sexta-feira, janeiro 31, 2025

Fundo do baú - Matraca Trica e Fofoquinha

 


Matraca Trica e Fofoquinha (Breezly and Sneezly no original) é mais um dos desenhos animados da Hanna-Barbera que junta um personagem alto supostamente esperto e um ajudante baixinho que o idolatra. No caso temo um urso polar, Matraca Trica e uma foca que vive gripada e espirrando, Fofoquinha.

A maioria das histórias gira em torno das tentativas de Matraca de entrar no quartel comandado pelo coronel Mandragão. As tentativas sempre terminam em muita confusão, para desespero do coronel.

Em um dos episódios, Matraca compra uma geladeira (“Não consigo resistir à lábia de um vendedor”) e quer entrar no quartel para ligar o aparelho. Claro que o coronel descobre o plano e coloca os dois para correr – e eles vão se esconder exatamente no campo de tiro para tanques, quase sempre se posicionando dentro ou atrás de algum alvo.

Lançado no ano de 1964, o desenho teve 23 episódios produzidos.

Jornada nas estrelas – O sucessor

 


O sucessor é um episódio da segunda temporada de Jornada nas estrelas exibido em 1967. Escrito por DC Fontana, o episódio explora uma abordagem característica do seriado: sem tecnologia ou dinheiro para mostrar alienígenas verossimilhantes, Jornada apresentava ETs humanoides e trabalhava as distinções culturais.

Na trama, a Entreprise é enviada para conseguir um acordo de mineração com um planeta guerreiro. O minério em questão é essencial para a Federação, mas Kirk descobre que sua tarefa pode não ser tão fácil quando encontra um klingon no planeta, tentando conseguir para seu povo os direitos de mineração.

Antes que o governante local, Maab, decida quem terá os direitos de mineração, ele sofre um golpe de estado. Ao mesmo tempo, uma nave klingon afasta a enterprise com uma falsa mensagem de um cargueiro terrestre em perigo.

Kirk, McCoy e Spock fogem da vila com a viúva do chefe deposto. Ela está grávida e seu filho pode ser o novo governante do planeta, caso sobreviva.

A sociedade capelana, essencialmente guerreira, privilegia essencialmente a honra de batalha. Se um chefe é deposto, seu filho e sua esposa devem ser mortos e fazer isso com honra. Por outro lado, se um homem toca em uma mulher, isso pode provocar uma reação de vingança de seus parentes, que não descansariam enquanto não matassem a pessoa que a desonrou. Então imagine McCoy tentando salvar uma mulher prestes da dar à luz, mas que não admite ser tocada.

Aliás, McCoy é a grande estrela do episódio. A maneira como ele contorna essa dificuldade, e o que isso provoca é boa parte do charme da história. Nesse episódio ele solta mais uma de suas famosas pérolas: “Eu sou um médico, não um alpinista!”.

De negativo, alguns comportamentos estranhos por parte de alguns personagens. À certa altura, por exemplo, Kirk atira uma flecha na perna do klingon sem nenhuma razão suficiente. Aparentemente a situação foi colocada ali apenas para que o episódio tivesse a obrigatória batalha de toda história.

Receita de bolo de laranja

 

INGREDIENTES

MODO DE PREPARO

  1. Bata no liquidificador os ovos, o açúcar, o óleo, o suco e a casca da laranja.
  2. Passe para uma tigela e acrescente a farinha de trigo e o fermento.
  3. Leve para assar em uma forma com furo central, untada e enfarinhada, por mais ou menos 30 minutos.
  4. Desenforme o bolo e molhe com suco de laranja.

Afuá – a Veneza marajoara

 


Afuá é uma cidade singular. Localizada na área norte da ilha do Marajó, foi toda construída sobre palafitas, já que a região alaga durante a cheia dos rios da região. Essa característica, de ser uma cidade sobre palafitas, fez com que fossem proibidos carros e motos, de maneira que a bicicleta que se tornou o principal veículo de transporte.

A população local é simplesmente apaixonada por bicicletas a ponto de gastar até 10 mil reais em customizações.

Criado por um morador local chamado Sarito na década de 1990, o bicitaxi se tornou uma sensação. Serve não só para levar pessoas que chegam de viagem para hotéis ou suas casas, mas também para passeios turísticos. Uma volta completa pela cidade custa em média 30 reais para três pessoas.

Outra opção é alugar bicicleta individual. O restaurante Barriga Cheia aluga bicicletas com preço médio de três reais a hora, ou 20 reais 24 horas. A cidade é muito arrumadinha, limpa, sem som alto, de modo que tanto o passeio de bicitaxi quando de bicicleta torna-se uma ótima diversão em família.

Para os mais aventureiros, uma boa opção é conhecer a Muralha.

Trata-se de uma samaúma antiguíssima, cujas raízes, acima de terra, chegam a mais de dois metros de altura. Das samaúmas que já vi essa é a maior, o que mostra o quanto é antiga.

O transporte para o local é feito via barco no porto da Emapa. A travessia é gratuita, mas é bom contar com moradores locais para ir até a samaúma, no meio da mata. Quando fomos, algumas crianças nos acompanharam. Reserve algum dinheiro para dar para elas.  

Afuá fica muito próxima de Macapá, cerca de duas horas por lancha. A passagem custa 60 reais.

Nós ficamos no hotel Dias (91-91495868), que, dizem, é o melhor da cidade. A diária lá era de 110 reais o casal. Mas existem vários outros hotéis e pousadas.

Até a ambulância é bicicleta. 

Os bicitaxis são uma atração local. 


Até os policiais andam de bicicleta em Afuá. 

Os moradores chegam a gastar até 10 mil reais na customização das bicicletas. 

A igreja local é belíssima e vale a visita. 

Toda casa tem pelo menos uma bicicleta na garagem. 

A muralha provavelmente é uma das maiores samaúmas da Amazônia. 


Existe também a opção de alugar uma bicicleta individual. 

Perry Rhodan – Os embaixadores de Aurigel

 

 

É muito irônico que, ali pelo número 70 da série Perry Rhodan, os melhores livros não fossem focados nos personagens principais, mas sim em uma trama paralela com personagens secundários.

Exemplo disso é Os embaixadores de Aurigel, número 72, cuja trama é centrada nos colonos do planeta Fera Cinzenta. Escrito por Kur Mahr (que parecia gostar muito dessa linha narrativa, já que escreveu todos os livros sobre esse planeta), o livro começa após os colonos terem conseguido sair da escravidão a que haviam sido submetidos por alienígenas, os peepsies.

Nesse número específico, eles conseguem montar uma nave e ir para o planeta dos alienígenas (não fica muito claro o objetivo, mas aparentemente a ideia é dar a entender que havia um outro povo, mais poderoso nas proximidades, tirando o foco dos colonos).



Mahr se preocupa em criar uma cultura para os peepsies, incluindo um padrão para os nomes: Sey-Wee, Uju-Riel, Iij-Juur-Eeelie. Até mesmo locais, como o planeta Fera Cinzenta, ganhavam um equivalente nesse padrão: Weelie-Wee. Isso inclui até mesmo a forma como os peepsies pronunciam os nomes doa terranos. Chellich, por exemplo, vira Tchee-Lich. É muito claro que o escritor, até então especializado nas questões técnicas, tinha um carinho tão especial por essa linha narrativa que se dava ao trabalho de desenvolver questões linguísticas.

Embora o plano dos colonos fosse meio nebuloso e talvez impraticável, Mahr desenvolve bem a trama e dá um jeito para que tudo pareça verossímil, incluindo uma reviravolta final.

Os embaixadores de Aurigel é um livro divertido, uma boa aventura, cuja leitura passa rapidamente, ao contrário de vários outros dessa mesma fase.

Miracleman – Dragões

 

O principal tema da série Miracleman é sobre como o poder corrompe e como o poder absoluto corrompe absolutamente. E esse tema é sintetizado no Kid Miraclean, que aparece pela primeira vez na terceira HQ da série (lembrando que cada história tinha apenas seis páginas).

Na trama, Johnny, ao ver na TV a aparição de Miracleman, resolve ligar para ele. Johnny não só sobreviveu à bomba nuclear, como se tornou um executivo de uma grande empresa.

Kid Miracleman se revela. Uma das cenas mais aterrorizantes dos quadrinhos de super-heróis. 

Mas Mike Moran tem uma suspeita: “E se ele estiver mentindo? Ele ainda fosse Kid Miracleman? Poderia ser Kid Miracleman para sempre, poderia ter tudo, dinheiro, prestígio, fama... poder cortar os laços com a humanidade. Poderia se tornar impiedoso, imbatível, totalmente corrupto. Foi assim, John ? Assim que aconteceu?”.

Sim, era exatamente isso que tinha acontecido... e a verdade se revela num quadro aterrorizante, em que o vilão simplesmente flutua no ar, no meio de relâmpagos.

O vilão não voa, flutua. 

Apesar da imagem, nós só compreendemos a que nível chegou seu poder e como esse poder o corrompeu quando ele persegue a mulher de Mike Moran. Ele simplesmente caminha no ar, como se estivesse flutuando. No caminho, encontra com uma secretária, que está trazendo o café e a mata. “O nome dela é Stephanie. Ela gosta de Adam and the ants. O nome de seu namorado é Brian. Ela coleciona cerâmicas. Suas entranhas se liquefazem. Ela é apenas humana”.

Alan Moore e Garry Leach com essa sequência reinventam toda a dinâmica visual dos super-heróis. Até então, o que tínhamos era personagens voando. Mas, se o super-homem não tem asas, ele de fato não voa, ele flutua, é a conclusão lógica.

Kid Miracleman não tem mais nenhuma compaixão. 


Kid Miracleman flutua, como se a gravidade não o afetasse, como se estivesse muito acima até mesmo das leis da natureza.

Mais à frente, no embate final entre Miracleman e Kid Miracleman, a narrativa de Moore é visceral, mostrando os super-humanos como seres acima da humanidade: “Há paixão aqui, mas não a paixão humana. Há emoções intensas e desesperadas, mas não sentimentos que reconheceríamos... eles são titãs e nós jamais compreenderemos o ínferno alienígena que arde na fornalha de suas almas. Nós somos apenas humanos”.  

quinta-feira, janeiro 30, 2025

Jornada nas estrelas - Todos os nossos ontens

 

 

Todos os nossos ontens, episódio da terceira temporada de Jornada nas Estrelas, mostra uma perspectiva interessante das viagens no tempo. 

Na trama, e Enterprise chega a um planeta cujo sol irá se transformar em uma supernova. Os habitantes locais não conhecem a navegação espacial, mas de alguma forma o planeta foi evacuado. Kirk, Spock e McCoy, no entanto, encontram uma biblioteca e um bibliotecário. Enquanto consultam os arquivos para entender o que aconteceu no local, Kirk ouve uma mulher gritando e vai em seu socorro. Acaba se deparando com um local que parece uma versão de uma Inglaterra do séc XVII. Ao tentar alcancá-lo, McCoy e Spock vão parar em era glacial há milhares de anos. 

Assim descobrimos o que aconteceu aos habitantes do planeta: eles foram enviados para o passado. 

É muito forçado o passado do planeta ser exatamente igual ao passado da terra. Mesmo com a teoria da evolução paralela de Gene Roddenberry, as chances da história ser exatamente igual à terrestre seria zero, principalmente hoje com as descobertas da teoria do caos. Qualquer mínima alteração mudaria completamente o curso da história. 

Apesar disso, há muitos méritos no episódio. O primeiro deles, como dito antes a visão curiosa sobre viagens no tempo. Em tempo: no início do episódio eu cheguei a considerar que os habitantes do planeta haviam sido enviados a livros de ficção, o que também seria uma ideia interessante.

Mas o melhor mesmo é o núcleo McCoy Spock. Eles encontram uma garota enviada sozinha para o passado, que se apaixona por Spock. Surpreendente, Spock também se apaixona por ela, o que gera um conflito ético, já que as mudanças no organismo dela não permitem que ela saia daquela época. A explicação para o comportamento do vulcano é que a viagem no tempo fez aflorar nele o mesmo comportamento de seus antepassados. A situação gera ótimas situação de conflito interno e com McCoy. 

O episódio também se destaca por mostrar mais uma característica de Spock: ele é vegetariano.

Museu Monteiro Lobato

 

Tive a oportunidade de visitar o Museu Monteiro Lobato, no sítio do escritor, em Taubaté. É emocionante conhecer a casa em que Lobato escreveu alguns dos seus melhores textos, com destaque para o livro Urupês. Infelizmente há pouca informação sobre o escritor, faltam legendas, textos explicativos e principalmente material interativo e audio-visual (vídeos, áudios etc). Para alguém revolucionário como Lobato, o museu parece bastante conservador. Entretanto, vale a visita (se estiver com crianças, há apresentações teatrais nos finais de semana). Se passar por Taubaté, não deixe de conhecer o Museu, que fica praticamente no centro da cidade. Confira as fotos. 
Há várias estátuas dos personagens espalhadas pela área do Museu. 

A casa-sede da fazenda do Lobato, agora sede do Museu. 





Certidão de batismo e de óbito do escritor. 


Uma das poucas salas com cara de museu moderno, dedicada às pinturas do escritor. 

Algumas das edições mais antigas de livros de Lobato (tenho a maioria dessas edições)



Mickey – a lâmpada maravilhosa

 


Geralmente quando pensamos em quadrinhos Disney, o que nos vem à mente são as memoráveis HQs com patos de autoria de Carl Barks. Mickey dificilmente parece ter histórias à mesma altura. Entretanto, o personagem teve um autor, Floyd Gottfredson, que criou algumas tiras realmente divertidas nas tiras nos anos 30 e 40. É provável que eu estivesse lendo os gibis errados, mas não lembro dessas HQs nas revistas da Abril. A editora, no entanto, supriu essa falha na coleção de álbuns Anos de ouro de Mickey.
Essas histórias eram publicadas em tiras de jornais e tinham uma dinâmica diversa das páginas dos gibis de Barks. Enquanto Barks tinha páginas inteiras para contar suas gags, Gottfredson precisava ser engraçado a cada tira. E ele, junto com os roteiristas, transformava isso numa infindável comédia de erros. Exemplo disso é a história “A lâmpada maravilhosa” publicada no segundo volume da coleção da Abril.
Na história, Minnie está obcecada por caríssimos objetos antigos. Para provar que ela não entende nada do assunto, Mickey compra num brechó uma lâmpada que pretende dar a ela como uma relíquia.
Ocorre que a lâmpada é verdadeira e abriga de fato um gênio. O problema é que o gênio entende tudo literalmente, o que provoca confusões em cima de confusões, extraindo humor de cada tira.
Mickey, para testar o gênio, pede que ele faça aparecer um coelho. Em seguida pede uma cabeça de repolho para o coelho. O gênio faz com que o animal tenha uma cabeça de repolho!
E isso é só o início de uma sucessão de erros que se estende por dezenas de tiras: quando Mickey diz que quer uma vida mais doce, o gênio enche a casa de açúcar; quando Mickey diz que vai dar uma festa dos diabos, o gênio faz aparecer o próprio demônio.
Finalmente, quando o protagonista aprende a controlar os poderes e fazer algo pelo bem da comunidade, ele transforma um aterro sanitário em vila residencial para pobres.
Mas o povo não aceita se mudar para lá porque fareja uma cilada, afinal ninguém dá nada de graça. Além disso, as autoridades se enfurecem com Mickey pois ele construiu a vila sobre um terreno público, sem autorização, e, aparentemente, usando mão-de-obra de outra cidade. É diversão a cada tira.  

O taoismo e a superação dos pares contrários

 

Muita gente conhece, e até usa o símbolo aí em cima, mas pouca gente realmente sabe o que ele significa. O tei-gi é a representação visual dos princípios do taoismo uma filosofia-religião chinesa. Os taoistas acreditavam que a vida estava em constante mudança. Nada é eterno, nada é para sempre, tudo está em cosntante transformação. 
Mas essa transformação se dá de forma cíclica e é o que a figura mostra. Ela é formada por duas partes, uma preta e outra branca. São os pares opostos, o yin e o yang: o masculino e feminino, o feio e o belo, o bom e mal. Normalmente, quando interpretamos o mundo, usamos os pares contrários: fulano é belo, fulano é feio, fulano é vitorioso, beltrano é um derrotado. Mas a figura nos mostra que devemos transcender essa visão limitada.

As formas preta e branca formam uma espécie de onda, como se fosse a água se movimentando. Isso simboliza a eterna mudança, base de toda a criação. Os pares opostos não estão estaques, mas em movimento. Uma mulher que hoje é bela amanhã pode se tornar feia. O que hoje é bem, pode ser o mal. O que hoje é prazer pode se tornar dor. A vitória pode se transformar em derrota. 
O tei-gi nos ensina que no auge da parte branca, temos um pequeno círculo preto, demonstrando que o máximo de um estágio é o começo do estágio seguinte. O auge do sucesso marca o início da decadência. O auge da derrota pode ser o início da vitória. Exemplo: no início da década de 1940, quando invadiram a Rússia, os nazistas viviam seu maior momento e parecia que eles eram invencíveis. Mas foi justamente nesse período que os rumos da guerra começaram a virar em favor dos aliados. 
Dessa forma, os pares opostos não são absolutos: o belo traz em si também o feio. O feio traz em si o belo. A imagem permite ver os pares opostos em uma perspectiva global e é o que faz o taoista, indo além deles. Assim, para o taoista, vitória e derrota são apenas dois lados da mesma moeda e não se deve apegar a nenhum deles, pois seria estar parado em um mundo de eterno movimento.

Crepúsculo dos deuses

 


A primeira vez que vi o filme Crepúsculo dos deuses foi numa sessão da TV Bandeirantes dedicada a filmes clássicos. Eu nem sabia quem era o diretor Billy Wilder e provavelmente nem mesmo o que era um filme noir. Mas fiquei magnetizado.

Billy Wilder, ao contrário de outros diretores, como John Ford, nunca foi conhecido pelo apuro técnico. Ele sempre se destacou pelos ótimos roteiros e pela narrativa envolvente. Mas em Crepúsculo dos deuses tudo é eficiente: a fotografia, os planos... cada take é perfeito em termos de composição. É nítido que Wilder sabia que essa seria sua obra prima e se esforçou ao máximo.

Na trama, um roteirista falido está fugindo de brutamontes que querem tomar seu carro por falta de pagamento quando se esconde na garagem de uma mansão antiga, em um bairro chique de Hollywood (daí o Sunset Boulevard do título original).

Ali mora uma atriz do cinema mudo, cuja carreira acabou com os filmes sonoros. A mulher acredita que ele é dono da funerária que irá cuidar do enterro do seu chimpanzé (um detalhe macabro que antecipa muito do que virá pela frente), mas ao descobrir que ele é um roteirista de cinema, o contrata para reescrever um roteiro escrito por ela. Ela acredita que esse roteiro será sua volta triunfal aos cinemas, mas na verdade, o roteiro é muito ruim e ela, além da voz estranha, ainda é considerada velha demais pelos estúdios (curiosamente, a personagem tem 50 anos, o que, na década de 1950 era considerado velhice).

O filme começa com um cadáver numa piscina. Na versão original era no necrotério. 


O que se estabelece aí é uma relação doentia que se anuncia, desde o primeiro momento, em tragédia. A personagem vive num mundo à parte, em uma casa cheia de retratos seus e assistindo diariamente seus próprios filmes no cinema particular.

Gloria Swanson, que interpreta a atriz decadente Norma Desmond, faz um trabalho espetacular. Sua atuação é forçada, em gestos e olhares, como se atriz do cinema mudo tivesse sido incapaz de distinguir realidade de ficção e estivesse vivendo como se vivesse num filme mundo. Swanson, aliás, é uma atriz que começou sua carreira em 1914, portanto na época do cinema mundo.

Wilder transformou seu filme em uma homenagem à primeira geração do cinema americano, incluindo no elenco atores famosos da época, como Buster Keaton, H. B. Warner e Anna Q. Nilsson, que aparecem em uma cena jogando cartas com a protagonista.  O diretor Cecil B. DeMille interpreta ele mesmo no filme. O diretor Erick von Stroheim, também um dos cineastas clássicos de Hollywood, interpreta o criado de Norma Desmond – posteriormente descobrimos que ele é um famoso diretor de cinema que largou a carreira para cuidar da atriz.

Norma Desmond vive em um mundo de fantasia, no qual ainda é uma estrela. 


O fato de todas essas estrelas terem aceitado participar do filme mostra como Crepúsculo dos Deuses já era considerado um clássico mesmo antes de ser lançado. De fato, ganhou três prêmios Oscar e na lista dos melhores filmes norte-americanos aparece entre os 20 primeiros.

Uma curiosidade é que Crepúsculo dos Deuses foi a única vez em que Wilder mexeu o roteiro. Ele era conhecido por seguir rigidamente seus roteiros, mas nesse caso teve que mudar tudo.

Na versão original, o filme começava num necrotério e o protagonista, já morto, se levantava e começava a contar sua história para outro defunto. Nas sessões de testes as pessoas gargalharam.

Wilder resolveu começar com o protagonista morto numa piscina enquanto uma voz em off narra a história. Nós só descobrimos que o narrador é o morto no final, o que deixou a narrativa muito mais interessante. Temos aqui um ótimo exemplo de como a narrativa em off pode ser usada de forma inteligente de forma a criar ainda mais camadas de significado, tornando o filme ainda mais denso. Aliás, provavelmente foi esse filme que sedimentou a narrativa em off como uma característica basilar do noir.

quarta-feira, janeiro 29, 2025

Nosso amigo extraordinário

 

  

O início de Nosso amigo extraordinário, filme de Marc Turtletaub, dá o tom da narrativa e toca nos principais temas da obra. Nós acompanhamos a rotina solitária do idoso Milton (interpretado por Ben Kingsley), que divide seu cotidiano entre a televisão, as poucas visitas da filha e as idas à câmara municipal, onde sempre faz as mesmas sugestões (mudar o lema da cidade e instalar uma faixa de pedestre em uma determinada rua), sem nunca ser atendido.

Essa rotina monótona é quebrada quando um disco voador cai em seu quintal e dele sai um ser extraterrestre. E aqui, aparece o principal tema da obra: a invisibilidade dos idosos. Quando Milton tenta avisar outras pessoas do que aconteceu, poucos ouvem, ninguém acredita nele e muitos passam a ver esse relato como uma demonstração de demência.

Incompreendido, Milton acaba achando compreensão de onde menos se poderia esperar: do extraterrestre.

Antes de continuar, vale destacar a caracterização do extraterrestre, quase tosca em um período como o nosso de grandes efeitos especiais. Trata-se, essencialmente, de um menino, ou mais provavelmente, uma menina, vestida com uma roupa, com nenhuma expressão facial e que não fala uma única palavra durante todo o filme.

Turtletaub parece ter feito isso de propósito, para nos lembrar que a força da ficção científica não está nos efeitos especiais espetaculares e caríssimos, mas no bom roteiro. Aliás, os piores momentos do filme são exatamente aqueles em que os efeitos especiais são mostrados, pois parecem pouco verossímeis diante dessa trama intimista.

Mesmo sem falar uma única palavra, o ser do outro espaço parece ouvir e entender Milton mais do que qualquer outro, inclusive a filha do idoso. Mais à frente, duas idosas acabam descobrindo o segredo de Milton e também entabulam amizade com o extraterrestre. As duas, aliás, já haviam aparecido na primeira cena, da câmara municipal, ambas apresentando propostas que jamais eram implementadas, o que demonstram que também não eram ouvidas.

Nosso amigo extraordinário é um filme sensível, que toca em um tema praticamente ignorado por Hollywood e o faz com competência.