Um gênero cinematográfico
que sempre suscitou discussões sobre a questão da realidade-ficção foi o
documentário. Em uma abordagem mais clássica, o documentário é visto como o
oposto da ficção, reproduzindo a bipolaridade ficção-realidade.
Mas
um novo gênero surge exatamente para contestar essa diferenciação: o mocumentary (ou, aportuguesando,
mocumentário).
Provavelmente
o primeiro exemplo célebre de mocumentário tenha sido Zelig, de Woody Alenn, de
1983. O pseudo-documentário é ambientado na década de 1920 e fala sobre Leonard
Zelig, um um homem que tem a capacidade de mudar sua aparência para se adequar
ao meio. Se ele está no meio de mafiosos, começa a se parecer com mafiosos, se
está no meio de médicos, parece um médico. É um verdadeiro camaleão humano.
Uma das estratégias usadas
para diluir o limite entre realidade e ficção é o uso de pessoas reais, como a
escritora Susan Sontag, o psicólogo Bruno Bettelheim, que, com seus
depoimentos, reforçam a verossimilhança da narrativa. O filme ainda usa outros
recursos de documentários, como imagens de cinejornais, fotos da época e até
mesmo áudios das consultas do protagonista com sua psicóloga (devidamente
acrescidos de ruídos que os tornam mais realistas).
O mocumentário, portanto,
testa os limites entre o ficcional e o real, entre o documentário e a ficção,
levando o espectador a indagar-se até que ponto essa separação é válida.
Atualmente há vários
exemplos famosos de mocumentários. Entre eles destaca-se o filme Borat, e o
seriado Modern Family.
Borat, filme dirigido por
Sasha Baron Cohen, de 2006, satiriza o modo de vida americano ao apresentar “O
segundo melhor repórter do glorioso país Cazaquistão viaja à América”, como diz
seu subtítulo, que vai aos Estados Unidos aprender sobre o modo de vida daquele
país.
Como elemento reforçador dessa sátira,
o ator permanece no personagem mesmo quando dá entrevistas de divulgação do
filme.
Modern
Family é um seriado
criado por Christopher Lloyd e Steven Levitan. A série mostraria as gravações
de um cineasta europeu que no passado havia feito um intercâmbio na casa dos
Pritchett e decidiu retornar aos Estados Unidos para fazer um documentário
sobre “sua família americana”. Após a recusa de outras produtoras, a ABC
resolveu produzir a série, mas com a condição de que a trama do diretor fosse
retirada da história, ficando apenas as ações das três famílias e seus
depoimentos para a câmera, que comentam e costuram os acontecimentos.
O enorme sucesso de
público e de crítica (o seriado já está na sétima temporada e já recebeu 15
prêmios Emmy) despertou atenção para o gênero mocumentário, mostrando sua
importância atual.
Embora não utilize
totalmente a linguagem dos documentários, os depoimentos para a câmera e a
abordagem sobre temas recentes (como a liberação do casamento gay) criam um
clima de verossimilhança próprio dos documentários ou reality shows. Seu sucesso é indício da familiaridade da audiência
com obras que testam os limites entre o ficcional e o real.
Sem comentários:
Enviar um comentário