Começou, de novo, a caça às bruxas nas escolas públicas. Segundo o G1, uma mãe, na cidade de Vila Velha, Espírito Santo, reclamou do filho ter emprestado na biblioteca da escola o livro O Nome do Jogo, de Will Eisner. Segundo ela, o livro é pornográfico. Como resultado, a prefeitura de Vila Velha mandou recolher álbum de todas as escolas públicas.
Mais uma vitória dos iletrados. O nome do jogo está longe de ser pornográfico. É um livro importante sobre a vida dos judeus na América e fala sobre como o casamento foi usado por eles como um meio de subir socialmente.
A mãe, claro, não se deu ao trabalho de ler. Folheou, viu uma mulher com as costas aparecendo (cena abaixo) e achou um absurdo. Se fosse um livro, não teria problema nenhum já que a mãe, iletrada, não se daria ao trabalho de ler a obra.
Já li em bibliotecas públicas livros com teor muito mais pesado que O nome do jogo. Satiricon, de Petrônio, é um dos melhores relatos sobre a Roma Imperial, mas é também um livro repleto de orgias (quem história sabe que os romanos encaravam o sexo com muita naturalidade). Li Dalton Trevisan em biblioteca pública. Li Machado de Assis em biblioteca pública (quem acha que a obra de Machado é inocente é porque nunca leu seus livros). Li Menino de engenho, de José Lins do Rego em biblioteca pública (para quem não leu, tem uma famosa cena de zoofilia).
Li Nelson Rodrigues em biblioteca pública.
Ninguém nunca reclamou desses livros na biblioteca porque os iletrados não leem e esses livros não tinha figuras. Os que são leitores sabem que as cenas mais fortes estão, na maioria desses livros, contextualizadas e não são o foco das obras. Embora Dom Casmurro tenha traição e tentativa de infanticídio, o livro vale pela profunda análise do ser humano. Se fizessem uma adaptação para quadrinhos, só iam ver isso porque os iletrados, como disse, não se dão ao trabalho de ler. Basta "ver as figurinhas".
Hoje, quem decide o que entra e o que não entra nas bibliotecas públicas são os iletrados e analfabetos. Este é o mundo em que vivemos.
2 comentários:
E viva a ignorância!
uma amiga minha que faz Pedagogia na UFPA me disse que as obras passam primeiro pelas mãos dos pedagogos e DEPOIS vão parar nos acervos das bibliotecas! ou seja, não podemos culpar somente os iletrados e analfabetos por escolherem o que vai entrar ou não nos acervos, mas também os responsáveis por sua triagem e conseqüente sistematização, já que não sabem “ler” e “identificar” obras que se adequem em determinados meios – como o que aconteceu com a obra do Eisner. O mito do quadrinho é coisa tão enraizada que inclusive o praticamente todo mundo do meio acadêmico acredita nisso (vergonha!) e acaba dando esse tipo de cagada monstro!
Mas, resumindo, o pessoal não sabe ler mesmo e quem paga o pato é o pessoal que sabe!
Aí fodeu-se tudo!
Isso é Brasil, né?
MUITO INFELIZMENTE, isso é Brasil.
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