No final dos anos 1970 a
revista do Demolidor não ia muito bem das pernas e corria o risco de ser
cancelada.
O personagem surgira em
1964, como um favor de Stan Lee para Bill Everett. Everett havia criado o
Namor, na década de 1940, mas na época estava desempregado. Lee resolveu criar
um herói para que ele desenhasse. Na época o roteirista havia percebido que dar
ao protagonista um defeito o tornava popular e lembrou-se que lera sobre
pessoas com cegueira que desenvolviam os outros sentidos. Estava aí a ideia: um
herói cego, mas com super-sentidos!
O nome Daredevil surgiu de
um personagem da era de ouro que não estava publicado. O visual do personagem
foi sugerido por Jack Kirby: uma roupa colante vermelha e amarela.
Infelizmente, Everett só deu
conta de desenhar o primeiro número, sendo substituído a partir do número dois
por Joe Orlando, até por Wallace Woody assumir o título, numa das fases mais
aclamadas. Uma das inovações de Woody foi o uniforme totalmente vermelho, que
caiu nas graças do público. Depois dele entrou John Romita Jr, que abandonou o
título para desenhar o Homem-aranha e dar ao personagem a sua cara moderna.
Depois veio Gene Colan, dono de um traço dinâmico, que desenhou o herói 1966 a
1973.
Passada essa fase inicial,
divertida e inspirada, o público foi aos poucos perdendo interesse pelo
personagem cego e nem mesmo a constante troca da equipe criativa conseguia
alavancar as vendas do Homem sem medo. A revista, que era mensal, virou
bimestral e corria sério risco de ser cancelada.
Foi quando um novo
desenhista foi colocado no título, em 1979. Seu nome: Frank Miller. Miller
começou apenas desenhando a partir dos roteiros de Roger Mackenzie. Miller dava
cada vez mais ideias para as histórias, até que acabou assumindo os roteiros e
os desenhos. Foi quando a revista, que estava para ser cancelada, acabou se
tornando um dos maiores sucessos da Marvel no final dos anos 1970 e início dos
1980.
Miller afastou o Demolidor
dos padrões dos super-heróis, aproximando-o do gênero policial “noir”, com
nítida influência de Will Eisner, criador do Spirit. Além disso, sua
diagramação era absolutamente revolucionária, muito inspirada no trabalho de
Bernard Krigstein, desenhista que fez seus principais trabalhos para a EC
Comics. Com Miller, um único quadro se dividia em vários, dando de fato, a
impressão de movimento. Havia quadros verticais, sequências de quadros
horizontais e vários outros recursos que dinamizavam as páginas de uma maneira
que nunca havia sido feito antes.
Além disso, Miller soube
desenvolver o personagem. Stan Lee havia criado o Demolidor como um herói
bidimensional, pois tinha a fraqueza de ser cego. Miller tornou-o tridimensional
e atormentado. Afinal, ele era um advogado que atuava além dos limites da lei.
Era alguém que havia vencido na vida graças às imposições do pai, que o
obrigara a estudar, mas também odiava o pai por essa mesma razão. Essa
dubiedade se estendeu até mesmo à sua grande paixão. Matt Murdock é apaixonado
por Elektra, uma assassina profissional.
Os vilões também se
transformaram. O Rei do Crime, que antes era quase humorístico (no Brasil era
chamado de O Careca quando aparecia nas histórias do Homem-aranha) tornou-se um
mafioso frio e calculista capaz de tudo para manter seu poder. Mas também o
vilão é tridimensional: sua frieza racional e sanguinária é contrabalanceada
por sua paixão pela esposa, pelo qual ele seria capaz de qualquer coisa.
Todos esses elementos
transformaram o Demolidor de Frank Miller uma das séries mais revolucionárias
da época. Miller, depois de deixar a Marvel e ir para a DC, onde faria algumas
das melhores histórias do Batman, voltou para a Marvel e fez mais duas
histórias antológicas do personagem: Demolidor, o homem sem medo (que reconta a
origem do personagem com traços de John Romita JR e All Wiliamson) e A queda de
Matt Mudock (com desenhos de David Mazzuchelli), provavelmente a obra
definitiva sobre o personagem.
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