A região amazônica tem uma rica história, muitas
vezes desconhecida da própria população local. Exemplo disso é uma república
independente surgida no estado do Amapá cuja história é contada no livro “Os
selos postais da República do Cunani”, de autoria do alemão Wolfgang Baldus,
recentemente lançado pelo Senado Federal.
No segunda metade do século XIX a região entre os
rios Araguari e Oiapoque era uma terra de ninguém. A região também chamda de
contestado, era reinvindicada tanto pela França quanto pelo Brasil, mas ninguém
se animava a gastar pólvora para conquistá-la. A solução foi declarar o local
uma região neutra até que se encontrasse uma solução definitiva para o ligítio.
Era uma terra de ninguém.
Em 1880 um aventureiro francês, Ferréol Guigues, um
suíço, Paul Quartier e dois norte-americanos descobriram ouro na região. Após a
morte dos americanos, os dois resolveram criar uma empresa para explorar o
ouro. Guigues foi a Paris em busca de
investidores e conheceu Jules Gross, escritor, jornalista e membro da sociedade
geográfica. Gros ajudaria os aventureiros a conseguirem dinheiro.
Em algum momento surgiu a ideia de transformar a
região em uma república independente como forma de atrair ainda mais os
investidores.
O local escolhido para a sede do novo país foi a
região do Cunani (a forma como os índios locais chamavam o peixe tucunaré). O
localidade consistia em 30 cabanas e 200 almas.
Nessa época a região era dominada por capitanias,
cada uma chefiada por um capitão.
O capitão do Cunani era Trajano Supriano Benítez,
um ex-escravo que viera de Belém ao ouvir boatos de que havia ouro na região.
Ele escolhera o local porque a região era essencialmente habitada por negros e,
como eles, queria que a região fosse governada pela França, já que naquele país
a escravidão havia sido abolida.
No ano de 1887, Ferréol Guigues e Paul Quartier
chegaram ao Cunani com armas e alguns barris de run.
Sentados em um cabaré, eles convidavam todos que
passavam a beber com eles. A única condição era assinar um documento. Esse
documento era a declaração de independência da região do Cunani. Sessenta
pessoas assinaram, o que dá uma boa ideia da quantidade de run oferecida pelos
aventureiros.
O documento dava a presidência do novo país para
Jules Gross e nomeava um ministério – todo composto por europeus, a maioria dos
quais nunca nem soube da honraria, a exemplo do Ministro da Educação Pública e
da Cultura, um negociante de selos de Bruxelas.
Qual a primeira coisa que um governante de um novo
país faz? Selos, claro! Pode parecer surreal, mas os selos eram uma forma de
legitimar um país: se ele tinha selos, tinha Correios e naquela época isso era
sinônimo de civilização. Além disso, se o selo era usado em cartas
internacionais, significava que outros países reconheciam a existência da
república.
Mas esses primeiros selos eram tão primários que
pareciam ter sido feitos por uma criança de cinco anos. Além da imagem simples
(uma estrela), trazia o preço invertido – o que faz acreditar que quem imprimiu
não tinha muita noção do processo de impressão, já que letras e números devem
estar invertidos na matriz para ficarem corretos no impresso, o que não
aconteceu.
O trio também cunhou moedas e criou uma bandeira
(toda verde com as cores da França num quadrado no canto superior esquerdo).
Eles passeava por Paris como se fossem autoridades estrangeiras e a
auto-propaganda era tanta que acabou chamando a atenção das autoridades. A
república fictícia teve até uma “guerra civil”, quando Guigues depôs Jules Gros
do cargo e esse não aceitou a situação.
A coisa se arrastou por anos, teve outro
presidente, outros ministros (alguns sabendo, outros não) até que as
autoridades resolvessem acabar com a brincadeira. A essa altura, a anedota
havia se tornado séria: já haviam sido recrutados 12 mil homens para invadir a
região e garantir a existência do da República do Cunani.
Essa não foi a primeira vez que a região se tornou
um país fictício. Em 1874 um tal de Prosper Chaton, ex-consul francês no Pará
proclamou-se Presidente da República do Cunani. Essa primeira República do
Cunani acabou por puro azar: Infelizmente Chaton era um jogador e acabou
perdendo o seu país numa mesa de jogo de Caiena.
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