A relação do autor com a editora começou de forma no mínimo bizarra. O roteirista Al Feldstein adaptara uma das histórias de Bradbury para os quadrinhos. O escritor, que lia as revistas da EC, escreveu uma carta reclamando. O dono da editora, William Ganes escreveu de volta com um cheque dizendo que eles tinham esquecido de enviar o valor refrente aos direitos autorais. O que começou como uma rusga virou amizade. A partir daí, o escritor liberou vários outros textos para serem adaptados.
Algumas dessas adaptações aparecem no álbum O papa defuntos, publicado pela editora LPM em 1990. A edição reúne seis histórias, todas com roteiros de Al Feldstein e desenhos de gente do calibre de Jack Davis e Wally Wood.
De toda a edição, a história mais fraca é O ataúde, com desenhos de Davis. Nela, um inventor tem um irmão alcoolatra e folgado, que se acha vítima, embora viva do dinheiro do irmão. A história começa com o irmão mais velho inventando um ataúde, pois sente que vai morrer. E de fato morre, mas o irmão bebâdo mando enterrá-lo num cesto de vime para economizar dinheiro. Curioso, entra no ataúde para só então descobrir a horrível verdade. É uma trama convencional, de alguém mal que recebe o castigo merecido.
Já Tia Tildy é uma típica história bradburyana, com um toque poético macabro. Na trama, uma velha se recusa a morrer e chega ao ponto de ir à funerária pedir seu corpo de volta. A forma como isso é contado é poética e ao mesmo tempo mórbida, algo destacado pelo traço distorcido de Graham Ingels.Marte, o paraíso é adaptação de uma das histórias mais célebres do livro Crônicas marcianas. Nela um grupo de astronautas pousa em marte e descobre que o local onde pousram é a exata réplica de uma pequena cidade norte-americana do início do século XX. É um dos finais mais antológicos e surpreendentes de todos os tempos.
Olhai os pássaros é um daqueles contos braburyanos em que o que é contado importa menos do que a forma aquilo é contado. Na história, um agricultor inventa uma maneira de voar, mas é executado pelo imperador. O ar de poesia e de metáfora é ainda mais destacado pelo desenho sensível e inovador de Bernard Krigstein.
O papa-defuntos, que dá nome ao título é a históira de um agente funerário que vira piada na cidade inteira, mas se vinga profanando os cadáveres das pessoas que caçoaram dele. É a história mais escatológica do álbum. Desenhada por Graham Ingels, uma escolha mais do que acertada.
Mas a melhor história do álbum é Dia das bruxas, com desenhos de Jack Kamen. É uma trama no melhor estilo do terror psicológico sobre um homem que resolve matar a própria filha. É um conto perturbador sobre demência que vai aos poucos tomando conta do protagonista a começar pelo flash back no qual ele se lembra do outono no qual ele havia se lançado ao chão, diante da casa da avó e chorado sem nenhuma razão. Depois acompanhamos seu casamento e o nascimento de sua filha, o crescimento da filha. Todos esses fatos, que poderiam ser momentos de felicidade, se transformam dentro de sua mente transtornada e paranóica. O final, em que ele comete o crime no meio de uma brincadeira de halloween é arrebatador por misturar terror psicológico com pura escatologia.
Sem comentários:
Enviar um comentário