No final da década de 1990, os editores da Marvel decidiram
dar uma mudada no personagem Justiceiro. Ele se matou, foi ressuscitado pelo
seu anjo guardião, ganhou armas sobrenaturais e passou a caçar demônios. Essa
fase bizarra representou o fundo do poço do personagem.
Depois disso, a editora resolveu contratar o roteirista irlandês
Garth Ennis para consertar a lambança. Ennis não só trouxe o anti-herói de
volta para suas origens, como acrescentou violência extrema e humor ácido,
criando a melhor fase do anti-herói de todos os tempos.
O Justiceiro de Garth Ennis tem sua melhor representação num
diálogo com uma vizinha (que descobre sua identidade). Ela pergunta porque ele
mata criminosos, esperando algo como “Deixar o mundo mais seguro para as
pessoas”. Ele responde: “Por ódio”.
Na sinopse da minissérie (que depois se transformaria numa
revista mensal), Ennis explicou o conceito: após ter um vislumbre de sua
família agora em paz no paraíso, ele é mandado de volta à terra pelos anjos. Os
tais anjos achavam que seria um pesadelo para ele, mas “involuntariamente dão a
ele um tipo de paraíso mortal, andando pelas ruas e punindo culpados, matando
vilões, fazendo o que adora”.
O Justiceiro de Ennis e Dillon vive apenas para matar. |
Ou seja: esse Justiceiro é uma força da natureza, um tipo de
serial killer, que vive apenas para matar malfeitores sem nenhuma crise de
consciência. Não há nenhuma tentativa de romantizar ou mesmo dar uma
profundidade emocional ao personagem. É simplesmente alguém que só consegue ver
o preto e o branco, uma versão radical da ideia original do criador do
personagem, Gerry Conway. Muito adequado para alguém que vinha de revistas como
a 2000 AD e muito distante do normal nos super-heróis. Considerando-se que o
personagem é alguém que simplesmente mata quem considera que merece morrer,
essa versão cínica era a única abordagem possível.
Para desenhar, foi escalado Steve Dillon, o artista perfeito
para o projeto. Dillon conseguia misturar violência extrema como humor,
especialmente graças à sua habilidade para desenhar expressões faciais.
O início da primeira história já dava o tom da série: um
bandido liga para os amigos e conta como o Justiceiro chegou no meio de uma
negociação de drogas e matou todo mundo menos ele. E agora ele tem bagulho
suficiente para ficar rico. É quando percebe o justiceiro saindo das trevas.
Num close o vemos chorando e dizendo: “Eu tenho que desligar, Mike”.
E a dupla não economiza nas sequências bizarras. Logo no
primeiro volume o Justiceiro joga um mafioso do alto de um prédio. Depois usa
ursos, um vizinho gordo e até uma pizza quente para matar bandidos. É tudo tão
exagerado que se torna impossível levar a sério e por isso mesmo essa versão
era tão divertida.
Essa série foi reunida no Brasil nos volumes 18 e 19 da
coleção de graphic novels Marvel, da Salvat.
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