Sem Stan Lee não exisitiria Gian Danton.
No final da década de 1950 a grandiosa DC dominava
o mercado de quadrinhos quase sozinha. Uma de suas concorrentes era editora
pequena, composta apenas de uma sala, um editor e uma secretária. Poucos anos
depois, essa editora secundária se tornaria o Davi que iria derrotar o Golias
nas vendas e na imaginação do público.
Stan Lee, o editor da Marvel, era a mente por
trás dessa mudança. Junto com Jack Kirby ele criou o Quarteto Fantástico, o
grupo de heróis que revolucionaria os quadrinhos com personagens
bidimensionais, brigas internas, histórias em continuidade e muita, muita ação.
O método criado por ele (chamado hoje de método
Marvel) permitia que artistas como Jack Kirby imprimissem um ritmo, uma
agilidade, um movimento que fazia parecer que as histórias do Super-homem
aconteciam em câmera lenta. Por outro lado, o texto de Lee humanizava e
caracterizava cada personagem. Até mesmo personagens terciários, como o
Surfista Prateado, ganhavam um background, uma história de vida, um modo de
falar, uma personalidade.
E Lee fazia questão de colocar créditos nas
histórias. Ao contrário da DC, que fazia questão de esconder os nomes dos
desenhistas e roteiristas, a Marvel alardeava aos quatro ventos que tinha os
melhores artistas e escritores e dava nome a cada um. E mais: seus textos
faziam acreditar que a Marvel era um verdadeiro mundo mágico, a casa das ideias
e que a produção de quadrinhos eram uma nova forma de arte (Se estivessem
vivos, Shakespeare e Michelangelo estariam fazendo quadrinhos, dizia ele).
Fazer quadrinhos era uma grande aventura!
Como resultado, os leitores começaram a prestar
atenção em quem fazia as histórias – e descobriram que havia alguém que
escrevia as HQs, os roteiristas. Também como resultado, o público universitário
se viu atraído pelos gibis e, com o tempo, isso abriu caminho para todo um
campo acadêmico, o de pesquisadores de quadrinhos.
Como editor, Lee tinha uma máxima, que passou
ao seu pupilo Roy Thomas: se uma revista está vendendo bem, deixe o time
criativo livre. Isso fez com que a Marvel explodisse em criatividade nos anos
1970, com trabalhos impressionantes como o Dr. Estranho de Steve Englehart e Frank Brunner, que
levou a psicodelia do personagem ao seu nível máximo e o texto a um nível
poucas vezes alcançado, antes e depois.
O sucesso da Marvel balançou a DC, fazendo com
que ela saísse de seu confortável conservadorismo. Durante anos a Distinta
Concorrência, como chamava Stan Lee, fez de tudo para ser tão criativa quanto a
Marvel – e conseguiu na década de 1980, quando trabalhos inovadores como os
Novos Titãs, Crise nas infinitas terras e as séries autorais Cavaleiro das
trevas e Watchmen balançaram a indústria de quadrinhos.
Eu lia quadrinhos desde pequeno, principalmente
quadrinhos infantis como Turma da Mônica e Disney.
Ali pelos 15 anos eu já tinha me enjoado desse
tipo de leitura. Foi quando, numa fila de banco, caiu em minhas mãos um
exemplar de Superaventuras Marvel. Eu simplesmente pirei na revista e em
especial naquele Doutor Estranho diferente, que flertava com a psicodelia (e
que se tornaria por anos meu personagem predileto, ao lado dos X-men). E pirei
mais ainda ao ver, nos créditos, o nome de quem fazia as histórias. Sim, cada
HQ tinha um desenhista ... e um roteirista! Ali surgiu o sonho de ser
roteirista.
Anos depois, o compadre Joe Bennett me
emprestou Watchmen, de Alan Moore e Dave Gibbons. Foi um impacto incomparável,
que me fez buscar tudo que achasse escrito por Alan Moore – e fez com que eu
aceitasse escrever uma história desenhada pelo compadre, a Floresta Negra.
Se Stan Lee não tivesse transformado a Marvel
no que ela se tornou, eu não teria lido aquela Superaventuras Marvel e nunca
teria tido o sonho de ser roteirista de quadrinhos. Se não existisse a eterna
concorrência com a Marvel, a DC continuaria sendo uma editora conservadora e
nunca teria publicado trabalhos tão revolucionários como Monstro do Pântao e
Watchmen – e, portanto, eu não teria tido o impulso de começar e o norte do
tipo de histórias que queria contar como iria contá-las.
Se não fosse a geração de universitários criada
pela Marvel, que a passou a ver os quadrinhos além do preconceito, eu nunca
poderia ter escrito meu TCC, minha dissertação e minha tese sobre quadrinhos.
Stan Lee mudou não só a indústria de
quadrinhos. Mudou a minha vida e a de muitas outras pessoas. De certa forma,
ele mudou o mundo.
Eu poderia dizer descanse em paz, mas duvido
que ele gostaria disso. Deve estar agora agitando as coisas lá no céu dos
criadores.
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