sábado, dezembro 31, 2005

Virada de ano

Ano passado fomos para a praça ver a festa dos fogos, mas voltamos frustados. Os fogos foram como orgasmo: quando você viu, já foi...
Este ano vamos para a casa de uma amiga. Vamos levar uma tábua de frios, outra de frutas e vamos fazer os nossos já famosos coquetéis... eu faço com álcool e o meu filho Alexandre os sem álcool.

Gato preto em campo de neve




Estou lendo Gato Preto em Campo de Neve, relato da viagem que Érico Veríssimo fez aos EUA na época da política de boa-vizinhança. Em plena Segunda Guerra Mundial, os americanos perceberam que países como o Brasil, por sua localização, não poderiam entrar na guerra ao lado do Eixo e começaram um processo de aliciamento que incluiu não só o presidente Getúlio Vargas, mas também artistas. Gente como Orson Welles e Disney vieram ao Brasil e escritores como Veríssimo foram conhecer a terra de Tio Sam. É impressionante como um bom escritor consegue produzir um grande livro mesmo num relato de viagem. Veríssimo se destaca pela análise dos tipos com os quais se depara e pelo texto fluente. Eu já tinha lido, emprestado da Biblioteca Pública de Belém, e quando vi num sebo aqui em Macapá, comprei na hora.

Globo lança séries para substituir Jô Soares nas férias

Agência Estado
09:10 26/12

A Globo adquiriu duas das séries de maior sucesso nos Estados Unidos e na TV paga brasileira para substituir Jô Soares de janeiro até março. A primeira a chegar é a quarta temporada de 24 Horas e a segunda, a sensação Lost. A mais recente temporada de 24 Horas - que já foi exibida no canal Fox - estreará logo no dia 2 e será apresentada diariamente após o Jornal da Globo. Leia mais

Congós: buracos vão continuar

Os moradores do bairro do Congós receberam um péssimo presente de Natal do governador: o presidente da Associação dos Moradores do bairro foi levar um abaixo assinado pedindo que o serviço de asfaltamento seja terminado e recebeu a notícia de que só depois da eleição. Ou seja: votem em mim e eu asfalto... Ah, tá...
Lembrando que com a obra, o asfalto da Claudomiro de Moraes ficou todo quebrado e a situação agora está muito pior do que era antes...

Ao povo o que é do povo

O blog do Ernani Motta publicou a relação dos deputados e senadores que vão devolver o dinheiro da convocação extraordinária. Um detalhe: nenhum é do Amapá.
Veja a lista:

Senado: 4 recusas

Cristovam Buarque (PDT-DF)
Pedro Simon (PMDB-RS)
Eduardo Suplicy (PT-SP)
Serys Slhessarenko (PT-MS)

Câmara: 36 recusas

PT: Antonio Carlos Biscaia (RJ), Dr Rosinha (PR), Henrique Fontana (RS), Luciano Zica (SP), Mauricio Rands (PE), Mauro Passos (SC), Orlando Desconsi (RS), Paulo Rubem Santiago (PE), Tarcísio Zimmerman (RS), Walter Pinheiro (BA) e *Zico Bronzeado (SC).

PTB: Armando Monteiro Neto (PE), Arnaldo Faria de Sá (SP), Íris Simões (PR), José Chaves (PE), José Múcio (PE) e Luiz Antonio Fleury (SP).

PSOL: Chico Alencar (RJ), João Alfredo (CE), *Luciana Genro (RS) e Orlando Fantazzini (SP).

PMDB: *Michel Temer (SP), Odílio Balninoti (PR) e Takayama (PR).

PSDB: Carlos Sampaio (SP), *Júlio Semeghini (AP), Mendes Thame (SP) e Gustavo Fruet (PR).

PPS: *Denise Frossard (RJ), Nelson Proença (RS) e *Raul Jungman (PE).

PV: *Fernando Gabeira (RJ) e *Sarney Filho (MA).

PFL: *Eduardo Sciarra (PR).

PL: Lincoln Portela (MG).

PP: *Vadão Gomes (SP).

Os deputados assinalados com (*) informaram a Mesa da Câmara a recusa somente após o encerramento do prazo. Portanto, terão os valores depositados, mas, comunicaram que não ficaram com o dinheiro.

Ladrão ´Papai Noel´ entala em chaminé

Ribeirão Preto - O servente de pedreiro Adriano Pedro de Oliveira, de 26 anos, de São Carlos, na região de Ribeirão Preto, tem motivos de sobra para odiar a história de que Papai Noel chega nas residências e entra pela chaminé para entregar presentes. Na madrugada de hoje, Oliveira tentou praticar um furto, com outros três homens, e literalmente "entrou pelo cano". Leia mais

Avião deixa passageiro bêbado em ilha remota

Londres - O comandante de um Airbus da companhia britânica Monarch, que seguia a rota Manchester-Ilhas Canárias (Espanha), fez um pouso não previsto numa pequena ilha portuguesa para deixar um passageiro bêbado que importunava a tripulação e as outras pessoas, informou o diário britânico Daily Mirror. O aparelho aterrissou na ilha de Porto Santo, habitada por 5 mil pessoas e integrante do Arquipélago da Madeira, no Atlântico. Porto Santo tem apenas 112 km2. O passageiro, um irlandês não identificado, de 53 anos, foi retirado à força do avião. Leia mais

Watchmen e a teoria do caos


O Omelete publicou uma resenha do meu livro Watchmen e a teoria do caos. Para conferir, clique aqui.

Ah, para comprar o livro, clique aqui.

Cante a canção comigo

Neste natal e final de ano, gostaria de lembrar uma das músicas mais bonitas de um grupo quase desconhecido, O Terço:

Hey, amigo
Cante a canção comigo
É nadaÉ quaseÉ tudoHey, amigo
Cante a canção comigo
MetadeÉ parteDe um todoNesse rockEstamos todos juntosNesse rockEstamos todos juntosNesse rockEstamos perto de serA unidade finalA unidade final

Espero que em 2006 sejamos não metades, mas partes de um todo. Que sejamos não seres separados pela distância, mas unidos pela amizade e respeito mútuo.

É o desejo de

Gian Danton e família

quarta-feira, dezembro 28, 2005

É O FIM!

Começa amanhã o FIM (Festival de Imagem em Movimento) no teatro das bacabeiras. Confira aqui a programação.

2005: Diário de bordo


Com esse susto que foi a morte do Chris, que pegou todos nós de surpresa, esqueci de avisar que meu texto com a retrospectiva de 2005 entrou no ar no Digestivo Cultural. Para ler, clique aqui.

Recebi por e-mail:

Telefonei para Goiânia e soube que Chris ficara encantado e partira no dorso do cavalo verde de que nos fala o Padre Vieira. Poucos conheci com o seu talento e erudição. Grande amigo apesar dos contatos curtos e esporádicos que tivemos ao longo das jornadas do nosso NP. Todos vamos sentir muito a sua falta. Athos Cardoso (Athos é autor do livro O que é aventura, da coleção Primeiros Passos, e de um livro antológico sobre os quadrinhos de Ângelo Agostini)

terça-feira, dezembro 27, 2005

Leia entrevista com o Chris Natal no site Alan Moore, o senhor do caos.

Superaventuras Marvel



Epitáfio

Chris Natal desencarnou ontem, dia 26 de dezembro, na UTI de um hospital de Goiânia. Seu corpo será velado e enterrado no Cemitério Jardim da Colina, em São Bernardo do Campo.

Chris foi professor e coordenador de curso de jornalismo em uma faculdade em Macapá. Era também um pesquisador, com atuação importante nas áreas de quadrinhos e propaganda subliminar.

Nem sempre concordei com suas opiniões e ações, mas ele sempre se revelou um amigo inteligente, divertido e fiel. Era alguém com o qual se podia conversar sobre qualquer assunto.

Chris era um caso clássico de superdotado, com todas as qualidades e defeitos dos superdotados: a inteligência ferina, o raciocínio rápido, o vício em informação, mas também a arrogância intelectual que ele não fazia a menor questão de disfarçar. Chris escrevia com rádio e televisão ligados, pois dizia que seu cérebro não se contentava com um só nível de informação.

Chris é o primeiro amigo, de minha geração, que morre, e morreu de forma boba, sem sentido. Logo ele, que parecia um touro, que nunca ficou doente enquanto eu o conheci, que dizia ter estômago de avestruz... Chris parecia invencível e talvez ele acreditasse mesmo ser invencível, tal a forma despreocupada e intensa com que vivia cada momento.

Ou talvez fosse o contrário: lá no fundo, talvez ele soubesse que ia morrer jovem e fazia questão de viver intensamente cada minuto, como quem sabe que não vai chegar ao ponto de chegada e corre o mais que pode para aproveitar cada metro do caminho. Talvez por saber que ficaria entre nós pouco tempo, ele fazia questão de ser notado, para que as pessoas sentissem falta dele...

O conselho “É preferível viver mil anos a dez que dez anos a mil” parece ter sido o lema de Chris. Ele devorava filmes e livros como quem sabe que tem pouco tempo e quer aprender tudo que pode no tempo que resta... mas também vivia cada emoção, cada sensação com a mesma gula. Bastava ligar “Chris, vamos pegar estrada...” e lá estava ele, na porta de nossa casa, pronto para viagem. Fizemos juntos uma viagem inesquecível para Pontal das Pedras e aproveitamos cada momento para conversar. Por insistência do Crhis, pegamos um barco e fomos parar no cenário mais bonito que já vi na minha vida. Naquela viagem, eu na proa e ele na popa, tiramos fotos um do outro, cada um tentando tirar a melhor foto, numa divertida disputa em celulose.

A mesma fome que ele sentia por informação, ele sentia por comida (uma outra forma de chamar a informação gustativa) e Chris era o melhor público que um cozinheiro poderia querer. Ao comer minha feijoada, ele afirmava categoricamente que era a melhor feijoada que ele já tinha provado em toda a sua vida, o mesmo para a pizza ou a lazanha... nesses momentos de cortesia culinária ele não se parecia nem um pouco com o Chris polêmico, que gostava de discutir e ostentava com orgulho as acusações que os adversários lhe faziam (quando o Bonfin Salgado o chamou de Canguru Australiano, ele fez questão de fazer para si uma camisa com essa expressão abaixo da imagem de um canguru com luvas de boxe).

Chris era um céptico, então ele riria do que vou escrever, mas espero sinceramente que seu espírito encontre a paz e a harmonia e que sua curta estada entre nós tenha sido mais um passo em sua evolução intelectual e espiritual. E, Chris, esteja certo de alguém não morre enquanto viver nas lembranças dos amigos. Assim, você estará para sempre em nossas lembranças.

Chris deixa uma viúva, Lili, e dois filhos, Matheus e Sofia.

segunda-feira, dezembro 26, 2005

Chris Natal na UTI

Crhis Natal está na UTI de um hospital em Goiania, em estado grave após uma cirurgia para redução de estômago. Chris foi professor e coordenador de curso de jornalismo em uma faculdade em Macapá.

domingo, dezembro 25, 2005

Bob esponja capitalista


Um ex-aluno de jornalismo Wilker Lira, fez seu TCC sobre a ideologia capitalista em Bob Esponja. Reproduzo aqui uma parte do trabalho:

Bob Esponja é o empregado ideal, nunca reclama do salário e está sempre feliz. É o personagem mais engraçado, está sempre metido em confusões e nunca consegue ser aprovado na auto-escola (que aqui se chama escola de pilotagem, pois os carros são barcos). Em “Bob Esponja, o filme” (2004), fica evidente que Bob Esponja e seu melhor amigo Patrick são apenas crianças, entretanto, como Bob Esponja está na auto-escola, e nos Estados Unidos a idade mínima para dirigir é de 16 anos, essa é a idade provável do garoto. Bob também faz tudo pelo patrão, seu Sirigueijo; ele não é só o patrão de Bob Esponja, mas também seu ídolo. No episódio Snowball efect – Efeito Bola de neve – (O NATAL de Bob Esponja, 2002) enquanto brincam de fingir ser outra pessoa, Bob Esponja diz querer ser seu Sirigueijo, quando Patrick lhe pergunta porque ele quer ser o patrão, Bob responde: “Porque ele é um bom líder.”
Em “Bob Esponja, o filme (2004); Bob arrisca sua vida, entra em terras desconhecidas, cheias de perigos, para poder salvar a vida do patrão.
Bob Esponja nunca reclama dos salários, a não ser quando é incitado a isso por Lula Molusco. No episódio Squid´s Strike, Bob chega a pagar a seu Sirigueijo para trabalhar. Em um outro episódio chamado Just one bite – só uma mordidinha - (HISTÓRIAS... 2003) Bob chega às 3 da manhã para trabalhar; Lula Molusco, que se encontrava lá na esperança de comer um hambúrguer escondido de Bob Esponja, pergunta a ele o que estava fazendo ali e Bob responde que sempre chegava para trabalhar aquele horário. Fica evidente aí a dedicação de Bob Esponja Calça-quadrada ao trabalho, dedicação esta, independente do que recebe para trabalhar; também fica evidente sua admiração pelo chefe.
Que capitalista rejeitaria um empregado como Bob Esponja? Ele jamais se importaria em não receber salários, seu prazer é o trabalho e nele estaria dedicado 24 horas por dia se fosse necessário. A hora de começar a trabalhar é o momento mais feliz para ele. Quando o dia acaba, ao contrário, é o momento mais triste, já que tem que parar de trabalhar, como se vê em sua fala no episódio Sirigueijo nasce de novo: “Hora de fechar, a hora mais triste do dia.” (HISTÓRIAS... 2003). Ou no episódio Como na TV (O NATAL... 2002), ao acordar: “Hora de fazer a minha coisa predileta no meu local predileto.” Sua coisa predileta é o trabalho de fazer hambúrgueres e seu local predileto é o local de trabalho. Bob Esponja é feito para ser engraçadinho, para cativar as crianças, é com ele que elas tendem a se identificar, é a ele que elas tendem a imitar; ele e seu jeito de ser, sua dedicação ao trabalho, sua dedicação ao patrão capitalista.

Compre DVDs do Bob Esponja no Submarino.

Sobre o Jabá


Mauro Dias

A música brasileira entrou num impressionante processo de decadência. Errado. A música brasileira continua boa como sempre. Há grandes compositores, cantores, instrumentistas. Mas não é possível dizer que estejam em atuação. Tentam atuar. Não têm onde. Tentam viver da arte – tolice. São dentistas, fiscais do INSS, professores, motoristas de táxi, balconistas, colunistas de jornais – essas atividades garantem a sobrevivência. Tomam tempo – a criação artística, que é a atividade principal (estamos falando de artistas) acaba sendo deixada para as horas possíveis. A música brasileira que toca nos rádios, na televisão, nos grandes palcos, nos estádios, nas festas de São João, no carnaval, nas convenções de criadores de gado é que está em decadência. E só ela que aparece. A outra música, a boa, existe, mas não aparece. A culpa é dos radialistas, dos que montam trilhas sonoras de televisão, dos executivos das gravadoras, dos produtores de discos e espetáculos, dos marqueteiros da indústria de entretenimento. Essa gente criminosa está transformando, conscientemente, coração em tripa. É responsável pela seleção do que você ouve e deixa de ouvir. Essa gente está assassinando o que há de mais rico em nossa produção cultural. E ganhando muito, muito, muito dinheiro. Leia mais

sábado, dezembro 24, 2005

Conto de natal


Gian Danton

1992 foi um ano difícil. A loja Quatro Irmãos tinha estado no zero por onze meses e havia esperança de recuperar o consumidor durante o natal.
No dia 24 de dezembro, lá estava, de manhã cedo, um Papai Noel na frente da loja, balançando um sininho de lata de Nescau e gritando muito timidamente:
- Feliz Natal ! Feliz natal !
Chama-se Melquior, o Papai Noel , e parecia ter o dom único de mexer tão somente a boca e a mão com o sino. Ficava retesado, mais inerte que uma estatua, na frente da Quatro Irmãos. Os passantes paravam, davam algumas gargalhadas, apontavam com o dedo e gritavam:
- E aí, palhaço? Quer me dar aula de balé?
- Ô bobão... você saber mexer ao menos a bunda?
E iam embora assim que a brincadeira perdia a graça.
Dava a impressão de que, ao invés de chamar, Melchior afastava os clientes. Depois de meia hora e trezentas olhadelas esperançosas pela porta, o seu João, dono da Quatro Irmão – que curiosamente só tinha um sócio – gritou lá de dentro:
- Olha, vamos colocar um pouco mais de vida nisso, que eu não quero defunto na frente da minha loja...
Como conseqüência imediata, o Papai Noel começou a pular, balançando o braço num movimento pendular, ao mesmo tempo em que cantava:
- Feliz Natal! Feliz Natal! Feliz Natal pra todos!
Era isso aí. Estava pegando o jeito. O coração bateu mais forte quando um garotinho atravessou a rua... na direção da loja!
Finalmente! O primeiro freguês! O natal dos filhos assegurado! Melchior podia sentir a pulsação dentro do peito, o suor escorrendo em direção à barba de algodão...
- Ei garoto!
- Eu?
- Você mesmo! Venha cá! Veja quantos lindos brinquedos temos na nossa loja... Papai Noel só compra brinquedos na Quatro Irmãos!
Os olhos do garoto brilharam. Melchior examinou-o de cima a baixo: tênis importado, camiseta da moda, bermuda de etiqueta. Tava no papo!
- É verdade? O senhor só compra na Quatro Irmãos?
- Compro.
- Tudo?
- Tudo!
- Até essa barba fajuta?
E puxou a barba do coitado, fazendo com que o elástico apertasse na nuca até doer.
- Seu pivete! Me dá isso aqui! Onde já se viu? Moleque impossível! Não tá vendo que eu tô trabalhando? Vem cá que eu te dou um chute no traseiro...
O moleque parou um pouco à frente, entocou o dedão na boca e começou a chorar.
Melchior ficou preocupado. Afinal, um garoto chorando em frente à loja não era exatamente uma boa propaganda. Lá dentro, por trás do balcão, o Seu João franzia a testa, numa expressão de “está despedido”.
- Ei, garoto. Vamos, não chore. Olha o sininho do Papai Noel...
O pirralho abriu um olho, deu uma espiada de leve e continuou chorando.
- Olha, lá na loja tem carrinho...
Era a palavra mágica. O garoto parou de chorar tão repentinamente quanto havia começado.
- Tem camburão de polícia, arma de raio laser, bonequinho suicida, caminhão de lixo, bombinha atômica, granada...
A cada palavra os olhos do menino se abriam mais.
- E todos esses brinquedos maravilhosos por um preço que parece brincadeira... O que você acha de pedir para a mamãe comprar seu presente na Quatro Irmãos? O que você acha, hein? É a loja oficial do Papai Noel...
- Pedir para a mamãe comprar meu presente aqui? – perguntou o pirralho, com cara de “boa idéia”.
- Isso mesmo. E então? O que acha, hein?
- Não dá. A mamãe já comprou meu presente.
E lá se foi o pulha, em direção à sorveteria.
Desaforo! Podia-se ver, agora, a indignação misturada com a persistência de um mártir por trás da barba de algodão. Havia de gritar a plenos pulmões, arrastar mães pelos cabelos, despir-se no meio da rua, mas traria um freguês para dentro da loja!
- Feliz Natal! Feliz Natal! – gritava, dando pulos desajeitados e balançando de um lado para o outro o sininho.
Tanto berrou que ficou rouco. No fim, mal conseguia pronunciar um insignificante dindonbel.
- Seu Melchior, venha cá! – berrou o chefe, detrás do balcão. Então eu pago o senhor parar ficar só dançando, feito vedete de auditório?
- ...
- Eu pago o senhor para chamar fregueses para a minha loja...
- ...
- O que foi? Se acha muito superior para poder falar comigo? É isso?
- Eu... eu tô rouco, chefe...
- Rouco? E para que eu vou querer um Papai Noel rouco? Suma já daqui, que eu não gosto de vagabundos na minha loja...
- ...
- Não entendeu? O senhor está despedido!
Despedido! Lá se iam o caminhão do Juquinha, a boneca da Maria e o revólver do Pedrinho... despedido!
Passara o mês inteiro procurando emprego e o primeiro oportunidade que conseguira escapava de suas mãos tão rápida e inevitavelmente quanto sua voz. Despedido!
- Des... des... DESPEDIDO!
As nove letras saíram de sua garganta como um urro de leão, assustando até o chefe. Melchior levou as mãos ao pescoço e ficou repetindo para si mesmo, com um sorriso abobalhado:
- Voltou... voltou... voltou! Chefe, o senhor faz milagres!
E tascou um beijo agradecido na careca reluzente do Seu João.
Um segundo depois, lá estava ele na frente da loja, cantando, gritando e pulando como se tivesse descoberto o uso das cordas vocais naquele mesmo instante.
Desta vez estava dando certo. Muitos paravam para tocar o bondoso velhinho e receber um conselho cristão:
- Respeite seus pais, escove os dentes antes de dormir e peça para a mamãe comprar seus presentes na Quatro Irmãos...
A freguesia aumentou bastante, até porque estava se aproximando a hora do pique. Foi quando uma ideiazinha, um vermezinho de nada, começou a romper a casca lá dentro, nos neurônios do Papai Noel.
- Já pensou se alguém vê você aqui? Que vexame! Um pai de família vestido de Papai Noel... se o pessoal do bairro descobre, essa valia por um mês de piadas.- cochichava a ideiazinha.
Melchior começou a disfarçar a voz, a olhar para os lados, assustado...
- Meu Deus! É o Gaspar! – exclamou, vendo um rapaz magro e alto descendo a rua.
Logo o Gaspar, o vizinho mais metido e todo o bairro. Embora não se vissem há muito tempo, Melchior lembrava-se dele no bar, pagando cerveja para todo mundo e gabando-se de seu famoso e lucrativo emprego na empresa estatal... logo o Gaspar!
“Desgraça pouca é bobagem”, pensou Melchior, encurvando-se e escondendo a cabeça com o saco vermelho.
Gaspar passou direto e entrou na loja vizinha, a Cinco Irmãos.
Melchior respirou aliviado, mas espantou-se quando, dali a alguns minutos, saiu de lá um Papai Noel magro e alto, gritando a plenos pulmões:
- Feliz Natal! Feliz Natal!
As crônicas não dizem quem deu primeiro pela coisa. Mas o fato é que dali a segundos lá estavam eles, frente-a-frente, olhando-se como se olhassem um espelho distorcido. Estudaram-se da cabeça aos pés, fizeram gestos um para o outro e, de repente, perceberam!
- Melchior! O que você está fazendo aqui?!
- E você, Gaspar? Papai Noel com roupa de palhaço...
Gaspar olhou para baixo e só então percebeu que sua roupa era realmente um traje de palhaço adaptado para se fazer passar pela vestimenta do bom velhinho.
- Olha só quem fala: papai noel de chinelo...
- Papai Noel brasileiro. – explicou Melchior, embora soubesse que na verdade o chefe não havia se disposto a comprar uma bota. Mas e o que você está fazendo aqui? E aquele emprego na estatal, rapaz?
- Pois é: fui despedido. Esse negócio de privatização... foi muita gente para o olho da rua. Agora tô tendo de dar uma de Papai Noel para poder comprar o presentinho do meu filho... é pouco coisa: uma diária e porcentagem por freguês que eu conseguir...
- Você também?
- Por quê?
- Eu também ganho por freguês que eu conseguir...
Concorrência. Um Papai Noel a mais era sempre uns cobres a menos no bolso. A ideiazinha começou a cochichar novamente.
Não era justo! Afinal, ele tinha chegado primeiro... o outro, com aquela roupa de palhaço, bem que podia chamar mais atenção e lá se ia a comissão... A ideiazinha voltou a crescer e se transformou rapidamente em ódio.
Ódio! A cabeça de Gaspar fendida, com os miolos escorrendo e Melchior sobre ele, golpeando implacavelmente com o sininho de Nescau... A rua seria dele, a cidade, o estado, o país, o mundo!
E nisso ia se aproximando do outro, pronto a pegá-lo de surpresa.
Súbito pararam os dois, com as mãos levemente levantadas, num ataque suspenso. Avermelharam, piscaram seis vezes, esconderam os respectivos sininhos às costas...
- Feliz Natal! – desejou Gaspar, meio sem jeito.
- Boas Festas! – retribuiu Melchior, entre os dentes.
- Feliz Ano Novo! – entoaram os dois, afastando-se um do outro.
Não tinha mesmo jeito. O negócio era ser tão alegre e chamativo quanto o concorrente.
Em nenhum instante a rua ficou tão risonha.
Os dois cantavam, agitavam seus sinos, chamavam os passantes, afagavam os cabelos das crianças e davam estrondosas gargalhadas no melhor estilo “Ho ho ho!”.
As duas lojas estavam enchendo de gente.
Era uma mulher que vinha comprar presente para o seu filhinho;um casal de velhinhos, que saiu com um jogo de damas; um homem baixinho, troncudo, que embirrou de comprar um jogo infantil para o seu afilhado de 15 anos...
Quanto mais fregueses entraram, mais os Papais Noeis se empolgavam e acabaram (nesse ponto as crônicas são um tanto obscuras, de modo que não se pode saber, portanto, quem começou) dançando juntos.
Ficaram lá, na frente da loja, de braços dados e agitando as pernas como se fossem bailarinos russos. Só pararam quando o dono de uma das lojas gritou lá de dentro:
- Que bagunça é essa aí na frente?
Já não existia nem um pinguinho de ódio ou rancor em seus corações. Sentiam-se unidos pela função como irmãos o estariam pelo sangue.
Ao meio-dia foram juntos a um bar da esquina comer um sanduíche de pão com salame. Tomaram um guaraná (um para dois, daqueles grandes, que era mais barato) e conversaram bastante.
Passaram o resto do dia como enamorados, lado a lado, fazendo a propaganda de suas respectivas lojas, o suor molhando suas roupas vermelhas.
O movimento começou a diminuir lá pela nove da noite. Gaspar parou um instante, olhou o relógio (lembrança dos velhos tempos da estatal), enxugou o suor da testa e soltou:
- Ufa! Nove horas! E eu ainda tenho de comprar o presente de meu filho...
- E o que é que você vai comprar para ele?
- Um daqueles trenzinhos de plástico, com vários vagões e rodinhas.
- Ah, sei. Quanto é que está na sua loja?
- Blá blá, blá.
- Tudo isso? Aqui está blá.
- Não brinca! Sério?
- Sério: blá!
- Nossa, tá muito mais barato que aqui... – avaliou Gaspar. Pode ter certeza de que vou comprar o presente aí... Esse pessoal da Cinco Irmão é um bando de ladrões!
O Ladrões saíra agudo, quase um assobio. Uma senhora dobrara a esquina e Gaspar ficara os olhos nela.
- Compre aqui que é mais barato, minha Senhora! Só a Cinco Irmãos tem o melhor preço da cidade!
A mulher pareceu hipnotizada. Deu uma sutil guinada no seu passo decidido e entrou na Cinco Irmão.
Gaspar piscou para Melchior:
- Não esquece de reservar o trenzinho...
A mulher entrou, comprou o presente e saiu. Depois dela, um senhor calvo, capengando de uma perna. Na Quatro Irmãos entrou uma falsa ruiva, em roupas típicas de secretárias.
E o tempo foi passando... passando. Lentamente... orquestrado pelo movimento dos dois...Nove e meia... dez horas... dez e meia... onze horas...
- Onze e meia! – espantou-se Gaspar, olhando para o relógio.
- Onze e meia?
- É.
- Quem sabe?
Olharam para os seus respectivos chefes com aquela cara de cachorro sem dono que os mendigos aperfeiçoam à perfeição.
Separados apenas por uma parede, cada um atrás do balcão de sua loja, os chefes retribuíram com os braços cruzados e a cabeça balançando de um lado para o outro, em negativa.
- Quem ele pensa que vai comprar a uma hora dessas?
- Algum Papai Noel atrasado, com certeza!
- É, acho que vamos ter de sair daqui meia-noite mesmo...
E assim foi.
Contando os segundo como se cada um deles fosse um preguiçoso que precisasse ser empurrado para passar, os dois chegaram finalmente às 24 horas.
Mais do que depressa, os dois funcionários da Quatro Irmãos e os três da Cinco Irmãos desapareceram pelas ruas, com seus embrulhos debaixo do braço.
Gaspar e Melchior foram os últimos. Gaspar ainda teve de comprar o trenzinho e Melchior gastou seus cobres numa boneca, num caminhão e num revólver de plástico. Saíram pelas ruas vestidos de Papai Noel mesmo.
Seguiram pela calçada a passos de marcha, enquanto o dono da Quatro Irmãos passava por eles num Monza 91.
O homem passara a manhã inteira reclamando que não havia conseguido trocar o Monza por um carro zero. Melquior teve vontade de comentar a ironia da coisa com o amigo, mas não teve forças.
Chegaram resfolegantes à parada.
- Que ônibus você vai pegar? – perguntou Gaspar.
- O Sacramenta Nazaré. E você?
- Eu também.
- Eu também, o quê?
- Também vou pegar o Sacramenta Nazaré.
- Ahhh... – fez Melchior, bocejando.
Gaspar estava apertando os olhos.
- Que ônibus é aquele ali? – gritou, de repente.
- É o Sacr...
Estenderam as mãos.
O ônibus, lotado, passou voando por eles.
Ficaram na mesma posição, com os braços estendidos, como se ainda pudessem trazer o ônibus de volta.
- Droga! Só falta agora eu não conseguir chegar em casa para levar o presente do meu filho!
- É... – concordou Melquior.
Os dois olharam, desolados, para os presentes, e sentaram no meio-fio.
- Sabe, - começou Gaspar – quando eu era criança, tinha uma coisa que me intrigava...
O sorriso de quem está contando algo levemente constrangedor dominou seus lábios.
- Eu... eu... queria saber por onde é que Papai Noel entrava em casa. É que todo mundo falava que ele entrava pela chaminé e deixava o presente debaixo da árvore.
Gaspar alisou os cabelos. O sorriso envergonhado havia aumentado consideravelmente.
- Só que lá em casa não tinha chaminé...
- E aí? Por onde é que ele entrava? – perguntou Melquior, rindo.
- Era isso que eu queria saber... Um dia eu decidi: fiquei acordado até de madrugada. Sabe aquela hora em que a gente só ouve o latido dos cães e o uivo do vento? Eu puxei o lençol e coloquei um pé fora da cama, depois o outro.
Tinham levantado. Gaspar contava empolgado, fazendo gestos com as pernas e os braços.
- Aí eu fui andando, pé ante pé... abri a porta e fui na ponta dos dedos até a sala. Não tinha ninguém lá... nenhum Papai Noel. Só a árvore de natal e os móveis...
- E aí? – quis saber Melquior. O que você fez?
- Eu me escondi atrás da árvore e fiquei esperando... rapaz, de repente eu vi: era ele! É ele! É ele!
- O Papai Noel?
- Não, o Sacramenta!
Melquior se virou e, instintivamente, fez sinal, mas já era tarde demais. Do ônibus havia sobrado apenas a poeira.
Sentaram-se, desanimados, no meio-fio.
- Era o meu pai. – disse Gaspar. Ele acordava de madrugada e deixava o presente embaixo da árvore. Aliás, sempre o mesmo presente: um carrinho de bombeiro azul com sirenes verdes que acendiam...
- Sempre o mesmo presente?
- É, ele tinha comprado um monte desses numa liquidação. Estavam com defeito de fabricação...
- ?
- Tinham sido pintados errado...
- Ah...
- Foi aí que deixei de acreditar em Papai Noel...
Ficaram lá sentados no meio-fio, alisando cada um a sua barba de algodão. Gaspar tirou o gorro e ficou batendo o pom-pom na perna. Melquior brincava com o sininho de lata de Nescau, olhando triste para algum ponto distante...
Ficaram um bom tempo assim. De repente, Gaspar tirou algumas notas amassadas do bolso e começou a contar.
- Quanto tu tem aí, hein cara?
Melquior largou o sininho e tirou algumas notas do bolso. Contou.
- Blá, blá, blá.. – respondeu, estendendo o dinheiro para o amigo.
Os dois montes de papéis sujos e amarrotados foram unidos e contados. O resultado deveria dar para comprar algo para se comer e talvez ainda sobrasse algum para tentar pegar o ônibus quando eles voltassem a circular.
Seus estômagos já protestavam em altos brados.
Passaram por ruas escuras, de casas antigas. Em algumas delas, podia-se ouvir o barulhinho dos festejos: gente falando alto, o tilintar de talheres, o rádio ligado, a TV passando um especial sobre filmes antigos...
Encontraram, finalmente, uma baiuca aberta. Alguns bêbados se amontoavam no balcão, as camisas abertas no peito, os rostos cheios de rugas e olheiras.
Passaram em frente a uma estufa de vidro, com armação de madeira, onde se acumulavam doces, massas e salgados. Um montículo de bolor nascia com uma flor sobre um pedaço de bolo de chocolate.
Decidiram-se por um pão com queijo e mortadela.
Melquior e Gaspar aproximaram-se do caixa, onde um português gordo, de enormes bigodes, barba mal-feita, chinelas de couro e lápis na orelha, palitava os dentes.
Já iam pedir quando os olhos de Gaspar bateram em uma garrafa de vinho em promoção.
- Me dê um sanduíche e uma garrafa de vinho. – solicitou Gaspar.
Cinco minutos depois, os dois Papais Noeis estavam dividindo o sanduíche e um vinho tão vagabundo que o rótulo borrava em contato com a água.
Depois da primeira garrafa, pediram a segunda, e a terceira.
Quando a noite os viu novamente, andavam porres pelas ruas da cidade, balançando seus sinos e cantando:
- Feliz Natal! Feliz Natal! Feliz natal pra todos!
Estavam nisso quando Melquior caiu ao chão e desabafou:
- Feliz natal uma ova!
Gaspar se aproximou e tocou-lhe o ombro. A rua se distorcia, girando em torno da cabeça.
- Ei cara! O que foi que aconteceu? Vamos dançar, vamos comemorar...
- Meu amigo... você é meu amigo, não é?
- Claro que sou.. amigão do peito! Palavra de escoteiro!
- Então senta aqui do meu lado que eu quero te contar uma coisa...
Melquior puxou o outro para perto de si, quase enforcando-o.
- Você é meu amigo... por isso eu vou te contar uma coisa que nunca contei pra ninguém...Sabe, quando eu era criança, a gente morava numa casinha de madeira e eu dormia na rede... a gente colocava a chinela havaiana da rede e quando acordava o presente de natal tava lá... sabe que um dia eu acordei... e sabe o que foi que eu vi?
- O presente?
- O chão.
Havia agora um misto de raiva e tristeza no olhar de Melquior. Os olhos passeava de um lado para o outro e caiam no chão.
- Eu não me conformei. Procurei no guarda-roupa, atrás da porta... Nada, não tinha nada, nem em cima do guarda-roupa e nem atrás da porta...
Melquior engoliu em seco, querendo se enterrar no chão.
- Aí eu fui com minha mãe e ela disse que quem comprava o presente era o meu pai e que ele tava desempregado... Você já deixou de ganhar presente de natal, cara? Foi aí que eu deixei de acreditar em Papai Noel...
Ficaram sentados no meio-fio, estudando atentamente os relevos do solo.
- Você é que tem sorte!- vociferou Gaspar, levantando-se e empurrando o outro para o lado. Você pelo menos nunca teve um natal de verdade...
- Eu?
- É. Você não tem com o que comparar. Não é como eu, que tive natal de verdade e não tenho mais...
- E o que é um natal de verdade? Hein?
- É... é.. é uma mesa cheia de comida: peru, panetone, bolo, passas.. e presente pra todo mundo... Antigamente era assim lá em casa.. agora nem para dar um presente de natal pra minha família eu presto...
Lágrimas desabrocharam dos olhos de Gaspar, deslizando calmamente pela barba postiça...
- Nem para isso eu sirvo... Nem pra dar um presente decente... agora eles devem estar lá, dormindo, com fome... e nem o presente do meu filho eu consegui levar... Droga! Droga de vida!
- Ei, cara! Olha, meu amigão do peito... ouve só um negócio: naquele dia que eu não recebi presente, a minha mãe me deu um abraço tão bom que valeu por um presente, sabe? Olha, eu descobri que natal não é presente, não é mesa cheia de comida... o que faz o natal é a gente... pensa bem... amanhã tu vai chegar em casa e vai poder dar um abraço no seu filho. Pior seria se tu chegasse lá dando presente, mas batendo em todo mundo...o natal quem faz é a gente.... Natal é amor, sabe? Natal é amor...
Tinham sono. Foram cedendo o corpo dolorido até deitarem completamente na calçada. Dormiram, um ao lado do outro.
Gaspar foi o primeiro a acordar. Algo ardia em seus olhos. Resmungou algumas palavras desconexas, levantou um pouco e tentou abrir as pálpebras.
Várias luzes ocuparam toda a sua área de visão. Dançando e descrevendo trajetórias caóticas, elas foram se unindo numa única e forte luz branca.
- Ei, cara! Acorda! O que é aquilo ali?
Melquior esfregou os olhos e soltou alguns impropérios.
- Que droga! Será que... o que é aquilo? O dia está nascendo?
- Não, é uma luz...
Era uma luz, de fato. Os dois se levantaram e, de repente, a esperança tomou conta deles.
Quem sabe todas aquelas histórias eram verdadeiras? Quem sabe ainda existisse um futuro melhor para todos? Lágrimas de felicidade e esperança brotaram dos seus olhos.
- É a luz de natal! – apostou Gaspar.
- Sim, é a luz de natal! – confirmou Melquior.
Aproximaram-se.
Seus passos eram lentos e seguros. Os braços, pernas e pés completavam uma coreografia de esperança e paz. Era a luz de natal.
Gaspar foi o primeiro a perceber.
Ele recuou horrorizado e estendeu as mãos na frente do corpo, num esforço inútil de defesa. Melquior também fez o mesmo, mas já era tarde demais.


Dois homens, vestidos de Papai Noel, foram atropelados por um ônibus hoje de madrugada.
O Motorista Manuel da Silva, da linha Sacramenta-Nazaré, disse, em entrevista, que não pensou que estivesse atropelando pessoas de verdade: “Quando vi os dois no meio da rua, pensei que fosse alucinação. Nem me preocupei em desviar. Nunca acreditei em Papai Noel”.
Hoje é véspera de natal. Engraçado que do natal a gente sempre lembra mais da véspera que do dia em si. O dia de natal tem jeito de pós-climax. As minhas boas lembranças são sempre da véspera, da família reunida, preparando quitutes, trocando presentes. É um momento que todos se unem em torno de uma idéia, um objetivo. Os livros espíritas dizem que é a época do ano que os espíritos benfeitores têm menos trabalho para convencer as pessoas a fazerem o bem. Talvez seja isso que chamam de espírito natalino. Espero que nesta data esse espírito ilumine as mentes de cada um dos meus leitores, espero que passem seu natal em paz e harmonia... e para aqueles que estiverem sozinhos, lembrem-se que nem mesmo a maior distância separa uma afeição verdadeira. Quem ama está sempre ligado por um fio de ternura a quem é amado...