Os escravos da górgona foi um dos livros que me influenciaram a escrever O Uivo da górgona (pelo menos foi a maior inspiração para o título ao ampliar o conceito de górgona para eventos que essencialmente mudam o ser humano para pior). Esse livrinho, originalmente denominado Os 100 dias da Górgona, foi escrito por Curtis Garland (pseudônio do espanhol Juan Gallardo) e publicado pela Cedibra em 1976 na forma de livro de bolso. Eu li provavelmente em 1984 ou 85 (comprei num sebo).
A história é fantasiosa: uma luz encobre o planeta terra. Quem a vê passa por transformações. O protagonista é um homem que sofreu acidente com ácido e está com os olhos enfaixados e por isso não se transforma. Ao acordar e tirar as faixas, ele descobre que todos estão paralisados, recobertos por uma película azulada.
Talvez seja coincidência, mas esse início me faz lembrar ao menos três obras. O homem que acorda num hospital após um apocalipse remete diretamente a Walking Dead e Extermínio. E pessoas sobrevivendo num mundo em que todas as outras foram paralisadas lembra muito o romance Blecaute, de Marcelo Rubens Paiva. Tpdas essas obras são posteriores, o que pode significar que alguém talvez também tenha lido esse livro de bolso. Ou talvez ele só tocasse em temas universais do imaginário terror e FC.
O protagonista percorre a cidade e, milagrosamente, encontra a namorada e descobre que ela não se transformou - Londres inteira estava na rua no dia de verão e por alguma razão ela estava trancada no porão, de modo que não viu o clarão.
O casal passa as 128 páginas do livro se livrando de perigos. Primeiro são os homens petrificados, que ganham vida, depois as crianças, que se tornam verdadeiros psicopatas, e, finalmente, gosmas espaciais que sugam as memórias da pessoa e se transformam nela.
Antes que perguntem: não, o livro não é bom. Há vários deus ex machina, desde o padre cego que encontram e que sabe contar tudo que eles não sabem até a própria sobrevivência da namorada do herói, quando todos os outros se transformaram. Ah, sim, e enquanto fogem do perigo, a moça só consegue pensar em se casar!
E os diálogos, ah, os diálogos! Talvez para lembrar o leitor quem estava falando - ou simplesmente para deixar os diálogos mais melosos, os protagonistas repetiam o nome um do outro a cada fala:
- Ewa, minha querida. Agora estamos sós diante de um mundo diferente, hostil e estranho. É preciso lutar com muita coragem e determinação... está disposta?
- Todd, ao seu lado eu sou capaz de tudo!
Mas, aos meus treze anos, eu prestava pouca atenção aos problemas de roteiro ou diálogos forçados. Na verdade, eu muitas vezes reescrevia a história em minha cabeça.
E, como disse, essa foi, provavelmente, a gênese de O uivo da Górgona.
Em outras palavras: mesmo livros ruins podem ser uma boa influência.
sexta-feira, novembro 22, 2024
Os escravos da górgona
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