quarta-feira, junho 03, 2020

Por que nossos jovens não têm o hábito da leitura?



            Uma reclamação constante dos pais é: meus filhos não lêem. Quanto mais se aproxima o vestibular, mais comum é a reclamação quanto a esse item. No entanto, o que fazem os pais para incentivar seus pais a lerem?
A verdade é que, por trás dessa aparente preocupação há muita hipocrisia. A maioria das pessoas que reclama é gente que não lê e não dá valor aos livros. O discurso do faça o que eu digo, não o que eu faço dificilmente funciona quanto o assunto é hábito de leitura. Só aprende a gostar de ler quem vive rodeado de textos. É na interação com os livros e com os adultos que as crianças aprendem a dar significado à leitura.
Claro, muitos argumentam que não têm tempo para ler, mas será que isso é verdade? Tenho o costume de reservar um livro para filas. Sempre que entro em uma fila, já vou com meu livrinho embaixo do braço. Consigo ler pelo menos um livro de fila por mês, sem grande dificuldade.
Pais que passam o final de semana inteiro assistindo televisão e não pegam um livro, uma revista semanal para pelo menos passar os olhos estão dando a seus filhos a lição de que é possível reservar tempo para tudo, menos para ler.
Apesar de tudo, há algumas crianças, que, mesmo sem maior estímulo começam a ler. Uma amiga minha, diretora de uma escola, diz que as crianças até os seis/sete anos são freqüentadoras assíduas da biblioteca escolar. A partir dessa idade elas vão diminuindo suas visitas até desaparecerem por completo.
O que acontece nesse meio tempo? O que faz com que crianças que eram muito interessadas em leituras percam o interesse?
Por incrível que pareça, a culpa é justamente das duas figuras que mais reclamam da falta de leitura dos jovens: os pais e a escola.
A escola trata o texto não pelo prazer de tirar dele seus vários significados, mas como desculpa para encontrar ditongos, hiatos e verbos e dificilmente tem programas sérios de incentivo à leitura.
Há algum tempo a editora Mithos, em convênio com a italiana Bonelli, resolveu incentivar a leitura distribuindo gibis de personagens como Tex, Zagor, Dylan Dog e outros para alunos da sexta-série e ensino médio. A idéia era fazer isso em escolas públicas e privadas. Na escola pública escolhida, depois de nove dias de espera, os editores ouviram da coordenadora pedagógica que os gibis eram inadequados para seus alunos. Provavelmente essa mesma coordenadora é uma das que reclamam diariamente da falta de leitura dos estudantes...
Essa postura revela uma moral preconceituosa: existem leituras adequadas e leituras inadequadas. Leitura adequada é leitura só de livro. Leitura formal, intelectual e poucas vezes relacionada com a vida do aluno. A leitura divertida, para essa visão antiga, é quase sempre inadequada.  Postura muito distante dos paradigmas atuais, que falam de leitura de mundo. Um bom leitor não é só leitor de livros. Ele lê tudo, de livros a propagandas, passando por gibis e livros de ficção-científica. Tudo pode ser passível de leituras, até os gestos das pessoas. Desse ponto de vista, a leitura de uma história em quadrinhos é tão saudável quanto a de um livro.

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