segunda-feira, dezembro 31, 2018

O sapo dançarino




Uma das melhores metáforas da vida que já vi foi um desenho animado da Warner, o sapo dançarino.
Na história, um trabalhor da construção civil está demolindo um prédio, quando encontra, nas fundações do mesmo, uma caixa. Quando ele abre, uma surpresa: sai de dentro dele um sapo cantando e dançando!
“Vou ficar rico!”, pensa o homem.
E leva para um canal de TV. Mas quando está diante do diretor, o sapo não dança, fica apenas ali, coaxando como um sapo normal. 
O homem acha que foi tudo uma alucinação, mas quando saem do estúdio, o sapo volta a cantar e dançar como um astro.
O homem então o leva a um agente de talentos, mas o sapo mais uma vez apenas fica sentado, coaxando.
Como última alternativa, o homem aluga um teatro e anuncia o sapo dançarino. O teatro lota, apenas para ver o sapo sentado coaxando.
Quando finalmente percebe que o sapo só cança e dança para ele, o homem está arruinado.
O desenho o mostra prendendo novamente o sapo na caixa e o colocando nas fundações do novo edifício.
Já pararam para pensar em quantas vezes nos deparamos com um sapo dançarino?
É o carro que apresenta algum defeito, mas funciona normalmente quando o levamos ao mecânico. É o eletrodoméstico que volta a funcionar normalmente quando o levamos à assistência técnica, é o bug do computador que desaparece quando chamamos o técnico em informática.  
São os sapos dançarinos.


As aventuras do pequeno Xuxulu


domingo, dezembro 30, 2018

O desafio das capas

O desafio das capas é uma brincadeira entre fãs de quadrinhos no Facebook. Um desafia o outro a publicar as capas que mais o marcaram. Eu fui desafiado pelo amigo Dennis Oliveira. A ideia era publicar apenas imagens, mas imaginem se eu ia resistir a fazer alguns comentários. Abaixo as imagens e os textos que publiquei.
Essa eu nunca li, mas foi o primeiro gibi de heróis que vi, na vitrine de uma mercearia, único local que vendia quadrinhos na cidade onde eu morava, Mococa - SP. Lembro que ficamos todos olhando através da vitrine, impressionados com a capa, mas ninguém tinha dinheiro para comprar.
Desafio das capas que mais me marcaram. Essa foi a primeira revista que comprei em banca. Não é nem de longe a melhor dessa série, mas adoro essa capa e foi aí que começou a saga da Fênix, uma das melhores HQs de heróis todos os tempos.
O primeiro número de Sandman teve um impacto muito grande, não só pelo texto de Gaiman, mas também pela capa incrível de Dave McKean. Nunca tinha visto nada parecido.

Desafio das capas que me marcaram. Aventura e ficção era uma publicação em PB da Abril que publicava material inicialmente da Marvel, depois de outras editoras americanas e, na fase final, material europeu e nacional. Essa capa de Joe Jusko abriu a série com chave de ouro.
Eu não comprei a Epic Marvel em banca por causa do preço, que não cabia no meu orçamento da época, mas depois fui comprando todas em sebo. Difícil escolher qual das capas me marcou mais, então vai a da número 1.
Quando comecei a gostar de quadrinhos, eu não tinha dinheiro para comprar meus gibis. Então, vasculhava os sebos de Belém em busca de números antigos da revista Heróis da TV, que um amigo de escola colecionava. Eu comprava, lia, vendia para ele pelo dobro do preço e, assim, ia fazendo caixa para comprar os meus próprios gibis (eu colecionava Superaventuras Marvel). E na revista o personagem que mais me chamava atenção era o Mestre do Kung Fu.
Essa foi a primeira revista de quadrinho nacional que comprei. Eu lia Turma da Mônica quando criança, mas nunca tinha lido material mais adulto. Eu fiquei totalmente fascinado com a capa de Rodval Matias e com as histórias de Mozart Couto. Lembro que na época eu pensei: "caramba, os brasileiros são tão bons quanto os americanos!".

Camiño di Rato - Bagavad

Camiño di Rato é uma das mais longevas revistas alternativas brasileiras, editada pelo roteirista Matheus Moura. Eu colaborei com o número 8 com a história Bagavad. A HQ faz parte de uma série ficção científica com o tema humanidade. Os títulos de todas as histórias são referências a livros que de alguma forma têm relação com o tema. O narrador, em Bagavad é um homem que trabalhava na desinfecção de planetas que estavam sendo explorados. Desinfecção significava o extermínio de espécies indesejadas. Mas eles encontram algo surpreendente quando matavam seres monstruosos em um planeta catalogado com Y-17. A arte ficou por conta de Rodrigo Nemo, que variou perfeitamente entre sequências mais realistas e sequências lisérgicas, de acordo com a necessidade do roteiro.

Pesquisa quantitativa

De inspiração positivista, a pesquisa quantitativa teve grande desenvolvimento na escola funcionalista.

Parte do princípio de que, para estudar o homem e a sociedade, é possível utilizar a mesma metodologia e o mesmo instrumental das ciências naturais.

A pesquisa quantitativa tem sido muito criticada por procurar reduzir as relações humanas a números exatos.

         Um exemplo disso seria a preferência das pessoas por determinada comida, digamos sorvete de chocolate e morango.

         Para os funcionalistas, essa questão pode ser tranqüilamente explicada com números, como no exemplo abaixo:

As pessoas gostam mais de sorvete de chocolate ou de morango?

55% das pessoas gosta de chocolate

40% prefere morango

5% não gosta de sorvete

sábado, dezembro 29, 2018

Mitologia nórdica, de Neil Gaiman



Quando era criança, Neil Gaiman se apaixonou pela mitologia nórdica graças à revista do poderoso Thor, da Marvel. Isso o levou a pesquisar o assunto e descobrir que a mitologia original era muito diferente da versão sci-fi expressionista dos quadrinhos, mas igualmente fascinante. O garoto, que pouco tempo depois se tornaria roteirista de quadrinhos e escritor de sucesso continuou fascinado por essas lendas. O resultado disso é o livro Mitologia Nórdica, lançado este ano pela editora Intríseca.
O volume, em capa dura, com belíssima ilustração de Steve Attardo tem quase 300 páginas divididas em pequenos contos no qual Gaiman narra algumas das principais lendas nórdicas, da origem do mundo ao ragnarok (que qualquer leitor da Marvel sabe se tratar do fim dos tempos).
O texto de Gaiman é primoroso, o que faz com que a leitura seja extremamente rápida. Mal percebemos enquanto viramos as páginas. Além disso, as tramas são divertidas e as versões diferenciadas de personagens famosos é um atrativo a mais.
Loki, por exemplo, não é um vilão clássico, como nas HQs da Marvel. É antes um espertalhão, que vive arrumando encrencas e muitas vezes, acaba tendo que livrar os deuses das confusões que ele mesmo arruma. Thor não é o galante guerreiro dos quadrinhos, mas um bruto meio atrasado das ideias que se sente melhor quando mata alguém.
Um dos melhores momentos do livro é o relato de quando o rei dos ogros rouba o martelo de Thor e exige em troca a mão da deusa Freya. Freya, mais linda das deusas, claro, recusa e Loki tem a ideia de vestir Thor de noiva e levá-lo ao reino do ogro. Toda a festa de casamento é hilária, com Thor comendo e bebendo como Thor e Loki tentando evitar que o rei ogro descubra o que está acontecendo. Quando finalmente resgata seu martelo, Thor, claro, mata todo mundo.
Gaiman consegue captar o humor, o drama, o épico e a poesia de cada uma dessas histórias. 

Hair - I Got Life

As aventuras do pequeno Xuxulu


The Superhero Evening Post

 Saturday Evening Post foi uma antológica revista norte-americana, mais conhecida pelas fantásticas capas com arte pintada por Norman Rocwell. Ficaram tão famosas que passaram a fazer parte do imaginário popular. The Superhoero Evening Post é uma série de ilustrações feitas por Ruiz Burgos homenageando as famosas capas da Evening, mas com o tema super-heróis. Para termos de comparação, coloquei no final do post uma capa original da revista.







sexta-feira, dezembro 28, 2018

O taoismo e a superação dos pares contrários

Muita gente conhece, e até usa o símbolo aí em cima, mas pouca gente realmente sabe o que ele significa. O tei-gi é a representação visual dos princípios do taoismo uma filosofia-religião chinesa. Os taoistas acreditavam que a vida estava em constante mudança. Nada é eterno, nada é para sempre, tudo está em cosntante transformação. 
Mas essa transformação se dá de forma cíclica e é o que a figura mostra. Ela é formada por duas partes, uma preta e outra branca. São os pares opostos, o yin e o yang: o masculino e feminino, o feio e o belo, o bom e mal. Normalmente, quando interpretamos o mundo, usamos os pares contrários: fulano é belo, fulano é feio, fulano é vitorioso, beltrano é um derrotado. Mas a figura nos mostra que devemos transcender essa visão limitada.

As formas preta e branca formam uma espécie de onda, como se fosse a água se movimentando. Isso simboliza a eterna mudança, base de toda a criação. Os pares opostos não estão estaques, mas em movimento. Uma mulher que hoje é bela amanhã pode se tornar feia. O que hoje é bem, pode ser o mal. O que hoje é prazer pode se tornar dor. A vitória pode se transformar em derrota. 
O tei-gi nos ensina que no auge da parte branca, temos um pequeno círculo preto, demonstrando que o máximo de um estágio é o começo do estágio seguinte. O auge do sucesso marca o início da decadência. O auge da derrota pode ser o início da vitória. Exemplo: no início da década de 1940, quando invadiram a Rússia, os nazistas viviam seu maior momento e parecia que eles eram invencíveis. Mas foi justamente nesse período que os rumos da guerra começaram a virar em favor dos aliados. 
Dessa forma, os pares opostos não são absolutos: o belo traz em si também o feio. O feio traz em si o belo. A imagem permite ver os pares opostos em uma perspectiva global e é o que faz o taoista, indo além deles. Assim, para o taoista, vitória e derrota são apenas dois lados da mesma moeda e não se deve apegar a nenhum deles, pois seria estar parado em um mundo de eterno movimento.

quinta-feira, dezembro 27, 2018

O que são variáveis?

Variável é um aspecto ou dimensão de um fenômeno que pode sofrer alteração.        
Variável independente é aquela que é a causa, que provoca, influencia ou determina outra variável.
Variável dependente é aquela que é influenciada ou determinada pela variável independente. É, portanto, a conseqüência da variável independente.
Variável interveniente é a que se coloca entre as variáveis estudadas a fim de anular, diminuir ou ampliar o impacto da variável independente sobre a dependente.

Em um estudo sobre que analise se o professor dinâmico exerce influência positiva sobre a aprendizagem do aluno, o dinamismo do professor é a variável independente, o aprendizado é a variável dependente e os outros fatores (como o salário do professor, seu nível de atualização, etc) que podem interferir nessa relação são as variáveis intervenientes. 

Kripta - qualquer dia é sexta-feira, qualquer hora é meia-noite


       Em 1964 as bancas norte-americanas viram aparecer uma revista sobre os filmes de terror chamada Famous Monsters of Filmland (Monstros Famosos do Cinema). O editor era o desconhecido Jim Warren.

       Em certo número de sua revista, Warren publicou uma HQ de terror e ficou esperando a reação. Ele temia que a revista fosse boicotada pelo Comics Code, que regulava os gibis americanos e havia acabado com a editora EC, especializada em terror. O gênero era totalmente proibido, mas ninguém prestou atenção àquela HQ. Warren logo percebeu que o formato magazine (20,5 x 27,5 cm) era visto como sendo para adultos e, portanto, não estava sob controle do código. Era o sinal verde para lançar uma revista só de terror, no novo formato e em preto e branco.
       Assim, no inverno de 1964 surgia a revista Creepy (algo como assustador). No ano seguinte surgia a Eerie, seguindo a mesma linha. As duas revistas juntavam a nata da EC Comcs, com artistas como Joe Orlando, Frank Frazetta e Reed Crandall. Além disso, foram se somando aos poucos novos artistas, como Steve Dikto, Gene Colan, Neal Adams, Richard Corben, Berni Wrightson,  entre outros.
     Para editar as revistas e escrever as histórias foi contratado Archie Goodwin, um roteirista mediano no gênero super-hérois, mas sempre muito criativo em outros gêneros. Posteriormente foi contrato também o editor e roteirista Bill Dubay.
     Na década de 1970, a revista vivia sua fase áurea, mas ao mesmo tempo enfrentava um problema: editoras maiores, como a Marvel, começaram a entrar nesse mercado e a oferecer maiores benefícios aos desenhistas. Então, justamente quando as revistas mais vendiam, começou a faltar mão-de-obra. A solução foi dada por Bill Dubay, que entrou em contrato com um grupo de artistas espanhóis para substituir os americanos que estava debandando. O que era um problema acabou virando a favor da editora: os novos artistas espanhóis contratados eram espetaculares e deram início à fase de ouro da Warren, produzindo as melhores histórias de suspense, terror e ficção-científica da década de 1970. Entre os novos artistas, destacavam-se Esteban Maroto, com um traço psicodélico que foi imitadíssimo na época, e José Ortiz.
     Foi na Warren que surgiu a mais famosa vampira dos quadrinhos (embora não tenha sido a primeira. Esse posto é ocupado por Mirza, do brasileiro Eugênio Colonnese): a Vampirella. A personagem estreou em 1969 e transformou-se logo num sucesso. A roupa foi criada por Trina Robbins, mas a personagem acabou sendo delineada visualmente pelo grande Frank Frazetta. 
     No Brasil, as histórias da Warren foram publicadas na revista Kripta, da editora RGE e durou 60 edições, com grande sucesso. O slogan, usado na propaganda de TV, era ¨Com Kripta, qualquer dia é sexta-feira e qualquer hora é meia-noite¨, tornou-se célebre.

Acusado de fraude, médico é alvo de processo que cobra R$ 500 mil

O médico da Santa Casa, Mauro Natel de Oliveira, virou alvo de ação pública após ser flagrado alterando prontuários para receber por cirurgias que não participou em Campo Grande .Cirurgião torácico do hospital há mais de 20 anos, ele confessou as fraudes e ainda afirmou que se não “fizesse não ganharia dinheiro” com a profissão. Leia mais

As aventuras do pequeno Xuxulu


quarta-feira, dezembro 26, 2018

Edgar Morin e a teoria da complexidade

Um dos pensadores mais importantes da atualidade é o francês Edgar Morin. Suas idéias, inicialmente criadas para discutir a questão do conhecimento, espalharam-se por várias áreas e tornaram-se uma referência obrigatória na área de educação a partir do livro Os sete saberes necessários à educação do futuro, escrito a pedido da Unesco.
         Essencialmente, o pensamento de Morin, chamado de teoria da complexidade, baseia-se na busca de uma ética na ciência e na crítica ao que ele considera os três pilares da ciência moderna: a ordem, a separabilidade e as lógicas indutivas e dedutiva. Morin também insiste na necessidade de se trabalhar com as limitações  do pensamento científico.
         A busca da ordem sempre foi o interesse principal da ciência. Para a ciência, caótico é tudo aquilo que é desconhecido. A partir do momento em que se descobre como algo funciona, revela-se a ordem.        
         A teoria da informação  ensina que ordem é falta de varidade/informação. Já caos é variedade/informação em estado puro. Um relógio é um exemplo perfeito de ordem. Ele sempre fará as mesmas coisas, sempre se movimentará de maneira uniforme a totalmente previsível. Já a bolsa de valores é um fenômeno mais caótico, pois é muito mais difícil prever seus movimentos.  Uma outra maneira de definir ordem, complementar à anterior, é através da determinação. Fenômenos ordenados são determinados. Determinação sugere uma relação causal. Se determinado fenômeno ocorre, ele terá obrigatoriamente uma conseqüência.
         A relação de causa e consequência é extremamente determinada na Ciência Clássica, por isso o relógio foi tomado como modelo do mundo.
         A crença na determinação fez com que os cientistas e filósofos sonhassem com a possibilidade de decifrar a verdade definitiva. A Ciência Clássica ignorava os fenômenos dinâmicos, que estão mais próximos do caos que da ordem. A bolsa de valores, o trânsito de cidade, as sociedades e até a vida humana são fenômenos que escapam ao determinismo. Morin vai criticar justamente essa idéia de determinismo, que até pouco tempo predominava nas ciências sociais. 
         Edgar Morin diz que a complexidade nos dá a liberdade, pois nos livra do determinismo. Não somos prisioneiros de uma determinação, seja biológica ou social. Ao contrário, construímos nosso próprio destino a partir de nossas escolhas, sejam elas conscientes ou não.
         Para Morin, portanto, o mundo é uma mistura de caos e ordem e o cientista deve aprender a lidar com ambos.
         A segunda parte da teoria de Edgar Morin, e também a mais difundida,  refere-se à crítica à separabilidade. A ciência sempre trabalhou com a idéia de que, para resolver um problema, é necessário dividi-lo em pequenas partes e estudá-las uma a uma.
         Esse princípio provocou a divisão do saber e a especialização, que permitiu um grande avanço tecnológico. Mas a especialização logo revelou suas deficiências, pois os cientistas, cada vez mais especializados, perderam a visão do todo.
         A teoria dos sistemas demonstrou que os fenômenos são processos de retroação contínua. É, portanto impossível em algumas situações estabelecer a causa e a conseqüência. O que é causa de um fenômeno é também causada por outro fenômeno numa rede de interações infinita.
Como conseqüência da separabilidade, a responsabilidade sobre as decisões, incompreensíveis para os leigos, são deixadas nas mãos de especialistas, que não consideram as conseqüências amplas de suas ações.
Em lugar da separabilidade, Morin propõe a complexidade, que significa abraçar o todo. Ou seja, é o princípio de que é impossível conhecer as partes sem conhecer o todo, assim como conhecer o todo sem conhecer as partes.
         A terceira parte da crítica de Edgar Morin à Ciência Clássica diz respeito à lógica indutiva. Desde Galileu a indução tem sido considerada o procedimento científico mais correto. Mas mesmo os defensores da dedução não conseguem responder a uma pergunta: quantos casos é necessário pesquisar para se  chegar a uma conclusão geral sobre o assunto? Morin usa a crítica de Karl Popper para fundamentar sua posição. Para Popper,  essa falha da indução faz com que ela não seja científica.
         Para Popper, a ciência só pode se utilizar da dedução, em que se faz uma generalização e depois vai se pesquisar casos singulares. Se os casos baterem com a hipótese, dizemos que ela foi corroborada (não confirmada, pois é possível que estudos futuros cheguem a conclusões diferentes). Se não baterem com a hipótese, dizemos que a mesma foi falseada. Popper demonstrou que só é científico aquele conhecimento que pode se mostrar falho, ao contrário do conhecimento teológico, que não pode ser falseado.
         Edgar Morin aproveitou a crítica de Popper à indução em sua filosofia, mas também fez crítica à dedução, citando o paradoxo lógico do mentiroso de Creta. Imagine que um cretense diz que todos os cretenses são mentirosos. Se ele estiver dizendo a verdade, está mentindo, pois ele também é cretense e, pela lógica, deveria estar mentindo. Se ele estiver mentindo, está dizendo a verdade. É uma situação que não tem escapatória lógica.
         Embora admita que a dedução é mais confiável que a indução, Morin propõe uma nova lógica, menos classificadora, que não fosse baseada no OU/OU, mas no E/E. Uma lógica complementar e não excludente, que permitisse termos contrários, como: “A vida surge da morte”. De fato, a morte do grão é o início da semente, que irá dar origem a outra planta. A cada dia nossa pele se renova em grande parte. É a morte das células da epiderme que nos permite continuar vivendo.

A vida de Nosso Senhor, de Charles Dickens


Entre os anos de 1846 e 1849, Charles Dickens, o homem que tornou popular a celebração de Natal, queria que seus filhos aprendessem a vida e os ensinamentos de Jesus Cristo da maneira mais simples e clara possível e a melhor maneira de fazer isso seria ele mesmo escrever isso e dar de presente para sua família.
O texto, conhecido inicialmente como “O Novo Testamento para crianças” permaneceu inédito por anos. Dickens considerava que aquele era um texto escrito exclusivamente para sua família e não fazia sentido publicá-lo. A primeira geração de seus descendentes aceitou sua decisão, mas logo ficou claro que não fazia sentido privar os leitores de tão valorosa obra. O resultado é o livro “A vida de Nosso Senhor”, publicado pela Martins Fontes.
Dickens usa a capacidade narrativa que encantou milhões de pessoas em todo o mundo para tornar agradável e simples a vida e a mensagem de Jesus, definido já no primeiro parágrafo: “Jamais viveu alguém tão bom, tão afável, tão gentil, tão cheio de perdão para com todas as pessoas que erraram, ou que era de alguma forma doentes, ou miseráveis”.
Os principais fatos da vida de Jesus, do seu nascimento humilde, em uma manjedoura, à escolha dos apóstolos entre os pobres, sua inteligência, seus milagres e martírio, tudo é contado de maneira simples, com direito a paradas para definir ou explicar palavras ou contextos históricos.
O escritor fez de seu livreto uma ode à tolerância e ao amor ao próximo. Segundo ele, ser cristão é “agir bem sempre, mesmo em relação a quem nos faz o mal. Cristandade é amar ao nosso próximo como nós mesmos e fazer a todos os homens o que desejamos que eles nos façam”.
Em uma época como a nossa, em que pessoas que se dizem cristãs pregam a violência e a intolerância, em que as comemorações de Natal dão lugar a brigas e até mesmo assassinatos, um livreto como esse é um precioso presente para a humanidade.
E a edição da Martins Fontes é primorosa, com papel pólen, diagramação arejada e detalhes em dourado. 

segunda-feira, dezembro 24, 2018

Feliz Natal


A arte natalina de Haddon Sundblom

A imagem que temos hoje do Papai Noel é fruto de uma longa evolução histórica. Sua origem está no bispo Nicolau de Myra, que ficou célebre ao dar suas riquezas aos pobres. Com o tempo, sua figura passou a representar o bom velhinho que dava presentes no natal. Mas sua imagem era muito diferentes da que conhecemos hoje, com um manto vermelho e mitra (o chapéu usado por bispos). Em 1862 o desenhista norte-americano Thomas Nast remodelou o Papai Noel, dando-lhe alguns quilos a mais e distanciando-o da imagem religiosa. Mas a figura rechonchuda, vestida de roupa e gorro vermelho só se tornou realmente conhecida mundialmente com a campanha de natal de 1931 da Coca-cola, ilustrada por Haddon Sundblom. Seus desenhos se tornaram obrigatórios a partir daí: eles mostravam o sempre sorridente velhinho e ecoavam uma eterna sensação de paz e alegria. Confira algumas das imagens de Haddon Sundblom.












Feliz Natal!


O homem que inventou o natal



A imagem que se tem hoje do Natal é nitidamente influenciada pelas histórias de Charles Dickens, em especial nos contos Os carrilhões e Canção de Natal.
Canção de Natal foi adaptado para todas as mídias possíveis, a exemplo do filme com Jim Carrey no papel principal. Era a história de um homem avaro que, visitado por três fantasmas na noite de natal, um do passado, outro do presente e um do futuro, acaba descobrindo que o sentido da vida não se limita ao dinheiro. A história de terror é um hino sobre o verdadeiro significado do natal.
A influência dessa história pode ser sentida até nos quadrinhos Disney: o Tio Patinhas é uma versão do personagem. Seu nome em inglês é McScrooge, uma referencia direta ao protagonista de Canção de Natal.

Em Os carrilhões um pobre homem de recados é fascinado pelos sinos da igreja (os carrilhões do título) e sente como se eles o estimulassem a continuar vivendo apesar da pobreza e das dificuldades que ele e a filha enfrentam. No período de natal, ele deixa de acreditar nos sinos e se desespera. Mas serão os sinos que irão lhe mostrar como seria a vida de todos os outros caso ele morresse. Dickens, um cristão convicto, deixa sua mensagem: até o mais humilde dos homens é importante nesse mundo.

O conto, embora não seja creditado, nitidamente serviu de base para A felicidade não se compra, filme de Frank Capra que se tornou símbolo do Natal. Durante anos era uma das atrações obrigatórias na televisão na época das festas. Seu enredo: um homem afundado em dívidas pensa em se matar, mas um anjo lhe mostra que a vida de toda uma cidade estaria muito pior sem ele.
Só esses dois exemplos mostram o quanto a obra de Dickens povoou o imaginário ocidental.
Antes de se  tornar um dos maiores escritores ingleses de todos os tempos, Dickens teve uma infância pobre. Seu pai foi preso por dívidas e ele experimentou na pele todas as dificuldades do período da revolução industrial na Inglaterra, uma época em que poucas famílias faziam fortuna à custa da miséria de milhões de pessoas, que viviam em condições sub-humanas, trabalhando  até 14 horas por dia em troca de um salário que mal dava para a alimentação.
O rapaz conseguiu sair da miséria graças a sua verve humorística. Depois de ser explorado num trabalho em que sua função era pregar adesivos em latas de graxa, Dickens tentou estudar, mas a péssima condição financeira de sua família o levou a abandonar a escola. Para tentar ganhar um pouco mais de dinheiro, o futuro escritor aprendeu estenografia e passou a trabalhar  para o jornal True Sun anotando as reuniões parlamentares e campanhas eleitorais. Era um trabalho difícil, muitas vezes chato, e que o obrigava a viajar pelas cidades do interior e muitas vezes ficar sem comer. Mas Dickens compensava isso anotando casos pitorescos e divertidos.
Um dia ele tomou coragem e enviou uma crônica humorística anônima ao Monthly Magazine. O texto não só foi publicado, como foi lido com avidez e mostrou que o autor tinha talento. o sucesso fez com que ele escrevesse uma série de outras crônicas para o jornal londrino mais popular da época, o Morning Chronicle. Foi quando um famoso desenhista, , propôs realizar uma série de desenhos humorísticos satirizando a política local. Os editores lembraram de Dickens para escrever as legendas, mas este propôs que fosse feito o oposto: que os desenhos ilustrassem seus textos.

O resultado foi as aventuras de Mister Pickwick, uma série que despertou pouco interesse no início, mas virou febre quando Dickens introduziu na história o criado de Picwick, Samuel Weller. O sucesso é total e representa uma virada na carreira profissional de Dickens.
Mas os anos de pobreza permearam quase todo o seu trabalho posterior. Oliver Twist, um dos seus primeiros sucessos, conta a história de um pobre órfão explorado e maltratado por aquelas pessoas que deveriam cuidar de sua proteção. Emblemática a cena em que ele, no asilo, é sorteado pelas crianças para pedir um pouco mais de comida. O cozinheiro toma o pedido como um desacato, uma insubordinação, pois significa que os cálculos das autoridades sobre quanto cada criança deveria comer estava errado. A ironia de Dickens faz do romance uma obra-prima universal.
Essa ironia, colocada a serviço da crítica social, vai permear quase toda a sua obra. Em David Coperfield são mostrados os maus tratos sofridos pelas crianças e o encarceramento por dívidas. O romance é considerado por muitos como uma espécie de autobiografia romanceada.

Publicados em folhetins em jornais londrinos, os textos de Dickens fizeram chorar e rir. Encantaram milhões de pessoas e moldaram o imaginário popular, em especial sobre o natal. Sua importância pode ser percebida não nos prêmios que recebeu ou nos livros que vendeu, mas numa história singela. Dizem que ao receber a notícia de que o escritor havia morrido, uma pobre menina, vendedora de flores na porta de um teatro indagou: “Papai Noel também morreu?”.