quarta-feira, julho 31, 2024

A arte de Murphy Anderson, o homem de prata

 


Murphy Anderson foi um dos principais nomes da DC na era de prata dos super-herois. Seu trabalho em personagens como Adam Strange se tornaram antológicos. Confira algumas de suas obras.











Distopias hipodérmicas em Literatura Lado B

 

Literatura Lado B foi uma antologia organizada por Denize Lazarin e Rodolfo Londero e publicado pela Editora da Unicentro com textos sobre ficção científica, terror, fantasia e quadrinhos.
O título refere-se ao fato desse tipo de literatura ter pouca visibilidade nos estudos acadêmicos. Geralmente o lado B é o que trazia as músicas menos conhecidos dos discos. Da mesma forma, são poucos os estudos sobre literatura de gênero no Brasil

Eu colaborei com o artigo “As distopias hipodérmicas”, sobre a como a teoria hipodérmica da mídia influenciou algumas das principais distopias do século XX: Admirável Mundo Novo, 1984 e Fahrenheit 451Clique aquipara baixar o livro. 

SAM 4 – a primeira revista Marvel que li

 


 No início dos anos 1980 não existia caixa eletrônico e muito menos aplicativos de bancos. A única forma de pagar uma conta era passar horas numa fila. Foi numa situação dessas que consegui ler pela primeira vez uma revista Marvel. O primeiro contato tinha acontecido anos antes, que quando vi na vitrine de uma mercearia um exemplar de uma Heróis da TV com uma capa realmente impressionante com o Motoqueiro Fantasma. Mas a primeira vez que li uma revista, foi ali, na fila do banco.

Alguém levara a superaventuras Marvel número 4 para ler e emprestara para alguém, que emprestara para o seguinte da fila e assim em diante até que chegou em mim. Eu só devolvi quando li a última página.

Passei anos procurando essa revista. Nunca encontrei em sebos.

Enfim, desisti e resolvi apelar para uma pessoa que produz fac símiles. Então, quase 40 anos depois, tive a oportunidade mágica de reler aquela revista, tentando entender como e porque ela me marcou tanto.

A capa era uma colagem, feita pelos artistas da Abril com um desenho em destaque de Luke Cage e dois boxes com o Demolidor (num estilo que não lembrava nada Frank Miller) e de Conan (num traço que lembrava remotamente John Buscema).         O verdadeiro impacto estava no miolo. A revista reunia quatro histórias, uma de Luke Cage, uma do Demolidor, uma do Dr Estranho e, fechando, uma de Conan.

Luke Cage era um herói nada convencional. 


Relendo, é possível perceber o quanto a história do Herói de aluguel deve ter sido marcante. Era algo totalmente diferente de qualquer coisa que eu já tivesse lido de super-heróis. Nada de máscaras, identidade secreta, um herói que parecia muito mais um anti-herói, que vendia seus serviços e, nessa história, alugava um muquifo acima de um cinema como escritório.

Na história, cortesia de Archie Goodwin no roteiro e George Tuska na arte, o personagem enfrenta um tal de Cascavel, que teria sido o responsável pela morte da namorada do herói. A HQ mostrava também a origem do personagem e a forma como ele escolhera seu marcante uniforme, escolhendo entre os itens descartados numa loja de fantasia.

Para quem estava acostumado com os heróis certinhos, que tinham tudo nas mãos, como os Superamigos, era algo totalmente diferenciado.

A cena página de Demolidor que me marcou. 


Mas o que vinha depois era muito mais revolucionário: o Demolidor de Frank Miller, nessa época ainda com roteiro de Roger Mckenzie. Na história, o herói investiga o roubo de um carregamento de adamantium.

A diagramação de Miller era revolucionária, assim como a abordagem do Demolidor (algo que eu não sabia na época) e a cena que mais me marcou já estava lá, na segunda página. O herói está num bar, tentando tirar informações de um bandido, quando outro meliante se aproxima dele pelas costas com uma faca. Sem se virar ou mesmo tirar o olho do que está sendo interrogado, o Homem sem medo para o agressor com um soco no rosto. Eu me lembro que pensei: caramba! Esse cara é incrível! Não sabia naquela época que o personagem era incrível porque tinha um gênio por trás de suas histórias. A ambientação urbana e factível era mais uma quebra com os coloridos Superamigos, que pareciam incapazes de dar um soco num vilão.

Em seguida vinha a história do Dr. Estranho. Essa história era continuação de uma trama anterior, inciada por Archie Goodwin e Barry Smith, toda baseada na mitologia lovecraftiana. Nessa edição, o roteiro já estava a cargo de Gardner Fox e a arte de Irv Wesley.

Doutor Estranho se tornou um dos meus personagens prediletos na Marvel. 


Na HQ, o mago se envolve com uma seita secreta que tenta trazer de volta um deus adormecido. Hoje vejo que a trama tinha todos os elementos que tornariam Lovecraft  famoso, numa nítida homenagem, entre eles uma cidade isolada com habitantes que são resultado de uma mistura de raças. Mas na época o que mais me marcou foi a sequência inicial: com o herói aprisonado por grilões numa mesa de concreto, uma cruz invertida com uma cobra ao seu lado e um demônio reptiliano se aproximando para matá-lo.

Eu não tinha lido a história anterior, mas apenas aquele quadro já era o suficiente para despertar minha atenção e tornar o Dr. Estranho um dos meus personagens prediletos da Marvel de todos os tempos. Aquilo não era só super-herói. Havia uma essência de terror ali, de mistérios assombrosos. Imaginem isso para alguém que estava saindo da infância (eu devia ter uns 12 anos na época) e praticamente só conhecia os Superamigos.

Quarenta anos depois eu ainda consigo me lembrar do diálogo final dessa história de Conan. 


Fechando a revista, uma história de Conan com roteiro de Roy Thomas e arte de Barry Smith na qual o cimério salva uma prostituta chamda Jenna das garras de um demônio morcego. Aqui foi a sequencia final que me marcou profundamente, a ponto de eu conseguir me lembrar do diálogo 40 anos depois. Os dois estão no deserto e Jenna sugere que Conan durma e sonhe sonhos de ouro. Quando o cimério acorda, ela fugiu com o ouro, ao que ele comenta: “Tenha sonhos de ouro, ela me disse... e eu fiquei com os sonhos... e ela com o ouro!”.

Era o fechamento perfeito de um mix perfeito que simplesmente fez pirar um garoto de 12 anos e mudou totalmente a forma como eu via os quadrinhos.

Quarenta anos depois essa edição ainda parece ter o mesmo encanto.

Psicopatas: uma mente peversa

 

Psicopatas são pessoas acima de qualquer suspeita.
 Você provavelmente não sabe, mas conhece pelo menos um psicopata. Especialistas acreditam que até 3% da população pode ser composta de pessoas com esse tipo de transtorno de personalidade. Isso significa que a cada trinta pessoas, uma é psicopata. E, o mais importante: é aquele que você menos desconfia.
            A maioria das pessoas quando pensa num psicopata, pensa num louco assassino, de cabelos despenteados e cara de mau. Alguém de quem você certamente fugiria se encontrasse numa rua deserta à noite. As ilustrações de Jack, o estripador, refletem essa idéia. Ele geralmente é mostrado com os olhos esbugalhados, a boca distoricida, uma faca na mão e outra contraída em esgar de raiva e ódio. Na verdade, no caso de Jack e da grande maioria dos psicopatas, essa imagem é a mais distante possível da realidade. As prostitutas que foram vítimas de Jack sabiam dos outros assassinatos e não deixariam se aproximar qualquer pessoa suspeita. Além disso, a situação em que ocorreu os crimes demonstra que as vítimas confiavam no assassino. Uma delas até comeu uvas oferecidas por ele.
            Quando a canadense Leslie Mahaffy chegou em casa depois de uma festa e descobriu que os pais tinham deixado a porta fechada, achou que estava com sorte ao encontrar um rapaz de boa aparência e educado, que se ofereceu para ajudá-la. Ela foi com ele até sua casa, onde acabou trancafiada e serviu de escrava sexual durante duas semanas antes de ser morta, esquartejada e colocada em blocos que concretos que seriam jogados em um lago. 
            A literatura criminal mostra que psicopatas são pessoas simpáticas, acima de qualquer suspeita, pois sabem que se revelarem sua verdadeira face, serão presos imediatamente. Assim, adotam uma máscara social. 
            A grande maioria dos psicopatas nunca vai matar, mas viverá de enganar e destruir a vida de outras pessoas. "Eles andam pela sociedade como predadores sociais, rachando famílias, se aproveitando de pessoas vulneráveis e deixando carteiras vazias por onde passam", diz o psicólogo canadense Robert Hare, uma das maiores autoridades mundiais no assunto.
            Hare começou a se interessar pelo tema quando, recém-formado, arranjou um emprego no presídio de Vancouver. Sua função era atender presos com problemas psicológicos e montar perfis psicológicos para pedidos de condicional. Lá ele conheceu um preso chamado Ray. Era simpático, contava histórias envolventes e tinha um sorriso e que fazia qualquer um confiar nele. E o psicólogo confiou. Certo de que o preso estava dedicado a ter uma vida correta, ele o ajudou a passar para serviços melhores dentro da prisão, como a cozinha. Os dois ficaram amigos, até que Hare descobriu que Ray usava a cozinha para produzir bebidas alcoólicas e vender aos colegas. Os funcionários do presídio alertaram o psicólogo para o fato de que ele não foi o único a cair no golpe. Pouco tempo depois, o psicólogo viu a verdadeira face do psicopata: o gente boa Ray sabotou os freios de seu carro, o que quase provocou sua morte.
            A maioria dos criminosos demonstra uma preocupação responsável por seus amigos e parentes. Os psicopatas não se importam com ninguém e não criam laços afetivos.
Para saber mais sobre o assunto, clique aqui

Doutor Estranho contra Drácula

 


Colocar o mago supremo em rota de colisão contra o príncipe dos vampiros e ao mesmo tempo fazer um crossover entre duas revistas Marvel. Essa foi a ideia que os roteiristas Marv Wolfman e Steve Englehart tiveram em 1976.

A história começou em The Tomb of Dracula 44 e terminou em Doctor Strange 14. Para ilustrar as duas histórias foi chamado Gene Colan, o veterano da Marvel, que, depois de passar por vários heróis da editora, se consolidara, merecidamente, como o ilustrador oficial de Drácula. Colan tinha um traço sujo e constantemente distorcia as figuras humanas, usando e abusando do escorço e de sombras – recursos que o tornavam perfeito para um título de terror.

Na trama, o assistente do Dr. Estranho, Wong, é morto pelo vampiro, o que coloca o mago em seu encalço.

Englehart e Wolfman são dois grandes roteiristas, dois dos principais nomes da era de bronze da Marvel e mostram aqui toda a sua destreza.

O texto de abertura da história escrita por Wolfman já dá o tom sombrio: “Stephen Strange está preocupado! Ele olha atentamente para a névoa cinzenta no interior da esfera brilhante e sabe seu significado! Em breve haverá uma batalha e, antes da noite terminar, o doutor estranho , o mestre das artes místicas encontrará a morte! Nem mesmo o poder contido no supremo cristal poderá salvá-lo quando à meia-noite soarem suas badaladas mortais!”.

A grande questão aí é como um vampiro poderia ser um adversário à altura de um mestre das artes místicas – e a solução encontrada é perfeita. No final da primeira parte, o doutor estranho tomba diante de Drácula.



A segunda parte, já na revista do Dr. Estranho, começa com o herói derrotado, incapaz de voltar ao seu corpo. E aqui a forma encontrada por Englehart para solucionar a situação é igualmente engenhosa.

No Brasil essas histórias foram publicadas pela primeira vez em Superaventuras Marvel 19 e 20.

Livro Como escrever quadrinhos

 


O livro Como escrever quadrinhos surgiu por acaso. Eu tinha sido convidado para uma convenção de quadrinhos em Belém e ia ministrar uma palestra sobre roteiro. Na última hora um convidado não pôde ir e a organização me pediu outra palestra, também sobre roteiro. Mas não podia ser a mesma, já que muita gente que vira a primeira palestra também veria a segunda.
O jeito foi improvisar: peguei algumas imagens de HQs minhas e fiz toda a minha apresentação em cima delas. Eu explicava não só o processo de produção do roteiro, mas também as dificuldades que eu enfrentara e como as resolvera.
No final, algumas pessoas que havia assistido as duas apresentações vieram elogiar e dizer que a segunda tinha sido mais interessante que a primeira. Uma delas me disse: “Por que você não transforma essa palestra em livro?”.
Eu já tinha um livro sobre o assunto, O roteiro nas histórias em quadrinhos, mas essa abordagem realmente parecia interessante: explicar como se faz roteiro a partir da minha própria experiência.
O livro, lançado em 2015 pela Marca de Fantasia, foi um sucesso. Tem sido usado como referência em vários cursos, TCCs, artigos. O relato mais recente é do amigo Alexandre Lobão, que, ao entrar na Gibiteca de Curitiba encontrou uma pessoa lendo o livro.
Como resultado, a tiragem de 800 exemplares já está praticamente esgotada.

Homem-aranha - longe de casa

 


O sucesso estrondoso do homem aranha está relacionado a uma fórmula que envolve ação, romance, drama e humor, cada um desses elementos na medida certa. 
É inevitável pensar nisso ao ver o novo filme do herói. 
Nesse filme temos a estreia de Mistério, um vilão menor do panteão de antagonistas do aracnídeo. Afinal, embora seja um dos primeiros antagonistas do aracnídeo, ele nunca teve uma grande história e nunca representou uma grande ameaça. Afinal, o personagem é apenas um ilusionista e, como tal, uma ameaça menor. 
Esse é o grande acerto do filme: transformar Mistério em uma ameaça real.
É um roteiro bem construído, apesar de algumas situações forçadas. O roteiro parece correr para que haja ação o tempo todo. Em determinado ponto, derrotado pelo vilão, perdido e sem dinheiro em um país desconhecido, a situação se resolve apenas com um telefone, usando o celular de um homem que fornece o aparelho sem sequer perguntar para onde será a ligação. Ali é tão óbvio que a solução não fazia parte do roteiro que os roteiristas incluíram uma piada, brincando com a situação.
Lembrando da afirmação inicial: parece haver algo errado na fórmula e no peso dos elementos. O excesso de ação não permite que os os outros elementos sejam devidamente explorados.Longe de casa é um filme melhor que seus antecessores, mas ainda é bastante inferior ao segundo filme de Sam Raimi.

Lanterna Verde e Arqueiro Verde – Ulysses Estrela está vivo

 

Em sua série sobre os dois heróis verdes da DC Comics, Denny O´Neil e Neal Adams falaram de várias mazelas dos EUA.  A situação dos indígenas norte-americanos foi abordada no número 79 da revista.

A história começa com um indígena sendo perseguido por dois homens que pretendem matá-lo. Ao interferir, os heróis descobrem que os perseguidores são o presidente do sindicato dos lenhadores e um brutamontes que se diz dono da área. Há 100 anos, o chefe Ulysses Estrela tinha feito um acordo com Washington, que cedia toda a madeira da região para sua tribo. O problema é que o registro desse acordo se perdeu e agora os lenhadores querem aproveitar para derrubar a floresta e lucrar com isso.

Neal Adams inovava nas soluções gráficas. 


A partir desse problema, cada herói tenta resolver o caso à sua maneira. O certinho Lanterna Verde procura os meios legais e chega a acionar um deputado em Washington, além de procurar o último descendente de Ulysses Estrela. Já o Arqueiro, em consonância com sua personalidade impetuosa, prefere se disfarçar como o fantasma de Ulysses Estrelas e convencer os indígenas a lutarem.

O Lanterna salva o último descendente de Ulysses Estrela de um incêncio criminoso... 


As divergências entre os dois termina com ambos lutando em um riacho.

O desenho de Adams está soberbo, como sempre, mas o roteiro tem problemas. Por exemplo, por que o descendente de Ulysses Estrela foi para a cidade ao invés de usar o documento para garantir os direitos da tribo? 

... enquanto o Arqueiro se disfarça como o fantasma do chefe indígena. 


Além disso, no final, as ações dos heróis não interferem em nada e tudo acaba se resolvendo de outra maneira. Talvez essa fosse uma forma O´Neil de afirmar que no final, quem deve resolver seus problemas são as pessoas normais, e não heróis, embora a história não deixe isso claro.

terça-feira, julho 30, 2024

Veludo Azul

 

Uma cena idílica. Flores, uma cerca de madeira pintada de branco, o céu azul, crianças atravessando na faixa, bombeiros passando e acenando. Parece o retrato perfeito de uma pequena e feliz cidadezinha do interior dos Estados Unidos. Então, a câmera enquadra um homem que rega alegremente o gramado de seu quintal. Ele tem um ataque cardíaco e cai ao chão enquanto a câmera se aproxima do gramado e a música Blue Velvet, de Bobby Vinton dá lugar a um som perturbador unido a imagens de insetos se devorando.

Esse é início de Veludo Azul, filme de David Lynch, de 1986 e representa perfeitamente a proposta da obra: mostrar o que se esconde por trás da aparência de normalidade e felicidade. Mostrar a sombra de uma cidade aparentemente pacata e feliz.

Na trama, o estudante Jeffrey Beaumont volta para casa para visitar o pai internado (o homem que sofre um ataque cardíaco na cena inicial). No caminho de volta do hospital, encontra uma orelha humana num matagal. Ele a entrega para a polícia, mas insatisfeito com os rumos da investigação oficial, resolve investigar o caso por conta própria. Isso faz com que ele vá penetrando cada vez mais fundo num reino sórdido de crimes e abuso sexual.

Sua investigação o leva até uma cantora de boate, Dorothy Vallens, cujo marido e o filho foram sequestrados por um mafioso local, Jack. A cena em que Jeffrey, escondido no armário, vê Jack abusando da cantora enquanto usa drogas é uma das mais marcantes do cinema de todos os tempos.

O filmes só foi feito porque o produtor, Dino DeLaurents, prometeu que daria liberdade total a Lynch em um filme barato se ele aceitasse as mudanças feitas em Duna (o produtor retalhou a obra). Lynch aproveitou bem a liberdade. Não só fez um filme que desnudava uma América que todos queriam encobrir como fez isso usando elementos de surrealismo. O filme todo parece ora um sonho, ora um pesadelo. Do nada surgem cenas gratuitas, como o bombeiro que passa no carro acenando ao lado de um dálmata, ou quando um dos personagens pega uma lâmpada e começa a cantar, sem razão nenhuma. Essa sensação de sonho/pesadelo é ainda mais destacada pelo clima teatral da obra, inclusive do ponto de vista de posicionamento dos atores em cena.

O filme foi ignorado pelo Oscar (só teve uma indicação, de melhor diretor, que Lynch perdeu para Sydney Pollack, de Entre dois amores). Dennis Hopper, que simplesmente encarnou o papel de mafioso depravado sequer foi indicado.

Mas com o tempo se firmou um culto em torno do filme e hoje Veludo Azul é considerado hoje uma das obras mais importantes do anos 80, abrindo caminho para que Lynch revolucionasse os seriados televisivos com Twin Pinks. Houve também uma consequência inesperada: a canção Blue Velvet, interpetada pela atriz Isabella Rossellini se tornou uma das mais tocadas nas rádios.

Howard, o pato

 


A década de 1970 na Marvel foi a era dos quadrinhos estranhos, fora da caixinha. A regra parecia ser “não há regra” – e eram muitas as experimentações. Surgiram desde quadrinhos sobre heróis espirituais, como Warlock, até quadrinhos sobre artes marciais (Mestre do Kung-fu). Até personagens clássicos, como o Dr. Estranho, tiveram aventuras que saiam completamente do comum – com o personagem contracenando com uma lagarta fumadora, por exemplo. Tudo isso capitaneado por uma geração de hippies que aproveitou ao máximo a abertura que a indústria de entretenimento estava lhes dando naquele momento.
Mas nenhum quadrinho foi tão revolucionário, tão fora da caixinha quanto Howard, o pato.
 O personagem surgiu como coadjuvante em uma aventura do Homem-coisa, escrito por Steve Gerber e desenhado por Val Maverick.
O monstro se envolvia em uma trama de encontros de realidades e – entre os personagens que surgiam estavam um bárbaro e um pato falante. Ao final da história, o pato simplesmente sumiu em meio às realidades, desaparecendo da história.


Seria o fim dele, mas os leitores gostaram do personagem e começaram a escrever para a Marvel pedindo mais histórias com aquele personagem. Roy Thomas, editor-chefe da editora na época, achava que o personagem não se sustentaria num título, mas Gerber garantiu que daria conta do serviço e o personagem ganhou uma segunda chance, primeiro na revista do Homem-coisa, depois com título próprio. O desenho ficou sob a responsabilidade de Frank Brunner (que havia ilustrada a fase mais lisérgica do Dr. Estranho) e depois de Gene Colan.
E eram aventuras absolutamente subversivas. Howard, depois que quicar em várias realidades, vem parar na terra, onde encontra uma linda moça que seria sua parceira e passa a viver suas aventuras enfrentando os tipos mais estranhos, a exemplo do Homem-nabo (vindo de uma espécie de vegetais agressivos que superaram os limites de suas raízes para se tornarem empreendedores galácticos), O Pestana (um artista com sonambolismo) e muitos outros.


Em uma das histórias, a dupla é vítima de uma gangue de valentões e Howard se torna mestre de Quac Fu em apenas três horas de treino!!! Aliás, essa é uma das aventuras mais divertidas, uma belíssima brincadeira homenagem ao personagem Shang Chi, da Marvel desenhada por John Buscema.
Howard não parava. Em um momento ele estava enfrentando um mágico contador espacial, em outro estava na cidade grande se deparando com uma velha gorda e adepta de teorias da conspiração, em outro estava num castelo vitoriano caindo aos pedaços enfrentando um monstro Frankstein feito de biscoito. Em outras palavras: era piração em cima de piração.
O ponto alto desse processo é quando o Partido Noturno resolve lançar Howard como candidato à presidência – e este passa a ser alvo de todo assassino profissional do país.
O personagem fez tanto sucesso que se tornou filme, uma película pouco inspirada que tinha pouco a ver com toda a subversão dos quadrinhos.

I-ching

 


            As mudanças constantes do universo são representadas nas figuras do Yin Yang. Yang representa a força masculina do universo, violenta, criadora. Yin é a força feminina, receptiva, flexível. Yin é a intuitiva, meditativa e complexa. Yang é racional, criativo e ativo.

            Na filosofia taoista, Yin e Yang são elementos do mesmo processo.  Quando um chega ao seu auge, engendra o outro. Ser sábio é combinar esses dois pólos, harmonizando Yin e Yang.

O estudo do ciclo de Yin Yang, embora seja muito influenciado pelas ideias taoistas, é comum a toda a cultura chinesa e já existia em um livro ancestral, o I-ching.

            A mais antiga forma de adivinhação chinesa era a leitura de sinais nos ossos de bois, surgidos depois que eram expostos ao fogo. Daí foi criada a adivinhação em cascas de tartaruga. Na dinastia Shang, o oráculo era consultado com o uso de varetas. O sábio jogava as varetas e determinava se a linha era inteira ou cortada. Depois de jogar seis vezes, formava-se o hexagrama e era possível interpretar seu significado.

            Em torno do ano 1150 a.C., o imperador Shang Chou Hsin mandou prender o governador da província de Chou, o rei Wen. Na prisão, ele elaborou os julgamentos dos hexagramas. Posteriormente, seu filho tomou o poder, tornando-se imperador e, descobrindo o trabalho do pai, resolveu ampliá-lo, escrevendo os comentários às linhas mutáveis. Posteriormente, o oráculo foi enriquecido com comentários atribuídos a Confúcio e seus discípulos.

            O I-ching não é um livro de adivinhações, pois ele não prevê o futuro, mas estabelece o estado em que as coisas estão, analisando a mudança e a relação entre as forças Yin e Yang.

            Por exemplo, no primeiro hexagrama, todas as linhas são inteiras. A imagem formada representa uma situação apenas de linhas fortes Yang, que significam força, criatividade e liderança, razão pela qual esse hexagrama é normalmente chamado de O criativo. O julgamento diz que as forças do céu impelem o homem e o ajudam a iniciar ou levar adiante um empreendimento. O comentário diz que “as forças da natureza favorecem tudo aquilo que se inicia”.

            O hexagrama oposto, chamado de O receptivo, é formado apenas por linhas cortadas, representando Yin, a passividade, a dedicação e concórdia, a diplomacia, a perseverança e a paz. O julgamento diz que o sucesso está garantido se a pessoa que consulta o oráculo colaborar e se deixar conduzir, mantendo-se sempre flexível e disponível. O comentário diz que “Ser receptivo é muito importante, pois todos os seres lhe devem o nascimento. Como a Terra, cuja função é receber a semente que depois darão os frutos, também obterá muitos benefícios àquele que souber tolerar e compreender as pessoas e as situações”.

Tom Strong e o planeta do perigo

 

 


Imagine a responsabilidade de escrever um personagem concebido por Alan Moore. É esse desafio que Peter Hogan se impõe na série em seis partes Tom Strong e o planeta do perigo (publicada encadernada no Brasil pela Panini em 2019).
Hogan se aproveitou de uma história do personagem publicada nos números 11 e 12 do título regular no qual Tom descobre uma contraparte da terra, chamada por ele de terra obscura, ocupada por diversos heróis científicos, inclusive uma contraparte sua, chamada de Tom Strange. Nessa fase da revista, Moore estava fazendo homenagens a quadrinhos clássicos e o número 12 imitava as capas da liga da justiça, inclusive na logo da revista e era uma clara alusão às terras paralelas da DC.
Na história, Telsa está grávida, mas a gravidez pode matá-la...


Na série de Hogan, Strong precisa da ajuda de Strange para salvar sua filha, Tesla. Seu filho, como o pai, tem a propriedade de se transformar em lava incandescente e isso pode matar a mãe. A única forma de resolver a situação é tornar Tesla invulnerável usando a fórmula Alisson, de  Tom Strange.
Mas quando chega no planeta obscuro, Tom Strong percebe que sua missão não será fácil: o local está dominado por uma praga que matou milhões de pessoas. E ele e Val, seu genro, podem estar infectados e levar a doença para a seu planeta. 
... para salvá-la, Tom e o genro vão para a Terra Obscura, mas o local está arrasado por uma pandemia. 


Assim, para salvar sua filha, ele precisa primeiro salvar a terra obscura, ajudando a encontrar uma cura.
Peter Hogan não é Alan Moore, mas consegue dar conta do recado. Consegue fazer uma história divertida, que aprofunda a mitologia da terra obscura. A arte de Chris Sprouse também ajuda bastante.