Acabei de ler Desespero, de Stephen King. Não é o melhor do mestre, mas King, mesmo que quando é ruim, é muito melhor que a maioria dos escritores comerciais.
A trajetória desse autor é interessante: na década de 1970 ele escreveu alguns romances bons, como O Iluminado, Zona Morta e Carrie. Essa fase terror teve seu auge no livro Cemitério, que provavelmente é o livro mais apavorante já escrito. Mas o auge mesmo foi no início dos anos 1990, com o livro Corredor da Morte, hoje chamado de À espera de um milagre por causa do filme, um belo livro cujos elementos fantásticos só servem para destacar a humanidade dos personagens.
Dali em diante, ele parece estar pendendo mais e mais para a fantasia e perdeu muito do charme que tinha antes. Seu enredos se tornaram fantasiosos demais, no meu entender. O que poderia ser uma história de violência doméstica com toques de terror, em Insônia, vira uma batalha campal entre o bem e o mau.
Desespero segue essa linha mais fantasiosa, em que o fantástico toma mais espaço que a caracterização dos personagens (o que dificulta ao leitor criar empatia com os mesmos). Mas ainda assim é um livro gostoso de ler. Impossível de parar de ler parece ser um adjetivo que foi grudado na testa de King e esse livro não foge à regra.
Desespero é uma pequena cidade mineira nos EUA. Quando um casal passa por um placa onde há um gato morto pregado, esse é apenas o prenúncio que virá. Eles são em seguida parados por um policial imenso, que mata o homem e prende a mulher. Para quem começa a ler, parece apenas uma história de psicopata, mas depois se percebe que há muito mais coisas em jogo, com entidades ancestrais e malignas envolvidas. A narrativa vai retornando no tempo e contando a história de todas as outras pessoas que estão presas com Mary. Entres eles a família Carver, cujo garoto David é o personagem mais consistente de todo o livro, embora seja também o mais fantástico. David encontrou Deus ao rezar para um colega que sofreu um acidente, e esse encontro vai ser fundamental na trama.
Desespero não é só um livro de terror, é também uma obra sobre crença e descrença, sobre como as pessoas deixaram de acreditar em algo maior e o vazio que isso deixou em suas vidas.
Mesmo quando escreve algo puramente comercial, King ainda tem algo a dizer.
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