O final de uma história em quadrinhos é um dos momentos mais importantes da trama. Quantas vezes já não ficamos com vontade de jogar o gibi no lixo depois de ler o final de uma história?
Apresento aqui algumas estratégias de finalizar
a história.
Uma das possibilidades é terminar com uma
ironia do destino.
É um final típico do seriado Além da
imaginação, que tornou esse recurso célebre.
Nos quadrinhos, o mais célebre exemplo de final
irônico é, provavelmente, Watchmen. Todo o plano ousado de Ozymandias pode ser
cair por terra por causa da escolha de um idiota.
Já o final surpresa é típico das histórias de
terror. Nesse tipo de estratégia o leitor descobre no final da história que
tudo que ele imaginava até ali sobre a trama e até sobre os personagens estava
errado. O final surpresa pode ser um verdadeiro desastre, mas, se bem feito,
pode se tornar célebre e até levar o leitor a refletir sobre o mundo à sua
volta.
Nos quadrinhos da EC Comics o final surpresa
chegou a pontos realmente antológicos. Em uma história, por exemplo, uma garota
é estuprada em uma pequena cidade do interior. Um forasteiro é preso. O xerife
finge facilitar sua fuga, mas é só uma estratégia para entregá-lo para uma
multidão enfurecida. No final descobrimos aquilo que já deveríamos saber se
estivéssemos prestando atenção aos detalhes: o xerife era o verdadeiro
estuprador.
Outra maneira engenhosa de terminar uma
história é com a elipse: a história começa como terminou.
Essa é uma estratégia particularmente útil em
histórias humorísticas. Por exemplo, a história podem mostrar uma família
embarcando numa viagem absolutamente desastrosa. Depois, todos dizem: Nunca
mais! No final, vemos essa mesma família, um ano depois embarcando numa viagem
que pelas pistas visuais será outra roubada.
Em uma das minhas histórias para a série de
álbuns Clássicos revisitados eu mostrava uma dupla de garotos extraterrestres
provocando, inadvertidamente, a extinção dos dinossauros. No final, após descobrir
o que tinham feito, eles resolvem voltar para a terra, na França de 1789 e tudo
leva a crer que eles irão provocar a revolução francesa.
O final em elipse pode se dar em termos
visuais: Piada Mortal começa com a chuva e depois Batman e Coringa conversando.
E termina com Batman e Coringa conversando e depois a chuva.
Aliás, Piada Mortal é exemplo de um outro tipo
de final: quando a história trata de um tema, ela deve terminar retornando ao
tema. O tema de piada mortal é a relação doentia entre Batman e Coringa e é
isso que vemos no início (Batman tentando estabelecer algum diálogo para que
não aconteça o final previsível dos dois se matarem) e no final de significado
aberto (que alguns interpertam como o Batman matando o vilão).
Finalmente, uma outra maneira de terminar a
história pode ser com uma reflexão do protagonista ou mesmo do narrador. Essa
reflexão pode ser sobre o impacto dos acontecimentos daquela HQ sobre a vida do
personagem, ou pode ser sobre o próprio protagonista.
Praticamente todas as histórias do Homem-aranha
da fase de Stan Lee e Joh Romita terminavam assim. No número 46 de The Amazing
Spiderman, por exemplo, vemos Peter Parker refletindo: “Naquele dia fatídico em
que me tornei o Homem-Aranha talvez tenha havido mais do que uma mudança física.
Talvez, ao receber outra identidade, eu tenha me tornado incapaz de ser
feliz!”.
Final encadeado é um tipo de final que só pode
ser usado em histórias curtas e cujo roteirista tem controle do processo de
edição.
Nele, uma história só termina de fato na
história seguinte. A primeira tem um final fraco, que deixa no leitor uma
impressão ruim, de algo mal acabado. Mas na história seguinte as duas histórias
se interligam no mesmo final, deixando o leitor surpreso e maravilhado.
Um exemplo desse tipo foi publicado pela EC
Comics e republicado no Brasil na revista Cripta do Terror 1.
Na primeira história, intitulada “Um é
pouco...”, uma femme fatale vive de enganar homens e tirar-lhes todo o
dinheiro, deixando-os na miséria. Depois de arruinar sua mais recente vítima,
ela conhece uma velhinha endinheirada num bar, que lhe propõe morar com ela
para lhe fazer companhia. A golpista percebe ali uma chance de se dar bem
novamente, mas quando chega na casa da velhinha descobre que ela tem um filho
enlouquecido depois de ter sido abandonado por uma mulher que só estava interessada
em seu dinheiro. A história termina com o rapaz matando a moça.
Um final fraco, não? Espere a próxima história
intitulada “...dois é demais”. Nela um homem de meia idade mata a esposa, a
enterra no porão e diz para a polícia que ela fugiu. Mas um detetive resolve
investigar e logo voltará com um mandato para revistar a casa. O marido então
corta todo o corpo, coloca-o num baú e viaja para outra cidade. Sua ideia é
esquecer o baú com o corpo no trem. Mas quando vê o detetive seguindo-o,
percebe que ele irá revistar o baú e troca a etiqueta do baú com o corpo de sua
esposa por um outro baú igual, que acha no compartimento de cargas. Quando o
detetive abre o baú...há um corpo lá dentro! Então vemos um último quadro no
qual o rapaz enlouquecido da primeira história pergunta à mãe o que ela fez com
o cadáver da garota que ele havia matado. E ela responde que o havia despachado
dentro de um baú num trem! O final fecha as duas histórias com uma reviravolta
realmente genial.
Essas são algumas possibilidades de finais para
histórias. É bom lembrar, no entanto, que o único limite para as possibilidades
de finais é a imaginação do roteirista.
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