terça-feira, abril 02, 2024

Memorial de Maria Moura

 


Memorial de Maria Moura é  uma minissérie que passou na Globo em 1994, adaptado da obra de Raquel de Queiroz. Trata-se de uma das melhores minisséries já apresentadas pela Globo (outra que gosto muito é Agosto, adaptado da obra de Ruben Fonseca).
Um dos destaques é o roteiro enxuto de Jorge Furtado (O homem que copiava) e Carlos Gerbase e a direção de Roberto Farias. Embora na época a TV estivesse engatinhando em técnicas cinematográficas, a direção vai muito além do simples plano e contra-plano, fazendo uma obra esteticamente competente e inovadora para a época.
As atuações são quase todas ótimas, com destaque para Glória Pires no papel principal e para a estréia de Cleo Pires interpretando Maria Moura jovem.
A mini conta a história de Maria Moura, uma mulher que desde pequena tem de defender suas terras de um padrastro que mata sua mãe e a violenta e, principalmente dos Marias Pretas, os primos que querem tomar tudo que é dela. Sem conseguir resistir, Maria foge da fazenda, o Limoeiro, em direção à Terra dos Padres, um local mítico, com de natureza exuberante e água corrente. Nesse processo ela deixa de lado a fragilidade feminina e se torna uma senhora de terras temida e respeitada, com um bando de jagunços fiéis prontos a dar sua vida por ela. Uma espécie de Robin Hood do sertão, Maria Moura acode todos aqueles perseguidos por inimigos poderosos.
Televisão é imagem. Na literatura podemos dizer que tal personagem tem essa ou aquela personalidade. Na TV (assim como nos quadrinhos e no cinema), fazemos isso através dos diálogos, da trilha sonora e, principalmente das imagens. É por isso que nos quadrinhos os vilões são feios e de proporções estranhas: deve ficar claro para o leitor que a moralidades deles é distorcida.
Em Maria Moura sabemos, desde a primeira cena, que os Maria Preta são o oposto da heroína. Enquanto ela é fiel e direta, eles são tortos e traiçoeiros. As roupas andrajosas mostram isso, mas percebemos o fato principalmente nas cenas em que eles estão comendo. Eles comem como porcos, de maneira nojenta, as mãos de unhas sujas, a comida se espalhando pela barba, sujando a roupa, melecando tudo.
Ou seja: as imagens os caracterizam como porcos, física e mentalmente.
A mesma caracterização é feita com Maria Moura. Quando foge do Limoeiro, ela prende o cabelo num turbante, escondendo-os, como se quisesse esconder sua feminilidade. No momento da história em que se apaixona, ela solta os cabelos, como se permitisse ser de novo mulher.
O único senão dessa ótima série é a mania de achar que humizar um herói é fazê-lo ter dúvida de seus propósitos. Maria Moura está o tempo se dizendo indecisa sobre o que está fazendo, sempre relutando, sempre dizendo que gosta de dar ordens, mas que queria alguém que lhe pusesse mando. É até possível que a personagem tivesse tais dúvidas, mas os diálogos não precisam insistir tanto nisso.

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