63
- Você voltou lá embaixo desde
então? – perguntou Edgar.
A garota balançou a cabeça, em
negativa. O professor podia ver o pavor em seus olhos.
- Fiquei o tempo todo aqui em
cima.
- Nunca encontrou ninguém além de
nós?
- Não. Desde então tenho comido
apenas doces do quiosque e dormido no cinema.
Edgar coçou o queixo:
- Isso salvou você do uivo da
górgona...
- Uivo da górgona? – perguntou a
garota.
- Foi o que começou tudo isso. –
explicou Jonas. É uma espécie de barulho que transforma as pessoas em seres irracionais,
como aqueles que você viu no estacionamento. Depois da primeira noite ele soou
outra vez. Mas não sabemos se isso acontecerá sempre.
- Vamos precisar de comida. Não
podemos passar o resto de nossos dias comendo doce. – avisou Zulmira.
Jonas apontou para as lojas de
refeições.
- Há muitas lojas na praça de
alimentação. Em muitas delas deve haver freezer. Mesmo desligados, eles
conseguem manter a comida preservada por um bom tempo.
- Mas para isso precisamos abrir
os cadeados.
- Eu cuido disso, mas vou precisar
da ajuda de alguém. Edgar?
- Conte comigo.
Os dois se aproximaram de um
McDonad´s. Jonas testou a fechadura da porta de correr:
- Está trancado.
- Imaginei que estaria. –
respondeu Edgar.
Jonas remexeu nos bolsos:
- Não que isso seja um problema
tão grande.
Edgar viu-o pegar alguns clipes e
remexer com eles na fechadura e perguntou-se: onde ele aprendera aquilo?
Enquanto testava a fechadura,
Jonas olhou para trás, apontando para Dani. Alan se aproximara dela e estavam
conversando.
- Há algo de estranho sobre essa
garota...
- Sem dúvida é estranha a história
dela. Ninguém ficaria sozinha no shopping apenas porque não consegue contato
com a mãe. Qualquer outra pessoa teria arranjado outra maneira de voltar para
casa...
Jonas concordou. Na fechadura,
algo estalou.
- Há outra coisa que gostaria de
conversar com você. Uma suspeita. Não queria falar na frente dos outros.
Edgar aproximou-se do outro. Então
era por isso que ele lhe pediria sua ajuda.
- Duvido que isso mude alguma
coisa. – disse Jonas. Mas eu precisava desabafar sobre isso com alguém...
Edgar fez um gesto com a cabeça,
estimulando o outro a continuar.
- Lembra-se do almoço que tivemos
na casa de Roberto?
- Claro. Mas...
- Eu sabia que havia algo errado
ali. Por que uma pessoa teria tanta carne guardada na geladeira?
- Do que está falando?
Jonas parou o serviço e olhou fixo
para o outro:
- Escute, eu já trabalhei como
açougueiro. Conheço cortes de carnes. Aquela carne não era nem de porco, nem de
boi...
- Está dizendo que comemos...
O outro fez que sim com a cabeça e
continuou o serviço.
Edgar engoliu em seco. De repente
tinha perdido a fome.
Sem comentários:
Enviar um comentário