Assim como Ana Terra, Rodrigo Cambará se tornou um personagem tão popular da trilogia O tempo e o vento, de Érico Veríssimo, que, de capítulo, passou a ser publicado como livro solo.
Sua primeira aparição é marcante tanto pela descrição acurada de Veríssimo quanto pelos ótimos diálogos: “Toda gente tinha achado estranha a maneira como o Cap. Rodrigo Cambará entrara na vila de Santa Fé”. Ele tinha vindo ninguém sabia de onde, com seu chapéu puxado para a nuca, a cabeça altivamente erguida, o olhar de gavião que irritava e ao mesmo tempo fascinava. Trazia um violão a tiracolo e uma espada apresilhada aos arreios. O lenço encarnado que trazia ao pescoço esvoaçava no ar como uma bandeira.
- Buenas e me espalho! Nos pequenos dou de prancha e nos grandes dou de malho! – diz ele, ao entrar na venda local.
O personagem cria ao mesmo tempo estranhamento e fascínio e vai, aos poucos, conquistando todos na cidade, a começar por Juvenal Terra, neto de Ana Terra, que num primeiro momento desafia o recém-chegado, mas logo se torna seu amigo.
Toda a trama do livro se desenvolve a partir de uma mudança no Capitão. Ele se apaixona por Bibiana Terra e resolve ficar na vila, contrariando sua natureza aventureira. Claro que esse romance irá enfrentar muitas dificuldades, a começar pelo pai da moça, Pedro Terra, que o odeia, e pelos Amarais, que mandam no local e cujo mais moço, Bento, quer a mão da moça mais bonita de Santa Fé. A garota, entretanto, é apaixonada pelo forasteiro. “O vício dela era Rodrigo”, escreve Veríssimo.
Apesar da trama relativamente doméstica na maior parte (na parte final, estoura a revolução farroupilha), é um livro que prende o leitor tanto pela personalidae carismática do protagonista quanto pelo texto de Veríssimo, que nos serve uma verdadeira aula de narrativa em que simbologias se sobrepõe.
À certa altura, por exemplo, a filha do casal está doente, mas o Capitão está na mesa de carteado. Vão avisá-lo, mas ele se nega a sair. “Escutou o vento. Sua filha está muito mal”. O vento aqui é uma simbologia feminina, algo que já havia sido explorado desde o capítulo sobre Ana Terra. Quando o capitão resolve finalmente ir para a casa, Veríssimo escreve: “Enfiou o poncho e saiu. A ventania esbofeteou-lhe a cara e ele começou a caminhar lentamente no rumo de casa”.
Se o vento é uma simbologia feminina, o tempo é uma simbologia masculina, assim como a guerra: “Um dia a guerra vem. Tudo se resolve. A guerra e o tempo. Remédio pra tudo”. Enquanto o tempo tudo cura, o vento tudo leva.
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