O gonzo jornalismo foi criado por Hunter
Thompson no final da década de 1960. Era um estilo tão pessoal, que parecia único,
incapaz de ser imitado, com matérias em primeira pessoa, repletas de sarcasmo e
ironias. Entretanto, no Brasil um jornalista chegou muito próximo do estilo de
Thompson, adaptando-o ao ares tropicais. Seu nome, Arthur Veríssimo, e as matérias
foram publicadas na revista Trip durante anos. É a junção dessas diversas
reportagens que compõe a antologia Gonzo!, publicado pela editora Realejo em
2014.
O livro reúne 30 reportagens com temas
absolutamente diversos e aleatórios. Arthur Veríssimo embarca em toda as
roubadas possíveis, de atirar num campo clandestino de armas no Camboja a ser
preso por engano na República Dominicana.
Arthur Veríssimo não é só o jornalista, mas
também um personagem dessas reportagens. Explica-se: o gonzo não acredita na ideia de
objetividade jornalística e a proposta é fazer o repórter mergulhar na matéria
e não só os bastidores das matérias são contados, mas também os momentos
constrangedores.
Aliás, tanto títulos como subtítulos das matérias
já dão o tom dos textos e são uma atração à parte. Exemplo: “Bombando Bombaim –
de rolê na Índia, o repórter-gonzo visita o Kumb Mela, flerta com atrizes de
Bollywood e, no fuzuê sacro do festival de Ganesh, o deus-elefante, quase é
abduzido por travestis eunucos”.
Há matérias um pouco mais convencionais, como
aquela sobre o edifício Demoiselle, uma favela vertical em pleno centro de São
Paulo. Mas a grande maioria é totalmente fora da caixinha.
Uma das mais divertidas é “Deus é grande”,
sobre uma cidade repleta de templos eróticos na Índia. Arthur argumenta que as
minunciosas esculturas parecem ter vida própria. “Os frisos e laterais possuem
aspectos tridimensionais. As cenas de zoofilia e outras bizarrices deixariam o
Marquês de Sade espumando de felicidade (...) Passo a mão sobre uma sinuosa estátua
e repentinamente sinto uma baita energia rasgando minhas entranhas. Efeito Kundalini.
Fico de fallus eretus diante das ninfas e da força magnética de templo”.
Pouco depois, encontra um casal de portugueses
aos amassos: “Marília, a noiva sem pudores, destila que nunca na vida havia
feito tanto amor com seu adorável Manuel. ‘Ora, pá, isso aqui é orgiástico. Estou
correndo para o quarto com meu Casanova de Lisboa’. Na mesma vibe, Manuel
exclama: ‘Vamos simbora, Marília, que quero engatar a posição da tarturuga’”.
Ou seja, é um livro
divertidíssimo, que mostra muito bem que humor e boas reportagens não são
conceitos opostos.
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