Em gótico americano, Alan Moore revisitou os principais monstros do terror. Nos números 41 e 42 ele abordou os zumbis, como sempre de maneira revolucionária.
Na trama, uma equipe de TV está gravando uma soap opera em um velho casarão sulista. Mas o local está impregnado de tragédia e maldição, um horror que virá à tona quando os atores encarnarem as pessoas reais que moraram ali.
A história começa com uma sequência em visão subjetiva. O leitor entra no casarão e parece ouvir os fantasmas. |
A história inicia como se o leitor estivesse entrando na casa e descendo ao porão até parar numa coluna manchada de sangue. O diálogo é colocado na forma de legendas, como se reverberasse pela estrutura da casa assombrada: a esposa do senhor envolveu-se com um negro. Quando descobriu, o senhor de escravos levou o escravo até o porão e esfolou-o.
A trama pula para os dias atuais e temos novamente um trio, mas agora com papéis trocados: a mulher é racista e tem nojo do ator negro, enquanto o ator que faz papel de seu marido faz de tudo para ser aceito pelo ator negro. Essa situação vai se invertendo quando os fantasmas do passado encarnam nos atores e eles passam a representar o drama real. Ao mesmo tempo, os mortos levantam da tumba e vão até o casarão, exigindo sua liberdade.
A sequência do morto que não consegue descansar é uma das melhroes. |
Curiosamente, as melhores sequências são focadas nos zumbis. É também quando o texto de Moore encontra seu ápice: “Mas uma coisa todos queriam sem exceção: liberdade. Liberdade desse solo ruim, onde ressentimentos enterrados envenenam as raízes do mundo e de todas as culturas. Liberdade dessas terras contaminadas que deitam frutos tão amargos”.
É um zumbi que protagoniza a impressionante sequência final, repleta de humor ácido e critica social. Um dos mortos vivos apresenta-se como candidato à vaga como bilheteiro em um cinema. O próprio dono do cinema afirma que é um trabalho lamentável, em que as pessoas são obrigadas a passar horas sem comer ou ir ao banheiro, por isso poucos ficam muito tempo. “Tudo bem, quando eu começo?”, responde o zumbi. “Olha, gostei da sua atitude. Você não resmunga sobre condições de trabalho nem vem com papo de sindicato. Não se fazem mais trabalhadores assim”. A metáfora é óbvia: algumas vagas de trabalhos são tão entediantes e deploráveis que só poderiam ser ocupadas por zumbis.
A parte final da história é cheia de homenagens a filmes de zumbis. |
Uma curiosidade é que, nessa sequência final, os filmes que estão passando no cinema são todos de zumbis, como A noite dos mortos vivos, o famoso filme de George Romero que redefiniu o gênero.
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