A
noção de demônio, básica para a Igreja Católica, serviu como hálibe para a perseguição a diversas minorias. Judeus,
ciganos, homossexuais, mulheres e qualquer pessoa que tivesse um comportamento
diferente poderia ser queimado pela fogueira da inquisição. Em Portugal, o
simples fato da pessoa tomar banho aos sábados era uma prova que poderia ser
usada contra ela num processo por judaísmo. Os padres, inclusive,
desestimulavam os banhos, pois a água entrava em locais que não era pudico
tocar.
Para a
Igreja, o demônio era a mulher. Os inquisidores Heinrich
Kraemer e James Sprenger, autores do Malleus Maleficarum, o Martelo das
Bruxas, livro de cabeceira dos religiosos da época diziam que deve-se exorcisar
o demônio que tem seios e cabelos longos. Para eles, a voz da mulher era como o
canto das sereias, que com suas doces melodias atraem os viajantes os matam
esvaziando seus bolsos e fazendo com que abandonem a Deus.
A bruxa, feia,
com os cabelos desgrenhados, desdentada e apavorante é a mulher em seu estado
natural, pois o diabo vive da luxúria carnal, que nas mulheres é irresistível.
A mulher, para os religiosos da época, era mais amarga que a morte. Seu beijo é
como a picada do escorpião. Seu abraço é um garrote que tira do homem a vida. A
serpente seduziu Eva, que fez perder o homem. Não fosse ela, teríamos o paraíso
na terra. São Bernardo disse que seu rosto é um vento queimante e que sua voz é
como o sibilo das cobras.
Catão de Utica
disse que se pudéssemos nos livrar das mulheres, não teríamos necessidade de
Deus nas nossas relações, pois sem a malícia e bruxaria das mulheres, o mundo
não conheceria perigos. Valerlo disse delas que são como as Quimeras, pois o
monstro tinha três formas: seu rosto era do radiantes e nobre leão, tinha o
ventre asqueroso de uma cabra e o rabo era de uma serpente. Da mesma forma, a
mulher é formosa em aparência, contaminada ao tato e mortífero viver com ela.
Os Eclesiastes dizem dela que "Não
há cabeça superior à de uma serpente, e não há ira superior à de uma mulher.
Prefiro viver com um leão e um dragão que com uma mulher malévola”.
Mas não é só a
mulher que era fonte da danação. Também os judeus o eram.
Dizia-se que o
demônio em pessoa dava aulas nas sinagogas e que os judeus tomavam como cuidado
seu profanar hóstias e envenenar a água benta. Acreditava-se que cospiam sobre a
hóstia usando a mesma boca que beijou as pudentas do diabo.
Os grandes flagelos do fim da
Idade Média foram creditados a eles, a peste negra, a febre amarela e todas as
outras desgraças. Por isso mesmo eram perseguidos em todos os cantos. No livro
O Complô, o quadrinhista Will Eisner mostra como uma intriga palaciana fez com
que o serviço secreto russo produzisse um documento, O Protocolo dos Sábios de
Sião, que seria o plano dos judeus para dominar o mundo. Esse livro foi a base
da propaganda nazista, mas engana-se quem pensa que a perseguição aos judeus
começou com o nazismo. Essa modalidade já era praticada há muito tempo pela
Igreja.
Também o negro era um
representante do demônio. Dizia-se que, como o pecado, o negro é inimigo da luz
e da inocência.
Santa Tereza era uma inimiga
ferrenha do mestre das trevas e um dia ele a visitou. Era um garotinho negro
com uma chama vermelha. Estava nu, pois os demônios, assim como os negros, não
têm vergonha de seus próprios corpos. E assim, nu, ele se sentou sobre as
sagradas escrituras e com suas pudentas em chamas queimou o livro.
Episódios como esse
justificavam a escravidão, a tortura e a fogueira.
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