative History of The Batman trazia uma proposta interessante: o cavaleiro das trevas lutando contra Jack, o estripador, em pleno século XIX.

O nome da série era uma referência aos lampiões de gás que iluminavam as ruas antes da popularização das lâmpadas elétricas.

Dificilmente poderia ser encontrado um artista melhor do que Mike Mignola para desenhar uma história desse tipo. Seu traço repleto de sombras e contrastes casava perfeitamente com a narrativa sombria e vintage.



O roteiro também tinha uma abordagem interessante: mostrava Bruce Wayne contando a Freud um sonho recorrente, o que servia de desculpa para o roteirista contar ao leitor a forma como os pais do herói haviam morrido. Durante anos o milionário vagara pela Europa conhecendo os principais gênios da época, do criador da psicanálise ao detetive Sherlock Holmes. Depois dessa longa preparação, ele volta para Ghotam City, onde estão acontecendo diversos assassinatos de mulheres, repetindo o que aconteceu na Inglaterra. 

A história traz referências a outros aspectos do universo do morcego, como quando o inspetor Gordon mostra a Wayne o retrato de um homem que acabara de prender: um psicopata que matava mulheres ricas com estricnina e que tentara se matar com o veneno, o que lhe provocara um eterno sorriso. Era um Coringa desse universo.

Um outro aspecto interessante da narrativa era usar recortes de jornais e até um cartão postal para ajudar a contar a história.

Era, portanto, uma HQ que prometia muito, mas entrega pouco. Apesar de toda a propalada capacidade dedutiva de Bruce Wayne, ele resolve o caso apenas por estar, sem explicação, no lugar certo, na hora certa.

No final, a história valia mesmo pelo visual incrível de Mignola.

No Brasil essa história foi renomeada de Gotham 1889 tanto pela Abril quanto pela Panini, que a republicou no ano de 2018.  

Bom dia, Verônica

 


Bom dia, Verônica, série brasileira da Netflix, é uma das melhores surpresas do ano, especialmente para quem gosta de histórias de suspense.

A série é baseada no livro homônimo de Ilana Casoy e Raphael Montes. Ilana é autora de dois livros sobre psicopatas, o que por si só já é um bom crédito para uma série sobre um serial killer.

Na história, uma escrivã de polícia acaba se deparando com um caso de um assassino serial quando a esposa desse liga para a delegacia. O que parecia apenas um caso de violência doméstica se revela algo muito mais aterrador: o psicopata usava a esposa para aliciar mulheres, todas vinda do Maranhão,  com a promessa de emprego. As mulheres são depois torturadas e mortas enquanto a esposa é obrigada a assistir pelos buracos de uma caixa de madeira colocada em sua cabeça.

O grande problema é que o assassino é também um tenente coronel da polícia e parece estar envolvido com um grupo infiltrado nas forças de segurança (embora não esteja claro do que se trata esse grupo é possível especular que se trata de um tipo de milícia). Não bastasse os próprios perigos relacionados a uma investigação de um serial killer se mistura mais esse: em quem confiar? Quem poderia ajudar na investigação e quem poderia na verdade repassar informações para o assassino, colocando não só a vida da escrivã, mas também sua família em perigo? Para piorar, tudo leva a crer que o pai da protagonista foi vítima desse mesmo grupo.

Soma-se a isso o cotidiano da própria esposa abusada tentando sobreviver na convivência com um homem extremamente violento que pode matá-la a qualquer momento.

Tudo isso constrói um clima de eterno suspense, deixando o leitor sempre no fio da navalha.

Direção e roteiros são extremamente competentes ao criar esse clima tenso, mas o grande atrativo mesmo é o elenco. Tainá Müller mostra que é muito mais do que um rosto bonito e magnetiza o leitor com sua interpretação da escrivã tanto em cenas de ação quanto em cenas mais intimistas. Camila Morgado e Eduardo Moscovis dão um show no papel, respectivamente, da esposa e do serial killer. As cenas cotidianas dos dois, por mais banais que sejam, como um simples jantar, são altamente carregadas de tensão. Um gesto de carinho pode esconder uma violência e um sorriso pode ser uma simples máscara para um drama intenso. A dinâmica entre os dois atores é tão perfeita que esses papéis marcarão a carreira dos dois.

Infelizmente nem tudo é explicado. Não sabemos, por exemplo, porque o serial killer só mata mulheres vindas do Maranhão ou qual a relação disso com sua mãe. É possível que a segunda temporada explique melhor esses temas.

Mas atenção: bom dia verônica é uma série pesada. Não é para todos os públicos. 

quarta-feira, novembro 29, 2023

Feliz Natal!

 


A arte zen de Katsushika Hokusai

 


Katsushika Hokusai  é um artista japonês especializado em xilogravura (com a matriz feita em madeira). Ele ficou mundialmente conhecido por sua gravura “A grande onda de Kanagawa”, talvez a arte oriental mais famosa do mundo. Além do detalhismo e da predominância das formas curvas (difíceis de serem realizadas na xilogravura), o quadro expressa perfeitamente a filosofia de eterna mudança do zen budismo e do taoismo. Confira outros trabalhos desse incrível gravador. 










Uma história de Saravejo

 


Entre os anos de 1992 e 1995 a Bósnia foi palco de uma sangrenta guerra étnica. Saravejo, uma cidade até então símbolo de tolerância, tornou-se o centro sangrento de um conflito em que um civil poderia ter seus bens expropriados ou até ser morto apenas por pertencer à etnia errada.

É esse conflito que Joe Sacco narra em Uma história de Saravejo, publicado no Brasil pela Conrad em 2005.

O principal informante de Sacco é Neven, um veterano que atuou em uma das milícias que defenderam a capital contra os sérvios. O álbum todo é costurado em torno da figura de Neven. Ele mente para Sacco, o explora, inventa histórias, arranja informantes que no final não sabem nada sobre a guerra, mas querem dinheiro. Mesmo assim, acaba sendo útil por mostrar o quanto a guerra foi dúbia e o tipo de pessoa que se envolveu nela.

Neven mostra também como Saravejo ficou repleta de ex-combatentes, pessoas que haviam acostumado a matar e não sabiam fazer outra coisa. O apartamento de Neven, totalmente caótico e repleto de lixo espalhado por todos os lugares é a perfeita definição visual de Saravejo no pós-guerra.

A guerra teve início com a desintegração das repúblicas comunistas no pós-queda do muro de Berlim. Na Bósnia, o partido nacionalista sérvio organizou grupos paramilitares para expulsar os não sérvios e se unir à Sérvia. O governo bósnio tinha sido obrigado a entregar suas armas para o Exército Popular da Iuguslávia. Quando os sérvios começaram a atacar Saravejo, só quem podia defender a cidade eram grupos paramilitares, verdadeiras gangues lideradas por bandidos e até por um cantor pop.

Essas gangues defendiam a cidade, mas também tocavam o terror. Podiam entrar na casa de alguém e confiscá-la. Matavam cidadãos de descendência sérvia. Sequestravam civis para cavarem trincheiras, uma atividade extremamente perigosa num local repleto de franco-atiradores. Chegou num ponto em que o próprio governo Bósnio, que finalmente conseguira montar um exército, teve que dar um basta.

Joe Sacco não só conta a história, mas também faz o perfil de cada um dos líderes de guanges, que se tornaram verdadeiros astros pop. Entre eles o surpreendente caso de Jusuf Prazina Aka Juka, um bandido que fora atingido num tiroteio antes da guerra e andava com muletas. Mesmo com a dificuldade de movimento, era um dos mais cruéis e mais populares, conquistando a admiração de milhares de fãs e seguidores, que embarcavam com ele nessa jornada de sangue e atrocidades.

É essa guerra sem mocinhos que Joe Sacco narra em seu álbum.

Batman – A saga de Hugo Strange

 

Publicada pela editora Abril em Super Powers 4, a saga de Hugo Strange marcou uma geração de leitores.

Com roteiro de Gerry Conway e desenhos de Don Newton, a história era continuação de uma trama anterior, na qual um mafioso elege o prefeito e o comissário e, aparentemente mata Hugo Strange tentando conseguir dele a informação sobre a identidade secreta do Batman.

A história começa com o mafioso sendo atormentado pelo fantasma de Strange, numa sequência genial (a arte-final de Alfredo Alcala ajuda muito no efeito). 


O texto diz: “Seu nome é Rupert Thorne, e porque controla o prefeito você é o homem mais poderoso de Gotham. Então por que você se esconde em seu quarto, morrendo de medo? Por que estremece com uma simples batida na porta? Afinal, você não é o chefe Thorne, aquele que tem o domínio sobre os políticos de Gotham? Não há nenhum homem vivo que possa prejudicá-lo. É exatamente isso que o aterroriza... nenhum homem vivo...” e quando ele abre a porta, vemos o fantasma de Strange vestido como Batman.

Uma sequência sem duvida nenhuma impressionante. Pena que o resto não siga o mesmo padrão.

Na sequência, Batman ajuda um bandido a fugir, vira fora-da-lei, é caçado pela polícia, leva um tiro nas costas, mas tudo se resolve facilmente. Incrível como os criminosos se auto-incriminam e como ajudar alguém a fugir da prisão pode deixar de ser crime se você for o Batman.

Resolvida essa parte da trama, começa a parte interessante. Strange não morreu. Ele volta e começa a atormentar Bruce Wayne com uma falsa mansão Wayne. Heróis atormentados por vilões enlouquecidos podem dar origem a grandes histórias. Que o diga JM De Matteis em A última caçada de Kraven. Mas aqui, de novo, as boas ideias não se realizam. Strange é pouco desenvolvido e sua loucura pouco explorada. Além disso, as solução para os falsos Robins e falsos Alfreds é preguiçosa: são robôs.

Enfim, uma saga de ótimas ideias mal-aproveitadas.

Catálogo do exposição Tesouros da Grafipar

 

A Grafipar foi uma das maiores editoras do Brasil entre o final dos anos 1970 e início dos anos 1980. Sua produção de quadrinhos eróticos desafiavam a censura da época sem cair na pornografia, misturando o erotismo a outros gêneros, como terror, aventura e ficção científica. A exposição Tesouros da Grafipar teve curadoria de José Aguiar e foi apresentada na Gibicon, em 2012. O cartaz da exposição foi realizado por Gustavo Machado, um veterano da Grafipar e tem a genialidade das melhores pin-ups: é sensual, sem mostrar muita coisa. A loira é Maria Erótica, criação de Cláudio Seto, coordenador editorial de quadrinhos da Grafipar, que aparece ao fundo, ao lado de uma barraca da feirinha de Curitiba. A exposição contou com um catálogo e colaborei com um texto contando a história da editora. Além dos quadrinhos selecionados, a publicação também trazia textos de Gonçalo Júnior, José Aguiar, Franco de Rosa e Faruk El-Khatib, dono da Grafipar.

Informação relevante

 


“Como faço para conservar meu casamento?”; “De que maneira posso me tornar mais feliz?”; “O que posso fazer para que formigas não ataquem minhas flores?”; ”Que tipo de filme devo assistir no final de semana?”; "Qual o melhor local para viajar no final de semana?".
              Essas são perguntas que dificilmente serão respondidas consultando-se um catálogo de biblioteca. No entanto, são perguntas importantes para as pessoas. As respostas a essas perguntas fazem parte do universo relevante.
              Esse é o tipo de informação que não se encontra em bibliotecas ou na educação formal (muitas bibliotecas talvez contenham essas respostas, mas a organização dos catálogos, essencialmente classificadora, torna quase impossível encontra-las).
              Geralmente essas notícias são fornecidas por amigos ou conhecidos. Se quero viajar no final de semana e não sei para onde ir, é mais prático pedir sugestão a um amigo do que consultar uma biblioteca ou um site.
              O cérebro humano lida melhor com a informação relevante do que qualquer computador ou biblioteca. Para uma pessoa que viaja muito, lembrar-se de locais agradáveis é uma informação muito relevante e, portanto de fácil recuperação.
              Embora nossa cultura dê pouca importância ao universo relevante, ele é de grande importância.
              Na verdade, o universo classificador está tão entranhado em nosso pensamento que a própria divisão de informação classificador, relevante e relacional tem como base o universo classificador.
              Entrentanto, o desenvolvimento da inteligência artificial só pode ocorrer se for construída uma máquina capaz de processar os três tipos de informação.

Perry Rhodan 68 – A caça das dimensões

 


 Um  artifício criado pelos autores da série Perry Rhodan para fazer com que a série atravessasse vários ciclos, com séculos transcorrendo, foi providenciar uma forma do protagonista ser imortal. E essa forma foi a ducha celular do Planeta Peregrino, à qual ele deveria se submeter a cada 72 anos.

No número 68 da série, chegou a época da ducha, mas o Planeta Peregrino simplesmente desapareceu. Tudo leva a crer que ele foi tragado pela dimensão dos druufs, o que faz com que Rhodan seja obrigado a atravessar para tentar salvá-los.

Embora não chegue a ser um livro ruim, esse é um episódio de pouco encanto.

Não havia muita história para ser contada, o que fez com que Kurt Mahr colocasse páginas e mais páginas de detalhes técnicos e de teorias científicas sobre o encontro das duas dimensões temporais. Talvez seja um defeito meu de conhecimento de matemática, mas boa parte delas me parece furada. Quando os druufs sequestram a nave dos terranos, Rhodan consegue facilmente se apoderar da nave usando a “inversão de causa e efeito”, em que algo que é efeito ocorreria antes daquilo que o causou. Talvez alguém mais versado em física ou matemática consiga me dizer que se isso faz sentido.

A capa alemã. 


Há alguns aspectos curiosos, como o trecho relacionado à temperatura. Quando os humanos são colocados na dimensão dos druufs, mais lenta, a temperatura de repente aumenta: “O que é a temperatura? Apenas a medida da velocidade média das moléculas. É claro que agora as mesmas se movem com maior rapidez que antes e assim a temperatura tem de subir abruptamente no momento em que as duas dimensões temporais se igualam”.

Há um problema, apresentado nos primeiros livros em que humanos foram para a dimensão dos druffs: se alguém entra na dimensão deles, um segundo dura dias na nossa dimensão, de modo que dias lá podem representar anos na nossa dimensão. Essse detalhe é ignorado no livro, já que Rhodan volta para nossa dimensão e o tempo se passou igualmente ao deles na outra dimensão.

Para piorar, no final descobre-se que o Planeta Peregrino, depois de ter sido tragado, simplesmente atravessou em outro ponto de volta para nossa dimensão, de modo que a missão de salvamento de Rhodan parece ter sido totalmente inútil.

Jornada nas estrelas - Réquiem para Matusalém

 

Nos ultimos dias da série Jornada nas Estrelas  a falta de recursos fazia com que surgissem roteiros muito interessantes que se passavam e um único cenário ou pouquissimos cenários. Nessa categoria se inclui Réquiem para Matusalém, episódio escrito por Jerome Bixby e dirigido por Murray Golden. 

Na história, a tripulação da Enterprise está sendo afetada pela febre rigeliana, cujo unico antídoto é o mineral ryettalyn. kirk, spock e mccoy descem num planeta desabitado em busca da substância, mas são surpreendidos por um robô (na verdade, um mecanismo nitidamente pendurado em um fio) e pelo seu mestre, um homem chamado Flint. Apesar de um estranhamento inicial, Flint acaba aceitando abrigar o grupo enquanto o robô procura e processsa o mineral.

Mas há algo estranho acontecendo. O local onde ele mora é ornamentado por quadros de Leonardo da Vinci que nunca foram pintados por ele, além de outras preciosidades. Além disso, ali habita uma jovem que diz ter abrigado após a morte os pais. A relação entre os dois fica entre o amor paternal e o amor romantico. A situação se complica quando a moça se apaixona por Kirky. 

Esse tema, que parece ter sido levementte inspirado em A tempesttade, de Shakespeare, serve parra diversas reflexões, entre elas, uma das mais importantes da série: o que é a humanidade. 

Alguns críticos têm destacado o comportamento estranho de kirk no episódio, a começar pelo ccomeço agressivo ccom Flint até o final, em que ele faz o papel do apaixonado brigando com outro pelo amor de uma mulher. A mudança no comportamento de flint, que inicialmente nãoo quer os terrestres no local e depois atrasa a entrega do medicamento para segura-los lá também parece estranha. Entretanto, os diálogos e interpretações sãao tão bons que acabamos esquecendo os problemas e nos concentrando nos meandros dessa trama sobre um homem imortal.  

terça-feira, novembro 28, 2023

Aldebaran, de Leo

 

Aldebaran é talvez o melhor exemplo de HQ em que a trama é toda desenvolvida a partir da ambientação. A série, criada pelo brasileiro Luiz Eduardo Oliveira, o Leo, é campeã de vendas na Europa e considerada uma das melhores séries de fantasia e ficção de todos os tempos.
Leo nasceu no Rio de Janeiroe, em 1944. Em 1971 fugiu do Brasil para escapar da repressão do regime militar. Foi para o Chile, Argentina até voltar para o Brasil, onde trabalhou com publicidade. Sua primeira HQ foi uma história de ficção-científica publicada na revista O Bicho. No final da década de 1970 conhece a revista Metal Hurlant, que teria forte influência sobre seu trabalho, e resolve tentar a sorte na França. Depois de anos publicando pequenas histórias em revistas como a L'Echo des savanes e Pilote, em 1991, a convite do escritor Rodolphe, começa a desenhar a série Trent, de grande sucesso.
As boas vendas lhe permitem lançar sua própria série. É quando surge Aldebaran.

A história se passa em um planeta marítimo colonizado por humanos. Mas, depois da primeira expedição, a colônica perde o contato com a Terra. Assim, Aldebaran fica totalmente isolada e passa a ser governada por uma ditadura militar-religiosa, que, entre outras coisas, força detentas a engravidarem para ajudar a povoar a colônia. Uma nova lei pretende obrigar todas as mulheres a engravidarem a partir dos 17 anos. A música é proibida e músicos são obrigados a se esconderem.
A história começa em uma pequena vila de pescadores onde começam a ocorrer fenômenos estranhos. Os peixes desaparecem. Um Nestor (uma espécie de baleia com braços) encalha na praia. Pescadores encontram na superfície um peixe das profundezas. Finalmente, o mar se transforma em uma espécie de gelatina e destrói uma vila de pescadores. Um homem misterioso parece saber o que está acontecendo e, ao se envolverem com ele, dois sobrevintes passam a ser perseguidos pelos militares.

Além da ótima trama e dos desenhos para lá de competentes, Aldebaran chama atenção especialmente pela forma como Leo cria toda uma ambientação alienígena e como a trama gira em torno dessa ambientação. A criatividade do quadrinista para criar visualmente e conceitualmente a flora e a fauna de Aldebaran, por exemplo, é impressionante. Um exemplo: o polvo da areia é capaz de mimetizar a forma de animais para atraí-los e capturá-los com seus tentáculos espalhados sob a areia. Ou as caravelas, animais flutuantes que produzem gás hélio usado pelos humanos em dirigíveis. Aliás, a própria Matrisse, o animal misterioso que parece estar por trás de todos os fenômenos estranhos, é um exemplo da complexidade dessa composição de cenário.

Junte a isso personagens cativantes, tridimensionais, como o trapaceiro Pad, e temos uma HQ obrigatória para todo fã de ficção científica.
A série, composta de cinco volumes, fez tanto sucesso que ganhou duas sequências, Betelgeuse e Antares. No Brasil a série foi publicada pela Panini até a segunda parte, Betelgeuse. Antares continua inédita entre nós.
Clique aqui para baixar os scans.